RETERRITORIALIZAÇÃO UTILIZANDO OS BIOMAS COMO UNIDADES ADMINISTRATIVAS
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- Derek Victorio Gesser Carvalhal
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1 2008/03/18 RETERRITORIALIZAÇÃO UTILIZANDO OS BIOMAS COMO UNIDADES ADMINISTRATIVAS Fernando Baggio di Sopra[1] (Brasil) Ao contrário dos países da América hispânica, onde as fronteiras políticas em parte correspondem às divisas ambientais, o Brasil é um imenso e heterogêneo território constituído por vários biomas e nações distintas, que se encontram artificialmente unidos. Se realmente há alguma racionalidade sustentando a ótica que mantém o nosso país coeso, me pergunto porque então não abolir as atuais fronteiras políticas do continente para depois formar uma única nação sul-americana, utilizando os biomas ou as bacias hidrográficas como unidades básicas administrativas? Fronteiras políticas não apenas são desnecessárias, como também tornam a gestão territorial praticamente impossível. Uma alternativa viável para substituí-las seria promover a fragmentação do território brasileiro, possibilitando um futuro reagrupamento territorial condizente às especificidades dos organismos bio-culturais sul-americanos. Desse modo, invalidaríamos a nossa atual dívida externa, já que não mais existiria o Brasil, e sim vários brasis: o Pampa, a costa atlântica, o Cerrado, a planície do Pantanal, a região amazônica, o Planalto Meridional, o das Guianas, o sertão nordestino... Semelhantemente, caso ocorra esta reestruturação territorial, todas as dívidas externas dos países hispano-americanos também seriam anuladas, e renasceríamos como uma nação economicamente saudável, sem mais necessitar pagar juros referentes a endividamentos contraídos por monarcas e militares indiferentes ao bem-estar da nação. Conforme suas raízes etimológicas, o conceito de bioma provém do grego: bio quer dizer vida, enquanto oma significa agrupamento ou massa. Portanto, bioma representa o conjunto homogêneo de seres vivos que ocupa um território específico, associado a uma determinada zona geoclimática da biosfera, identificável em escala regional. Assim como cabe aos municípios, no tocante ao gerenciamento territorial, criar e extinguir os bairros que o constituem, falta à América algum mecanismo institucional que possibilite reordenar as atuais fronteiras político-administrativas. Desse modo, não mais haveria linhas arbitrárias separando o Pampa, por exemplo, em três regiões ambientalmente e culturalmente indistintas, nas quais o arquétipo do gaúcho encontra-se historicamente enraizado na personalidade do cidadão comum: os campos do Rio Grande do Sul, os do Uruguay e os da Argentina. Apenas uma região geográfica pode ali ser identificada: o bioma Pampa. Qualquer fronteira que divida o território habitado pelo gaúcho tende a prejudicar sua sistemática organizacional e servirá apenas para que empresas transnacionais lucrem mais, ora em um, ora em outro país pampeano, conforme as taxas de juros e as demais condições de mercado específicas de cada local. Outro exemplo interessantíssimo de como as atuais fronteiras políticas da América do Sul prejudicam a integração entre os povos irmãos, é a região do Pantanal: as planícies alagadiças que compõem este paradisíaco cenário estendem-se, também, pelo bioma Chaco, que abrange o norte paraguaio e o leste boliviano, e possui as mesmas características ambientais que configuram o Pantanal. Entretanto, nos livros didáticos não consta nenhuma referência à similaridade entre os biomas Chaco e Pantanal, que são estudados independentemente embora sejam habitados pelas mesmas espécies de flora e fauna, e possuam condições climáticas semelhantes, caracterizando-se como um único ecossistema. Pode-se certamente afirmar que chaqueño e pantaneiro são diferentes denominações dadas à personificação de uma mesma cultura humana autóctone do bioma constituído pelas planícies alagadiças da região central do nosso continente. Em relação à Amazônia, onde o processo colonizatório brasileiro ocorreu recentemente, induzido pelo Ciclo da Borracha, pergunto-me se é justo considerarmos o Acre como parte integrante do
2 território brasileiro pelo simples fato de alguns seringueiros terem, há menos de um século, colonizado pequenas porções de uma terra milenar habitada por indígenas amazônicos que provavelmente mantinham relações com o Império Inka, se é que dele não participavam. Frente a este contexto em que linhas arbitrárias separam nações ao meio, os governos preocupamse em firmar acordos baseados na redução das alíquotas de compra e venda de produtos, aos moldes do Mercosul. Contudo, de nada adiantam acordos de cooperação internacional fundamentados, principalmente, nas relações econômicas, pois a integração comercial integra somente os grandes empresários, que, assim, podem vender suas inutilidades para o continente inteiro. A Economia é conseqüência da evolução humana, e não a sua causa. As reformas constitucionais propostas neste último ano pelos dois países sul-americanos autodeclarados bolivarianistas, Bolívia e Venezuela, incluem a permissão para criar e suprimir Estados em seus domínios. Mesmo com aprovação apenas parcial, essas reformas representam uma nova abordagem sobre a gestão territorial, cujos últimos teóricos foram os militares responsáveis pelos golpes de governo ocorridos na América Latina na década de 1960, como o general Golbery do Couto e Silva (autor de Geopolítica do Brasil, de 1967). Devemos buscar mecanismos legislativos que nos permitam reterritorializar as nações daqui não de maneira isolada, mas em escala continental, para, então, unificarmos nossas políticas públicas, otimizando o desenvolvimento sulamericano. Os benefícios proporcionados pelo reordenamento territorial através da substituição das atuais fronteiras serão inúmeros, sendo a possibilidade de reativação das linhas férreas um dos mais úteis dentre eles, visto que o Fordismo contribui, e muito, para estagnar o nosso real desenvolvimento sócio-econômico. Idealizado pelo empresário estadunidense Henry Ford, fundador da Ford Motors Company, o Fordismo é um modelo de produção em massa que revolucionou a indústria automobilística na primeira metade do século XX e teve seu ápice no período posterior à Segunda Guerra Mundial, nas décadas de 1950 e Uma das principais características do Fordismo foi que os veículos passaram a ser montados em esteiras rolantes que se movimentam enquanto o operário fica praticamente parado, realizando uma pequena etapa da produção. Desta forma, não é necessária quase nenhuma qualificação dos trabalhadores. As peças são, em sua grande maioria, fabricadas longe dos países onde posteriormente são unidas. É como se comprássemos um quebra-cabeças e o montássemos para depois revendê-lo. Enquanto isso, os países desenvolvidos fabricam as peças dos seus quebra-cabeças e depois os vendem para países aculturados, feito nós, que ficamos com um percentual ínfimo do lucro total da produção da indústria automobilística. Concomitantemente à invasão das montadoras de automóveis no Brasil, iniciou-se a nossa dependência dos combustíveis derivados do petróleo e a secundarização do transporte público ferroviário de passageiros em prol da construção das estradas de rodagem, fabricadas, também, a partir do petróleo. Outro aspecto interessante dessas transformações, induzidas, principalmente, pelos interesses econômicos de empresários estadunidenses, japoneses e alemães, é o fato de que a grande mídia convencionou que os automóveis são o meio de transporte ideal para o cidadão comum, visto que, assim, as transnacionais automobilísticas e do ramo de combustíveis podem lucrar sobre cada indivíduo, fato esse que não ocorria quando o modo de locomoção usual era o trem. Agora, dependentes do petróleo, ficamos à mercê de sua cotação internacional e, a cada crise da economia mundial ou conflito em qualquer parte da Terra, somos obrigados a gastar mais para nos locomover, subsidiando, assim, o elevado padrão de consumo das sociedades dos países desenvolvidos, onde são gastos os lucros das corporações transnacionais. Na Proclamação da República, em 1889, já existiam no Brasil cerca de dez mil quilômetros de ferrovias, mas foi no início do século XX que se deu um grande passo no desenvolvimento ferroviário, tendo sido construídos entre 1911 e 1916 mais de cinco mil quilômetros de linha férrea. Em 1957 foi criada a Rede Ferroviária Federal (RFFSA) que unificou as 42 ferrovias existentes, criando um sistema regional composto por 18 estradas de ferro. Nesta altura, a rede ferroviária já se estendia por 25 mil quilômetros, com ligações à Bolívia, à Argentina e ao Uruguai. Com a construção e posterior duplicação da Rodovia Presidente Dutra, em 1967, ligando São Paulo ao Rio de Janeiro (o ramal de trem mais lucrativo), a ferrovia acabaria perdendo bastante força, devido ao desinteresse cada vez maior do governo brasileiro em fortalecer o transporte público de passageiros, existente até então em diversos Estados: Alagoas, Espírito Santo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo e Santa Catarina... Em 1996, a RFFSA foi privatizada e as suas linhas foram divididas entre várias empresas. Com isso, o transporte ferroviário de passageiros foi praticamente extinto no Brasil pelo simples motivo de que as corporações transnacionais lucram mais vendendo carros e combustíveis derivados do petróleo,
3 e o governo é submisso aos interesses financeiros delas, preocupando-se mais com o bem-estar de tais empresas do que com o povo. Atualmente, além do transporte de carga, permanecem em atividade alguns poucos trens turísticos, como o Trem da Uva, na Serra Gaúcha. Mesmo reconhecendo a beleza e a importância cultural das locomotivas turísticas, é fato que apenas a elite brasileira possui condições financeiras de deslocar-se até estes trens e pagar para andar neles. Já a maior parte da população brasileira, esses não tem dinheiro para passear. Seria extremamente benéfico que os governos democratizassem os trens como meio de locomoção popular, revitalizando as ferrovias. Se realmente planejássemos a gerência do nosso território de forma consciente e independente das corporações transnacionais que patrocinam os nossos políticos, então construiríamos linhas férreas interligando a América do Sul inteira, em vez de rodovias. As veias da América Latina não estão apenas abertas, como diz o jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano, elas estão também esburacadas e há pedágios a cada 50 quilômetros, entupindo nossas artérias e extraindo os nossos recursos. A reimplantação do transporte público ferroviário reduziria substancialmente os custos de locomoção da população de baixa renda, além de contribuir para a preservação do ambiente, já que os trens são bastante econômicos e ecológicos em relação aos automóveis. Além disso, os custos de manutenção das ferrovias são muito inferiores se comparados à conservação das estradas. Mesmo que o governo tape hoje todos os buracos que existem nas rodovias, novos buracos estarão sendo naturalmente abertos no exato momento em que os que já existem estão sendo tapados, pois o asfalto tem vida útil curtíssima. [1] Estuda Geografia na UFRGS. Recebeu o Prêmio Coleção 2000, do Instituto Estadual do Livro - RS, pela primeira novela. Foi um dos vencedores do Prêmio Teixeira e Souza de Literatura de 2007, participou de algumas antologias poéticas, é colunista do Jornal Tribuna das Cidades, com sede em Cruz Alta, colaborador da Via Política, tem artigos publicados na revista Caros Amigos, na Varanda Cultural e em diversos jornais, como o Sul de Minas, Página 20 (AC), A Crítica de Rondônia, Zero Hora (RS), A Notícia (Joinville), A Voz de Ermesindee Jornal das Freguesias, ambos de Portugal, e outros mais TEXTOS RELACIONADOS: 2012/03/02 AS ILHAS FALKLAND. TRINTA ANOS DEPOIS DO CONFLITO DE /09/17 PORTUGAL, A NATO, O ATLÂNTICO SUL E O BRASIL João Brandão Ferreira 2010/06/13 PODER AÉREO: RECURSO DA MODERNA COERÇÃO MILITAR Mauro Barbosa Siqueira (Brasil) 2010/06/09 A INSENSATEZ DOS SEM-LIMITES (OU A AUSÊNCIA DELIMITES NA ACÇÃO DOS INSENSATOS) Vânia L. Cintra (Brasil) 2010/06/02 O ACORDO DE TEERÃO Oliveiros S. Ferreira (Brasil) 2010/05/24 A MEDIAÇÃO BRASILEIRA NO CONFLITO COM O IRÃO 2010/04/27 PODER AEROESPACIAL BRASILEIRO: DISSUASÃO E SEGURANÇA, COERÇÃO COMO MEDIDA EFICAZ À DEFESA NACIONAL Mauro Barbosa Vieira (1) (Brasil) 2010/04/26 BRASIL POTÊNCIA REALIDADE OU MITO?(III PARTE) 2010/04/14 ACORDO MILITAR BRASIL EUA: A REGIÃO QUER RESPOSTAS
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