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3 C R I A N Ç A S ( E P A I S ) E M R I S C O
4 A edição deste livro é parcialmente subsidiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia TÍTULO: CRIANÇAS (E PAIS) EM RISCO EDITOR: ANTÓNIO PIRES ã INSTITUTO SUPERIOR DE PSICOLOGIA APLICADA CRL RUA JARDIM DO TABACO, 34, LISBOA 1.ª EDIÇÃO: SETEMBRO DE 2001 GRAVURA DA CAPA: «FAMILY GROUP» ( ) DE HENRY MOORE COMPOSIÇÃO: INSTITUTO SUPERIOR DE PSICOLOGIA APLICADA IMPRESSÃO E ACABAMENTO: PRINTIPO INDÚSTRIAS GRÁFICAS, LDA. DEPÓSITO LEGAL: /01 ISBN:
5 ANTÓNIO PIRES CRIANÇAS (E PAIS) EM RISCO I S P A L i s b o a
6 A meus pais
7 N O T A D E A B E R T U R A
8 NOTA DE ABERTURA A paternidade constitui um desafio difícil e complexo e também um dos mais importantes da comunidade humana. As mudanças sociais ocorridas nas últimas quatro décadas vieram colocar em risco a orientaçã o, apoio e preparação para a parentalidade. À medida que a posição da mulher muda, aspectos do papel maternal são assumidos por outros na família e na sociedade. Os pais de hoje estão sob maior stress social e económico. Hoje em dia a parentalidade é vista como algo que consome muito tempo e envolve esforço. Na maioria das famílias os pais trabalham e o tempo que passam com a criança é bastan te escasso e disputado a muitos afazeres. Depois de duas décadas de estudos sobre a interacção mãe crianç a, sobretudo em situações estruturadas e não naturais de laboratório, pouco se sabe do modo como estes aspectos se integram no dia a dia e num todo parental. Por outro lado, existe cada vez mais informação sobre uma situação de parentalidade ideal havendo pouco conhecimento sobre situações em que a parentalidade foge da norma. Se a maternida de já é vista hoje em dia como uma situação que consome muito tempo e envolve esforço como será se ela ocorrer numa situação de risco acrescido devido a doença ou condições de vida adversas como nos casos em que a criança tem uma doença crónica como a asma, diabete s, 11
9 ANTÓNIO PIRES insuficiência renal, fibrose quística ou cancro, nasceu prematura, é portado ra de trissomia 21, de autismo, ou a mãe é toxicodependente, seropositiva, abusa da criança, ou se encontra deprimida? Apesar da especificidade de cada uma das doenças crónicas existem factores comuns que as tornam uma potencial situação de risco para a criança e família como a sobrecarga diária que recai sobre a família, a organização e prestação de serviços a estas famílias ser muito fragmentada, o tratamento necessitar do envolvimento de uma variedade de profissionais de saúde, ser bastante caro, a dor e o desconforto serem comuns, e a situação gerar bastante incerteza. Se a parentalidade já é nalguns casos exigente, cansativa e preocupan te com crianças de termo, no caso de prematuros ela pode ser ainda maior. Os pais passam momentos difíceis após o seu nascimen to. Há ansiedade e medo relacionados com a sua sobrevivência, com a possibilidade de complicações durante o internamento e receiam que o desenvolvimento futuro da criança possa estar ou vir a estar compromet ido. Educar uma criança com atraso mental, como a trissomia 21, é um desafio para os pais. Estes têm de lidar com o facto de lhes ter nascido uma criança com aspecto diferente e que age de modo diferente das crianças da sua idade. A criança com autismo infantil apresenta características que podem criar dificuldades e causar sofrimento aos pais como a ausência de atenção, de comunicação e de linguagem. O carácter restrito, repetitivo e estereotipado dos seus comportamentos dificilmente pode gratificar ou entusiasmar os pais. O número de mulheres toxicodependentes tem vindo a aumentar. A toxicodependência não é incompatível com uma maternidade adequada no entanto a toxicodependência traz riscos acrescidos para a criança e para a mãe. As alterações das capacidades e do estilo de vida das mães podem ser de tal ordem que afectem a capacidade da mulher cuidar de si e das suas crianças. 12
10 NOTA DE ABERTURA Nem todas as crianças de mães seropositivas nascem infectadas, mas mesmo neste caso as crianças encontram-se numa situação de risco que os pais têm de enfrentar. O ambiente em que vivem envolve o medo do contágio; o ostracismo social, o isolamento social relacionado com a necessidade de manter o segredo; redefinição de papeis familiares e nalguns casos completa desorganização familiar; têm de lidar com as separações devidas a hospitalizações ou por incapacidade física dos pais para tratarem deles e têm de se preparar para a perda ou lidar com ela. Nos pais maltratantes aparece, instabilidade emocional, pensa men - tos egocêntricos acerca das relações, sentimentos negativos acerca da satisfação das necessidades dos outros, e duas vezes mais situações de depressão. Estes pais tendem a não apreciar a individualidad e e perspec - ti vas da criança, ou a encorajar a independência ou a abertura a novas experiências. Têm com frequência expectativas irrealistas sobre as suas crianças. As suas interacções com os filhos revelam mais hostilidad e, interferência, emoções negativas, menos sintonia afectiva e cognitiva. A falta de confiança das mães deprimidas nas suas capacidades, o facto de estarem muito voltadas para si próprias e consequentemente menos disponíveis, atentas e envolvidas com as suas crianças constitui também uma situação de risco. São estas as situações de risco que estudámos nos últimos anos. Interessámo-nos sobretudo pelo ponto de vista dos pais. O que eles relatam sobre a criança, sobre si próprios e sobre o quotidiano familiar. O que acontece nas famílias quando existe uma situação de risco com origem num dos filhos ou num dos pais? Como é que os pais se comporta m? Como reagem, e o que fazem para lidar com a situação? Metologicamente decidimos escolher uma abordagem que nos proporcionasse o ponto de vista dos pais e por isso escolhemos a entrevista em que o objectivo central era colocar os pais a falar sobre o que os preocupava. Um método que nos fornecesse processos e não apenas produtos. 13
11 ANTÓNIO PIRES Este livro reúne um texto sobre a parentalidade em risco, um texto que descreve a método utilizado, Grounded Theory, e um conjunto de textos empíricos fruto de várias centenas de entrevistas gravadas, transcri tas e analisadas muitas vezes em conjunto por mais de dez pesso as. Trata-se portanto de um esforço conjunto, que começou por ser uma aventura e terminou num enriquecimento sobre o conhecimento da parentalidade. ANTÓNIO PIRES 14
12 P A R E N T A L I D A D E E M R I S C O A N T Ó N I O P I R E S
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