A Produção do Conhecimento Matemático ao se estar-com as TIC: um estudo fenomenológico
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- Marcos Castelhano Cipriano
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1 A Produção do Conhecimento Matemático ao se estar-com as TIC: um estudo fenomenológico Miliam Juliana Alves Ferreira 1 GD6 Educação Matemática, Tecnologias Informáticas e Educação à Distância. Neste texto trazemos uma apresentação da pesquisa de doutorado que está sendo desenvolvida junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática (PPGEM) da UNESP de Rio Claro. Expomos a interrogação que faz com que nos voltemos para Como o matemático que produz matemática com as TIC explicita a percepção das características da sua produção?quando dizemos matemáticos nos referimos àqueles profissionais que pesquisam e produzem, usando o computador, em matemática pura ou matemática aplicada e que se disponham, por meio de entrevistas, falar de sua produção. A intenção no diálogo com esses profissionais é compreender a produção do conhecimento matemático ao se estar-com as TIC. Ou seja, falar de como esse matemático se percebe produzindo matemática com as TIC. Ainda, neste texto, trazemos os procedimentos metodológicos da pesquisa. Destacamos os modos pelos quais os dados serão produzidos e analisados bem como apresentamos a postura assumida, a fenomenologia. Palavras-chave: Educação Matemática; Fenomenologia; Produção de Conhecimento; Expressão; Percepção. Introdução Muito se tem discutido acerca das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC). As discussões envolvem tanto a utilização das TIC nas salas de aula dos variados níveis de ensino quanto as potencialidades dos softwares para o ensino e aprendizagem de matemática, o ciberespaço como possibilidade de trabalho, ambientes virtuais, a Educação à Distância, entre outras possibilidades abertas pelas tecnologias. É fato que as tecnologias estão aí. Cada vez mais se fazem presentes no nosso dia-a-dia. Cada vez mais somos enlaçados pelas TIC. A Internet possibilitada via banda larga, wifi, 3G ou 4G está presente em celulares tornando o acesso ao ciberespaço cada vez mais fácil. A tecnologia está na palma das nossas mãos! Daí compreendê-la é relevante; discutir suas potencialidades, suas vantagens e desvantagens ou entender o que elas podem oferecer é uma exigência para o profissional da Educação. Outro foco de interesse, quando se discute o uso das tecnologias, principalmente as digitais que envolvem o uso do computador, é a produção do conhecimento matemático. Tais discussões despertaram meu interesse e me fizeram querer entender a aproximação tecnologias e matemática. 1 Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho UNESP/Rio Claro. miliam_arierref@hotmail.com. Orientadora: Profa. Dra. Rosa Monteiro Paulo.
2 Na pesquisa de Mestrado A Expressão no Ciberespaço: um voltar-se fenomenologicamente para o diálogo acerca de conteúdos matemáticos, concluída em 2014, atentamo-nos para o ciberespaço e as formas de expressão em comunidades do já desativado Orkut e grupos do Facebook que tratavam de matemática. A pesquisa, cujo interesse estava em compreender como se dava e era possível o diálogo acerca de conteúdos matemáticos no ciberespaço, nos possibilitou compreender aspectos da comunicação, expressão e diálogo. Também desvelou aspectos significativos do ciberespaço, da própria comunicação no ciberespaço e do estar-com o outro. Revelou modos de os sujeitos se expressarem matematicamente nessas comunidades e grupos destacando o ouvir o outro como solo para que o diálogo acerca de conteúdos matemáticos fosse possível. Mostrou três modos de expressão predominantes: a expressão por meio da linguagem matemática, por meio da fala e por meio de imagens. Os dados revelados pela pesquisa trouxe o desejo de querer compreender outros aspectos que envolvem a matemática e as tecnologias digitais. Outras interrogações surgiram. Algumas foram respondidas no interior da sala de aula, atuando como professora efetiva de matemática na rede estadual e utilizando o ciberespaço como um espaço que, para além do ambiente da sala de aula, ampliava a aproximação com os alunos e a discussão matemática. Outras questões, porém, ganharam força e deram origem ao projeto de doutorado cuja intenção pretende-se expor neste texto. Essa pesquisa, em nível de doutorado, que será desenvolvida por mim junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática (PPGEM) da UNESP de Rio Claro, terá a orientação da Profa. Dra. Rosa Monteiro Paulo. Como se trata de uma pesquisa que está iniciando, procuramos expor, neste texto, a interrogação que faz deslanchar o trabalho, o interesse pelo tema, os objetivos da pesquisa, a metodologia que possibilitará o nosso caminhar e alguns autores que nos têm sido significativos para compreender a região de inquérito, isto é, as tecnologias e a produção do conhecimento matemático. A intenção é apresentar o que se pretende na pesquisa de modo a favorecer o diálogo. Da inquietação ao projeto de pesquisa de doutorado: explicitando a interrogação Conforme mencionamos, o movimento de análise dos dados na pesquisa de mestrado, a interpretação das categorias articulada as leituras foi expondo o compreendido, mas também dando lugar a novas inquietações e fez com que o desejo de querer saber mais
3 aflorasse. Entender a produção do conhecimento matemático com as TIC mostrava-se, para mim, essencial. Essa inquietação foi sendo tematizada e originou os primeiros passos em busca do sentido desse querer saber. Com Bicudo (2011) compreendemos que o ponto crucial da pesquisa é a interrogação. Daí fazer sentido perguntarmo-nos constantemente o que a interrogação interroga (BICUDO, 2011, p. 23). Essa centralidade mostra-se porque a interrogação diz de uma perplexidade do pesquisador, algo que o incomoda e que ele quer compreender colocandoo em movimento. Com isso, ao buscar explicitar o querer saber para a construção do projeto, procurou-se explicitar a interrogação: Como o matemático que produz matemática com as TIC explicita a percepção das características da sua produção? No entanto é preciso que a interrogação, além de fazer sentido para o pesquisador, seja clara a quem a lê. Logo, dizer quem é o matemático que produz matemática com as TIC também é fundamental. Dizer quem é, significa apontar possibilidade. Neste momento, em que iniciamos a pesquisa, esse matemático é aquele profissional que pesquisa (produz) no âmbito da matemática pura ou da matemática aplicada e que, para produzir o que produz, faz uso do computador. São esses matemáticos que tomaremos como sujeitos para a pesquisa. Além de dizer quem é o matemático, o como da interrogação também solicita esclarecimentos. Ele indica uma intenção: aquela de querer saber quais são os modos pelos quais os matemáticos, sujeitos da pesquisa, vivenciam suas experiências de produzir matemática com o computador. Ou seja, o como indica que, ao entrevistar os sujeitos, pretende-se compreender como eles percebem as características da matemática por eles produzida. Assim, a interrogação tem a intenção de mostrar que, na pesquisa de doutorado, pretendese lançar um olhar compreensivo para as falas dos sujeitos procurando a percepção que esses matemáticos têm da matemática por eles produzida ao estarem com as TIC. Consideramos que compreender essa percepção do matemático acerca de sua produção é imprescindível já que Borba (2005) afirma que a matemática trabalhada em diferentes contextos e com diferentes mídias é transformada e que a mídia e o contexto interferem na maneira pela qual a matemática é produzida. Tal afirmação esta baseada na ideia de reorganização do pensamento. O autor expõe que o pensamento é reorganizado pela presença das TIC. Compreender o sentido dessa reorganização e da produção, para o sujeito que produz, é o que nos move.
4 Kalinke e Almouloud (2013) ao discutirem sobre a mídia computador afirmam que ela apresenta particularidades e características únicas. Dizem os autores que o texto na tela do computador é escrito de forma multilinear e multissequencial sendo possível ao leitor dar a dimensão que ele quiser. Enquanto a página é uma unidade estrutural, a tela é uma unidade temporal (KALINKE e ALMOULOUD, 2013, p. 203). Ainda, segundo esses autores, a tela do computador como espaço de escrita e de leitura, traz consigo novas maneiras de ler e de escrever e um novo estado ou condição para aqueles que exercem, nela, práticas de escrita e de leitura. São afirmações como as de Borba (2005) e Kalinke e Almouloud (2013) que nos levam a buscar compreender as características da produção matemática na perspectiva do seu produtor. Ou seja, o matemático, que produz matemática com as TIC percebe-se produzindo uma matemática distinta daquela da cultura ocidental? Quais são as características dessa matemática produzida? Como as TIC interferem no modo pelo qual a matemática é produzida? É nesse sentido, que se pretende explicitar o compreendido acerca das características da matemática para matemáticos que trabalham em sua produção com as TIC. Para isso iremos focar a percepção (e sua expressão) estando, por meio de entrevistas, com os matemáticos que produzem matemática com as TIC. Matemática, conhecimento, produção e produção de conhecimento: compreensões iniciais Para compreender a região de inquérito na qual a interrogação - Como o matemático que produz matemática com as TIC percebe as características da sua produção?- se situa, voltamo-nos para algumas questões que consideramos relevantes. Elas buscam o sentido de O que é a Matemática para o matemático? O que é conhecimento? O que é produção? O que é produção de conhecimento? Tais compreensões são importantes uma vez que elas irão permear a pesquisa. A intenção não é esgotar tais temas ou responder perguntas, mas mediante a leitura de autores da Filosofia da Matemática e da Filosofia da Educação Matemática, buscar clarear o sentido do que é perguntado. Para este texto trazemos apenas os estudos iniciais cuja intenção é expor a busca da pesquisa. Iniciamos com uma inquietação acerca do O que é Matemática? De acordo com Davis e Hersh (1986, p. 31), Uma definição pouco sofisticada /.../ é que a matemática é a ciência
5 da quantidade e do espaço (grifos dos autores). Na busca de ampliar essa definição tida como pouco sofisticada, os autores acrescentam que a matemática também trata do simbolismo relacionado com as quantidades e o espaço (DAVIS e HERSH, 1986, p. 31). Abbagnano (2007, p. 642) afirma que podem ser distinguidas quatro definições fundamentais para a Matemática. A primeira traz a Matemática como Ciência da quantidade e é entendida, segundo Abbagnano (2007), como a primeira definição filosófica da Matemática. O autor diz que essa definição foi formulada por Aristóteles, embora estivesse de modo implícito nas considerações de Platão acerca da aritmética e também da geometria. Esse conceito de Matemática persistiu por muito tempo, mas começou a parecer insuficiente para exprimir todos os aspectos desse campo de estudos (ABBAGNANO, 2007, p. 643). A segunda definição considera a Matemática a ciência das relações, ou seja, coloca-a estreitamente ligada à lógica ou como parte desta. Abbagnano (2007) mostra que os antecedentes dessa concepção podem ser encontrados em Descartes. Na terceira concepção a Matemática é a ciência do possível, onde o possível é tomado como aquilo que não implica contradição. Esta terceira definição é pertencente à corrente formalista. A quarta definição toma a Matemática como a ciência da construção possível, ou seja, a Matemática é a ciência que tem por objeto a possibilidade de construção. De acordo com Abbagnano (2007, p. 645) esta quarta definição trata-se da noção kantiana da Matemática como construção de conceitos, defendida pelo intuicionismo. Já Silva (2002, p. 6) afirma que uma das características fundamentais da Matemática é sua universalidade. Voltando a Davis e Hersh (1986, p. 33) entende-se que a definição de matemática muda. Cada geração e cada matemático sério, em uma dada geração, formulam uma definição de acordo com seu entendimento. Para esclarecer tal afirmação os autores sugerem que consideremos Arquimedes, Newton e Gauss, que trouxeram grandes contribuições para a Matemática, contribuições essas que foram se consolidando e sendo construída desde os primórdios. Tanto Arquimedes quanto Newton e Gauss sabiam que em um triângulo a soma dos ângulos equivale a 180º. No entanto, afirmam Davis e Hersh (1986), o que diferenciava o saber de cada um deles era o modo de pensar. O que estava na mente de Arquimedes era diferente do que estava na mente de Newton e isso, por sua vez, diferia do que estava na mente de Gauss. Não é somente um problema de mais, que Gauss sabia mais matemática do que Newton, o qual, por sua vez, sabia mais do que Arquimedes. É também um problema de diferente. O estado atual do conhecimento está entrelaçado em
6 uma rede de motivações e aspirações diferentes, interpretações e potencialidades diferentes. (DAVIS e HERSH, 1986, p ). Davis e Hersh (1986, p. 60), ainda dizem que para entender a matemática de uma época anterior, é exigido que penetremos na consciência individual e coletiva contemporâneas, o que, segundo os autores, é uma difícil missão, uma vez que os escritos não dão conta de expressar tudo aquilo que se passava na consciência do matemático naquele momento. Os escritos não descrevem a rede da consciência em detalhes. É improvável que se possa reconstruir a significação da matemática baseando-se somente nos registros escritos (DAVIS E HERSH, 1986, p. 60). Isso nos vai anunciando que entender o sentido do O que é a Matemática nos faz enveredar na perspectiva de seu produtor o que, nos remete, também, a ideia de produção e produção de conhecimento. Ao buscarmos pelo significado de conhecimento vê-se que o conhecimento está relacionado do ato de conhecer, ter a ideia ou a noção de alguma coisa. Conhecimento 2, do latim cognitio, para a enciclopédia e dicionário online Infopédia, designa a ação de aprender. Ainda segundo o Infopédia, conhecimento é o ato pelo qual o indivíduo toma consciência dos dados da experiência e procura compreendê-los ou explicá-los. Para Zagzebski (1999), o conhecimento é proporcionado pelo contato cognitivo do sujeito com a realidade, tratando-se de uma relação em que de um lado está o sujeito consciente e do outro uma porção da realidade. De acordo com o Infopédia podem ser considerados três níveis de conhecimento: (1) Senso comum: saber superficial, o conhecimento aparente e sem rigor; (2) Ciência: é o estudo e a investigação, por meio da observação e experimentação chegam-se as leis científicas; e (3) Filosofia: saber que complementa a ciência. Já a produção está ligada ao ato de produzir 3, que por sua vez significa dar origem a; fazer existir; criar. Ao falar de produção somos levados a pensar nas indústrias e suas linhas de produção que originam produtos diversos. No entanto, para o que nos interessa, não estamos buscando, primeiro, esse sentido de conhecimento em que se separa o sujeito do objeto ou de produção. Interessa-nos, por exemplo, a produção que, como explicita Mocrosky (2010, p. 36), significa trazer à frente, levar ao aparecer tendo em si o movimento inicial do que é efetivado de modo a
7 habitar o que vem por esse movimento. Interessa-nos, então uma produção que é dinâmica, que envolve o sujeito que produz. Procurando entender o sentido de conhecimento e de sua produção, encontramos Anastacio (1999, p.134) que diz: o conhecimento configura-se como uma produção, construído, nãoimposto. Para a autora o conhecimento matemático constitui-se como um objeto cultural. Nessa ótica, tendo visto a Matemática como fruto de um trajeto histórico, é possível vê-la, ainda, como um pro-jeto. Isto significa o lançar-se em direção a possibilidades que nem sempre podem ser percebidas a priori. (ANASTACIO, 1999, p. 134). Interessa-nos, na pesquisa, a produção de conhecimento que envereda por esse caminho. E ainda mais, interessa-nos a produção de conhecimento matemático ao estar-com as TIC. O estar-com as TIC nos leva a buscar como os sujeitos da pesquisa, matemáticos que produzem matemática com as TIC (seja o computador, software, ciberespaço, Internet, dentre outras possibilidades tecnológicas) percebem sua produção. Como já mencionado, as compreensões trazidas até aqui são fruto de leituras iniciais que apontam o caminho. Para o estudo, na pesquisa, um horizonte que se abre são as obras de Merleau-Ponty, acerca da percepção e expressão; de Deleuze, Brunschvicg, Husserl, Klein, Bourbaki, Caraça e Kluth acerca do pensamento, do pensamento matemático e da ciência matemática. Também entendemos que será relevante o estudo de autores da Educação Matemática que focam a produção do conhecimento matemático com as TIC como Borba, Borba e Villarreal, Bonomi, Faleiros, entre outros que, no decorrer da pesquisa, se mostrem significativos para a compreensão do investigado. Por ora, gostaríamos de deixar clara a postura assumida que não considera o sujeito ou a própria produção do conhecimento separado da realidade, mas que vê a produção do conhecimento atrelada à realidade. Conforme esclarece Bicudo (2000) assumimos a produção ou a construção do conhecimento e construção da realidade como um mesmo movimento no qual o mundo faz sentido para a pessoa, onde ocorre o processo de significação, onde se explicitam as significações e onde participamos da construção da realidade mundana (BICUDO, 2000, p.41). Assim, é a característica dessa produção que queremos compreender no matemático que se percebe produzindo com tecnologias. A fenomenologia e a postura fenomenológica como um caminho para a compreensão daquilo que se interroga
8 O pesquisador define o modo pelo qual irá realizar a pesquisa dependendo de suas intenções investigativas. Como, em nossa pesquisa o foco é fazer interpretações das entrevistas que nos levem à compreensão do que nos dados se expõe, optamos pelo modo de pesquisar qualitativo. De acordo com Bicudo (2011) o termo qualitativo indica a qualidade dos dados que se encontram a espera de uma análise interpretativa. Os dados, em nossa pesquisa, são produzidos pelo pesquisador por meio das entrevistas. Busca-se clareza para as características da matemática produzida. Ao perceber-se produzindo matemática e dar-se conta dessa percepção, o matemático, no diálogo, diz do produzido. Expressa o percebido. O pesquisador, atento aos dizeres, volta-se para o que é expresso buscando compreensões. Martins e Bicudo (1989) consideram o pesquisador como aquele que deve perceber a si mesmo e perceber a realidade que o cerca em termos de possibilidades, dirigindo-se, por meio da pesquisa qualitativa, a fenômenos, não a fatos. Fatos são eventos, ocorrências, realidades objetivas, relação entre objetos, dados empíricos já disponíveis e apreensíveis pela experiência, observáveis e mensuráveis no que se distinguem de fenômeno (GARNICA, 1997, p.112). Desse modo, assumindo uma postura fenomenológica para conduzir a pesquisa, voltamo-nos para a compreensão do fenômeno. FINI (1994) esclarece que fenômeno é aquilo que surge para a consciência, e que se manifesta para ela como resultado de uma interrogação. A consciência, na concepção fenomenológica, segundo Bicudo (2010, p. 27) pode ser compreendida como um movimento intencional que nos permite ir em direção ao focado como figura destacada do fundo, da totalidade em que sempre estamos com os outros. Bicudo (2011, p. 29) afirma ainda que fenômeno diz do que se mostra na intuição ou percepção. Segundo Merleau-Ponty (1994, p. 6) a percepção não é uma ciência do mundo, não é nem mesmo um ato, uma tomada de posição deliberada; ela é o fundo sobre o qual todos os atos se destacam e ela é pressuposta por eles. Em nossa pesquisa, entendemos que o matemático ao dizer das características percebidas em sua produção dará possibilidades de a sua produção se destacar. Para sermos capazes de ver isso que se destaca e compreendermos o que é interrogado assumimos a postura fenomenológica, conforme dissemos. A Fenomenologia é uma escola filosófica que, segundo Ales Bello (2006), surgiu na Alemanha no final do século XIX, tendo como precursor, na linha do existencialismo, Edmund Husserl ( ). Segundo Machado (1994), a palavra Fenomenologia é
9 originada de duas expressões gregas: Phainomenon (fenômeno), que significa aquilo que se mostra por si mesmo, o manifesto; e logos, tomado como o discurso esclarecedor. Bicudo (2011, p ) esclarece que fenômeno diz do que se mostra na intuição ou percepção e logos diz do articulado nos atos da consciência em cujo processo organizador a linguagem está presente. A Fenomenologia não será tomada na pesquisa apenas para o tratamento dos dados, ou seja, não somente como uma metodologia de pesquisa. Assumiremos no trabalho uma postura fenomenológica. Segundo Bicudo (2009), a principal diferença entre a atitude natural e a atitude fenomenológica é que, para a fenomenologia o objeto é sempre intencional. Ou seja, enquanto no mundo da atitude natural o objeto diz respeito às coisas em si, /.../ às coisas existentes fora do campo da percepção (BICUDO, 2009, p ), na atitude fenomenológica a coisa não é tida como em si. Isso, segundo Bicudo (2009, p. 17), tem dois motivos: primeiro porque ela não está além da sua manifestação, e, portanto é relativa à percepção e dependente da consciência, e segundo porque a consciência não é parte ou região de um campo mais amplo, mas é ela mesma um todo que é absoluto, não dependente, e que não tem nada fora de si. Compreendemos que, ao adotar a postura fenomenológica de fazer pesquisa, o objeto de investigação é percebido pelo pesquisador que se volta para os seus dados de modo intencional, procurando compreender o que se mostra significativo ao que interroga. Nesse sentido, pesquisar fenomenologicamente, ou assumir um postura fenomenológica de fazer pesquisa, significa ter uma inquietação e procurar explicitar o que dela se compreende, procurando por essa compreensão num emaranhado de vivências que envolvem as leituras que o pesquisador realiza, os sujeitos com os quais se envolve na pesquisa, as articulações que é capaz de fazer no caminhar. Em linhas gerais, a postura fenomenológica nos leva a assumir um modo de fazer pesquisa que busca deixar que o discurso dos sujeitos sejam reveladores do sentido do interrogado. Quando o pesquisador interroga, sua interrogação está situada. Ou seja, o pesquisador está preocupado com sujeitos de um determinado contexto que é por ele, e pelos sujeitos, vivenciado. Essa situcionalidade dá-se no mundo-vida da experiência vivida e, na fenomenologia, é chamado de Região de Inquérito. Os dados são produzidos nas descrições dos sujeitos que vivenciam uma dada situação. Logo, os dados não estão em algum lugar a espera de serem coletados. Eles se constituem na descrição da experiência vivida pelos sujeitos. Tais descrições são relatos de sujeitos distintos e, portanto, são distintas, uma vez que a experiência é vivenciada de modos
10 diferentes pelos variados sujeitos. Cabe ao pesquisador buscar, nessas descrições, o sentido do que é relatado. Ou seja, é pelas descrições que o pesquisador busca a estrutura do fenômeno ou aquilo que, na descrição, se mantém. Interrogando Como o matemático que produz matemática com as TIC percebe as características da sua produção, para que seja possível compreender o interrogado a intenção é: (a) Fazer um levantamento que nos leve a definição dos sujeitos de pesquisa, isto é, aos matemáticos que produzem matemática com o computador; (b) Entrevistar esses matemáticos para que seja possível compreender como eles percebem a matemática produzida com o computador; (c) Gravar em áudio tais entrevistas e transcrevê-las para posterior análise seguindo a postura fenomenológica; (d) Explicitar, mediante a análise fenomenológica dos dados, o modo pelo qual os matemáticos entrevistados percebem a matemática que produzem com as TIC; (e) Fazer um estudo de obras de educadores matemáticos que tratam da produção do conhecimento matemático com as TIC buscando compreender o sentido dessa produção para os autores; (f) Fazer um estudo de obras que discutam as características da matemática tal qual ela é compreendida na cultura ocidental explicitando modos de raciocínio e de validação das produções. A intenção na pesquisa centra-se na compreensão do objeto de estudo mediante análise dos discursos dos sujeitos e o exposto acima não diz de um roteiro linear a ser seguido, mas de ações que antevemos para a compreensão do que é interrogado. A viabilidade da pesquisa Tal qual estamos compreendendo, para clarear a região de inquérito da pesquisa alguns estudos teóricos serão necessários. Para tanto nos valeremos de livros e textos disponíveis, no acervo das bibliotecas da UNESP, acervos pessoais ou através de mídias online. As entrevistas serão feitas com matemáticos, docentes de universidade públicas, que produzem pesquisas em matemática pura ou matemática aplicada com as TIC e se disponham a participar da pesquisa.
11 Ainda, como membro do grupo de pesquisa Fenomenologia em Educação Matemática (FEM), coordenado pela Profa. Maria Aparecida Viggiani Bicudo e pela Profa. Dra. Rosa Monteiro Paulo (vice-coordenadora), terei uma aproximação com os membros do grupo e integração com os mestrandos e doutorandos do Programa de Pós-graduação em Educação Matemática do IGCE que pesquisam em Fenomenologia. Isso abre espaço para o diálogo, para a interlocução acerca de temas da fenomenologia e da própria produção do conhecimento. Há, por essa pertença ao grupo, a possibilidade de formação de grupos de estudos em que seja possível a realização de seminários e apresentação das ideias compreendidas levando-nos ao engajamento no programa. Esta pesquisa que nos propomos a desenvolver faz parte de um projeto do grupo FEM submetida ao CNPq para ser desenvolvida no período de 2015 a 2019 que visa a produção do conhecimento matemático com as TIC. Entendemos que isso também torna-se um fator importante de interlocução e crescimento em termos da investigação que, ao ser partilhada, avança em consistência e relevância. Esses argumentos nos fazem entender que se trata de uma pesquisa exequível tanto do ponto de vista do estudo teórico quanto da produção de dados ou discussão e apresentação de resultados parciais nos grupos de estudo. REFERÊNCIAS ABBAGNANO, N. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, ALES BELLO, A. Introdução à fenomenologia. Bauru: EDUSC, ANASTACIO, M. Q. A. Três ensaios numa articulação sobre a racionalidade, o corpo e a educação na matemática f. Tese de Doutorado em Educação Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, Campinas, BICUDO, M. A. V. Fenomenologia confrontos e avanços. São Paulo: Cortez, BICUDO, M. A. V. (Org.). Pesquisa Qualitativa Segundo a Visão Fenomenológica. 1 ed. São Paulo: Cortês, 2011, 150p. BICUDO, M. A.V. Filosofia da Educação Matemática segundo uma perspectiva fenomenológica. In: BICUDO, M.A.V. (Org.). Filosofia da Matemática - Fenomenologia, concepções, possibilidades didático-pedagógicas. São Paulo: UNESP, 2010, p BICUDO, M. A. V.; ROSA, M. Realidade e cibermundo: horizontes filosóficos e educacionais antevistos. Canoas: ULBRA, 2010, 136p.
12 BORBA, M. C. Coletivos seres-humanos-com-mídias e a produção de Matemática. I Simpósio Brasileiro de Psicologia da Educação Matemática, 2002, p conhecimento. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, Disponível em: < >. Acesso em: 02 Set DAVIS, P. J.; HERSH, R. A experiência matemática. Rio de Janeiro: F. Alves, FERREIRA, M. J. A. A Expressão no Ciberespaço: um voltar-se fenomenologicamente para o diálogo acerca de conteúdos matemáticos , 204 f. Dissertação de Mestrado em Educação Matemática Universidade Estadual Paulista, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Rio Claro, FINI, M. I. Sobre a Pesquisa Qualitativa em Educação, que Tem a Fenomenologia como Suporte. In: BICUDO, M. A. V. e ESPOSITO, V. H. C. (Orgs) A pesquisa qualitativa em educação: um enfoque fenomenológico. Piracicaba: UNIMEP, p GARNICA, A. V. M. Algumas notas sobre Pesquisa Qualitativa e Fenomenologia. Interface Comunicação, Saúde, Educação, v.1, n.1, KALINKE, M. A.; ALMOULOUD, S. A. A mudança da linguagem matemática para a linguagem web e as suas implicações na interpretação de problemas matemáticos. ETD Educação Temática Digital, Campinas-São Paulo, v. 15, n.1, p , jan./abri l LÉVY, P. Cibercultura. Tradução: Carlos Irieneu da Costa. 2 ed. São Paulo: Editora 34, MACHADO, O. V. M. Sobre a Pesquisa Qualitativa em Educação, que Tem a Fenomenologia como Suporte. In: BICUDO, M. A. V. e ESPOSITO, V. H. C. (Orgs). A pesquisa qualitativa em educação: um enfoque fenomenológico. Piracicaba: UNIMEP, p MARTINS, J.; BICUDO, M. A. V. A Pesquisa Qualitativa em Psicologia: Fundamentos e Recursos básicos. São Paulo: Moraes, 1989, 110p. MERLEAU-PONTY, M. A prosa do mundo. São Paulo: Cosac & Naify, 2002, 192p. MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da Percepção. São Paulo: WMF Martins Fontes, MOCROSKY, L. F. A presença da ciência, da técnica, da tecnologia e da produção no curso superior de Tecnologia em Fabricação Mecânica. 2010, 364f. Tese de Doutorado em Educação Matemática Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Rio Claro, ZAGZEBSKI, L. O que é o conhecimento. Disponível em < >. Acesso em: 03 Set
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