Codex Manesse: quatro iluminuras do Grande Livro de Canções manuscritas de Heidelberg (século XIII) an álise iconográfica.



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Transcrição:

Codex Manesse: quatro iluminuras do Grande Livro de Canções manuscritas de Heidelberg (século XIII) an álise iconográfica. Terceira parte Prof. Dr. Ricardo da Costa Departamento de História/ UFES riccosta@npd.ufes.br Resumo Análise iconográfica de três iluminuras contidas no Grande Livro de Manuscritos Canções de Heidelberg (século XIII). As iluminuras escolhidas são: 1) Herzog Heinrich I von Anhalt (1170-1252), 2) Herzog Johann von Brabant (1252-1294) e 3) Graf Rudolf von Neuenburg (Rudolf II - [1158-1192] ou Rudolf I [1201-1258]). Palavras-chave: Codex Manesse, O Grande Livro de Heildelberg, Análise iconográfica Abstract Iconographic analyses of three iluminures contained in the Great Book of Manuscripts Songs of Heidelberg (XIII century). The chosen iluminures are: 1) Herzog Heinrich I von Anhalt (1170-1252), 2) Herzog Johann von Brabant (1252-1294) and 3) Graf Rudolf von Neuenburg (Rudolf II - [1158-1192] or Rudolf I [1201-1258]). Keywords: Codex Manesse, The Great Book of Heidelberg, Iconographic analysis 31

Análise das iluminuras Quadro 8: Conde Heinrich von Anhalt Provavelmente o cantor desta iluminura é Henrique I, conde de Alsácia e príncipe de Anhalt (c.1170-1252). Assim, o manuscrito titula-o erradamente como duque (veja o texto escrito na página acima da iluminura). Com Henrique I começou a história de Anhalt como principado independente. Henrique era sobrinho de Henrique III de Meißen. Suas 2 trovas mostram vestígios do baixo dialeto alemão, embora o conde tivesse se esforçado para redigir em alto alemão, a língua oficial de então. Freqüentemente o iluminista serve-se de 2 tipos diferentes de quadros para representar uma cena de batalha com o trovador como protagonista. Por esse motivo, o elmo e o escudo de armas do trovador não estão representados acima da cena, como vemos normalmente. Eles são colocados na armadura. A parte superior do quadro fica então livre. O iluminista desenha linhas vermelhas e azuis na moldura, que é decorada com losangos dourados. No meio do quadro, duas linhas douradas, colocadas abaixo das muralhas do castelo. Elas dividem a iluminura em duas cenas, propiciando um jogo visual com uma relação de subordinação: a parte superior da cena serve como espaço coadjuvante para a parte inferior, onde se encontra o protagonista, no centro, que é o trovador-guerreiro. As duas linhas douradas também caracterizam o espaço pertencente ao castelo, que, na cena, é posto como uma espécie de tribuna, onde as damas apreciam a batalha. Por detrás das muralhas do castelo, o iluminista colocou quatro mulheres: elas atuam como espectadoras da cena principal e guardam uma relação bastante amistosa com o que ocorre abaixo, no plano inferior do quadro. O traço prateado que divide a cena em 2 quadros desempenha igualmente duas funções. A partir dele, o iluminista pode utilizar figuras com tamanhos diferentes, e que não devem ser interpretadas separadamente. O espectador da cena os têm como sinal indicativo da posição social dos personagens. 32

A reação das mulheres reflete, ao mesmo tempo, o acontecimento na cena abaixo e, através de suas bonitas e coloridas manifestações gestuais, expressa a idéia da guerra como ofício trovadoresco. Repare a gesticulação das damas com as mãos: como já vimos em outro artigo sobre o Codex, uma mão aberta e outra com o dedo indicativo são gestos que mostram um diálogo em forma de ensinamento. Assim, todas as damas conversam animadamente a respeito da batalha. Na segunda cena, abaixo, a iluminura mostra 3 pares de cavaleiros com escudos de armas em suas roupas durante um Buhurt jogo de guerra praticado durante o intervalo das campanhas militares. Nele, grupos de cavaleiros lutam entre si, para manter a forma e também exercitar os reflexos. O quadro mostra a luta decisiva, travada às portas do castelo, e que levará à vitória neste simulacro de batalha. O duque, localizado no meio do quadro, e seus dois companheiros de luta, seguram debaixo de seus braços esquerdos as cabeças de seus respectivos inimigos e pegam suas espadas para o golpe, o que mostra a extrema violência destes exercícios cavaleirescos da í a crítica da Igreja para com os torneios (LE GOFF, 1994: 267-282). Dois capacetes dos vencidos já encontram-se no chão. Os trajes do duque repetem-se, com pequenas variações, em seus dois companheiros de luta, à esquerda e à direita. Quadro 9: Duque Johann von Brabant O cantor desta iluminura de batalha, no centro, com o cavalo vermelho, é Johann von Brabant (1252-1294). Ele é um dos mais importantes príncipes de seu tempo. Através da vitória na batalha de Worringen (1288), o duque Johann pôde anexar Luxemburgo ao Brabante. O duque ficou famoso por seu fino comportamento em sua corte. No século XIII, a glória do príncipe já não derivava somente de sua bravura em combate. Era igualmente importante que sua corte tivesse brilho, que fosse rodeada de poetas. Ele também deveria ser o responsável pela educação dos que o rodeavam (DUBY, 2001: 117). Poeta e guerreiro como os príncipes de seu tempo, Johann von Brabant morreu em 1294, devido a um ferimento de guerra. Ele é o único trovador que redigiu suas canções em outra língua, o holandês. Elas foram traduzidas para o alto alemão, mas mesmo assim reconhece-se certas expressões do dialeto alemão holandês. Na seqüência original do Codex, seguem-se aos imperadores e aos reis os duques de Anhalt e de Brabant. Para 33

ambos, foram escolhidas cenas de guerra: no caso do Brabant, a cena de guerra é de vida ou morte, talvez a decisão na própria batalha de Worringen. O duque, no centro da cena com um elmo dourado em forma de dragão, ataca de assalto dois inimigos. Ele lidera um grupo de três homens armados com escudo, espada e capacete. Eles são representados do lado direito da moldura do quadro, atravessando uma linha imaginária que divide o quadro ao meio, na perseguição a 2 inimigos que subitamente viram-se contra seus adversários durante a fuga; o de trás está com a espada erguida para o alto. A seu encontro vem o duque. Ele atingiu o capacete do adversário de tal maneira que o sangue espirrou. O companheiro de luta que está ao seu lado não pôde impedir isso. Os animais fantásticos que adornam os elmos do duque e de um de seus cavaleiros (um dragão dourado voador cuspindo fogo e a cabeça de um lobo verde no carregador da bandeira) além das espadas sendo brandidas ao alto aumentam ainda mais o efeito teatral da iluminura como um ataque cavaleiresco ousado e arrojado. Para suas cenas de guerra e campanhas militares o iluminista baseou-se no estilo artístico das iluminuras de seu tempo. A forma inclinada à esquerda dos cavaleiros dessa cena é um exemplo do estilo vigente para uma iluminura que retratava uma cena de batalha. Além disso, a disposição das espadas, que saltam para fora do quadro, deixa claro que a moldura só foi pintada depois do quadro. No primeiro e quarto quadrado da bandeira, numa superfície dourada, são mostrados o leão vermelho de Limburgo, e no segundo e terceiro quadrado (superfície preta), o leão dourado de Brabant. Os motivos da bandeira repetem-se sobre a manta do cavalo do duque e sobre seu escudo. Quadro 10: Conde Rudolf von Neuenburg O conde Rodolfo de Neuenburg é o primeiro cantor originário da cidade na qual o Codex Manesse foi ordenado, a Suíça. A polêmica a respeito dessa iluminura é se o trovador em questão é Rodolfo II de Neuenburg (1158-1192) ou seu sobrinho, Rodolfo I (1201-1258), o fundador da dinastia Nidau. Qualquer que seja o Rodolfo retratado, suas canções, em boa parte cópias de canções de trovadores provincianos, têm como tema central a dama graciosa inatingível. A miniatura certamente quis estimular a atmosfera triste e o retorno dos pensamentos do poeta ao mundo natural. Nela encontra-se pela 34

primeira vez a representação do poeta-trovador, sentado sozinho, meditativo, uma cena típica utilizada desde a Antigüidade para retratar o poeta-escritor. A composição do quadro possui semelhanças com as iluminuras de Heinrich von Veldecke e Walther von der Vogelweide. Todos estes três trovadores são representados com um rolo de manuscrito, atributo de seus ofícios de poetas, e seus brasões relembram suas condições cavaleirescas. Através de cautelosas variações da postura do corpo, o gesto das mãos, os braços, e, especialmente, a ordenação dos atributos conforme sua posição na hierarquia cavaleiresca o iluminista alcan ça outra acentuação artística no conteúdo do quadro. Rodolfo está vestido de verde e vermelho, num trono, colocado em cima de uma espécie de pedestal. A postura do trovador expressa tranqüilidade e um espírito pensativo. Ele apóia o braço esquerdo no joelho, elevado pelo degrau do pedestal. De sua mão, salta um imenso rolo de manuscrito, que ordena-o em sua posição de poeta. A cabeça inclinada indica um momento de introspecção, realçado pela mão direita do poeta, com os dois dedos unidos, e o olhar sonhador, demonstrado pelas grandes pupilas, que reforçam a expressão de um espírito contemplativo. Como demonstração desse mundo interior no qual o poeta está mergulhado, o iluminista espalhou rosas vermelhas no fundo do pergaminho, como se fosse um tapete imaginário envolvendo-o e a seu escudo de armas. Elas são as folhas de sua postura encantadora e, ao mesmo tempo, o símbolo de sua canção de amor. Por esse motivo, a roseira sai de seu corpo: ela indica esse momento de meditação e contemplação. O poeta pensa em sua amada para escrever sua trova e, nessa imaginação, as rosas brotam de sua mente. Para realçar o espírito poético do trovador, o iluminista renunciou à ordem cavaleiresca do conde, abandonando os atributos da espada e do capacete em troca dessa decoração com as rosas. Apenas o escudo de armas acima do conde explica a qual ordem ele pertence. Em ouro, duas estacas vermelhas, cada uma com três caibros brancos. Fonte CODEX MANESSE. Die Miniaturen der Großen Heidelberger. Liederhandschrift Insel. Herausgegeben und erläutert von INGO F. WALTHER unter Mitarbeit von GISELA SIEBERT. Frankfurt am Main, Insel Verlag, 1988. Bibliografia BANN, Stephen. As Invenções das História Ensaios sobre a representação do passado. São Paulo: Editora Unesp, 1994. BLOCH, Marc. A Sociedade Feudal. Lisboa: Edições 70, 1987. BURGUIÈRE, André (org.). Dicionário das Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1993. CHEVALIER, Jean & GUEERBRANT, Alain. Dicionário de Símbolos Mitos, sonhos, costumes, gestos, formas, figuras, cores, números. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1995. CURTIUS, Ernest Robert. Literatura Européia e Idade Média Latina. São Paulo: HUCITEC, 1996. 35

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