ANÁLISE CRÍTICA DA OBRA DE EGON BELZ

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1 ANÁLISE CRÍTICA DA OBRA DE EGON BELZ ANÁLISIS CRÍTICO DE LA OBRA DE EGON BELZ CRITICAL ANALYSIS OF THE WORK OF EGON BELZ Eixo 2 O lugar da teoria, da crítica e da história no projeto Ana Lúcia Abrão Latrônico Acadêmica de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Regional de Blumenau Resumo: Este trabalho apresenta um estudo sobre a vida e a obra de Egon Belz, com o objetivo de mostrar a importância deste para a história da arquitetura de Blumenau, registrar seu acervo e analisar algumas de suas obras. Primeiramente foi realizada a revisão bibliográfica sobre a vida do arquiteto, entrevistas, e seus escritos para entender seu pensamento sobre a arquitetura. Posteriormente, foi feito um levantamento do seu acervo arquitetônico, que classificou seus projetos cronologicamente e tematicamente. Finalmente, quatro obras foram escolhidas e analisadas. Observamos que a maioria dos projetos de Belz é residencial, totalizando 33% do seu acervo. Destas obras, foram analisadas as residências de Nilton de Andrade, Manoel Wilson Almeida, Elvis Schlegel e Leopoldo Schmalz. Estas residências possuem características em comum, que combinam a arquitetura vernacular com o modernismo, o que pode ser considerado uma das maiores contribuições do arquiteto para a arquitetura da região. Palavras-chave: Arquitetura e Urbanismo, Egon Belz, Acervo Arquitetônico, Projetos Arquitetura, Arquiteto Blumenau. Resumen: Este trabajo presenta una investigación sobre la vida y obra del arquitecto Egon Belz. Tiene la finalidad de revelar la importancia de éste para a historia de la arquitectura de Blumenau, registrar su acervo y analizar algunas de sus obras. Primero fue realizada la revisión bibliográfica sobre la vida del arquitecto, entrevistas, y sus escritos para entender su pensamiento sobre la arquitectura. Después se hizo un levantamiento de su acervo arquitectónico, que clasificó sus proyectos cronológica y temáticamente. Finalmente, fueron elegidas y analizadas cuatro obras. Observamos que gran parte de los proyectos de Belz es residencial, totalizando un 33% de su acervo. De estas obras, fueron analizadas las viviendas de Nilton de Andrade, Manoel Wilson Almeida, Elvis Schlegel y Leopoldo Schmalz. Estas viviendas tienen características en común, que combinan la arquitectura vernácula con el modernismo, lo que puede ser considerado una de las más grandes contribuciones del arquitecto para la arquitectura de la región. Palabras-clave: arquitectura y urbanismo, Egon Belz, patrimonio arquitectónico, proyectos de arquitectura, arquitecto Blumenau. Abstract: This paper presents a study of Egon Belz s life and work, with the main pourpose of describing its importance for the Blumenau architectural history. It also provides a analyze and record of some his architectural projects. The methodology includes a literature review on the life of architect, some interviews and writings to understand the way this architect thinks about architecture. Afterwards, it was made a survey of its architectural heritage, which ranked their projects chronologically and thematically. Finally, we observed that 33% of Belz s projects were housing. The architetonic project Andrade s, Wilson s, Schlegel s and Schmalz housing projects were analyzed. It was found that these housing architetonic project have some characteristics that combine modernism with vernacular architecture, which can be considered one of the greatest contributions of the architect to the local architecture heritage. Keywords: architecture and urbanism, Egon Belz, architectural collection, architecture projects, Blumenau architect.

2 ACERVO ARQUITETÔNICO EGON BELZ INTRODUÇÃO A arquitetura moderna em Blumenau chegou tarde, considerando seu desenvolvimento em nível internacional ou mesmo no Brasil. Neste contexto destacou-se o arquiteto Egon Belz por combinar os elementos da arquitetura moderna com os tradicionais de origem germânica, muito presentes na cidade, e, assim, criando uma tipologia própria, que se percebe facilmente ao analisar seus projetos. Portanto, no âmbito regional, Belz tem grande importância para a história da arquitetura e evolução das técnicas construtivas da região. Falecido em 2007, o arquiteto preservou seu acervo de projetos, que contém, não só as versões finais, mas também o processo evolutivo, por meio dos diversos estudos e croquis realizados, possibilitando uma análise mais detalhada de suas obras. Os projetos de Belz foram classificadas cronologicamente e por temas. Destes, foram escolhidas quatro residências para realizar sua análise completa, levando-se em consideração morfologia, funcionalidade, técnicas construtivas, conforto ambiental, espacialidade interior, relação com o espaço exterior; e assim, essas obras foram relacionadas entre si, podendo-se perceber com clareza a linha projetual do arquiteto. Contextualização Egon Belz nasceu em 19 de novembro de 1931, em Blumenau, SC. Filho de Lily e Willy Belz, morava no Bairro Ribeirão Fresco, onde teve uma infância muito livre, possibilitada pelo grande pomar que possuía atrás de casa o que, segundo ele, está se perdendo com a vida e o urbanismo modernos (BELZ, 2002). Começou sua vida escolar no Colégio Sagrada Família, onde estudou três anos, para depois transferir-se para o Colégio Santo Antônio. Sentiu uma grande diferença nessa mudança, não se acostumando com a rigidez da nova

3 escola. Por isso, transferiu-se para Curitiba, onde estudou durante um ano no Colégio Novo Ateneu, e onde adaptou-se muito bem (BELZ, idem). Egon destacou-se no esporte, por influência de seu pai que também era desportista. Mas quem o influenciou rumo à arquitetura foi sua mãe, que lhe contava detalhes sobre a construção de sua casa, quando ainda era muito jovem (BELZ, 2003). A relação entre arquitetura e esporte sempre esteve muito próxima para ele. O arquiteto conta que o esporte o ajudou a ter boas amizades e oportunidades na vida. E foi por causa do esporte que Egon foi morar em São Paulo, onde confirmou-se sua vontade em cursar arquitetura, aguçada pelas exposições do curso de arquitetura da Universidade Mackenzie apesar de que já manifestava essa preferência desde os tempos em Curitiba (BELZ, 2002). Na época em que cursou o segundo grau na Mackenzie, conheceu o arquiteto Franz Bastian, através de seu filho, o que o levou a trabalhar alguns meses no escritório Breslau & Bastian. Foi aí que teve a oportunidade de se aprofundar no desenho arquitetônico, pois até então era autodidata. Quando Belz foi passar as férias em Blumenau, seu primo o contou que estava trabalhando com um arquiteto recém chegado da Alemanha, e sugeriu que Egon mostrasse seus trabalhos para ele. Foi assim que Hans Broos convidou-o para trabalhar no seu escritório. A minha arquitetura procura ser sóbria, clara, sem rodeios e sem ostentação inútil. Egon afirma, ainda, que teve o privilégio de ter clientes que aceitavam suas idéias, pois em diversos casos, a comunidade não se achava ainda culturalmente preparada para receber propostas arquitetônicas mais avançadas. O projeto do Ginásio de Esportes Sebastião Cruz, o Galegão, que o diga (BELZ, Idem). Para Egon, São Paulo foi uma época muito feliz e de grandes experiências: participou dos festejos do 4º Centenário da cidade de São Paulo acompanhando a evolução dos preparativos, o desenrolar de obras, com alguns espaços importantíssimos, como por exemplo, o Parque do Ibirapuera,

4 de Oscar Niemeyer, considerado por arquitetos, intelectuais, urbanistas e o próprio povo, como um grande signo da cidade de São Paulo. Também em São Paulo trabalhou no escritório de Hans Broos, formando uma importante parceria. Sob a tutela de Hans Broos, Egon teve grandes colaborações em projetos que foram destaque no cenário nacional, como por exemplo: o Hospital em Santos, publicado na revista Acrópole n 318, em 27 de junho de 1965; o Hospital Osvaldo Cruz de São Paulo, publicado na revista Habitat n 77, em maio de 1964, entre outros mais. Esta relação fez com que na obra arquitetônica de Egon possa ser claramente notada a influência do modernismo e da arquitetura de Hans Broos que, conforme Daufenbach (2006), concebia espaços nítidos, utilizando planos na vertical e horizontal, onde o concreto aparente surge como material de expressividade. Depois de morar mais de 10 anos na maior metrópole da América do Sul, regressou a sua cidade natal. De volta a Blumenau, Egon abriu, em 1967, seu próprio escritório, com o nome de Ebelza Projetos, que mais tarde, em 1999, foi transferido para sua antiga casa, no Bairro Ribeirão Fresco (ODEBRECHT; MARTINS, 2010). Mesmo já tendo uma vasta experiência na área em que trabalhava, Belz sentia falta de exercer a profissão com maior propriedade, por isso em 1977 ingressou no curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), graduando-se em 1985 (ODEBRECHT; MARTINS, Idem). O arquiteto e desportista foi um dos defensores do modernismo em Blumenau, o que vai ao encontro de suas palavras, uma cidade precisa evoluir, não pode estar sobre uma falsa compreensão do que seja tradição (BELZ, 2003). Segundo clientes, o arquiteto sabia captar bem as idéias, e procurava fazer obras que valorizassem a paisagem, usando materiais simples e que não prejudicassem a natureza (MAZZAFERRO, 2003). Também era ideia de Belz, fazer com que as pessoas e a comunidade compreendessem um pensar arquitetônico moderno, contemporâneo, sem no entanto esquecer os elementos oriundos da tradição cultural da região, revelada pelo tijolo maciço aparente e pela madeira. Para o arquiteto persistiam dois pensamentos básicos: 1. A preservação do patrimônio arquitetônico original ainda existente.

5 2. A construção moderna, contemporânea, através de um amalgamento engenhoso com a antiga arquitetura enxaimel. Esse segundo pensamento ficou registrado em diversas obras de Egon Belz, nas quais tirou partido da expressividade do concreto aparente, como material inovador, e também de grandes panos de vidro. Por outro lado era constante o uso da madeira, como material tradicional nas esquadrias e estrutura da cobertura, e do tijolo aparente, característico da arquitetura vernacular da região. MATERIAL E MÉTODOS Primeiramente, para contextualização e entendimento da obra do arquiteto Egon Belz, foi realizada uma pesquisa sobre sua biografia, considerando a importância do esporte em sua vida, suas influências culturais, a experiência adquirida trabalhando em São Paulo e com o arquiteto Hans Broos. Também foram utilizadas entrevistas realizadas anteriormente por outros acadêmicos, e seus escritos, para o entendimento do seu pensamento. Na seqüência, este trabalho inventariou o acervo profissional de Belz, seguindo critérios de classificação cronológica e temática. Para a classificação do material inventariado foram criadas tabelas com o registro de todos os projetos e um gráfico percentual para compreender quantitativamente as áreas temáticas abordadas pelo arquiteto e existentes em seu acervo. De posse deste registro, foram selecionadas quatro residências ainda não estudadas. Suas plantas baixas foram digitalizadas com ajuda do Auto CAD e os croquis perspectivos foram escaneados para facilitar a divulgação do material e seu manuseio durante este trabalho. Posteriormente, foi realizada uma análise mais aprofundada das características projetuais de cada residência, relacionadas à implantação, volumetria, funcionalidade, uso de materiais e elementos arquitetônicos, conforto ambiental e a interação com a paisagem na relação interior/exterior.

6 Como conclusão da pesquisa, as quatro residências foram comparadas, procurando-se analogias entre elas, e assim, poder reconhecer a linha projetual da arquitetura de Egon Belz, que lhe é tão característica. RESULTADOS E DISCUSSÃO Como Belz manteve praticamente todo seu acervo guardado, não só os projetos finais mas também os estudos e croquis realizados para a concepção de cada obra, bem como seus projetos acadêmicos, esta pesquisa conseguiu fazer com que se submergisse no mundo do arquiteto e que fosse possível fazer todos os registros necessários. O acervo arquitetônico de Belz conta com 308 projetos, que foram classificados cronologicamente e por temas. São eles: (I) projetos residenciais, (II) igrejas, (III) edifícios, (IV) interiores, (V) esportivos, (VI) comerciais e industriais, (VII) detalhamentos, (VIII) projetos acadêmicos, e (IX) diversos. Pelo número de obras registradas para cada tema, verificou-se que o principal foco de Belz foram os projetos residenciais, que compõem 33% do seu acervo arquitetônico, como pode ser observado abaixo, na Tabela 01, seguida do gráfico da Figura 01. Tabela 01: Classificação das Obras de Egon Belz. CATEGORIA QUANTIDADE Residenciais 101 Igrejas 13 Edifícios 16 Interiores 26 Esportivos 18 Comerciais e Industriais 47 Detalhamentos 36 Acadêmicos 9 Diversos 42 Figura 01: Gráfico circular: porcentagem dos projetos do acervo de Belz.

7 Segue abaixo a Tabela 02, contendo os projetos residenciais que se encontram no acervo de Belz: Tabela 02: Projetos Residenciais de Egon Belz. RESIDENCIAIS NOME ANO Estudo para residência - não identificado Ingo Scharf - Reforma apto Egon/Elgrit Belz - Moradia/Escritório (levantamento) Com Gershausen - perspectivas Sr. Antonio M Gouveia Residência Herold Residência Ligia - estudos Lindoll Bell - piscina Ruy Willecke - reforma - estudos Orlando Moraes Erwin Michel 1958 D. Helia - Comboriú 1962 Residência Harry Hannemann 1965 Iwan Hertwig 1966 Residência 'Marcolino' 1966 Egon Belz - estudos para escritório + moradia 1967 Residência Longershausen 1967 Orlando Baron 1967 Casa Siedfrid 1968 Gert Steinbach 1969 Residência Dieter Schmidt - granito 1969 Orion Tonolli 1970 Casa de praia Ralf Willeke 1970 Manfredo Bubeck 1970 Eugen Belz 1971 Casa Peiter Felpudos - préd. Histórico rua XV 1971 Ingomar Annvseck 1971 Celso Zipf 1971 Waldir Klitzke - Reforma 1971 Rolf Steinbach - reforma 1972 Adolfo Schmalz - Reforma/Ampliação 1972 Hans Schadrack 1972 Piscina dr. Evaristo Gouvea 1973 Jemerson Rodrigues - apto 1973 Residência Spethmann - reforma 1973

8 Dr. Rufino - casa de praia 1974 Apto. Leopoldo Schmalz 1974 Apartamento Divo Lara 1974 Darcy Mendes 1974 Gert Hofmann - reforma 1975 Celso Zipf - reforma 1975 Dr. Antônio Andrade 1975 José Sotto Anísio Petris 1976 Juarez Aumond 1976 Ewald Jan Scherner 1977 Eduardo Po Krywieky 1977 Leopoldo Kohlbach 1977 Sr. Paul Heinritz 1977 Waldir Klitzke 1978 Sr. Edelmas Soccal 1978 Casa Antônio Pacheco - reforma 1978 Casa de baixo 1978 Lilly Belz Eulália Hering 1979 Alfredo Wuensch 1979 João Wanka F Luiz Carlos Damiani 1979 Jorge Tennenberg 1979 Cláudio Fraga 1980 Hans Prayon 1980 Mário Mazzaferro - elétrico 1980 Mazzaferro Nello 1980 Leopoldo Schmalz Residência Casas 1981 João Mosimann 1982 Rudiberto Maus 1982 Mario Mazzaferro - arquitetônico 1982 Mario Mazzaferro 1982 Gerold Zumach 1983 Ricardo Meyer 1983 Erica H. H. Saur 1983 Arno Missner 1984 Waldemar Knecht 1984 Gert Hofmann 1984 Manoel Wilson Almeida 1984 Odete Nascimento 1985 Estudos apto. Ricardo Meyer 1985 Günther Steinbach 1985 Eunildo Rebelo 1986 Apartamento Leopold A Schmalz 1986 Apartamento "Mansão Rafaelo - estudos" 1986 Gerhard Blohm 1986 Sebastião M. Pereira 1986 Nilton de Andrade 1987 Valdemar Pedrini - Churrasqueira 1987 Lazaro Rebelo 1988 Apto. Sr. Sert Hofmann - Perspectiva 1988 Elvis Schlegel 1988 Osvaldo Luciani 1990 Eocir Baeza Lopes 1991 Eocir Baeza Lopes - elétrico 1991 Jaison Bretzeke 1993

9 Ademar Kruegue 1994 Andrea Clarke 1994 Residência/restaurante Orlando Morais 1994 Residência Borba 1996 Leopoldo Schmalz apto Residência Sakurada 1998 Wilson Dickmann 1998 Sotto 2003 Destas 101 obras, foram selecionadas: a residência Nilton de Andrade, residência Manoel Wilson Almeida, residência Elvis Schlegel e residência Leopoldo Schmalz para a realização de detalhada análise, considerando

10 implantação, morfologia de planta e volume, funcionalidade, conforto ambiental, materiais e técnica construtiva, espacialidade interior e interação com a paisagem. Segue abaixo a análise destas obras: Residência Nilton de Andrade A residência Nilton de Andrade foi projetada em 1987 para o Loteamento Champs Elisees II, em Blumenau SC, num terreno de grandes dimensões, e com desnível em sua diagonal. Esta declividade foi aproveitada no projeto, gerando quatro expressivos níveis: o setor íntimo no mais alto; o setor social e a garagem três degraus abaixo do íntimo; a piscina, ainda mais baixa, separando-se da casa por um talude com escadaria de 8 degraus; e no nível mais baixo desenvolve-se grande área de jardim, o que pode ser observado na perspectiva, Fig. 3. Também o acesso social, que ladeia o de veículos, apresenta-se escalonado, para vencer o desnível desde a rua. Figura 02: Planta Baixa da Residência de Nilton de Andrade. Fonte: Desenho de Ana Lúcia conforme original do acervo de Egon Belz. 1 - Vestíbulo 6 Lavanderia 11 Dormitório 2 - Lavabo 7 Banho 12 Dormitório Casal 3 Sala de estar e jantar 8 Banho Casal 13 - Garagem 4 Copa 9 Dormitório 5 - Cozinha 10 Dormitório

11 O projeto é composto por dois corpos retangulares interceptados horizontalmente e cobertos por um telhado de duas águas, que de modo contínuo prolonga-se sobre a garagem incorporando um grande vazio ao volume fechado. O fato de uma planta formalmente irregular, conforme Figura 02, receber uma cobertura contínua em duas águas, determina limpeza volumétrica à edificação. Foi projetada em alvenaria portante, utilizando revestimentos diferenciados na fachada: madeira na estrutura aparente da cobertura e nas esquadrias, reboco convencional nas paredes, e uma cinta de concreto aparente que contorna a edificação amarrando o corpo vazio ao fechado (Figura 03). Figura 03: Residência de Nilton de Andrade. Fonte: Croqui de Egon Belz, acervo do arquiteto. Assim como em outras obras de Belz, a natureza do entorno se integra à residência através de um jardim localizado entre o vazio coberto e um dos volumes da casa. Os dormitórios abrem-se para a piscina por meio de portas janelas, mesma forma de abertura que integra a área social ao jardim. A setorização da casa é clara e estanque, com a área social na parte frontal, e as áreas de serviço e íntima locadas em lados opostos, separadas por um corredor linear na parte central da casa, que determina a circulação principal outra característica de diversos projetos de Belz.

12 Os cômodos são, em sua maioria, tradicionalmente compartimentados, com exceção das salas de estar e jantar que são integradas, divididas somente por uma estante no centro do grande espaço. A cozinha isola-se junto ao setor de serviço. Neste projeto, Belz também explora os níveis para criar uma espacialidade interna, deixando a área social hall, lavabo e sala de estar e jantar 45cm mais baixa que o restante da casa, e assim, conseguindo um pé direito mais elevado para esses ambientes. Quanto à insolação, os quartos e sala de estar/jantar estão voltados para noroeste, onde incide o sol da tarde. Por isso, todas as aberturas desta fachada receberam venezianas proporcionando o controle da entrada do sol, e o conseqüente conforto ambiental térmico em seu interior. Também os grandes beirais ajudam neste sentido. Esta questão climática, bem como a relacionada com a paisagem, ou a adequação topográfica, são consideradas importantes pelo arquiteto e se tornaram recorrentes em seus projetos. Residência Manoel Wilson Almeida A Residência Manoel Wilson Almeida foi projetada em 1984, para a Rua Carlos Rieschbieter, no Bairro Boa Vista, em Blumenau - SC. O terreno tem uma frente de 47m, o que possibilita o acesso da garagem pela lateral da casa, e o acesso social pela frente (Figura 04). Figura 04: Planta Baixa do pavimento térreo da Residência de Manoel Wilson Almdeida. Fonte: Desenho de Ana Lúcia conforme original de Egon Belz.

13 1 Área de Serviço 6 Banho 11 Escritório 16 Quarto 2 Depósito 7 Despensa 12 Lavabo 17 Garagem 3 Banho 8 Circulação 13 Estar 18 Terraço 4 Lavanderia 9 Cozinha 14 Jantar 19 Terraço 5 - Criada 10 - Vestíbulo 15 - Jardim 20 Pátio para secagem Nesta residência, como na maioria dos projetos de Belz, nota-se a forte integração com a natureza, através de floreiras, terraços, e um jardim na parte central da casa - que pode ser contemplado pela sala de jantar/estar, corredor e quarto, além da churrasqueira na parte externa da casa - fazendo referência às casas-pátio da arquitetura moderna; além de grandes aberturas que trazem toda essa natureza para o interior da casa. O grande número de sacadas, terraços e o integrado jardim, concebidos como espaços de transição, também exploram as visuais do exterior, conduzindo o olhar para a paisagem, ainda muito verde no Bairro Boa Vista. A edificação apresenta dois pavimentos que se dividem em três volumes: dois mais baixos, com apenas um pavimento e cobertos por telhado de duas águas, e outro volume mais alto, com dois pavimentos, também coberto por telhado de duas águas. Esta composição determina um conjunto dinâmico de formas irregulares. Figura 05: Planta Baixa do pavimento superior da Residência de Manoel Wilson Almeida. Fonte: Desenho de Ana Lúcia conforme original do acervo Egon Belz.

14 21 Dormitório casal 25 Circulação 29 W.C. 22 Terraço 26 Passagem 30 - Chuveiro 23 Sacada 27 Dormitório filhos 24 - Banho 28 - Sacada Na fachada principal, o volume da escada destaca-se por seus cantos chanfrados, marcando o acesso social com sua expressiva escadaria ornada por duas floreiras, que loca a residência num nível mais elevado em relação ao terreno. Ainda na fachada principal, o muro de elementos vazados que delimita e protege visualmente o pátio de secagem, apresenta o mesmo formato chanfrado, repetindo a forma numa dimensão ampliada. A modulação da edificação, construída em alvenaria portante, é bem clara, outra característica forte nos projetos de Belz. Também a setorização da residência é evidente, somente se confunde pela existência de um cômodo que pode ser um quarto de visitas ou uma sala íntima, espaço que fica deslocado da área íntima. Há também um cômodo junto ao hall de entrada, que pode ser usado como escritório. No 2º pavimento localiza-se somente a área íntima, dando total privacidade ao setor (Figura 05). A circulação principal se dá em linha reta, por um corredor central, nos dois pavimentos. Os cômodos são, no geral, compartimentados, com exceção das salas de jantar e estar, que são integradas. Este cômodo também se integra à área de churrasqueira/terraço, através das grandes portas-janelas. Conforme a planta, há somente um dormitório para os filhos, porém, o formato do cômodo e a existência de duas portas, define claramente o espaço em duas áreas. Essas duas áreas deverão ser compartimentadas por meio de armários embutidos, dispensando as paredes e ganhando espaço útil. O uso de armários divisores em detrimento de paredes é recorrente nos projetos de Belz. As escadas dos terraços do primeiro pavimento também são aproveitadas para a criação de bancos. Residência Elvis Schlegel

15 Figura 06: Planta Baixa da Residência de Elvis Schlegel. Fonte: Desenho de Ana Lúcia conforme original do acervo Egon Belz. 1 Hall 6 Cozinha 11 Quarto casal 16 Área coberta 2 - Lavabo 7 Lavanderia 12 Vestiário casal 17 Pátio 3 Sala de estar 8 Circulação 13 Banheiro casal 18 Área coberta para 2 carros 4 Sala de jantar 9 Dormitório 14 Banheiro 19 Sala de jogos 5 - Copa 10 Dormitório 15 Banheiro serviço 20 - Piscina Projetada em 1988, a residência de Elvis Schlegel localiza-se no loteamento Morsh, no Bairro da Velha, em Blumenau - SC, num amplo terreno de esquina. Trata-se de uma edificação térrea com dois estudos de volumetria, ambos com cobertura de telhas cerâmicas, cuja estrutura é formada por um misto de concreto e madeira. O sistema construtivo também utiliza alvenaria portante. Na alternativa volumétrica 1 (Figura 07), a residência é composta por quatro (4) volumes, cada um coberto por telhado de duas águas criando um dinâmico jogo de cumeeiras, todas perpendiculares ao acesso principal. Uma cobertura plana interliga a sala de jogos, localizada num volume separado por um pátio, ao corpo principal da casa e define o espaço da churrasqueira. Nesta alternativa a manifestação do concreto aparente se dá de modo restrito.

16 Figura 07: Estudo de Volumetria 1 Residência Elvis Schlegel. Fonte: Croqui de Egon Belz, acervo do arquiteto. Na alternativa volumétrica 2 (Figura 08), manteve-se o telhado em duas águas, sendo que a principal mudança ocorreu na posição das cumeeiras, que agora posicionam-se paralelas ao acesso principal. Como na alternativa 1, o arquiteto também criou recortes no telhado, para as áreas descobertas da casa, todavia deu maior destaque à entrada principal da residência com um pórtico em concreto aparente. Surgiram, ainda, expressivas calhas de concreto que contrastam com o madeiramento da cobertura. Esta, por sua vez, se projeta em grandes balanços determinado avantajados beirais, cuja sombra beneficia a maior parte das fachadas. Junto ao estudo de volumetria 2 existe, em separado, um croqui do acesso principal com linhas chanfradas, que não consta nos croquis volumétricos, mas cuja forma aparece no projeto final da residência. Estes desenhos em sua seqüência definem a evolução projetual do arquiteto por meio de uma linha de pensamento que evolui a partir da análise criteriosa da forma, da função a de sua volumetria.

17 Figura 08: Estudo de volumetria 2 Residência Elvis Schlegel. Fonte: Croqui de Egon Belz, acervo do arquiteto. A setorização da planta apresenta clara divisão funcional, organizando-se a partir da criação de blocos quase independentes: um bloco para o setor social, outro para o setor de recreação e o terceiro para o íntimo, sendo que os serviços não definem um bloco independente, interpondo-se entre o social e o íntimo. A ligação entre os cômodos se dá por um corredor central, como também ocorre em outras tantas residências do arquiteto (Figura 06). Todos os cômodos da casa são bem amplos e compartimentados. A sala de estar conta com iluminação zenital, impregnando no ambiente a percepção de ainda mais amplidão. Como em todos os outros projetos analisados, a natureza penetra no ambiente interno através do pátio e da varanda, além das grandes aberturas determinando uma das características principais dos projetos de Egon Belz. Os três dormitórios estão voltados para nordeste, recebendo apenas a incidência do saudável sol da manhã, já que o sol do meio dia é bloqueado pelos amplos beirais. Para a devida proteção todas as aberturas contam com

18 venezianas, mesmo a sala social, que apresenta uma grande varanda lateral coberta, corroborando na proteção das aberturas. Nota-se uma grande preocupação do arquiteto com os detalhes de seus projetos, que dão mais riqueza à obra como o revestimento em madeira numa das fachadas, o pergolado ao lado da sala de jogos que se integra com a piscina, um suporte para folhagens no lado da entrada principal, um banco junto ao pátio que determina um uso funcional na área coberta da churrasqueira. Estes detalhes se apresentam sempre exaustivamente elaborados e expressos por minuciosos desenhos, uma característica própria do arquiteto. Residência Leopoldo Schmalz Figura 09: Planta Baixa do pavimento térreo da Residência de Elvis Schlegel. Fonte: Desenho de Ana Lúcia conforme original do Acervo Egon Belz. 1 Garagem 11 Vestíbulo 21 Lavanderia 2 Banheiro 12 Lavabo 22 Dormitório de serviço 3 Depósito 13 Biblioteca 23 Banheiro 4 Jardinagem 14 Vestuário 24 Dormitório de serviço 5 Dormitório de visitas 15 Banheiro 25 Apartamento da governanta 6 Banheiro 16 Dormitório da suíte 26 Copa 7 Banheiro 17 Refeições 27 Sala 8 Dormitório de visitas 18 Estar 28 - Piscina 9 Circulação 19 Varanda 10 - Lavabo 20 - Cozinha

19 O projeto da Residência Leopoldo Schmalz data de 1981 e tem como localização a Rua Coronel Federsen em Blumenau SC. Por meio da análise desta residência verifica-se que ela foi projetada sobre um terreno de grandes dimensões e com acentuado desnível, o que possibilitou a criação de um acesso de veículos, em rampa, pelo subsolo, onde se encontram a garagem com 9 (nove) vagas para veículos, uma adega e banheiro. (Figura 10) Entre a garagem e a adega, e num compartimento próprio, encontra-se a escada helicoidal que dá acesso ao pavimento térreo, onde se desenvolvem as principais atividades da casa (Figura 09). Figura 10: Planta Baixa do subsolo da Residência de Elvis Schlegel. Fonte: Desenho de Ana Lúcia conforme original do Acervo Egon Belz. 28 Piscina 31 Motos 29 Rampa de acesso à garagem 32 Adega 30 Garagem para carros 33 - Banheiro De grande dimensões, amplos espaços e com uma planta estendida e intercalada de vazios, esta residência possui seu acesso principal conformando um elemento simétrico em relação ao setor social. A partir deste hall desenvolve-se para um lado o setor íntimo, com apenas uma suíte, e para o outro, um apartamento para as visitas e o setor de serviços, no qual existe um apartamento para a governanta e uma décima vaga de garagem.

20 O projeto foi concebido a partir de uma modulação, cuja diretriz é o tamanho dos cômodos. O fluxo circulatório principal é o mesmo característico dos projetos de Belz determinando um corredor linear central. Nesta residência, devido a suas amplas dimensões, a circulação também ocupa uma grande área, cortando praticamente toda casa no sentido longitudinal. A piscina se amolda ao formato da casa, envolvendo a suíte quase como um espelho d água, e fazendo com que se possa contemplá-la desde o dormitório e de sua varanda. Como característica de Belz, um vazio penetra na residência levando a natureza para dentro do ambiente por meio de um espaço destinado à jardim. Outros vazios se fundem com a massa edificada, formando um volume recortado que propicia a iluminação e ventilação natural cruzada. Das quatro residências analisadas esta é a obra que volumetricamente mais se aproxima às características da arquitetura moderna, por sua predominante horizontalidade, conseguida pelo uso da platibanda. As grandes varandas se desenvolvem num nível elevado do terreno em declive, proporcionando amplas visuais. O arquiteto também usa o concreto aparente em volumes sobre a cobertura, como as chaminés e o reservatório de água, trazendo brutalidade à edificação. O projeto desta residência possui vários estudos de volumetria, onde as alterações acontecem principalmente nas aberturas e nos detalhes construtivos. Num dos estudos de fachada aparece adicionado um segundo pavimento, cuja planta baixa não foi encontrada. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como Belz utiliza uma linha projetual bastante característica, fica fácil fazer uma analogia entre as quatro obras aqui estudadas. Nestas residências percebe-se que o arquiteto dá grande importância à natureza, integrando-a ao ambiente interno através de pátios, floreiras, jardins e grandes aberturas que permitem a sua contemplação tornando as residências uma mistura entre introvertidas (pelos pátios internos) e extrovertidas (pelas grandes aberturas ao exterior).

21 O esquema básico de distribuição interna das residências também é comum entre as quatro obras. Belz utiliza um corredor linear central como circulação principal, que separa as áreas social (geralmente na parte frontal da casa, junto à entrada social), íntima e serviço tornando a setorização bem clara, na maioria das vezes. Percebe-se uma preocupação do arquiteto com os detalhes construtivos e os elementos arquitetônicos da edificação como os revestimentos em madeira nas residências de Nilton de Andrade e Elvis Schlegel, por vezes misturados com outros materiais, como o concreto aparente. Este material muitas vezes aparece como elemento de expressão, dando personalidade ao projeto. Como destaque tem-se a pérgola em concreto na residência Elvis Schlegel e as chaminés e o reservatório da Residência Leopoldo Schmalz. O arquiteto também se preocupa e dá uso aos espaços externos, como extensão dos internos, por vezes cobrindo-os para criar uma área de churrasqueira ou ampla varanda, ou mesmo deixando-os descobertos, para uso de serviço, piscina ou jardim. As freqüentes pégolas proporcionam um terceiro uso aos espaços externos, determinando uma área semisombreada. O espaço interno também ganha destaque nos projetos de Belz, por vezes criando desníveis dentro de casa para moldá-la ao terreno, trabalhando diferentes alturas, amplos pédireitos, ou utilizando iluminação zenital. Outro artifício bastante frequente é a eliminação de paredes substituindo-as por armários embutidos, dando mais funcionalidade à residência e flexibilidade à edificação. Dos quatro projetos analisados, a tipologia que mais difere é a da Residência Leopoldo Schmalz, que possui mais características da arquitetura moderna, principalmente pela volumetria horizontal e expressividade do concreto aparente. Porém, continuam persistindo nela os traços característicos do arquiteto.

22 REFERÊNCIAS: ACRÓPOLE. Hospital em Santos. Revista Acrópole, São Paulo, ano XXVII, n. 318, p , jun BELZ, Egon. Relatos da vida. Entrevista concedida a Bruno Belz, dez Retrospectos de vida. Entrevista concedida a Bruno Belz, fev DAUFENBACH, Karine; ARTEIRO, Giselle. Hans Broos: a expressividade da forma f, il. Dissertação (Dissertação Mestrado em Ciências em Arquitetura) Programa de Pós- Graduação em Arquitetura, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, HABITAT. Hospital Osvaldo Cruz, São Paulo. Revista Habitat, São Paulo, ano XIV, n. 77, p , maio/jun MAZZAFERRO, Nello; MAZZAFERRO, Nita. Residência Mazaferro. Entrevista concedida a Bruno Belz, março, ODEBRECHT, Silvia; MARTINS, Bruna Eliza. A Influência da Arquitetura Moderna na obra do arquiteto Egon Belz. In: Mostra Integrada de Ensino, Pesquisa e Extensão (4), Anais da MIPE, Dynamis revista técno-científica, n.16, supl.2, p.85-86, 2010.