Avaliação da utilização de larvas de abelhas Africanizadas (Apis mellifera) como bioindicadores da presença de resíduos de Thiamethoxam
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1 1 Avaliação da utilização de larvas de abelhas Africanizadas (Apis mellifera) como bioindicadores da presença de resíduos de Thiamethoxam Maria Claudia Colla Ruvolo-Takasusuki 1*, Denise Alves Lopes 1, Vagner de Alencar Arnaut de Toledo 2, Juliano Hideo Hashimoto 2 Universidade Estadual de Maringá, Departamento de Biologia Celular e Genética 1, Departamento de Zootecnia 2 - Av. Colombo, 5790, CEP: , Maringá, PR, Brasil *mccrtakasusuki@uem.br RESUMO A atividade relativa das esterases em ovos e larvas de Apis mellifera foi avaliada após a aplicação do inseticida thiamethoxam in vivo e in vitro. Extratos de ovos e larvas de operárias L1, L2, L3, L4, L5 (idade em dias) foram submetidos à eletroforese em gel de amido e corados com substratos cromogênicos e derivados de 4-metil umbeliferona. As análises in vivo mostraram que nos ovos houve inibição de 25% da atividade relativa das esterases. EST-1 em L3 e EST-1 e EST-4 em L4 apresentaram inibição de 25%. Nos bioensaios in vitro EST-1 e EST-2 apresentaram 50% de inibição em L1 e L3. EST-5 apresentou respectivamente inibição de 100%, 50% e 25% em L5, L3 e L4. EST-4 apresentou inibição de 100% em L1, L4 e L5 e de 50% em L2 e L3 quando foi empregado substrato cromogênico, e ausência de inibição com o substrato butirato de 4-metilumbeliferona. Alterações morfológicas e fisiológicas foram observadas nas larvas submetidas aos bioensaios. Palavras-chave: Isoenzimas, esterases, inseticida, polinizadores
2 2 INTRODUÇÃO As abelhas (Apis mellifera L.) são os polinizadores mais importantes da agricultura devido a sua habilidade de visitar centenas de flores durante cada viagem ao campo para coletar pólen e nectar (Free, 1993). Contudo, perda de polinizadores algumas vezes com concomitante redução na produção das culturas tem sido atribuída aos pesticidas, algumas doenças e a ácaros parasitas das abelhas (Kevan, 1999). Dentre estes o envenenamento das abelhas por pesticidas é um problema grave que afeta a produção de mel e a polinização de várias culturas (Jones et al., 1998). Há milhares de anos o homem utiliza pesticidas para reduzir as perdas e ataques de insetos em suas culturas. Registros históricos indicam a utilização de inseticida desde a época de Homero (1000 a.c.). A Segunda Guerra Mundial (1940) abriu a Era Química com a introdução de um conceito totalmente novo no controle químico de insetos, inseticidas orgânicos sintéticos, o primeiro foi o DDT (Ware, 1994). Com o intuito de reduzir perdas causadas por insetos pragas em suas culturas, os agricultores utilizam pesticidas que podem deixar resíduos nas flores, néctar e pólen. Tais resíduos podem contaminar as abelhas que estão polinizando a cultura e esses, serem levados para a colméia contaminando os seus produtos: mel, própolis, cera e até a cria. Como conseqüência gera prejuízos aos apicultores. Portanto, a ação predatória acumulada ao longo da história da humanidade vem resultando em alterações ambientais significativas, hoje, em muitos casos possíveis de serem mensuradas. Como as A. mellifera são suscetíveis a muitos inseticidas comumente utilizados para proteger o plantio de várias culturas, esses insetos podem ser utilizados como bioindicadores para a determinação de resíduos de alguns pesticidas, bem como para detectar o nível de toxicidade perigosa para as abelhas frente a inseticidas comumente empregados (Accorti et al., 1992; Porrini et al., 1998). Os efeitos prejudiciais dos pesticidas em abelhas dependem da toxicidade, do número e método de aplicação, horário, condições climáticas e do tipo de alimento coletado (Jones et al., 1998).
3 3 Insetos holometábolos como as abelhas A. mellifera apresentam quatro fases de desenvolvimento, a embrionária, larval, pupal e adulta. Em cada uma dessas etapas o inseto apresenta características morfológicas e fisiológicas diferentes. Dessa maneira, o requerimento enzimático para o desempenho metabólico das atividades tecido-específicas em cada fase do desenvolvimento varia. Assim, algumas enzimas podem apresentar atividade na fase embrionária, desaparecer nas fases larval e pupal, voltando a ser detectadas na fase adulta (Ruvolo-Takasusuki, 1994). Entre as enzimas do metabolismo intermediário podemos destacar as esterases, que participam de vários processos, inclusive a detoxificação do organismo do inseto por xenobióticos (dentre eles inseticidas). A atividade das esterases pode ser afetada por meio de vários fatores externos como por exemplo, o contato da abelha com resíduos de inseticidas durante a coleta de pólen e/ou néctar. Levados ao ninho esses resíduos podem contaminar a cria e/ou os produtos das abelhas, prejudicando a apicultura que está associada à polinização de várias culturas. Assim, nesse estudo foram avaliadas as alterações da atividade das esterases durante as fases de ovo e larva de Apis mellifera africanizada após a contaminação in vitro com o inseticida Thaimethoxam. MATERIAIS E MÉTODOS Para o desenvolvimento desse estudo foram utilizadas colméias de Apis mellifera mantidas no apiário da FEI-Fazenda Experimental de Iguatemi - extensão Universidade Estadual de Maringá-PR. As rainhas foram separadas para realizar postura durante 24 horas. Após esse período foi feito o mapeamento dos ovos depositados. Foram realizados dois bioensaios com três repetições cada. Os bioensaios foram realizados utilizando três colméias de Apis mellifera, sendo que as rainhas eram irmãs, filhas de uma rainha que foi acasalada naturalmente. O ciclo de desenvolvimento de operárias de A. mellifera Africanizada é o seguinte: ovo (3 dias), larva (5 dias), pupa (12 dias). As larvas passam por cinco mudas (uma por dia) sendo denominadas de L1, L2, L3, L4, L5.
4 4 Bioensaio 1 (in vivo). As concentrações utilizadas d inseticida em cada experiment foram de 2mg/mL and 6 mg/ml. Papel de filtro com 15 cm de diâmetro embebido em solução aquosa de thiamethoxam foi introduzido na colméia. Após 48 horas 200 ovos (homogeneizados juntos) e 50 larvas de cada idade: L2, L3, L4 e L5 foram sacrificadas e submetidas à eletroforese individualmente. Bioensaio 2 (in vitro). Larvas com idades entre 1 e 5 dias, receberam a aplicação tópica de inseticida thiamethoxam na concentração de 2mg/mL, após 2 horas foram sacrificadas e submetidas a eletroforese individualmente. Eletroforese As amostras foram homogeneizadas em solução aquosa 0,1% de 2-mercaptoetanol e centrifugadas a xg por 10 min a 5 C. Em seguida foram aplicadas em géis de amido de milho (penetrose 30 TM Corn Products do Brasil S.A.) a 14% (Smithies, 1955). Os géis foram preparados com tampão 0,02 M Tris-HCl, ph 7,5 e a corrida eletroforética foi realizada utilizando o tampão 0,3 M Tris-HCl, ph 7,5. Substratos fluorogênicos (4-metil-umbeliferona) e cromogênicos (1-naftil ésteres) foram utilizadas para a revelação das esterases. Soluções de acetato e butirato de 4-metilumbeliferona foram preparadas imediatamente antes do uso de acordo com o método de Hopkinson et al. (1973) e Coates et al. (1975). As colorações com acetato e butirato de 1- naftil-fosfato foram preparadas de acordo com o descrito por Bitondi e Mestriner (1983). RESULTADOS Os resultados obtidos foram comparados com os descritos anteriormente por Ruvolotakasusuki et al. (1997) como pode ser observado na Tabela 1. Em ovos de Apis mellifera são detectadas três regiões de atividade esterásica: EST-1, EST-1a e EST-3 (Tabela 1). Na Tabela 2 pode-se observar que após a aplicação do inseticida Thiamethoxam na concentração de 6mg/mL, houve inibição de 25% da atividade das três regiões esterásicas detectadas nessa fase do desenvolvimento de abelhas.
5 5 Tabela 1. Padrão de atividade das esterases de Apis mellifera durante o ciclo de desenvolvimento proposto por Ruvolo-Takasusuki (1997). + = presença; - = ausência Fase/Esterase Ovo Larva Pupa Adulto EST EST-1a EST EST-2a (início) - EST EST EST EST Tabela 2. Redução da atividade das esterases de ovos e larvas de operárias de Apis mellifera após a contaminação com o inseticida thimethoxam. Substrato empregado acetato e butirato de 4-metil-umbeliferona. (+) = inibição parcial da atividade relative das esterases; (-) = sem inibição da atividade relativa das esterases; NA = sem atividade nessa idade L2, L3, L4, L5 = larvas com 2, 3, 4, e 5 dias de idade Ovo L2 L3 L4 L5 Esterases/ [mg/ml] EST EST-1a - + NA NA NA NA NA NA NA NA EST EST-3 NA NA EST EST-5 NA NA NA NA Inibição de 25% na atividade relativa das esterases foi detectada na EST-1 de L3 e EST-1 e EST-4 em L4. Não foi detectada inibição das regiões de atividade esterásica nas larvas L2 e L5 (Tabela 2). EST-1 e EST- 2 tiveram suas atividades reduzidas em 50% em larvas de 1 e 3 dias. EST-5 apresentou atividade relativa reduzida em 50% e 25% nas larvas L3 e L5 respectivamente e inibição total em L5 (Tabela 3).
6 6 Quando comparados os substratos fluorogênicos e cromogênicos foi observada diferença apenas no padrão de inibição da EST-4. No substrato cromogênico, essa esterase apresentou inibição total em larvas L1, L4 e L5 e de 50% em larvas L2 (Tabela 4). Tabela 3. Atividade relativa das esterases detectadas em extratos de larvas de Apis mellifera após a aplicação tópica do inseticida thiamethoxam,frente aos substratos acetato e butirato de 4-metil umbeliferona. (++) = inibição total; (+) = inibição parcial da atividade relative das esterases; (-) = sem inibição da atividade relativa; NA = sem atividade nessa idade Idade Esterases (dias) EST-1 EST-1a EST-2 EST-2a EST-3 EST-4 EST-5 L1 + NA + NA - - NA L NA L3 + NA + NA L4 - NA L5 - NA Foram detectadas ainda diferenças de atividade da EST-4 dependendo do substrato empregado. Quando o substrato empregado foi o butirato de 4-metil-umbeliferona essa isoenzima apresentou atividade relativa normal em todas as fases do desenvolvimento larval estudadas. Frente ao substrato α-naftil-butirato, foi observada redução de 50% da atividade relativa da EST-4 em L3 e nas larvas L1, L2, L4 e L5 não foi detectada atividade dessa isoenzima (Tabela 4). Tabela 4. Atividade relativa das esterases detectadas em extratos de larvas de Apis mellifera após a aplicação tópica do inseticida thiamethoxam,frente aos substratos α-naftil acetato e
7 7 butirato. (++) = inibição total; (+) = inibição parcial da atividade relative das esterases; (-) = sem inibição da atividade relativa; NA = sem atividade nessa idade Idade (dias) Esterases EST-2 EST-2a EST-3 EST-4 EST-5 L1 + NA - ++ NA L2 - NA L3 + NA L4 - NA L5 - NA A análise dos resultados mostrou que a inibição da atividade relativa das esterases foi maior em larvas jovens (L1) e menor inibição da atividade relativa das esterases em larvas mais velhas (L5). Foi observada também, uma diminuição no tamanho das larvas que entraram em contato com resíduos do inseticida em comparação com aquelas que permaneceram na colméia controle. Além disso, parece que, quando são utilizadas para os testes com inseticidas colméias mais fortes, há menor inibição da atividade relativa das esterases em comparação com colméias mais fracas. DISCUSSÃO O ovo dos insetos pode ser considerado um sistema fechado, e o suprimento de aminoácidos para a síntese de proteínas no início do desenvolvimento embrionário depende da degradação das reservas do vitelo contidas nele (Rockstein, 1978). Dessa maneira, a casca do ovo estaria contribuindo com a proteção do embrião em desenvolvimento, atuando como barreira impedindo a penetração do inseticida. A utilização de marcadores bioquímicos ou biomarcadores pode ser importante para o monitoramento da poluição ambiental (Poly, 1997). Manwell e Baker (1968) sugeriram que os poluentes podem influenciar o polimorfismo bioquímico porque algumas enzimas interagem diretamente com os pesticidas e outros poluentes. A exposição a doses subletais de inseticidas nos fornece informações sobre o impacto ecológico desses pesticidas nos polinizadores. As EST-3 e EST-4 de abelhas A.
8 8 mellifera podem ser utilizadas para detectar a presença de resíduos de metil-parathion e malathion entre 1 e 14 dias após a contaminação com esses inseticidas, pois há alteração na atividade relativa dessas esterases quando comparadas com o controle não contaminado (Attencia et al., 2005). O inseticida thiamethoxam atua interferindo nos receptores nicotínicos de acetilcolina (Antunes-Kenyon e Kennedy, 2001). A molécula mimetiza a acetilcolina e se liga ao sítio receptor nicotínico bloqueando-o. Este bloqueio leva ao acúmulo de acetilcolina causando paralisia e morte do inseto (Rancan et al., 2006). Portanto, em nossos resultados a inibição parcial das esterases detectada após a aplicação in vitro de thiamethoxam nas larvas de abelhas Africanizadas, pode ter sido ocasionada pela ligação das moléculas do inseticida (mimetizam a acetilcolina) ao sitio ativo das esterases promovendo a sua inibição parcial. Hashimoto et al. (2003) avaliaram a utilização de operárias adultas de A. mellifera africanizadas como bioindicadores da presença de resíduos de thiamethoxam. Esses autores detectaram inibição parcial na atividade relativa das EST-1, EST-2, EST-4 e EST-5 devido ao contato e a toxicidade oral desse inseticida para abelhas, permitindo aos autores sugerirem que essas isozimas poderiam ser utilizadas para detectar a presença de thiamethoxam. Os padrões de inibição mesmo que parciais detectados no presente estudo com larvas de A. mellifera, permitem sugerir que além das operárias adultas as larvas de abelhas Africanizadas também poderão ser empregadas para detectar a presença de resíduos do inseticida thiamethoxam. REFERÊNCIAS ACCORTI, M., GUARCINI, R., ODDO, L.P. The bee as a biological indicator and test insect. Redia. v. 74, p ANTUNES-KENYON, S.E.; KENNEDY, G. Thiamethoxam a new active ingredient review. Massachusetts Pesticide Bureau, Department of Food and Agriculture
9 9 ATTENCIA, V.M, RUVOLO-TAKASUSUKI, M.C.C., TOLEDO, V. A.A. Esterase activity in Apis mellifera after exposure to organophosphate insecticides (Hymenoptera: Apidae). Sociobiology, v. 45, p BITONDI, M.M.G.; MESTRINER, M.A. Esterase isozymes of Apis mellifera: substrate and inhibition characteristics, developmental ontogeny, and electrophoretic variability. Biochemical Genetics. v. 21, p COATES, P.M., MESTRINER, M.A., HOPKINSON, D.A. A preliminary genetic interpretation of the esterase isozymes of human tissues. Annals Human Genetics. v. 39, p FREE, J.B. Insect pollination of crops. London, U.K: Academic Press, HASHIMOTO, J.H., RUVOLO-TAKASUSUKI, TOLEDO, V.A.A. Evaluation of the use of the inhibition esterases activity on Apis mellifera as bioindicators of insecticida Thiamethoxam pesticida residues. Sociobiology. v.42, n.3, p HOPKINSON, D.A., MESTRINER, M.A., CORTNER, J., HARRIS, H. Esterase D: a new human polymorphism. Annals Human Genetics. v. 37, p JONES, W. A., DUBBO, N.S.W., HOLTKAMP, R.H. Pesticide and Bees (Pesticides affecting beekeeping and cross pollination). Agnote Northern Territory of Australia. n.485, p KEVAN, P.G. Pollinators as bioindicators of the state of the environment: species, activity and diversity. Agriculture, Ecosystems and Environment. v. 74, p MANWELL, C.; BAKER, C.M.A. Genetic variation of isocitrate, malate and 6- phosphogluconate dehydrogenase in snails of the genus Cepaea introgressive hybridization, polymorphism and pollution? Comparative Biochemistry and Physiology. v. 26, p
10 10 POLY, W.J. Nongenetic variation, genetic-environmental interactions and altered gene expression. II. Disease, parasite and pollution effects. Comparative Biochemistry Physiology. v. 117B, p PORRINI, C. CELLI, G., RADEGHIERI, P. Monitoring of pesticides through the use of honeybees as bioindicators of the Emili-Romagna coastline ( ). Annali di chimica. v. 88, p RANCAN, M., ROSSI, S., SABATINI, AN.G. Determination of thiamethoxam residues in honeybees by high performance liquid chromatography with an electrochemical detector and post-column photochemical reactor. Journal of chromatography A, v. 1123, p , ROCKSTEIN, M. Biochemistry of insects. Academic Press, New York, 649 p RUVOLO-TAKSASUSUKI, M.C.C. Caracterização genetica de uma esterase sexo/específica de Apis mellifera. São Carlos: UFSCar, 1994, 120 p. Tese (doutorado) Programa de Pós-Graduação em Genética e Evolução, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, RUVOLO-TAKASUSUKI, M.C.C., DEL LAMA, M.A., SOARES, A.E.E. Genetic characterization of a new Apis mellifera esterase. Apidologie. v. 28, p WARE, G.W. The pesticide book. 4 th, Fresno (California): Thomson Publications p. SMITHIES, O. Zone electrophoresis in starch gels: group variation in the serum proteins of normal human adults. Biochemical Journal. v. 61, p
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