TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 fls. 424 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de Sumaré, em que são apelantes/apelados ROSELI LUZ DOS SANTOS DE OLIVEIRA, LUCIA HELENA VILELLA DE CAMARGO (ESPÓLIO) e SOLANGE VILELLA DE CAMARGO PADOVANI (INVENTARIANTE), são apelados/apelantes FRANCISCO CARLOS VIEIRA, ROBERTO LUIZ DOS SANTOS, SELMA REGINA DE SOUZA ALMEIDA, VALDOMIRO APARECIDO EICHEMBERGUE, RITA DE CÁSSIA REZENDE DE SOUZA, LUCIMARA APARECIDA EICHEMBERGUE, ANA MARIA PARMEGGIANI DE SOUZA CAMPOS, DÉBORA CRISTINA FAGNANI e CRISTIANO HENRIQUE FRANCISCO. ACORDAM, em 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso da ré, para julgar extinta a ação, por ilegitimidade passiva, sem resolução de mérito, nos moldes do art. 485, VI do NCPC", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores CLAUDIO AUGUSTO PEDRASSI (Presidente), VERA ANGRISANI E RENATO DELBIANCO., 16 de agosto de 2016 CLAUDIO AUGUSTO PEDRASSI RELATOR Assinatura Eletrônica

2 fls. 425 Voto n.º Apelação Cível n.º Apelante/Apelado: Espólio de Lucia Helena Vilella de Camargo Apelado/Apelante: Francisco Carlos Vieira e outros Vara de origem: 1ª Vara Cível da Comarca de Sumaré SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. Escreventes regidos pelo regime estatutário pretendem o recebimento de quinquênios. Ação proposta em face do espólio da antiga titular da delegação. Ilegitimidade passiva reconhecida. Legitimidade passiva que é do titular atual da delegação (pessoa física). Novo delegado que assume o ativo e o passivo do tabelião anterior. Continuidade do vínculo de emprego entre os autores e o atual titular do cartório. Sucessão configurada. Extinção da ação. Recurso da ré provido e recursos dos autores prejudicados. Vistos. Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo Espólio de Lucia Helena Vilella de Camargo e por Francisco Carlos Vieira e outros contra a r. sentença Apelação nº Sumaré - VOTO Nº /9

3 fls. 426 que julgou procedente esta ação ordinária, para reconhecer o direito dos autores de receber quinquênios incidentes sobre o salário base e vantagens incorporadas, a cada cinco anos de efetivo exercício, bem como o pagamento retroativo a partir do momento em que completaram os adicionais, observada a prescrição quinquenal e descontado o que já foi efetivamente pago. Recorre a requerida, alegando as preliminares de inépcia da petição inicial, de cerceamento de defesa e de ilegitimidade passiva. No mérito, sustenta que os apelados foram admitidos na função de auxiliar e passaram a exercer a função de escrevente posteriormente ao advento da Lei nº 8.935/94, aplicando-se aos mesmos as regras celetistas; que os autores buscam enriquecimento ilícito, em razão da recusa dolosa em exibir os documentos necessários. Subsidiariamente, pleiteia a definição da base de cálculo do benefício e a redução da verba honorária. Recorrem, também, os autores, requerendo o conhecimento do agravo retido, determinando que a requerida apresente os contracheques dos autores. No mérito, pleiteiam a aplicação da prescrição decenal e reflexos dos quinquênios em férias e 13º salário. Contrarrazões apresentadas às fls. 400/407 e 408/419. É o relatório. 1. Os autores foram admitidos no Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos de Pessoa Jurídica e Anexos de Notas de Sumaré, no cargo de auxiliar e depois foram promovidos a prepostos escreventes. Apelação nº Sumaré - VOTO Nº /9

4 fls. 427 Entendem que, como não fizeram a opção pelo regime trabalhista, são regidos pelo regime estatutário, fazendo jus ao recebimento dos quinquênios durante todo o período trabalhado. A r. sentença julgou procedente a ação, concluindo que os autores fazem jus ao benefício pleiteado. Todavia, a decisão deve ser reformada. 2. Com efeito, verifica-se na espécie a ocorrência de carência de ação, por ilegitimidade passiva. De fato, os autores ajuizaram a presente demanda em face do Espólio de Lúcia Helena Vilella de Camargo, que era a Titular da Delegação durante todo o período em que pleiteiam o referido pagamento. Entretanto, com o seu falecimento, a delegação foi assumida pelo atual titular, que manteve o vínculo de trabalho com os autores, tendo em vista que todos permanecem prestando serviços no cartório extrajudicial (cf. fls. 03). Desta forma, houve a alteração da titularidade do serviço notarial, com a transferência da unidade econômico-jurídica e a continuidade da prestação de serviços pelos autores ao novo titular, caracterizando o fenômeno de sucessão trabalhista e respondendo o tabelião sucessor pelos créditos trabalhistas anteriores à sua delegação. Note-se que o novo titular ao assumir a delegação, assume também todo o ativo e o passivo do Apelação nº Sumaré - VOTO Nº /9

5 fls. 428 cartório, sendo o responsável pelas verbas salariais ora buscadas. As serventias possuem natureza jurídica de concessão sui generis do serviço de registro e notarial, cuja delegação dá-se por meio de concurso público, devendo ser provida por pessoa física. Constituição Federal: Nos termos do art. 236 da Art Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. 1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário. 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses. Por sua vez, a Lei Federal nº 8.935/94 regulamentou o dispositivo constitucional acima citado determinando em seus artigos 20 e 21 sobre a responsabilidade dos notários e oficiais de registro: Art. 20. Os notários e os oficiais de registro poderão, para o desempenho de suas funções, contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados, com remuneração livremente ajustada e sob o regime da legislação do trabalho. 1º Em cada serviço notarial ou de registro haverá tantos substitutos, escreventes e auxiliares quantos forem necessários, a critério de cada notário ou oficial de registro. 2º Os notários e os oficiais de registro encaminharão ao juízo competente os nomes dos substitutos. 3º Os escreventes poderão praticar somente os atos que o notário ou o oficial de registro autorizar. 4º Os substitutos poderão, simultaneamente com o notário ou o oficial de registro, praticar todos os atos que lhe sejam próprios exceto, nos tabelionatos de Apelação nº Sumaré - VOTO Nº /9

6 fls. 429 notas, lavrar testamentos. 5º Dentre os substitutos, um deles será designado pelo notário ou oficial de registro para responder pelo respectivo serviço nas ausências e nos impedimentos do titular. Art. 21. O gerenciamento administrativo e financeiro dos serviços notariais e de registro é da responsabilidade exclusiva do respectivo titular, inclusive no que diz respeito às despesas de custeio, investimento e pessoal, cabendo-lhe estabelecer normas, condições e obrigações relativas à atribuição de funções e de remuneração de seus prepostos de modo a obter a melhor qualidade na prestação dos serviços. Verifica-se, portanto que a responsabilidade pela gestão administrativa e financeira é exclusiva do respectivo titular, ou seja, da pessoa física que recebeu a outorga. A C. 1ª Câmara de Direito Público já apreciou esta questão, no julgamento da Apelação Cível nº , sendo relator o eminente Des. Luís Francisco Aguilar Cortez, j. 02/02/2016, neste sentido: De outra parte, não procede a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam apontada pelo réu, atual oficial do cartório de registro civil, sob o fundamento de que não é responsável pelas verbas eventualmente devidas em período anterior à data em que assumiu a titularidade do cartório extrajudicial (fevereiro de 2010), tendo em vista a sucessão de responsabilidade configurada no caso concreto. Não se desconhece a divergência jurisprudencial e doutrinária sobre o tema, todavia, adoto a posição de que para a configuração da responsabilidade patrimonial é necessário o preenchimento de dois requisitos: (a) a transmissão interina da unidade econômico-jurídica e (b) a continuidade na prestação de serviços do empregado ao novo titular; situações configuradas no caso dos autos, uma vez que o réu assumiu a titularidade da serventia extrajudicial em 17/02/2010 e o autor continuou a prestar serviços até março de 2013, ocasião em que pediu demissão. Nesse sentido, já decidiu esta Corte: AGRAVO DE INSTRUMENTO. Serventuário de Cartório de Títulos e Documentos. Decisão que acolheu a preliminar de ilegitimidade passiva do atual Oficial do Cartório em relação a verbas trabalhistas anteriores à delegação que deve ser reformada. Precedentes dessa Corte. RECURSO PROVIDO (8ª Câmara de Direito Público, AI nº , rel. Des. Antonio Celso Faria, j ). Apelação nº Sumaré - VOTO Nº /9

7 fls. 430 ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL - SERVIDOR - ADMISSÃO ANTERIORMENTE À CONSTITUIÇÃO DE DELEGAÇÃO DO SERVIÇO - DISPENSA OU DEMISSÃO REGIME HÍBRIDO OU ESPECIAL - COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO PASSIVO TRABALHISTA - LEGITIMIDADE PASSIVA DO NOTÁRIO OU REGISTRADOR - EXTINÇÃO DO PROCESSO AFASTADA -INDENIZAÇÃO DEVIDA. 1. É da responsabilidade exclusiva do respectivo titular o gerenciamento administrativo e financeiro dos serviços notariais e de registro, inclusive no que diz respeito às despesas de custeio, investimento e pessoal, especialmente os passivos trabalhistas. Inteligência dos artigos 21 da Lei nº e 58, 2º, da Lei Estadual nº /06. Extinção do processo, sem resolução de mérito, afastada. 2. Servidor admitido como auxiliar de cartório anteriormente à Constituição Federal de 1988 e não optante pelo regime celetista. Regime híbrido ou especial. Inexistência de estabilidade. Dispensa ou demissão cabível a critério do titular da delegação do serviço de Notas ou Registro. Direito do servidor a quinquênios, licenças-prêmio em pecúnia, aviso prévio, indenização e férias proporcionais. Sentença reformada. Pedido procedente, em parte. Recurso provido (9ª Câmara de Direito Público, Ap nº , rel. Des. Décio Notarangeli, j ). Assim, considerando a manutenção do vínculo de trabalho, o réu, ora apelante, responde pelos débitos anteriores à assunção da outorga da serventia, conforme bem decidiu o M.M. Juízo a quo (especialmente às fls. 150/153). No mesmo sentido: Apelação / Indenização por Dano Moral Relator(a): Maria Olívia Alves Comarca: São Bernardo do Campo Órgão julgador: 6ª Câmara de Direito Público Data do julgamento: 25/07/2016 Data de registro: 27/07/2016 Ementa: APELAÇÃO Pedido de indenização por danos morais e materiais Funcionário de serventia extra-judicial Danos havidos no âmbito da relação funcional, decorrentes da ausência de recolhimento de contribuições previdenciárias em favor do autor Demanda proposta em face do Cartório e do atual Tabelião Ilegitimidade passiva Extinção do processo, sem resolução de mérito Reforma parcial que se impõe Serventia extrajudicial que não é dotada de personalidade jurídica Ausência de capacidade de ser parte Extinção do feito corretamente pronunciada em relação ao Cartório Legitimidade passiva que é do titular da serventia (pessoa física) Novo tabelião, ademais, que assume o ativo e o passivo do tabelião anterior Sucessão caracterizada Legitimidade daí decorrente Sentença reformada Julgamento imediato da Apelação nº Sumaré - VOTO Nº /9

8 fls. 431 lide Parcial procedência dos pedidos Pedido de pagamento de indenização por danos morais Inadmissibilidade, no caso Hipótese que não trata apenas de imputar responsabilidade ao novo tabelião pelo passivo trabalhista/funcional da serventia, mas de condená-lo por dano moral não causado por ele Dano material, contudo, caracterizado Possibilidade de responsabilização do autor, nesse particular Indenização devida Ressarcimento dos valores correspondentes ao recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas após a data em que o autor já teria direito à aposentadoria Recurso parcialmente provido Apelação / Reintegração Relator(a): Peiretti de Godoy Comarca: Guaratinguetá Órgão julgador: 13ª Câmara de Direito Público Data do julgamento: 18/04/2012 Data de registro: 22/08/2012 Ementa: REINTEGRAÇÃO DE CARGO. Serventuário de cartório extrajudicial Declaratória de nulidade de procedimento demissional. Legitimidade passiva ad causam do atual Tabelião do 2º Cartório de Notas da Comarca de Guaratinguetá Afastada a legitimidade passiva ad causam de antigo titular da delegação. Pleito de reintegração do demandante ao seu posto de trabalho Autor ingressou na serventia em maio de 1984, sem que tenha optado pela transformação de seu regime de trabalho em celetista (artigo 48, da Lei nº 8.935/1994). Necessidade de instauração de procedimento administrativo disciplinar, a legitimar o ato de dispensa. Dispensa nula de pleno direito Afastamento indevido. RESPONSABILIDADE CIVIL Indenização Valores devidos no período entre a demissão e a reintegração Inaplicabilidade da Lei nº /2009. Demanda proposta anteriormente a sua vigência. Sentença de improcedência reformada Recurso provido. Desta forma, o recurso da ré deve ser provido, reconhecendo-se a carência da ação por ilegitimidade passiva, restando prejudicado os recursos de agravo retido e de apelação interpostos pelos autores. 3. Considera-se prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional aventada, observado que é desnecessária a citação dos dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido analisada. Apelação nº Sumaré - VOTO Nº /9

9 fls. 432 Isto posto, conheço e dou provimento ao recurso da ré, para julgar extinta a ação, por ilegitimidade passiva, sem resolução de mérito, nos moldes do art. 485, VI do NCPC. Ficam invertidos os ônus da sucumbência; arcando os autores com o pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios de 15% sobre o valor da causa atualizado. Ficam prejudicados os recursos de agravo retido e apelação interpostos pelos autores. Cláudio Augusto Pedrassi Relator Apelação nº Sumaré - VOTO Nº /9