Nº COMARCA DE FELIZ A C Ó R D Ã O

Transcrição

1 APELAÇÃO CÍVEL. ANULAÇÃO DE RECONHECIMENTO VOLUNTÁRIO DE PATERNIDADE. EXAME DE DNA QUE EXCLUI A PATERNIDADE. PROVA DE ERRO ACERCA DA PATERNIDADE VICIANDO A MANIFESTAÇÃO DE VONTADE. REVOGAÇÃO. IRRELEVÂNCIA, NO CASO, DO DEBATE ACERCA DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. Embora o reconhecimento voluntário de paternidade seja irrevogável, isso não significa que, diante de comprovado erro, não possa ser desconstituído, pois, nesse caso, não se trata de revogação, senão que de vício no ato de reconhecimento. Tal circunstância torna irrelevante o debate acerca da paternidade socioafetiva, que, mesmo se provada, não pode subsistir se constituída sobre uma vontade viciada. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. APELAÇÃO CÍVEL OITAVA CÂMARA CÍVEL COMARCA DE FELIZ H.G.S... D.S... APELANTE APELADO A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento à apelação. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES. ALZIR FELIPPE SCHMITZ E DES. RICARDO MOREIRA LINS PASTL. Porto Alegre, 01 de dezembro de

2 DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, Relator. R E L A T Ó R I O DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (RELATOR) Trata-se de recurso de apelação interposto por HIGIANA G. S., irresignada com sentença que julgou procedente a ação de anulação de reconhecimento voluntário de paternidade ajuizada por DARCY S.. Sustenta que (1) a procedência da demanda requer três requisitos, quais sejam a ausência de relação biológica, comprovação de vício de consentimento no ato de reconhecimento da paternidade e ausência de filiação socioafetiva; (2) não restou comprovado vício de consentimento no ato registral, uma vez que o apelado compareceu espontânea e pessoalmente para reconhecer a paternidade; (3) não bastasse isso, levou mais de 14 anos para ajuizar esta demanda, o que é muito tempo para se questionar a paternidade; (4) na época do nascimento, o apelado era casado e a mãe da apelante era solteira, de modo que, se tinha alguma dúvida, deveria ter buscado prova da paternidade, mas não o fez; (5) caso fosse verdadeira a alegação de que não existia contato entre pai e filha, o apelado não se conformaria em pagar pensão por tantos anos sem poder desfrutar da companhia da filha; (6) não ficou comprovada a inexistência de filiação socioafetiva; (8) os depoimentos das testemunhas não merecem credibilidade e não são suficientes para formar um juízo de procedência da ação; (9) a jurisprudência gaúcha se firmou no sentido de ser impossível revogar o reconhecimento voluntário de paternidade. Pede provimento. 2

3 Houve resposta. da apelação. O Ministério Público opina pelo conhecimento e não provimento Vieram os autos conclusos, restando atendidas as disposições dos arts. 549, 551 e 552 do CPC, pela adoção do procedimento informatizado do sistema Themis2g. É o relatório. V O T O S DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS (RELATOR) Não merece qualquer reparo a sentença apelada. Observe-se que diante da incontrastável prova técnica que excluiu a paternidade sob o aspecto genético/biológico, resta evidenciado o erro que viciou inarredavelmente o reconhecimento de paternidade. O apelado acreditou na palavra da mãe da apelante, com quem efetivamente havia mantido um relacionamento amoroso. Prova tanta do erro é que, mesmo diante do ajuizamento desta demanda, a apelada seguia afirmando, certamente pelo dizer de sua mãe, que era filha do apelante, pois aquela não teria tido outro relacionamento do período. Ora, a contundência da afirmação constante expressamente da contestação posteriormente desmentida pelo exame de DNA, somente 3

4 confirma a tese de que o apelado laborou em erro ao registrar a recorrente, fato esse muito bem apreendido pela Magistrada prolatora da sentença. O fato de ter prestado alimentos indica que em que pese tenha mantido uma relação extraconjugal, o apelado agiu de boa-fé e, sendo pessoa responsável, diante do nascimento de uma criança que pensava ser sua filha, o mínimo que poderia fazer era lhe prestar alimentos. A circunstância de ser o apelado casado e de a apelante ser fruto de relação extraconjugal, inclusive residindo em outra cidade, somente reforça a afirmação de que os litigantes não conviviam e que o vínculo entre eles era meramente documental, em decorrência do registro e da obrigação alimentar. Entretanto, ainda que contatada a relação socioafetiva, ainda assim não se poderia manter o reconhecimento de paternidade decorrente de uma vontade viciada pelo erro sobejamente comprovado nestes autos. Certamente que a desconstituição do reconhecimento de paternidade trará danos à apelante, que, contudo, não podem ser atribuídos ao apelado, que foi a maior vítima da falácia que o levou a reconhecer e prestar alimentos a uma filha que não era sua. Por todo o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação. DES. ALZIR FELIPPE SCHMITZ (REVISOR) Acompanho o fundamentado voto do eminente relator, o que implica que também nego provimento do recurso. DES. RICARDO MOREIRA LINS PASTL 4

5 Examinei os autos e, tal qual o eminente Relator, entendo que o recurso não deve ser acolhido, ante a comprovação de que o reconhecimento de paternidade havido deu-se por intermédio de manifestação de vontade defeituosa, razão por que subscrevo integralmente os fundamentos contidos em seu voto, para também negar provimento à apelação. DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS - Presidente - Apelação Cível nº , Comarca de Feliz: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME". Julgador(a) de 1º Grau: MARISA GATELLI 5