O Projeto Imperialista: Um modelo de regressão histórica em direção ao subdesenvolvimento e à recolonização
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- Júlio Figueiredo Caetano
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1 O Projeto Imperialista: Um modelo de regressão histórica em direção ao subdesenvolvimento e à recolonização Ceci Vieira Juruá : Economista e pesquisadora Os modelos macroeconômicos que figuram nos manuais da Teoria Econômica são absolutamente falsos pois repousam em hipóteses absurdas desvinculadas do movimento concreto das sociedades. Nos países periféricos esses modelos são particularmente perversos, pois além dos vícios que lhe são inerentes, monopolizam a reflexão acadêmica para problemas que não são os nossos. A difusão de tais modelos se faz com base no poder e no dinheiro das empresas e das universidades estadunidenses. Há vários estudos de intelectuais reconhecidos abordando esse movimento de imperialismo cultural. Os programas e políticas recomendados e impostos pelo Fundo Monetário, Banco Mundial e outras agências internacionais fundamentam-se nos modelos originados em Chicago e em outras universidades dos Estados Unidos e, por isto, são não só inadequados à realidade das sociedades sul-americanas, mas pior são instrumentos funcionais à expansão do poder imperial. Um olhar retrospectivo sobre promessas e realizações embutidos nos programas do Fundo Monetário pode ser útil, nas circunstâncias atuais. É o que faremos, a seguir, analisando especificamente três elementos centrais no processo de desenvolvimento econômico e social, durante a década de 1990: o crescimento econômico, a balança de pagamentos, a estabilidade monetária. 1-Houve crescimento econômico? Os países da América do Sul não cresceram na última década, e tiveram crescimento lento na década de 1980.* O Produto Interno Bruto-PIB brasileiro, medido em dólares de 2001, é inferior, atualmente, ao valor médio do PIB do triênio 1989/1991, tendo retrocedido de US$ 530 bilhões para aproximadamente US$ 450 bilhões : queda de 15% no espaço de uma década.
2 O exemplo mais trágico é o da nação argentina cujo PIB atual, US$ 65 bilhões, é de apenas 1/3 do que era usualmente, o seu valor, no início da década de A Argentina foi o país mais cruelmente atingido pelo neoliberalismo, é a maior tragédia econômica produzida na virada do século XX para o XXI, tragédia econômica que se desdobra diabolicamente em tragédia social, em eventos cotidianos que sinalizam para um quase genocídio no interior de uma sociedade que era o símbolo de progresso material, social e cultural da América Latina. Pragmaticamente, analisando os resultados quantitivos e qualitativos, e os indicadores macroeconômicos, torna-se evidente o fracasso das políticas neoliberais preconizadas pelo FMI e pelo BIRD. A síntese do fracasso obtido são as taxas de desemprego e subemprego, superiores a 20% da população em idade economicamente ativa, tanto na Argentina quanto no Brasil. Sem crescimento econômico, sem emprego, nossas sociedades estão fadadas ao subdesenvolvimento. 2-A Balança de Pagamentos é sustentavelmente equilibrada? A tríade maldita das políticas preconizadas pelas agências internacionais de financiamento privatização, liberalização, desregulação conduziram ao desequilíbrio crônico do nosso Balanço de Pagamentos e ao acúmulo de uma dívida externa impagável. No Brasil, o superávit comercial externo, que estava em torno de US$ 10 bilhões nos primeiros anos da década de 1990, transformou-se em saldo comercial negativo superior a US$ 3 bilhões, entre 1994 e 1995, durante a implantação do Plano Real e, no curto espaço de 5 anos, 1994/1999, nossa dívida externa foi mais do que duplicada. Na Argentina, também a dívida externa foi duplicada no curto espaço de 5 anos, 1991/1996, durante a primeira fase de implantação do famigerado sistema colonial de câmbio : o currency board. O desequilíbrio no comércio de mercadorias foi agravado pelo desequilíbrio na conta de Transações Correntes que, além do resultado comercial, registra os fluxos de pagamentos ao exterior de juros da dívida externa crescente -, e de lucros/royalties/dividendos das empresas estatais privatizadas e desnacionalizadas.
3 A operação de conversão de um superávit em déficit comercial foi consequência : do regime de câmbio fixo (que, no Brasil, vigorou até janeiro de 1999, e na Argentina até o final de 2001), da abertura comercial irresponsável e da política equivocada de ancorar a estabilidade monetária, tão ao gosto dos financistas internacionais, no câmbio e no aumento das importações. No Brasil, o coeficiente de importações foi mais do que duplicado no espaço de 6 anos, situando-se hoje por volta de 13%. Duas constatações representam, bem, a síntese dos movimentos descritos acima : no Brasil, o passivo externo líquido já assumiu um valor próximo ao do PIB brasileiro, na Argentina a dívida externa é mais do que o dobro do PIB argentino. O melhor indicador da dependência externa é a relação Dívida Externa / Exportações : no Brasil a dívida externa acumulada é equivalente a 4 anos de exportações, na Argentina essa relação é de 6 vezes. Por isto a dívida externa é impagável nas condições atuais do modelo de não crescimento implícito nas políticas neoliberais impostas pelo FMI. O desequilíbrio crônico da Balança de Pagamentos de nossos países corresponde ao que a Escola da Cepal designou por vulnerabilidade externa. Mas é também uma das metas rigorosamente desejadas por toda política imperialista, porque a combinação dívida externa impagável + vulnerabilidade externa coloca nossas economias e nossos povos a reboque das decisões das altas finanças internacionais! De joelhos, em posição de súplica, diante dos agiotas internacionais. 3-A aparente estabilidade monetária fortaleceu a moeda nacional? Qualquer dona de casa brasileira sabe que a estabilidade de preços é apenas aparente. Despesas que fazem parte do orçamento doméstico corrente são aumentadas regularmente : tarifas de energia elétrica, telefone e gás de cozinha, são líderes da escalada de preços. Mas há também produtos de consumo não durável, fabricados em mercados oligopolizados ou dependentes de insumos de tais mercados, cujos preços vem aumentando mais rápido do que os rendimentos do cidadão comum : produtos de higiene e limpeza, pão e massas em geral, combustíveis. Em economês, diríamos que este é o resultado inevitável da presença de agentes com poder de mercado na produção de bens de consumo inelástico. Um cálculo rápido indicaria que a classe média com renda próxima de US$ dólares em 1995, teve uma perda de poder aquisitivo real em torno de 30 a 40% de
4 seus rendimentos. Os que puderam manter até agora seu status social são aqueles que a) eram possuidores de um patrimônio imobiliário ou financeiro ; b) obtiveram progressão salarial. Houve nitidamente, nessa década de 1990, um movimento de concentração de renda e de esvaziamento da classe média brasileira, resultado da dinâmica dos preços relativos (preços crescentes e salários estagnados e/ou desemprego) e da transferência de renda, operacionalizada pelo Governo e pela política fiscal, da classe média para os rentistas da dívida pública, internos e externos. Do lado da população pobre há uma quantidade crescente de sobretrabalho que é exigida pelas necessidades de sobrevivência. Procuram compensar um ganho cada vez menor com uma quantidade de trabalho cada vez maior, para fazer frente ao desemprego e ao salário mínimo estagnado na faixa de dólares. A aparente estabilidade monetária e sua combinação perversa - desemprego crescente + redução de salários e rendas do trabalho + aumento de preços de bens essenciais tem causado uma soma enorme de prejuízos materiais e humanos a pelo menos 95% da população brasileira e é geradora de uma profunda insegurança social, desfazendo esperanças e confiança no futuro. Paralelamente à concentração de renda, as finanças públicas vem sendo submetidas a um desequilíbrio fiscal crônico, frente às taxas de juros praticadas e ao montante da dívida pública interna e externa. É provável que, ao final de 2002, a dívida pública total seja equivalente ao PIB brasileiro! Dívida igualmente impagável! E já não são poucos os arautos do neoliberalismo que pregam abertamente a necessidade de um aumento do superávit primário do orçamento público. Em outras palavras, querem ampliar a redução do salário real do funcionalismo, a redução dos serviços ainda prestados pelo Estado, e a liquidação do que ainda resta de Seguridade Social Pública, de forma absolutamente convergente com as políticas do Fundo Monetário e do Banco Mundial. Não está dito, mas está implícito no noticiário econômico e empresarial, que os restantes ativos públicos estratégicos estão também ameaçados de desnacionalização. Refiro-me, particularmente, ao Banco do Brasil e à Petrobrás, que já estão sendo utilizados na rolagem da dívida externa e na fabricação de dólares clonados : o lançamento de títulos de dívida interna com correção cambial, a exemplo do que vem sendo praticado pelo Banco Central do Brasil.
5 Enfim, a anarquia monetária avança celeremente no Brasil, a exemplo do que ocorreu na Argentina. Lá, os governos provinciais e parcelas importantes da sociedade foram obrigados a utilizar papel pintado (patacones e outros, ironicamente designados como moeda social?) para fazer frente às transações econômicas indispensáveis e à sobrevivência. Enquanto a moeda má (o peso e as moedas sociais) expulsavam dos mercados e das transações ordinárias a moeda boa (o dólar), os bancos estrangeiros sequestravam esta moeda boa, os dólares, e a devolviam a seus países de origem. No final deste processo, que demorou aproximadamente 5 anos (1995/2000), a poupança dos argentinos teve de ser confiscada, as reservas internacionais tornaram-se absolutamente insuficientes para operar seja como lastro da moeda nacional, seja como garantia de um funcionamento normal das transações internacionais! Mesmo sem a lei de livre conversibilidade adotada na Argentina, a economia brasileira caminha na mesma direção, graças aos dólares clonados, à financeirização rápida da atividade econômica e à desvalorização permanente da moeda nacional. Caminhamos, inapelavelmente, para uma anarquia monetária, também no Brasil, e a sinalização desta direção já foi dada pela rolagem da dívida interna no over e no mercado superespeculativo de derivativos - os swaps da dívida pública interna -, como também pela reestruturação não soberana da dívida externa troca de títulos vincendos por títulos de prazo menor e com taxas mais elevadas de juros! São práticas não saudáveis de política econômica e monetária que guardam traços semelhantes com a reestruturação desastrosa da dívida argentina, na recente gestão de Domingos Cavallo. Concluindo, julgamos que o conjunto de políticas preconizadas pelo Fundo Monetário, à luz de seus resultados desastrosos, fazem parte de um modelo econômico e social que já podemos designar como um modelo de regressão histórica em direção ao subdesenvolvimento e à recolonização. A visualização do subdesenvolvimento é dada por: redução do PIB, aumento do desemprego, perda de valor da moeda nacional, extrema vulnerabilidade externa, piora da situação social dos trabalhadores, fragilização da classe média, concentração da renda e da propriedade em geral. Quem tiver dúvidas pode recorrer à vasta literatura ainda disponível sobre os países subdesenvolvidos. A visualização da dependência externa/recolonização é mais fácil de se obter, bastando para isto ler os jornais diários que anunciam, em entrelinhas ou explicitamente : os projetos da ALCA, de dolarização, de intervenção econômica e militar de potências estrangeiras em nossos países!
6 Resistir é preciso e é urgente. O modelo que venho procurando entender, muito a contragosto, é um modelo em tres fases. Na primeira são aplicadas as medidas que conduzem à dívida e à vulnerabilidade externa. A segunda fase consiste na desestruturação econômica interna e na montagem de um desajuste fiscal crônico, com perda do valor real da moeda nacional, a única de responsabilidade do Estado nacional; politicamente é a fase de perda crescente de legitimidade por parte dos governos nacionais. Mas o desenvolvimento da primeira e da segunda etapas deste modelo FMI, na minha leitura e interpretação, é peça central do projeto imperialista, as duas fases conduzem à erosão da soberania e colocam-nos no limiar de uma terceira fase : de transmissão, aos trustes e oligopólios internacionais, dos instrumentos efetivos de gestão macroeconômica. Esse é o verdadeiro conteúdo do projeto Dornbusch para a Argentina, apresentado por ocasião de uma conjuntura social crítica na Argentina, conjuntura que colocou frente a frente a insurreição popular e o governo nacional destituído de legitimidade! No Brasil, ainda não esgotamos a segunda etapa do projeto imperialista. Por isto ainda é possível ter esperanças de que, mais uma vez, resistiremos à invasão estrangeira e seremos capazes de por fim à pilhagem de nossos recursos, coletivos e individuais. Mas o momento é agora! MODELO DE REGRESSÃO HISTÓRICA DA AMERICA DO SUL - DIREÇÃO : SUBDSENVOLVIMENTO E RECOLONIZAÇÃO - FASE 1 : DIVIDA EXTERNA IMPAGÁVEL / EXTREMA VULNERABILIDADE EXTERNA / PERDA DE COMPETITIVIDADE FASE 2 : DESTRUTURAÇÃO DO SISTEMA BANCÁRIO NACIONAL / DÍVIDA INTERNA IMPAGÁVEL / DESAJUSTE FISCAL CRÔNICO FASE 3 : O PODER ABSOLUTO DOS TRUSTES E OLIGOPÓLIOS MUNDIAIS / A LIQUIDAÇÃO DA CIDADANIA E DOS DIREITOS SOCIAIS E LIQUIDAÇÃO DA SEGURIDADE SOCIAL PÚBLICA / A TRANSFERENCIA DO GOVERNO NACIONAL A UM GOVERNO MUNDIAL (FMI?) / A FRAGMENTAÇÃO DO TERRITÓRIO E A INTERVENÇÃO MILITAR.
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