O MEIO AMBIENTE E O RISCO DE APAGÃO NO BRASIL. Victor José Ferreira Gomes
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- Jónatas Raminhos Cunha
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1 O MEIO AMBIENTE E O RISCO DE APAGÃO NO BRASIL Victor José Ferreira Gomes
2 O MEIO AMBIENTE E O RISCO DE APAGÃO NO BRASIL Victor José Ferreira Gomes
3 No ano de 2001, o Brasil sofreu um forte desequilíbrio entre a oferta e demanda de energia elétrica, denominada Crise do Apagão. Entre as causas da crise está a falta de chuvas nas cabeceiras dos rios em Minas Gerais, onde se encontram cerca de 65% dos reservatórios das usinas hidrelétricas. Segundo a ONS, verificou-se nos primeiros meses de 2001, mínimo histórico de vazão na maioria dos rios deste Estado (2007). No entanto, a causa estrutural e principal está diretamente associada ao processo de privatização do setor elétrico brasileiro iniciado em 1990 com o Plano Nacional de Desestatização. Esta mudança da estrutura do setor elétrico foi determinada por uma lógica neoliberal que passou a dominar o cenário macroeconômico mundial a partir da crise do México de O novo modelo construído apresentou fragilidades e inconsistências nos seus fundamentos em relação ao Sistema Elétrico Brasileiro, com especificidades e características únicas no mundo. (CASTRO; FERNANDEZ, 2007). Como resultado da crise do modelo de privatização, foi imposto a todas as classes de consumo um racionamento equivalente a 20% do volume médio de demanda de MWh. Ao final de 2001 foi contabilizado um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país de apenas 1,31%, muito baixo se comparado ao do ano 2000 que crescimento de 4,36%. (IBGE, 2007). O setor mais prejudicado foi o industrial, que obteve taxa de crescimento negativo no ano do apagão. A partir de 2003 foi iniciado um processo de reestruturação do setor elétrico. O governo buscou construir novas bases para um modelo cuja característica central passa a ser a da parceria estratégica público-privado, deixando para o passado o modelo de privatização pura. Atualmente, o espectro de uma crise entre oferta e demanda de energia elétrica volta ao cenário do setor, tendo em vista algumas previsões para o crescimento do PIB, crescimento de demanda por energia elétrica e a legislação ambiental, especificamente na questão dos licenciamentos. A metodologia da EPE, no seu Plano Decenal, utiliza três cenários para a previsão de crescimento do PIB entre No primeiro cenário, o de alto crescimento, prevê uma média decenal de 5,0% ao ano. No cenário de referência, a média é de 4,2% ao ano, e no cenário de baixo crescimento, a média é de 3,1% ao ano (MME/EPE, 2006). 1 Com base nestas estimativas de expansão média do PIB, foi feita uma projeção para a necessidade de expansão da capacidade de geração estimada em cerca de 220 TWh nos próximos 10 anos, representando aproximadamente MW médios. Nesse sentido, há necessidade de um aumento anual de aproximadamente 5% de oferta de energia elétrica para sustentar o crescimento do PIB brasileiro no cenário de referência, indicando assim uma elasticidade-renda da demanda de energia elétrica relação entre PIB e oferta de energia elétrica próxima a 1,2. 1 O Plano Decenal da EPE ainda se encontra em fase de Consulta Pública.
4 A partir da experiência obtida com a Crise do Apagão, tornou-se imprescindível melhorar as condições para o aumento da oferta de energia elétrica. Neste sentido, o governo buscou um aprimoramento da regulação do setor, a partir de De acordo com Castro (2007), esta reestruturação, conciliada com outros fatores, em especial com a melhoria significativa dos fundamentos macroeconômicos do Brasil, possibilitou a solução de vários problemas que impediam a expansão da oferta de geração nos anos 1990 até Entretanto, persiste um entrave para o aumento da oferta. Trata-se da questão dos licenciamentos ambientais e, por conseguinte, da necessidade de ajustes na legislação pertinente ao tema (CASTRO, 2007, p. 70). Constata-se a existência de sérias dificuldades na obtenção de licenças ambientais para os novos empreendimentos de geração, seja por morosidade administrativa do órgão executor das licenças ou por entraves legais. Como o modelo de privatização percebido entre 1990 e 2002 não induziu novos investimentos para geração de energia elétrica, o aparato legal de licenciamentos para estes empreendimentos ainda não foi devidamente testado e suas exigências não criaram uma experiência acumulada. A legislação aplicável ao procedimento administrativo de licenciamento ambiental se baseia, em termos gerais, nos capítulos sobre Competência e Meio Ambiente da Constituição Federal de 1988 e na Lei 6938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente), estes regulamentados pelas Resoluções 001/86, 006/87 e 237/97 do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente), para empreendimentos de energia elétrica em geral e pela Resolução 279/2001, para empreendimentos com pequeno potencial de impacto ambiental. De acordo com a Resolução 006/87 do CONAMA, o procedimento possui três etapas distintas para as usinas hidrelétricas, respeitadas as peculiaridades de cada caso: Licenciamento Prévio (LP) requerida no início do estudo de viabilidade da Usina; Licenciamento de Instalação (LI) obtida antes da realização da licitação para construção do empreendimento - e Licenciamento de Operação (LO) obtida antes do fechamento da barragem. Na atual sistemática dos leilões de energia nova, a LP é requerida pela EPE (Empresa de Pesquisas Energéticas), a LI e a LO são requeridas pelo empreendedor vencedor do leilão. Isto ocorre com o objetivo de não responsabilizar a EPE para a elaboração detalhada do projeto,
5 deixando tal procedimento para o vencedor do leilão, que supostamente possui mais conhecimento técnico na área de projetos hidrelétricos. O licenciamento ambiental possui como uma de suas mais expressivas características a participação social na tomada de decisão, por meio da realização de Audiências Públicas como parte do processo (IBAMA, 2007)., No nível federal, o Ibama durante o processo de licenciamento ouve os Órgãos Ambientais (OEMAs) envolvidos no licenciamento e os Órgãos Federais de gestão do Patrimônio Histórico (IPHAN), das Comunidades Indígenas (FUNAI), de Comunidades Quilombolas (Fundação Palmares), de controle de endemias (FUNASA), entre outros. De acordo com Di Pietro, licença é ato administrativo unilateral e vinculado pelo qual a Administração Pública faculta àquele que preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade. (2004, p. 220). A característica de ato vinculado faz com que somente caiba à autoridade a verificação do preenchimento dos requisitos legais por parte do particular. Entretanto a licença ambiental possui natureza jurídica de autorização, que se caracteriza pela discricionariedade (O EIA/RIMA estudo de impacto ambiental/relatório de impacto ambiental - não vincula o licenciador) e precariedade (a licença ambiental pode ser revogada sem gerar direito à indenização artigo 9º, IV, Lei 6938/81). A exigência de três licenças, a ausência de critérios objetivos e técnicos para o licenciamento e o grande número de órgãos envolvidos nestes, criam uma grande quantidade de exigências administrativas que acabam por burocratizar e dificultar o processo de licenciamento, gerando incertezas que vão se refletir, diretamente, no custo de construção das usinas hidrelétricas e conseqüentemente criam riscos para o empreendimento dificultando e afastando investidores. Desta forma, há a necessidade de mudanças na legislação pertinente ao tema e nos critérios dos órgãos executores do licenciamento. Uma alternativa seria a adoção do mecanismo fast-track (tramitação rápida) existente em países como Inglaterra e Estados Unidos e sugerido por Calou (2007, p. 29). Esta poderia ser uma alternativa viável para a solução de parte dos problemas legais referentes ao licenciamento no Brasil. Outra alternativa seria a imposição de critérios objetivos para o EIA/RIMA. E ainda, seria necessário o fiel cumprimento dos prazos para o deferimento ou indeferimento das licenças pelos órgãos responsáveis. O quadro abaixo mostra a diferença entre os prazos legais e a média observada nas primeiras etapas de licenciamento entre os anos de 1997 e 2006.
6 Quadro 1. Prazos legais e média observada nas etapas prévias de licenciamento ambiental referentes a 63 empreendimentos licenciados pelo IBAMA entre 1997 e 2006 Fonte: CALOU, 2007, p.25. O órgão executor das licenças em nível federal é o IBAMA, em nível estadual são os órgãos ambientais estaduais integrantes do SISNAMA e em nível municipal, os órgãos municipais integrantes do SISNAMA. Para a geração de energia elétrica, a Resolução 237/97 do CONAMA distribui as competências dos níveis federal, estadual e municipal de acordo com o critério da localização e da extensão dos impactos ambientais. Com o objetivo de não submeter licenças de empreendimentos de importância estratégia para o setor elétrico brasileiro a órgãos estaduais e municipais, que não possuem padronização nos critérios de licenciamento, seria mais adequado um critério de competência objetivo levando em conta a importância do empreendimento para o setor elétrico brasileiro, como, por exemplo, o de localização aliado com o de potência gerada pela usina. Assim, as licenças dos empreendimentos de importância para a garantia de oferta de energia elétrica no Brasil seriam submetidos a somente um órgão, de nível federal. Cabe ressaltar que, de acordo com dados do Balanço Energético Nacional de 2007, a energia hidráulica responde por 75,9% do total da oferta de energia elétrica no Brasil (EPE, 2007). Com as dificuldades na obtenção de licenças ambientais, esta fonte de energia limpa e renovável tende a perder espaço na matriz energética brasileira. De acordo com Castro, não há experiência no mundo, que garanta no curto e médio prazo, uma conversão radical na matriz energética em favor de fontes alternativas (2007, p.73), o que sustenta a necessidade e prioridade da fonte hidrelétrica para o crescimento econômico brasileiro. O gráfico abaixo demonstra que o crescimento do número de licenças prévias cresceu bem abaixo do número total de licenças, sinalizando problemas sérios na oferta de novos empreendimentos de geração para os leilões de energia nova. (CASTRO, 2007, p.72) Gráfico 1.
7 Demonstrativo de Licenças Ambientais emitidas no Brasil entre 1999 e 2005 Fonte: MMA, elaboração Gesel UFRJ. Como ilustração da dificuldade da obtenção das licenças ambientais para empreendimentos hidrelétricos pode-se mencionar que uma das causas da ausência de contratação de energia hidrelétrica no leilão A-3 realizado em julho de 2007, foi a dificuldade na obtenção de LPs para novos empreendimentos hidrelétricos por parte da EPE. Neste leilão foram contratados 1304 MW médios provenientes somente de usinas térmicas a óleo combustível a um preço médio de R$/MWh 134,67, sendo uma energia mais cara e suja. Entretanto, ressalta-se que a causa primordial para a ausência de contratação de energia hidrelétrica no último leilão foi a falta de estudos, por parte da EPE, das bacias hidrológicas, onde são definidos novos aproveitamentos. Outro exemplo são os pedidos sucessivos, por parte das empresas interessadas, pelo adiamento do início do fornecimento de energia dos empreendimentos do Rio Madeira, o primeiro previsto para janeiro de As futuras usinas do complexo do Rio Madeira (Santo Antônio 3150 MW e Jirau 3300 MW) serão fundamentais para o suprimento de energia elétrica nos próximos anos no Brasil e o pedido de adiamento tem fundamento na dificuldade e morosidade no processo de obtenção das licenças ambientais, visto que, de acordo com a legislação em vigor ainda faltaria a obtenção da LI e LO. Nestes termos e a título de conclusão, pode-se afirmar que existe um risco potencial de uma nova crise de oferta no Brasil se, por um lado, o crescimento previsto do PIB for superado, e, por outro lado, a questão do travamento ambiental não for, efetivamente, superada. A reestruturação do setor elétrico iniciada em 2003 foi de grande valia para minimizar o risco de crise, pois ao consolidar o marco regulatório e criar, via leilões de energia nova, contratos de longo prazo para cada novo empreendimento, passou a dar garantias firmes para a obtenção de financiamento no BNDES e no mercado de capital nacional. Desta forma, para que o risco potencial de crise não se configure e fique em patamares aceitáveis, é necessária uma ampla reestruturação da legislação
8 ambiental que, em síntese, permita uma desburocratização do procedimento de licenciamento ambiental para as novas usinas hidrelétricas. Referências bibliográficas BRASIL, Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução 006/87. Dispõe sobre o licenciamento ambiental de obras do setor de geração de energia elétrica. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil]. Brasília. 22 out 1987, Seção I, Pág CALOU, Sílvia. Desenvolvimento Energético e Licenciamento Ambiental. In: 8º Encontro de Energia, 2007, São Paulo, 45p. CASTRO, Nivalde José de. O destravamento ambiental do setor elétrico brasileiro. Revista Custo Brasil. Rio de Janeiro: ano 2, número 8, p , abril/maio CASTRO, Nivalde José de; FERNANDEZ, Paulo Cesar. A Reestruturação do setor elétrico brasileiro: passado recente, presente e tendências futuras. In:Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica, Rio de Janeiro: Furnas, out DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17 a ed. São Paulo: Atlas, EPE. Balanço Energético Nacional 2007: Ano Base 2006: Resultados Preliminares. Rio de Janeiro: EPE, IBAMA. Licenciamento. Disponível em: < Acesso em: 25 ago IBGE. Dados Consolidados Disponível em: < Acesso em: 20 jul MME/EPE. Plano Decenal de Expansão de Energia Elétrica 2006/2015. Brasília: MME/EPE, ONS. Hidrologia. Disponível em: < Acesso em: 21 jul 2007
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