INFERTILIDADE AUTO-DECLARADA E DESEJO DE FILHOS NA PNDS 2006

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1 INFERTILIDADE AUTO-DECLARADA E DESEJO DE FILHOS NA PNDS 2006 Introdução A infertilidade é considerada pela OMS como um grave problema de saúde pública, cujo impacto varia entre as diferentes populações e adquire relevância para comunidades específicas. Estima-se que a infertilidade conjugal atinja, na população mundial, cerca de 10% a 15% dos casais em idade fértil, com tendência crescente em função da idade (Ombelet, W. et al, 2008; Samrsla, M; Nunes, J., Kalume, C.,Cunha, A e Garrafa, V, 2007). A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS) 2006 (Berquó, E; Garcia, S; Lago T, 2008) revelou que 37% das mulheres relataram terem sido esterilizadas ou serem inférteis, não podendo ter filhos ou mais filhos. Considerando-se que há mulheres arrependidas por terem se submetido à esterilização e aquelas que eventualmente adiaram o desejo da maternidade, há um elevado percentual de mulheres que poderão recorrer aos serviços de reprodução assistida para engravidar. O estudo aqui proposto propõe-se a: 1. Identificar e caracterizar, do ponto de vista sócio-demográfico, as mulheres em idade reprodutiva, que se autodeclararam inférteis, histerectomizadas e menopausadas, ou cujos companheiros são inférteis, e que desejam ter filhos; 2. Investigar a busca por tratamento da infertilidade nos serviços públicos e privados; 3. Avaliar as características e fatores associados aos desfechos: mulheres que estão aguardando atendimento nos serviços de saúde; as que foram atendidas, mas não obtiveram tratamento para engravidar; e as que estão em tratamento; 4. Identificar as mulheres que se arrependeram de ter realizado a esterilização, e por motivo de arrependimento. Metodologia Estudo com base nos dados da PNDS A PNDS é uma pesquisa domiciliar de representatividade nacional das cinco macrorregiões brasileiras, urbanas e rurais. A

2 partir de dez estratos amostrais, domicílios foram selecionados, segundo um modelo estratificado de conglomerados aleatório simples em duas etapas: sorteio de setores e sorteio de domicílios. Nos domicílios selecionados foram feitas entrevistas com mulheres em idade reprodutiva, de 15 a 49 anos. (Cavenaghi, S., 2008) Os dados da PNDS 2006 são provenientes de uma amostragem probabilística complexa e, portanto, as análises estatísticas levaram em conta os pesos e o planejamento amostral complexo. (Berquó, E.; Garcia,S.; Lago, T., 2008). As variáveis sociodemográficas incluídas na análise são: macrorregião de residência, anos de estudo, faixa etária, classe socioeconômica, situação conjugal e raça/cor da pele. Testes do tipo qui-quadrado foram ajustados para identificar associações entre infertilidade, busca por tratamento e as variáveis sociodemográficas. Estabeleceu-se limite de significância para valores de p<0,05. A análise foi realizada nos programas Stata v.9 e/ou SPSS v.14 Resultados e Discussão Este trabalho tratou caracterizar do ponto de vista sócio-demográfico, uma dada condição reprodutiva referida pelas próprias mulheres. A intenção não foi calcular medidas de prevalência de infertilidade, seja por critérios epidemiológicos ou clínicos. Reconhecem-se as limitações do estudo. Em primeiro lugar, são opiniões restritas ao momento da entrevista e, nesse sentido, a afirmação sobre o desejo de filhos pode mudar em função do futuro da situação conjugal da entrevistada. Em segundo lugar, como a condição de infertilidade é baseada em auto-declaração, não é possível ter certeza se essa condição foi baseada em diagnóstico médico, qual o tipo de infertilidade (primária ou secundária) e há quanto tempo essa condição apresentase. Das mulheres de 15 a 49 anos investigadas, 4% estavam grávidas, 21% eram esterilizadas e cerca de 3%, tinham parceiros vasectomizados. As demais mulheres foram classificadas como em condições reprodutivas (64,5%) ou não reprodutivas (6,6%). Quase metade das mulheres em condições não reprodutivas, deixaram de procurar ajuda nos serviços de saúde. As mulheres negras deixaram mais de procurar ajuda (58,7%) do que as não negras (37,6%). Das mulheres em condições não reprodutivas, 49% declararam desejar ter um filho.

3 As mulheres esterilizadas não foram consideradas no grupo daquelas em condições não reprodutivas, pois não responderam à bateria de perguntas sobre se procuraram ajuda para engravidar. No entanto, como parte desse considerável segmento se arrependeu da laqueadura e desejava engravidar, foram analisadas separadamente, as características sócio-demográficas dessas mulheres, o percentual de arrependimento e os motivos alegados. Ainda são altos os índices de esterilização feminina no Brasil, 29% de acordo com a PNDS Apesar de essa prevalência ser menor que a registrada em 1996 (40%), a idade média da mulher na realização da laqueadura reduziu entre 1996 e 2006, de 28,6 para 28,1. Ademais, a realização desse procedimento antes dos 25 anos correspondeu a 20% e 27%, em 1996 e 2006, respectivamente. (Berquó e Lima, 2008). O arrependimento da realização da esterilização foi perguntado para mulheres que declararam ter realizado o procedimento; 12% das mulheres esterilizadas atualmente encontram-se arrependidas. Dentre os motivos mais citados, cerca de 70% declararam desejar um outro filho e 15% ter mudado de marido. Este panorama é complementado pelo seguinte dado: 4,6% se arrependeram logo após a esterilização e 59,1% destas, motivadas pelo desejo de ter filho. Observa-se que das 16,8% mulheres que não fariam esterilização nos dias atuais, 57,5% declararam querer um outro filho. Esses resultados apontam para a necessidade do sistema de saúde reforçar as orientações dadas às mulheres quanto às baixíssimas chances de reversão do método. As escolhas reprodutivas variam conforme as mudanças que ocorrem na vida das mulheres. Apesar de o adiamento da reprodução ser mais acentuado no segmento das mulheres de nível socioeconômico mais elevado, esse adiamento também ocorre entre as mulheres das classes sociais menos favorecidas (Berquó, E.; Garcia, S., 2012). O desejo de ter filhos biológicos pode ficar impossibilitado, em função da faixa etária mais avançada. Ressalta-se a falta de atendimento de parcela da população, sem possibilidades financeiras de acesso aos serviços privados de reprodução assistida e que se depara com a quase inexistência de serviços públicos nesse campo (Garcia, S. 2012; Makuch, 2011; Ombelet et al, 2008). Nesse sentido, do ponto de vista do

4 exercício dos direitos reprodutivos, esses segmentos estão longe de poder exercê-los (Samrsla, M. et al., 2007; Peterson, M, 2005) Referências Bibliográficas BERQUÓ, E. e GARCIA, S. Algumas considerações sobre a reprodução tardia. In: Turra, Cássio M. e Cunha, José Marcos P. da (orgs.). População e desenvolvimento em debate: contribuições da Associação Brasileira de Estudos Populacionais. Demografia em Debate. Belo Horizonte: ABEP, v. 4, julho 2012, 240: BERQUÓ, Elza, GARCIA, Sandra, LAGO, Tânia. (coord). Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher - PNDS [Relatório final]. São Paulo: CEBRAP BERQUÓ, Elza & LIMA, Liliam P. Intenções reprodutivas e planejamento da fecundidade. In: Berquó, E.; Garcia, S.; Lago, T. (coord.) Relatório Final - Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher - PNDS São Paulo: CEBRAP CAVENAGHI, S. M.. Perfil dos domicílios e das famílias. In: Ministerio da Saude e Cebrap. (Org.). Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher PNDS 2006: Dimensões do processo reprodutivo e da saúde da criança. 1ed.Brasília: Ministerio da Saude, 2009, v. 1, p FATHALLA, M. Current Challenges in Assisted Reproduction. Report of a Meeting on Medical, Ethical and Social Aspects of Assisted Reproduction. Who headquarters, Geneva, Swuiterland, september, (Edited by Effy Vayena, Patrick Rowe and David Griffin). GARCIA, S; BELLAMY, M e DE RUSSI, K. Considerações sobre Reprodução Assistida no Contexto Brasileiro. Revista Eletronica da ABEP,

5 MAKUCH, M., et al. Inequitable access to assisted reproductive technology for the low-income Brazilian population: a qualitative study. Human Reproduction, vol.26, n.8 pp , OMBELET., COOKE, I., DYER, S., SEROUR, G., & DEVROE, P. (2008). Infertility and the provision of infertility medical services in developing countries. Human Reproduction Update, 14 (6 ), doi: /humupd/dmn042 PETERSON, M. Assisted Reproduction Technologies and Equity of Access Issues. Journal Med Ethics, (31) , 2005 SAMRSLA, M; NUNES, J., KALUME, C.,CUNHA, A e GARRAFA, V. Expectativa de Mulheres à Espera de Reprodução Assistida em Hospital Público do DF Estudo Bioético. Revista Brasileira de Associação Médica, 2007, 53(1): 47-52, 2007