Honoris Causa da Universidade Andina Simón Bolívar e da Escola Superior Politécnica do Litoral Quito, 7/6/2013

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1 Honoris Causa da Universidade Andina Simón Bolívar e da Escola Superior Politécnica do Litoral Quito, 7/6/2013 É uma honra muito grande receber o doutorado honoris causa de duas importantes universidades equatorianas, a Universidade Andina Simon Bolívar e a Escola Politécnica do Litoral. Recebo estes títulos como demonstração da grande amizade entre Equador e Brasil, que vem se estreitando nos últimos anos, e do nosso esforço conjunto para construir a unidade sul-americana. A Universidade Andina Simon Bolívar constitui-se um marco dessa integração, com sua orientação acadêmica voltada para a expansão e troca de conhecimento entre países vizinhos. Dois anos atrás, a Andina inaugurou a cátedra Brasil- Comunidade Andina de Nações. Na ocasião, concedeu sua mais alta honraria ao professor Cândido Mendes de Almeida, uma das maiores expressões do Humanismo em meu país. A Escola Politécnica do Litoral se destaca no ensino e na produção de conhecimento, formando milhares de jovens nos variados campos da engenharia, além de proporcionar destacados cursos de pós-graduação. Por sua reconhecida excelência, a Espol contribui para o avanço tecnológico em nosso continente, tendo entre seus doutroes Honoris Causa um ex-presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o economista Enrique Iglesias. É especialmente significativo que esta solenidade se realize na Sala Capitular de San Agustín, palco de relevantes acontecimentos na história do Equador. Aqui se realizou, em 1556, a Aula Magna de inauguração da Universidade de San Fulgencio, a primeira do Equador.

2 Séculos mais tarde, a Sala Capitular voltou a ser palco de um fato histórico: a declaração de independência, com a constituição do Conselho Soberano de Quito, em 16 de agosto de Aqui realizamos também a II Cúpula de Chefes de Estado da UNASUL, em agosto de 2009, marco relevante na integração dos países sul-americanos. O sítio histórico de Quito, um dos mais belos patrimônios da arquitetura que o Equador preserva para a Humanidade, abrigará, no próximo ano, a sede permanente da UNASUL. Tantas convergências me levam a dedicar esta homenagem à unidade dos povos da América do Sul e da América Latina. Magníficos reitores, meus amigos, minhas amigas, Receber o doutorado Honoris Causa de duas universidades tão importantes é uma grande emoção para alguém que, na juventude, não teve a oportunidade de frequentar a universidade. Sou filho de uma família de uma das regiões mais pobres do meu país. Muito cedo, ao lado de minha mãe e meus irmãos, tive de fazer a penosa viagem para o sul, em busca das oportunidades que por muito tempo foram negadas a milhões de brasileiros. Na periferia de São Paulo, cresci mirando o exemplo de trabalho e perseverança de minha mãe. Fui engraxate e auxiliar de tinturaria, até conseguir o primeiro diploma, de torneiro mecânico, obtido numa escola profissional para jovens trabalhadores. Aquela profissão abriu-me as portas para o mundo do trabalho assalariado na grande categoria dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo. No chão da fábrica comecei minha militância sindical, que me levaria ser eleito, em 1975, presidente do que era então maior sindicato da América Latina.

3 Eram tempos muito duros para a sociedade brasileira, sob a uma ditadura que oprimia especialmente os mais pobres e a classe trabalhadora, proibindo a livre organização e o sagrado direito de greve por melhores salários e condições de trabalho. Aprendi com meus companheiros que organização e unidade podiam nos garantir grandes conquistas, mas a luta sindical não era suficiente para libertar definitivamente a classe trabalhadora. Em 1980 nós criamos o Partido dos Trabalhadores, que reuniu as maiores lideranças sindicais, expressivos movimentos sociais, militantes das comunidades de base da igreja, alguns dos mais destacados intelectuais do nosso tempo. Ao longo de mais de 20 anos, esse partido de profundas raízes populares cresceu institucionalmente, conquistando posições nas câmaras municipais e no Congresso Nacional, elegendo prefeitos e governadores, adotando práticas inovadoras de gestão democrática com participação social. Aprendemos como nossos erros e acertos, aprendemos com a sabedoria povo. Descobrimos a importância de fazer alianças amplas, sem objetivos subalternos, para governar um país com as dimensões e a complexidade do Brasil. Nestes 20 anos disputei e perdi, por três vezes, as eleições para a presidência, mas nunca desistimos do objetivo de governar para transformar um país profundamente desigual. Até que em outubro de 2002 o ovo brasileiro me concedeu, em eleições diretas, o meu segundo e diploma: o de presidente da República Federativa do Brasil. Eis a razão porque me emociono ao receber o diploma Honoris Causa dessas duas grandes instituições. Meus amigos, minhas amigas, Recebo esta homenagem também como reconhecimento às grandes transformações pelas quais o

4 Brasil vem passando nestes dez anos, aprofundadas no governo da presidenta Dilma Rousseff. Neste período de uma década um breve instante no relógio da História 36 milhões de brasileiros saíram da pobreza extrema, mais de 40 milhões alcançaram a classe média e 20 milhões de empregos formais foram criados. Nada disso ocorreu por acaso e nem de forma isolada no contexto da América do Sul, onde a maioria dos países também começa a construir uma era de crescimento com inclusão social. As transformações no Brasil resultam da combinação de uma série de políticas públicas, que tiveram como centro a geração de empregos e oportunidades para a maioria da população, numa estratégia em que o crescimento beneficiou o conjunto do país. Nosso primeiro compromisso era combater a fome, o que fizemos por meio do Fome Zero, que contempla uma série de programas para distribuir renda, melhorar as condições de vida dos mais pobres e gerar oportunidades. O mais conhecido destes programas é o Bolsa Família, que garante uma renda básica mensal a mais de 13 milhões de famílias ou cerca de 50 milhões de brasileiros e de brasileiras. Além de garantir um direito básico do ser humano o direito de se alimentar todos os dias o Bolsa Família contribui para manter as crianças frequentando a escola, com as vacinas em dia, e para o acompanhamento prénatal das gestantes. Os recursos do programa movimentam o comércio nos bairros mais pobres e nas localidades mais distantes do país, somando-se aos benefícios pagos pela Previdência aos idosos e a milhões de trabalhadores rurais aposentados. Adotamos uma política de valorização permanente do salário mínimo, que passou de 80 dólares em 2002 para 340 dólares. Com o aquecimento da economia, os sindicatos ganharam mais força; em 2012, seguindo a

5 tendência dos últimos anos, 94% dos acordos trabalhistas garantiram aumentos salariais acima da inflação. Ampliamos, ainda, o acesso ao crédito para os trabalhadores e para financiar a habitação, a agricultura, a indústria, as pequenas empresas e os empreendedores individuais. O crédito disponível no Brasil foi multiplicado por 6, e corresponde hoje a 54% do PIB. A combinação de renda, salários, crédito e emprego despertou uma nova dinâmica na economia brasileira, impulsionando a produção e os novos investimentos. Alcançamos este ciclo virtuoso de crescimento com inclusão sem abrir da estabilidade, reduzindo a inflação de 12,5% em 2002 para 5,8% em Os pobres e os trabalhadores sabem mais do que os economistas o quanto isso significa na vida real. A renda das famílias cresceu 35% na última década, mas é importante observar que a renda dos 20% mais pobres cresceu 66%, enquanto a renda dos mais ricos aumentou 10% no período. Estamos revertendo a tendência secular de aprofundamento do abismo entre pobres e ricos o que vejo com alegria suceder também no Equador e outros países sul-americanos. Este povo capaz de tantas conquistas é o verdadeiro destinatário de todas as homenagens que recebo. Meus amigos, minhas amigas, A Universidade é o local privilegiado da reflexão, da busca do conhecimento, do aprimoramento do ser humano em todos os sentidos. Por isso mesmo ela cumpre um papel indeclinável no processo de emancipação dos povos, na conquista da verdadeira liberdade pelas camadas mais amplas da população. Longe de embotar o espírito crítico, o engajamento social da Universidade impõe o desafio de combinar a excelência acadêmica com a ampliação das oportunidades

6 para os mais pobres inclusive a oportunidade de ascender ao ensino superior e nele permanecer. A democratização do acesso à Universidade é parte do esforço que fazemos no Brasil para garantir ensino público de qualidade para todos. Trata-se de universalizar um direito básico e de criar condições para o desenvolvimento sustentado ao longo do tempo. Triplicamos o orçamento federal para a Educação, superando o falso dilema que às vezes se impõe entre ensino superior e ensino fundamental. Em se tratando de Educação, tudo é prioridade: formar doutores e alfabetizar idosos; abrir creches e laboratórios. O governo deste trabalhador metalúrgico foi o período em que mais foram criadas universidades no Brasil: nada menos do que 14, além de 126 extensões universitárias, duplicando o número de vagas no ensino público superior. Esta semana a presidenta Dilma Rousseff assinou os atos de criação de 4 universidades. Criamos, em 205, o PROUNI, um programa que troca parte dos impostos devidos pelas universidades particulares por bolsas de estudos para estudantes pobres. Mais de 1 milhão e 300 mil jovens tiveram acesso ao ensino superior pelo PROUNI. Revolucionamos, em 2010, o financiamento universitário, abolindo a exigência de garantias por parte dos estudantes. Agora o estado é o fiador de empréstimos com juros subsidiados e prazos mais longos. Jovens médicos e professores que optam pelo serviço público têm a dívida cancelada. Graças a estes programas, qualquer jovem brasileiro tem hoje a oportunidade que eu não tive; a oportunidade com que a maioria dos pais de família jamais pode sonhar: ter um filho estudando na universidade. Cuidamos também de oferecer aos jovens um ingresso digno no mercado de trabalho por meio das escolas técnicas de nível médio. O governo anterior ao nosso havia proibido o investimento federal neste setor do ensino.

7 Revogamos a proibição e construímos, só no meu governo, 214 escolas técnicas de nível médio -- uma vez e meia a quantidade que havia sido feita em um século. No governo da presidenta Dilma, este número já chegou a 290. A presidenta também criou, em parceria com as organizações da indústria e do comércio, o PRONATEC, um programa que está oferecendo qualificação profissional a 2 milhões de trabalhadores e deve alcançar 8 milhões nos próximos anos. Em nosso governo, foi proibido o emprego do verbo gastar no que se refere à Educação. Todo o dinheiro público aplicado no ensino é chamado pelo seu nome verdadeiro: investimento. Dessa forma, podemos ter certeza de que as crianças de hoje e os jovens vão compartilhar um futuro melhor, num país mais justo e em uma América do Sul mais fraterna e menos desigual. Meus amigos, minhas amigas, Um grande educador brasileiro, Paulo Freire, dizia que a educação liberta o oprimido. maior desafio e a maior responsabilidade dos educadores é serem sempre coerentes: fazer daquilo que eles dizem e defendem, um guia para a ação. Ele mesmo deu o exemplo, ao praticar Na política não é diferente. Quando um governo faz o que diz que prometeu fazer, ganha a confiança do povo. E quando um governo diz que vai criar oportunidades e as cria. Quando diz que vai ampliar direitos e os amplia. Quando diz que vai criar e ampliar melhores condições de vida, de educação, de moradia, de renda e de saúde... e as cria e as amplia. Aí, meus amigos e minhas amigas, esse governo não apenas tem a confiança do povo. Esse governo é assumido pelo povo como SEU PRÓPRIO governo, como o governo de todos, como um governo popular e, por isso mesmo, um governo que lhe pertence e que ninguém pode lhe tirar. Um governo que certos setores da imprensa poderão tentar atacar de mil formas diferentes, mas sempre sem sucesso.

8 Sempre sem conseguir mudar aquela marca que a dignidade deixa no coração e na consciência do povo, quando os direitos são garantidos, respeitados e ampliados. No meu governo a educação foi uma prioridade. Alguns fatos podem dar conta disso. Fizemos em 10 anos, mais escolas técnicas que as que tinham sido feitas em um século. Tenho a honra de ter sido o Presidente brasileiro que mais universidades públicas criou durante seu mandato: foram 14 novas universidades e 126 campus universitários, especialmente, nas regiões mais pobres e distantes do país. Criamos o Programa Universidade Para Todos, que permitiu que mais de 1 milhão e 300 mil jovens tivessem acesso à universidade, grande parte deles a primeira geração de universitários nas suas famílias, 60% deles negros e negras. Ampliamos no quadro de professores nas universidades federais, passado de 44 mil a quase 80 mil em oito anos, melhorando também significativamente o salário docente. Mudamos o sistema de crédito estudantil, antes baseado em critérios bancários tradicionais, e colocamos o próprio Estado como avalista dos beneficiários. Isto permitiu não só democratizar o acesso aos recursos, mas também ampliá-los e diversificá-los. Criamos novos modelos de instituição universitária, nas periferias das grandes cidades (onde moram os filhos dos trabalhadores e as populações mais pobres e onde não existiam universidades). Também criamos instituições inovadoras que hoje possuem uma importância estratégica muito significativa, como a Universidade da Integração Latino-americana (UNILA), na tríplice fronteira entre o Brasil, Argentina e Paraguai; e a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), no Estado do Ceará, o primeiro a abolir a escravatura no Brasil.

9 Criamos uma nova política de Ciência e Tecnologia, que permitiu ampliar as fronteiras de inovação e criar novas formas de articulação, mutuamente enriquecedoras, entre o sistema produtivo e as instituições universitárias. Esses avanços foram ampliados e fortalecidos pelo governo da Presidente Dilma, onde foi aprovada e regulamentada a Lei de Cotas, que permite reservar 50% das vagas das universidades públicas para os estudantes mais pobres, negros e indígenas. Ela deu continuidade e estendeu ainda mais e revolução que o ensino técnico brasileiro experimentou nesta última década. Criou o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC), que permitiu uma ampla expansão da oferta de cursos de educação profissional e tecnológica. Também, intensificou a enorme mudança que estamos promovendo no campo da pesquisa e da inovação científica, com a criação de um Programa que hoje é referência no mundo todo: Ciência sem Fronteiras. A iniciativa está destinada a conceder mais de 100 mil bolsas a estudantes e jovens profissionais brasileiros para a formação de pós-graduação, realização de estágios e intercâmbios nas melhores universidades do mundo. O objetivo é lhes permitir o acesso a uma formação de excelência e contribuir com a inovação e a competitividade da nossa economia nesta cada vez mais complexa sociedade do conhecimento. Ampliar as oportunidades educacionais dos jovens pobres é a mais urgente e necessária reparação de uma injustiça crônica. Fazer com que o direito à educação deixe de ser patrimônio de poucos, tem que ser o compromisso de todo governo democrático. Forneçamos uma, apenas UMA oportunidade aos mais pobres e veremos como eles são capazes de derrubar os imensos muros e barreiras que limitam, frustram e se antepõe aos seus sonhos. Senhores Reitores, meus amigos, minhas amigas.

10 Fico muito honrado por receber hoje o doutorado honoris causa da Universidade Andina Simón Bolívar. Ela representa um novo tipo de organização acadêmica, de caráter internacional, e desempenha um papel central na integração e na cooperação entre as nações andinas. É, sem dúvida nenhuma, uma das melhores universidade latino-americanas, pela qualidade dos seus programas acadêmicos e, fundamentalmente, pelos seus cursos de pós-graduação. Agradeço ao seu Presidente, o Professor Ernesto Albán, e ao seu Reitor, meu querido amigo, Enrique Ayala pela distinção que sua universidade me confere. Peço, por favor, Enrique, que você transmita esse agradecimento a toda a comunidade da Universidade Andina. Vocês fazem muita honra ao nome que carregam. O sonho de Bolívar, de construir uma América Latina integrada e emancipada, pode ser alcançado por instituições como esta. Agradeço ao Reitor Sérgio Flores e a toda a comunidade acadêmica da Escola Superior Politécnica do Litoral. A ESPOL é uma instituição de referencia no Equador, pela qualidade das suas faculdades, escolas e institutos. Também pela produção acadêmica dos seus centros de pesquisa e pelas revistas que edita. Receber desta importante instituição o doutorado honoris causa, me enche de orgulho e felicidade. O Brasil e o Equador devem fortalecer e intensificar sua aliança estratégica. Devemos estreitar e consolidar nossa integração comercial e econômica, mas também nossa integração educacional e cultural. A união entre nossos países é fundamental para enfrentar os desafios que nos deparará um sistema mundial cada vez mais competitivo e menos solidário. A solução para os grandes problemas sul-americanos só poderá ser encontrada com uma mais ampla e ousada integração entre as nossas nações. Juntos seremos sempre mais fortes. Devemos construir e multiplicar as pontes que nos unem. A união entre o Brasil e o Equador vai fortalecer o importante e histórico processo de

11 integração regional que vive hoje a América do Sul. Temos que estar mais unidos porque o nosso futuro não depende só de nós, senão do que sejamos capazes de construir juntos. O grande artista equatoriano Oswaldo Guasayamin tem uma frase que muito me impactou, nesse extraordinário museu que é a Capela do Homem: Chorei porque não tinha sapatos. Até que vi uma criança que não tinha pés. Temos que sermos capazes de construir uma ética da solidariedade, um compromisso inalienável na luta contra todas as forma de sofrimento e humilhação produzidas pela miséria, o abandono e a exclusão. Devemos indignar-nos, reagir perante a exploração, perante a dor. Os direitos não podem ser patrimônio de poucos. A felicidade e as oportunidades não podem ser propriedade daqueles que podem pagar por elas. Temos que assumir juntos o desafio de lutar por um mundo mais justo, mas democrático, mais igualitário. Nossas universidades devem ser protagonistas ativas na construção desse novo mundo possível. A obra de Oswaldo Guayasamin, muito nos inspira nessa luta. Honrando sua memória, reafirmo meu compromisso de continuar trabalhando para tornar mais forte e ativa a integração entre o Equador e o Brasil. Muito obrigado.