PRÁTICA DE ENSINO INTERDISCIPLINAR NO CURSO DE ADMINISTRAÇÃO NA PERSPECTIVA DOS DISCENTES. Introdução As mudanças e desafios no contexto social influenciam a educação superior, e como consequência, os programas e cursos vêm passando por questionamentos sobre procedimentos didáticos, currículos, resultados de aprendizagem e práticas institucionais. Sabe-se que o ensino de administração, como um conjunto de conhecimentos e habilidades a ser ensinado e aprendido em instituições formais de ensino é relativamente recente e tem passado por diversas reformulações curriculares (TEIXEIRA; WISSMANN, 2013). Hoje, espera-se com este ensino, que o estudante passe a compreender questões científicas, técnicas, sociais e econômicas, no seu conjunto, observados os níveis graduais do processo de tomada de decisão, bem como desenvolver o gerenciamento de novas informações, apresentando flexibilidade nas situações diversas presentes ou emergentes nos vários segmentos do campo de atuação do administrador (BRASIL, 2002). Nesse sentindo, a interdisciplinaridade tem se colocado como uma possibilidade para dar conta do desenvolvimento de tais habilidades e competências, no contexto do ensino de administração (ARAÚJO; SALGUES, 2013; RODA; ZAMBONI, 2004). Entretanto, sabe-se que a realização programas de ensino sob essa perspectiva, implica na readequação nos modos de ser docente e estudante, por requerer desses atores a disponibilidade para aprenderem juntos a atuarem de maneira colaborativa no processo de ensino-aprendizagem, como corresponsáveis pelos objetivos didáticos. A apropriação conceitual da interdisciplinaridade, seus princípios, e estratégias de trabalho ainda não fazem parte do arcabouço de uma parcela significativa de professores. Trabalhos como de Scharmach e Domingues (2008) demonstram que o corpo docente apresenta baixa expectativa quanto à efetividade da interdisciplinaridade em curso de administração. Entretanto, ressaltam que as possibilidades o ensino interdisciplinar são amplas e ocorre, a partir de um grupo que demonstre comprometimento e identificação com a proposta. Nesse sentido, e considerando a ciência da administração como de natureza sistêmica, uma vez que se apropria de diversos campos de conhecimento, há de se pensar que seja inerente ao seu estudo a abordagem interdisciplinar. Entretanto, num panorama mais amplo não é isso
que se observa. Desse modo, entendemos que é relevante contribuir para o debate da questão, uma vez que o ensino superior no país tem sido alvo de críticas (PAIVA; ESTHER; MELO, 2004). Nesse contexto, o presente trabalho trata de uma experiência interdisciplinar, desenvolvida em uma Instituição de Ensino Superior - IES, no curso de bacharelado em Administração, por meio de Projeto Integrador PI, que busca principalmente relacionar os conhecimentos, promovendo a vinculação entre os conteúdos estudados e o mundo do trabalho. Trata-se de um projeto envolvendo as unidades temáticas que são cursadas a cada semestre, desenvolvido a parir de pesquisa de campo no âmbito de uma temática escolhida. Assim, o objetivo deste trabalho é discutir a avaliação dos estudantes de administração sobre seus processos de aprendizagem no âmbito de um Projeto Integrador. Referencial Teórico Sabendo-se que o processo de ensino-aprendizagem é intensamente dinâmico, e que vários elementos conjuntamente o determinam, podemos destacar a habilidade de metacognição, que consiste na capacidade do individuo de conhecer seu próprio conhecimento (GONZÁLEZ, 1996). Metacognição é um termo relativamente recente, fruto da psicologia contemporânea e de orientação cognitivista. Em linhas gerias a metacognição se refere ao conhecimento sobre nossos próprios processos de conhecer. Em função disso, importa que o indivíduo seja, não só capaz de aprender, mas também de pensar sobre o seu próprio processo de aprender. O controle metacognitivo, refere-se ao conjunto de informações que uma pessoa tem sobre o desenvolvimento de seu conhecimento. Ao final da leitura de um texto, podemos ter a sensação de que entendemos ou não entendemos o texto Martins e Borges (2007, p.2). Esse monitoramento revela o estado da pessoa em relação ao que foi aprendido e à sensação de saber. O monitoramento do tipo sensação de saber ocorre durante ou após situação de aprendizagem e está relacionado ao julgamento que fazemos sobre o conhecimento de um assunto ou de como aquele assunto pode ser lembrado, posteriormente, em outra experiência. Podemos perceber esse tipo de monitoramento metacognitivo com a seguinte situação: quando somos questionados sobre algum assunto e fazemos inicialmente uma avaliação sobre o conhecimento que temos sobre ele. Essa avaliação sobre o que sabemos ocorre em duas escalas de tempo distintas. A princípio fazemos um julgamento da sensação de saber, ou de não saber aquele assunto. Quando nosso julgamento da sensação de saber é positivo nós nos engajamos em uma tentativa de evocar os conhecimentos que julgamos possuir.
(MARTINS E BORGES, 2007). Assim, após esforço de busca, e em outra escala de tempo, nosso exercício é o de avaliar a lembrança que temos do conhecimento. Acredita-se também que as habilidades metacognitivas, podem se desenvolver antes, durante ou após a realização de uma atividade (RIBEIRO, 2003). E que essas habilidades podem estar relacionadas com as dimensões do processo de ensino-aprendizagem: conceituais e procedimentais e atitudinais Zabala (1998). Metodologia A presente pesquisa se configura como uma pesquisa de intervenção, na qual se analisa situações para a promoção da aprendizagem (LEMOS, 2005). Desenvolvida no contexto de uma IES, em Recife PE. A situação didática ocorreu no âmbito de um trabalho interdisciplinar, com uma turma do curso de bacharelado em administração. Os dados aqui apresentados foram coletados após a apresentação dos projetos, por meio de questionário, em que se contemplavam aspectos de autoavaliação de aprendizagem sobre a construção de conhecimento e habilidades no âmbito das disciplinas envolvidas. Resultados Em virtude da limitação deste texto, apresentaremos aqui os resultados de apenas duas questões do instrumento aplicado, a saber: as principais coisas que aprendi na construção do projeto e comentários gerais sobre o projeto. Agrupamos as respostas nas seguintes categorias: habilidades metacognitivas no âmbito das atitudes (quadro 1); quanto aos conhecimentos disciplinares (conceituais), quando são mencionados conceitos específicos de disciplinas; e habilidades metacognitivas que enfatizam procedimentos (saber fazer), numa avaliação sobre o que se aprendeu e o que precisa aprender ainda (MARTINS E BORGES, 2007). Quadro 1 - Afirmativas dos estudantes que indicam habilidades metacognitivas no âmbito das atitudes. Trecho das respostas dos alunos Não saiu como eu planejei. Tenho consciência que poderia dar mais para o projeto, mas acredito que serviu de experiência para os próximos desafios. Da próxima vez irei me empenhar mais. Percebi que aprendi muito e que posso aprender muito mais. Evolui na habilidade de ler interpretar textos, que vai me ajudar no resto da vida. Sinto-me mais confiante, diante do curso e também pessoalmente. Paciência, dedicação, coragem. Fonte: dados da pesquisa
As afirmativas que demonstram uma tomada de decisão para uma intervenção numa ação futura (quadro 1). São interpretadas, aqui, como habilidades metacognitivas relacionadas a construção de atitudes, como pode ser visto na afirmativa: Tenho consciência que poderia dar mais para o projeto, mas acredito que serviu de experiência para os próximos desafios.. Entre as habilidades metacognitivas vinculadas aos saberes disciplinares conceituais, foram agrupadas aquelas afirmativas que enfatizaram uma temática que é tratada especificamente no âmbito de uma das disciplinas do curso, como: formatação de trabalho acadêmico; comportamento organizacional; o papel da comunicação nas organizações; e conceito de liderança. Já as habilidades metacognitivas, quanto ao que se percebe o que; ou o quanto se aprendeu a fazer; ou ainda precisa aprender a fazer foram alocadas, como aprendizagens procedimentais, mas também apontam para a construção de atitudes (zabala, 1998) como pode ser visto no quadro 2. Quadro 2 - Habilidades metacognitivas relacionadas com o saber fazer Trechos das respostas dos estudantes Formatação do projeto, apresentação e forma de vestimenta. Fazer pesquisa e se aprofundar na teoria. Formatação, elaboração e comportamento. Fazer citações e pesquisa. Apresentar com postura, colocar os autores para conversar confrontado Ter paciência e persistência, vontade mesmo diante das dificuldades. Trabalho em equipe, pesquisa de campo, importante para o trabalho de conclusão de curso. Persistência, paciência, sensação de capacidade: é possível. Confrontar autores, citar corretamente, ter foco nos objetivos, saber que é possível. Pesquisa, analisar dados, fazer um artigo. Redigir um texto coerente, pesquisar e falar em público. Ter disciplina, trabalhar em equipe, relacionar teoria e prática. Pesquisa de liderança e comportamento organizacional. Fonte: dados da pesquisa Considerações Finais Na construção deste trabalho, foi evidenciada a validade do projeto de integrador como possibilidade de prática de ensino na formação superior, na medida em que, na avaliação dos estudantes pesquisados contribui para a construção de competências e habilidades necessárias a formação do bacharel em administração. Ratificamos que os saberes disciplinares foram identificados nas narrativas dos estudantes, demonstrando os projetos interdisciplinares temáticos, evocam conteúdos específicos. Reiteramos também que o instrumento utilizado, permitiu a identificação de aspectos de aprendizagem procedimental e atitudinal, ampliando a perspectiva de aprendizagem, estritamente conceitual.
Cabe aqui registrar, que práticas de ensino pautadas na interdisciplinaridade, não se constitui tarefa fácil, pois envolve uma série de mudanças conceituais, tanto ao papel de professores quanto de alunos. Nesse sentido, o presente trabalho consiste num primeiro olhar sobre os resultados da situação aqui investigada. Referências ARAÚJO, F.R.S.; SALGUES, l.j.v. A problemática da interdisciplinaridade nos cursos de graduação em administração: proposta para reflexão teórica. Disponível em: <http://www.ead.fea.usp.br/semead/8semead/resultado/trabalhospdf/64.pdf>. Acesso em 30. Set. 2013. BRASIL, PARECER CNE/CES 146/2002 HOMOLOGADO Despacho do Ministro em 09/5/2002, publicado no Diário Oficial da União nº 90, de 13/5/2002, Seção 1. GONZÁLEZ, F. E. Acerca de la metacognición. Revista Paradigma. 1996. Disponível em <[http://www.revistaparadigma.org.ve/doc/paradigma96/doc5.htm>. Acesso em: 20. mar. 2010. LEMOS, E. (Re)situando a Teoria de Aprendizagem Significativa na Prática Docente, na Formação de Professores e nas Investigações Educativas em Ciências. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências. v. 5, p. 38-51, 2005. MARTINS, C. M. C; BORGES. Os processos metacognitivos envolvidos na elaboração de explicações. VI ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISADORES EM EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS, Anais... Florianópolis, 2007. PAIVA, K.C.M.P; ESTHER, A.B; MELO, M.C.O.L. Formação de competências e interdisciplinaridade no ensino de administração: uma visão dos alunos. Revista Gestão e Planejamento. Salvador, n. 10, p. 63-77, 2004. RIBEIRO, C. Metacognição: um Apoio ao Processo de Aprendizagem. Psicologia: Reflexão e Crítica, v. 16, n. 1, p. 109-116, 2003 RODA, F.; ZAMBONI, M. Um estudo da percepção discente sobre a prática interdisciplinar no curso de graduação em administração. In: VII Seminários em Administração - SEMED. Anais... FEA-USP. São Paulo, 2004. SCHARMACH, A.L.; DOMINGUES, M.J.C.S. Interdisciplinaridade no curso de administração em instituição de ensino superior no sul do Brasil: entendimento dos professores. In: XIX ENANGRAD, Anais... Curitiba, 2008. TEIXEIRA, E,B.; WISSMANN, A.D.M. O ensino de administração da UNIJUÍ: quatro décadas de história. Revista GUAL. Florianópolis, v. 6, n. 1, p. 156-175, 2013. ZABALA, A. A Prática Educativa: Como Ensinar. Porto Alegre: Artmed, 1998.