DESENVOLVIMENTO DE MATRIZ VÍTREA PELO PROCESSO SOL-GEL VISANDO INCORPORAÇÃO DE REJEITO NUCLEAR
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1 DESENVOLVIMENTO DE MATRIZ VÍTREA PELO PROCESSO SOL-GEL VISANDO INCORPORAÇÃO DE REJEITO NUCLEAR Ana Maria Matildes dos Santos* e Wander L. Vasconcelos** *Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear - CDTN-CNEN/MG amms@urano.cdtn.br, Caixa Postal , Belo Horizonte-MG, Brasil **Depto. de Engenharia Metalúrgica - UFMG wlv@urano.cdtn.br, Rua Espírito Santo, 35-2 o andar - Centro , Belo Horizonte-MG, Brasil RESUMO A tecnologia sol-gel é considerada promissora para obtenção de vidros para a incorporação de elementos radioativos. Este fato deve-se, principalmente, à ausência de poeira durante as etapas de processamento, à menor temperatura de trabalho, à obtenção de vidros mais homogêneos. Além disso, com esse processo, é possível controlar as propriedades finais do vidro, atuando nas etapas intermediárias do processamento onde se pode, por exemplo alterar a morfologia, o tamanho e a distribuição dos poros presentes na matriz. Neste trabalho foram obtidos vidros de sílica incorporados com césio utilizando-se o tetrametil-ortossilicato (TMOS) como precursor, HF e HNO 3 como catalisadores e o sal de cloreto de césio como elemento de incorporação. A seqüência usual do processo sol-gel para obter os géis de sílica foi: preparação do sol, gelação, envelhecimento, secagem, densificação. Vidros porosos de sílica foram submergidos em solução aquosa com 3 g/l e 27 g/l de Cs. Parâmetros estruturais foram medidos tais como volume de poro, área superficial, densidade volumétrica. Uma avaliação da conectividade e da permeabilidade dos vidros porosos foi realizada. O efeito de diferentes teores de césio nas propriedades dos géis são apresentados assim como também o comportamento de vidros porosos quando imersos em solução aquosa com cloreto de césio. I. INTRODUÇÃO Os rejeitos oriundos da geração de energia núcleoelétrica são bastante diversos quanto à forma, toxicidade, atividade, composição química etc., sendo, em geral, classificados em relação à atividade como sendo de baixo, médio e alto nível [1]. Devido a essas características, não existe uma matriz única para a imobilização desses rejeitos. Tal matriz de incorporação do rejeito é a primeira barreira imposta aos radionuclídeos devendo, portanto, apresentar boas propriedades, principalmente as relativas à permeabilidade e resistências mecânica, térmica e química. Um grande número de matrizes têm sido desenvolvido e avaliado para o condicionamento do rejeito radioativo, visando o melhoramento de suas propriedades. Entre as técnicas de acondicionamento de rejeitos radioativos de alto nível, a técnica de vitrificação é a mais empregada. Esta técnica está sendo considerada também para rejeitos de baixa e média atividades devido à sua capacidade de incorporar um maior volume [2]. No escopo da técnica de vitrificação, o processo solgel é uma das alternativas para obtenção da matriz para incorporação de rejeito. Isto se deve ao fato de se obter, além de uma maior homogeneidade do produto final, a facilidade de controle do processo e das características estruturais da matriz de incorporação [3,4]. Através da hidrólise e condensação de um alcóxido, dependendo do modo como as reações químicas são catalisadas, pode-se obter estruturas diferentes, ou seja, com catálise em meio ácido tem-se uma estrutura linear aberta e com catálise em meio básico pode ser obtida uma estrutura ramificada bem fechada. Também, pode-se influenciar na estrutura dos materiais atuando diretamente nas seguintes variáveis de processo: relação molar entre água e precursor, natureza e concentração do catalisador, tipo de solvente e seqüência de mistura de reagentes [5].
2 Com o objetivo de avaliar a utilização do processo sol-gel como alternativa para contenção de rejeitos radioativos, foram obtidos géis de sílica via hidrólise e condensação do tetrametil-ortossilicato (TMOS), à pressão atmosférica e à temperatura ambiente. O cloreto de césio foi utilizado como simulador de rejeito. As etapas usuais do processo sol-gel são: obtenção do sol, vazamento, gelação, envelhecimento, secagem e densificação [6]. Assim, foram produzidos géis, com diferentes teores de césio, e géis porosos de sílica. Estes géis foram submetidos a testes de impregnação com cloreto de césio, para se verificar a estabilidade deles em contato com soluções aquosas de cloreto de césio. Este trabalho apresenta, além da metodologia de obtenção de géis incorporados com césio via mistura direta e de géis porosos impregnados com césio, os resultados obtidos em suas caracterizações físicas e os resultados de integridade física em função do teor de césio, na solução de impregnação, e da temperatura de estabilização dos géis. II. PARTE EXPERIMENTAL Os géis de sílica foram obtidos através do processo sol-gel, via hidrólise e condensação do tetrametilortossilicato (TMOS), a baixa temperatura e à pressão atmosférica, utilizando-se os ácidos nítrico e fluorídrico como catalisadores. Foram obtidos géis porosos para testes de impregnação com cloreto de césio (elemento de incorporação) e géis incorporados com césio através da mistura direta do CsCl na solução de vazamento. As principais etapas no caso de mistura direta são: vazamento, gelação, envelhecimento, secagem e densificação e, no caso de impregnação, além dessas etapas, tem-se as de estabilização e impregnação conforme mostrado na Figura 1. Na síntese dos géis incorporados com césio, via mistura direta, foram considerados os seguintes parâmetros: ph igual a 1,5, razão molar água/tmos igual a 16, concentração de HNO 3 na faixa de 0,1 % a 0,25 % e concentração de HF na faixa de 0,16 % a 0,32 % (porcentagem volumétrica). Para a síntese de géis porosos, o valor de ph ficou entre 0,5 e 1,5, razão molar água/tmos em 16, concentração de HNO 3 igual a 0,82% e concentração de HF em 0,25 e 0,32%. Os géis porosos obtidos com 0,25 % e 0,32 % de HF são identificados respectivamente como batelada 01 e batelada 02. Os sóis foram vazados em recipientes de plástico, sendo a gelação à temperatura ambiente. O envelhecimento foi feito à temperatura de 60 C durante 48 horas e a secagem à temperatura de 105 C durante o mesmo período. Os géis incorporados com césio, via mistura direta, foram tratados na faixa de temperatura de 300 C a 900 C. Os géis porosos foram tratados termicamente às temperaturas de 400 C, 500 C, 600 C, 650 C, 700 C, 800 C e 900 C. Com os géis porosos foram realizados testes de impregnação submergindo-os em uma solução de cloreto de césio. As concentrações de césio na solução de imersão foram: 3 g/l e 27 g/l Os géis obtidos via mistura direta de cloreto de césio foram caracterizados quanto à integridade física, teor de césio, superfície específica e microdureza Vickers. Os géis porosos foram caracterizados quanto à integridade física, fração volumétrica, superfície específica, tamanho de poros e presença de água. TMOS + água + catalisador (HNO 3, HF) + CsCl ( no caso de mistura direta) GELAÇÃO (gel úmido) ENVELHECIMENTO IMPREGNAÇÃO (no caso de gel poroso) DENSIFICAÇÃO MISTURA DOS REAGENTES (formação do sol) VAZAMENTO SECAGEM (gel seco) ESTABILIZAÇÃO (no caso de gel poroso) VIDRO Figura 1. Esquema do processo sol-gel para obtenção de vidros incorporados com césio. III. RESULTADOS E DISCUSSÃO Géis Obtidos por Incorporação Direta de CsCl. O tempo de gelação foi tomado como sendo aquele em que o sol não mais se deslizou pelas paredes do recipiente. A densidade volumétrica dos géis secos a C foi medida por picnometria com mercúrio. Na Tabela 1 são apresentados os resultados de tempo de gelação e densidade. Os géis continuaram íntegros após a etapa de secagem e após os tratamentos térmicos, sendo que, apenas os géis, obtidos sem HF apresentaram trincas internas. Na Figura 2 é mostrado, como exemplo, um gel seco incorporado com césio. O teor de césio foi obtido por fluorescência de raios X (Rigaku, modelo 3064).
3 Figura 2. Gel incorporado com césio por mistura direta. Pela Tabela 1, verifica-se que para a concentração de 0,32 % de HF a presença do césio aumentou o tempo de gelação, enquanto que sem o HF ou para a concentração de 0,16 % de HF o contrário foi observado. A presença do ácido fluorídrico diminui o tempo de gelação. A medida de superfície específica foi feita através da adsorção de nitrogênio, utilizando o equipamento SASE (Sistem Automático para Medição de Superfície Específica) que foi desenvolvido pelo CDTN (Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear) [7]. Os resultados de superfície específica em função do teor de césio e da temperatura estão mostrados respectivamente nas Figuras 3 e 4 (resultado para amostras com 0,16 % em peso de césio na solução de vazamento). Observa-se, na Figura 3, uma diminuição da superfície específica em função do teor de césio e, na Figura 4, uma diminuição na superfície específica com a presença do césio. TABELA 1. Resultados de Tempo de Gelação e Densidade. % em peso de Cs (na solução de vazamento) tempo de gelação densidade (g/cm 3 ) % HF 0 ~8 dias 1,64 0 0,13 ~7 dias 1,64 0 0,16 ~7 dias 1,66 0 0,47 ~6 dias 1, ,64 0,16 0, ,66 0,16 0, ,72 0,16 1, ,74 0,16 2, ,75 0,16 4, ,79 0, ,47 0,32 0, ,56 0,32 0,6 95 0,56 0,32 1, ,60 0,32 2, ,67 0,32 Figura 3. Superfície Específica em Função do Teor de Césio em Géis Secos. Figura 4. Superfície Específica em Função da Temperatura. Os resultados dos ensaios de microdureza Vickers (Durimet Leitz Wetzlar, modelo 7060) estão apresentados na Figura 5. Figura 5. Microdureza Vickers em Função da Temperatura de Tratamento Térmico. Na Figura 5 observa-se que as amostras com césio apresentaram valores de microdureza Vickers um pouco maiores que os géis de sílica pura. Esse resultado é também coerente, tendo-se em vista que, conforme mostrado nas
4 Figuras 3 e 4 e na Tabela 1, a presença do césio aparentemente acelerou a sinterização da sílica. Géis Porosos para Impregnação com de CsCl. A densidade volumétrica foi medida por picnometria com mercúrio, sendo que a densidade teórica do vidro foi tomada como 2,2 g/cm 3. A superfície específica dos géis foi medida com o equipamento SASE. A presença de água foi avaliada com espectrofotômetro UV-VIS-NIR (Hitachi, U-3501). Os géis de sílica continuaram íntegros e transparentes após a etapa de secagem e os tratamentos térmicos de estabilização. A Figura 6 apresenta a fração volumétrica de poros para os dois tipos de géis porosos (batelada 01 e batelada 02) em função da temperatura. A Figura 7 mostra os resultados de superfície específica em função da temperatura de tratamento térmico e a Figura 8 apresenta o raio médio de poros em função da temperatura. Figura 8. Raio do Poro em Função da Temperatura. A conectividade e a permeabilidade foram estimadas conforme equações apresentadas na referência [8]. As Figuras 9 e 10 mostram os resultados encontrados. Na Figura 11 são apresentados os espectros UV-VIS-NIR obtidos para géis estabilizados em diferentes temperaturas. As bandas de absorção se devem às vibrações radiais das ligações OH presentes que formam silanóis (Si-OH), seus harmônicos e combinações [9]. Nesta figura, observa-se que os picos de absorção decrescem com a temperatura de estabilização mostrando uma associação da diminuição da concentração de grupos OH com a elevação da temperatura de tratamento térmico. Figura 6. Fração Volumétrica em Função da Temperatura de Estabilização. Figura 9. Conectividade em Função da Temperatura. Figura 7. Superfície Específica em Função da Temperatura.
5 Figura 10. Permeabilidade em Função da Temperatura. Figura 12. Gel na Solução de CsCl. Os géis tratados a 650 C, 700 C, 800 C e 900 C não apresentaram trincas e a interface água/gás desapareceu sem a ocorrência de trincas. Foi verificado que quanto maior a temperatura de tratamento térmico maior o tempo necessário para o completo desaparecimento da interface água/gás e que esse tempo também dependeu da concentração de césio na solução de imersão. IV. CONCLUSÕES Figura 11. Espectro UV-VIS-NIR. Imersão de Géis Porosos em Solução Aquosa de CsCl. A Figura 12 ilustra um gel submerso na solução de cloreto de césio. As amostras estabilizadas a 400 C, ao serem submergidas na solução aquosa de cloreto de césio, apresentaram trincas internas e liberaram uma grande quantidade de gás. As amostras de 500 C apresentaram uma interface água/gás contornando a amostra. A interface foi caminhando em direção ao centro geométrico da amostra até que a mesma dividiu-se em duas partes. O tempo para a ocorrência de quebra da amostra foi menor para o gel imerso na solução com maior teor de césio (30 min para a solução de 27 g/l e 2 h para a solução de 3 g/l). O comportamento da amostra tratada a 600 C foi similar à de 500 C, porém o tempo de ocorrência de quebra da amostra foi bem maior (~ 23 h). O estudo realizado mostrou que é possível produzir géis monolíticos de sílica incorporados com césio. O aparecimento de trincas só foi observado em géis catalisados apenas com ácido nítrico e tratados acima de C. Observou-se que a presença de césio aumenta a sinterabilidade dos géis de sílica. Foi possível também obter vidros porosos de SiO 2, estabilizados na faixa de temperatura de 400 C a 900 C, com as seguintes características: raio médio de poros na faixa de 86 Å a 113 Å; permeabilidade na faixa de 0,65 x m 2 a 1,25 x m 2, conectividade na faixa de 0,86 x cm -3 a 2,2 x cm -3 e superfície específica na faixa de 225 m 2 /g a 250 m 2 /g. A impregnação desses vidros em solução aquosa de cloreto de césio mostrou a ocorrência de trincas e de fraturas em géis tratados a 400 C, 500 C e 600 C. Foi verificado que o tempo de aparecimento de trinca é menor para os géis imersos na solução com maior concentração de césio. REFERÊNCIAS [1] COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR (Brasil). Gerência de rejeitos radioativos em instalações radiativas. Rio de Janeiro, RJ, (CNEN-NE-05). [2] BICKFORD, D.F. & SCHUMACHER, R. Vitrification of hazardous and radioactive wastes, WSRC-MS , 1994.
6 [3] ULRICH, D.R. Prospects of the sol-gel processes. Journal of Non-Crystalline Solids, vol.100, p , [4] NAZERI, A., BESCHER, E., MACKENZIE, J.D. Ceramic composites by sol-gel method: a review, Ceramic Engineering Science Proceedings, vol.14, n.11-12, p.1-19, [5] MACKENZIE, J.D.. Applications of the sol-gel method: some aspects of the initial processing. In: HENCH, L.L., ULRICH, D.R. Science of ceramic chemical processing. Gainesville :John Wiley, Part 1, P [6] HENCH, L.L. & WEST, J.K. The sol-gel process, Chemical Review, vol.90, p.33-72, [7] FERREIRA, R.A.N. et al. Desenvolvimento de um equipamento para medição de área específica de pós, Cerâmica, vol.36, n.246, p , [8] SILVA,G.F.B.L.,SANTOS,A.M.M., VASCONCELOS, W.L. Avaliação da conectividade e permeabilidade de vidros porosos de sílica obtidos a partir de TMOS e HF. In: III Encontro de Metalurgia, Mineração e Materiais da UFMG, Belo Horizonte, MG, 16 e 17 de outubro, p [9] HENCH, L.L. & WANG, S.H. The sol-gel glass transformation of silica. Phase Transitions, vol.24-26, p , ABSTRACT New processing techniques are required for the immobilization of radioactive wastes in order to minimize the risks of environment contamination. In this field, the sol-gel technology appears as an alternative exhibiting as advantages the absence of powders during processing, low processing temperatures, and obtention of more homogeneous products. In this work, dense and porous silica glasses, incorporated with Cesium, were obtained through sol-gel process employing tetrametyl-ortosilicate as precursor, HF and HNO 3 as catalyst and Cesium Chloride as embbeded element. The usual sequence was used to make the silica gels: sol preparation, gelation, aging, drying and densification. The porous glasses were immersed into aqueous solution with 3 g/l and 27 g/l of Cs. Structural parameters are measured as pore volume, specific surface area, bulk density. An evaluation of pores connectivity and permeability were carried out. The effect of different Cesium contents on the properties of the gels is presented as well as the behavior of porous glasses when immersed into aqueos solution with CsCl.
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