Movimentos Sociais na Internet: Possibilidades e Desafios



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Transcrição:

Movimentos Sociais na Internet: Possibilidades e Desafios Aline de Oliveira Rios Índice 1 Introdução 2 2 Barreiras de acesso 3 3 O ativismo é fundado por necessidades do cotidiano 4 4 Considerações finais 5 5 Referências Bibliográficas 6 Resumo As transformações vivenciadas pela sociedade atual com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação, especialmente a popularização da internet, estão reconfigurando as relações humanas. Em um mundo em que se torna possível romper as barreiras da distância com um clique, urge-se refletir sobre o impacto destes aparatos na forma como as pessoas se organizam para pleitear contratos que contemplem suas necessidades e anseios, que agora podem tomar proporções planetárias. Tidos como uma das principais formas de articulação da sociedade civil, ao lado de outras organizações, os movimentos sociais constituem um forte instrumento para promover Jornalista graduada em 2005 pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Ponta Grossa, PR E-mail: alynerios@gmail.com a deliberação pública 1, em termos habermasianos. Entretanto, a possibilidade de projetar intenções, informações e outras manifestações de um extremo ao outro do planeta por meio de aparatos tecnológicos não é suficiente para potencializar a ação dos movimentos sociais. Além dos obstáculos próprios de acesso e manipulação pura da máquina, as pessoas precisam estar preparadas para interpretar este novo mundo digital e mais do que isto, se apropriar dele a favor de suas lutas, em batalhas travadas agora também no ciberespaço 2. Passemos, portanto, às reflexões sobre os desafios e possibilidades de atuação dos atores sociais na dimensão virtual. 1 Referência ao conceito de Democracia deliberativa, apresentado por Rousiley Maia no texto Mídia e Deliberação: atores críticos e o uso público da razão. (MAIA; CASTRO, 2006, p. 153). Vale destacar que Maia ampara-se na teoria delineada pelo filósofo Jürgen Habermas, descrita ao longo de várias de suas obras, ao tratar da deliberação e do uso público da razão. 2 Ciberespaço, conforme considera Gustavo Lins Ribeiro (2000, p. 470) citando Arturo Escobar (1994, p. 214), refere-se às redes e sistemas crescentes de meio ambientes mediados por computador. (...) O ciberespaço é visto como capacitador de co-presença completa e da interação de múltiplos usuários (...).

2 Aline de Oliveira Rios Palavras-chave: Movimentos Sociais. Internet. Ativismo. Inclusão. 1 Introdução O surgimento da rede mundial de computadores abre precedentes para uma espécie de co-presença no ambiente virtual. Na internet, é possível assumir novas identidades, circular por espaços não tangíveis ao limite do estar e sobretudo, partilhar de uma grande comunidade planetária. Em outro extremo, no entanto, estão todas as limitações inerentes ao acesso à toda forma de tecnologia que, inserida em um contexto capitalista, pressupõe uma lógica de obsolescência que amplia ainda mais o panorama de não-inclusão 3. Desta forma, partindo de considerações sobre a organização atual da sociedade, pretende-se à luz de alguns estudiosos, realizar uma análise sobre possibilidades relacionadas ao ativismo protagonizado por movimentos sociais. Ao discutir a inclusão digital em seu livro Cidade Digital: portais e redes no Brasil, André Lemos (2007, p. 36) considera que a conformação de uma sociedade em rede, marcada pela emergência de tecnologias de base digital e o surgimento de redes telemáticas, faz emergir junto à sociedade necessidades políticas e sócioculturais. Neste mundo alterado, os atores sociais enfrentam novos obstáculos para in- 3 O conceito de não-inclusão adotado aqui foi relatado pela professora Doutora Maria Lúcia Becker em aula expositiva do curso de especialização em Mídia, política e atores sociais na Universidade Estadual de Ponta Grossa e faz referência à uma situação em que quando as pessoas não tiveram oportunidade anterior de acesso a determinado meio, elas não podem ser excluídas deste e sim, estariam em situação de não-inclusão. screver suas demandas em uma agenda pública. Patrícia Bernal, em artigo publicado no livro Comunicação e Movimentos Populares: quais redes? 4, apresenta três premissas para discutir o impacto das novas tecnologias de comunicação e informação sobre a ação de movimentos sociais. De acordo com Bernal (2002, p. 300): os atores sociais lutam pela conquista de espaço também no ambiente virtual, paralelo aos enfrentamentos na dimensão real da vida, para ampliar sua área de ação; a internet promove a redefinição do espaço público 5, garantindo a implementação de novas formas de ativismo, produzindo novas identidades e criando cenários para a deliberação pública; e a rede mundial de computadores permite romper com os limites do espaço-tempo, ao projetar um espaço simbólico, justaposto ao espaço público, favorecendo outras formas de interação entre atores sociais que lutam por um mesmo projeto. Rousiley Maia, no artigo Redes Cívicas e internet: Do ambiente informativo denso às condições da deliberação pública, chama a atenção para o fato de que a internet se mostra como uma arena conversacional, em que o espaço se desdobra e novas conversações e discussões políticas podem seguir seu curso (EISENBERG; CEPIR, 2002, p. 46). Diante destas colocações, fica evidente 4 (PERUZZO; COGO; KAPLUN, 2002, p. 300) 5 Patrícia Bernal (2002, p. 316) citando o seminário Paradojas de los entornos virtuales, de Miguel Banet, considera El espacio público es el aquel donde se plasman unas prácticas discursivas (como los debates, denuncias, convocatorias, protestas) y unas acciones de unos actores. Por un lado es el lugar de la estruturación, del intercambio social y de la expresión colectiva, donde se discutem e impulsan los proyetos de los diferentes grupos y movimientos, es un espacio que se construye al ser recorrido.

Movimentos Sociais na Internet: Possibilidades e Desafios 3 que a internet assegura um novo espaço de intervenção, mas que este não substitui a necessidade de articulação no espaço público. Antes de avançar nesta colocação, passemos às formas possíveis de ativismo político a partir da rede. Gustavo Lins Ribeiro declara em Política Cibercultural: Ativismo político à distância na comunidade transnacional imaginada-virtual que a internet se configura como um novo campo de conflitos e contestação políticos (ALVAREZ; DAGNINO; ESCOBAR, 2000, p. 476). Para Ribeiro, que trata do ativismo de Organizações não-governamentais na rede (ALVAREZ; DAGNINO; ESCOBAR, 2000, p. 480), Coalizões podem ser feitas com vários atores operando em diferentes níveis de agência, comunicações e alianças transnacionais tornam-se efetivas com nenhum ou pouco controle dos Estados-nações. Estas relações podem ocorrer através de debates produzidos em fóruns na internet, com a troca de e-mails, conforme cita Maia: Além da prática da conectividade isolada do usuário da rede, a internet proporciona, em terceiro lugar, uma forma de conexão coletiva. Isso ocorre desde a troca de e-mails numa base cidadão-cidadão, chats, grupos eletrônicos e listas de discussão sobre questões específicas até as amplas conferências virtuais. (MAIA; CASTRO, 2002, p. 47) Nestes termos, a comunicação passa também a constituir uma arma fundamental no ativismo político de movimentos sociais. Ressaltando que o termo comunicação aqui é utilizado com a intenção de designar as formas possíveis de cidadãos se colocarem em contato com outros cidadãos, buscando favorecer a deliberação pública, articular ações ou simplesmente procurar o estabelecimento de identidades. 2 Barreiras de acesso Antes de ingressar propriamente na discussão em torno da necessidade de articulação de atores sociais no espaço público, com vistas à uma potencialização de ações na esfera virtual, faz-se necessário apresentar algumas problemáticas que antecedem esta preocupação ao tratar de aspectos mais básicos quanto ao acesso às novas tecnologias de comunicação e informação. Esta reflexão é pertinente haja vista que não há como pensar em ativismo na rede sem considerar a dimensão humana e democrática em que as pessoas, os cidadãos, devem ser tidos como peça fundamental. Um dos primeiros obstáculos quando se pensa em acesso à internet guarda relação com a oportunidade de estar em contato com as novas tecnologias, lacuna que vem sendo suprida com a efetivação de projetos de inclusão digital efetivados não só pelos governos, como também por entidades da sociedade civil. (Lemos, 2007, p. 35). André Lemos ampara-se nas pesquisas que realizou para enfatizar que a inclusão digital deve ser pensada considerando os âmbitos técnico, cognitivo e econômico. (2007, p. 35). Para o autor, o ato de incluir digitalmente deve ser visto como o pontapé para que as pessoas inseridas em comunidades e realidades menos favorecidas se apropriem das tecnologias de informação e comunicação. Lemos destaca ainda: As TICs [tecnologias de informação e comunicação], principalmente a internet, permitem que uma pessoa não seja apenas consumidora de informação. O que está em jogo

4 Aline de Oliveira Rios com a cibercultura contemporânea é a liberação do pólo da emissão (...), a reconfiguração do universo midiático contemporâneo (...) e a conectividade generalizada por meio de redes telemáticas. A inclusão digital não deve ser apenas um modelo de ensino técnico, onde alunos aprendem determinados softwares e como navegar na internet. O modelo de inclusão deve compreender e estimular diversas formas de emissão de informação, criando mecanismos para uma maior inserção social e cultural do indivíduo 6. (2007, p. 41) Apesar de ingressarmos nesta problemática apenas de forma tangencial, esta discussão é importante para expor o quanto a simples existência de um ciberespaço não é suficiente para promover deliberação pública, bem como o engajamento e interesse de pessoas nas questões suscitadas pelo ativismo de movimentos sociais na internet. Considerando uma pessoa que está em seus primeiros passos na jornada pelo mundo virtual, além do acesso ao computador, seja ele de sua propriedade ou manuseado em centros populares, o cidadão precisará ser capacitado a interpretar e resignificar os signos da linguagem, estar apto a manusear os softwares e também, ser capaz de interpretar e refletir sobre as formas como seus anseios debatidos e vivenciados no espaço público podem ser traduzidos na forma de demandas expostas através da projeção na internet. Se esta dimensão de não-inclusão for desconsiderada, corre-se o risco de promover um enfraquecimento do argumento dos atores sociais, ampliando ainda mais o leque de não-incluídos que acabam por constituir mais uma forma de exclusão social ao 6 Grifos nossos. lado de outras, a exemplo da miséria material (LEMOS, 2007, p. 39). 3 O ativismo é fundado por necessidades do cotidiano É no desenrolar de sua vida real que as pessoas sofrem as necessidades e dificuldades que podem determinar sua conscientização e politização, vindo a estimulá-las ao engajamento na luta por demandas sociais. Com a internet, abre-se também a possibilidade da criação de uma certa simpatia às causas que afetam a todos em escala mundial, como ocorre em relação às questões de ordem ambiental, e que também pode desembocar em um posterior engajamento político. A partir do interesse e da identificação de pessoas com determinados atores sociais, com base na formação de identidades 7, há a necessidade de integrar estes cidadãos ao processo de deliberação pública que via de regra deve amparar a articulação de ações a serem efetivadas tanto no espaço público quanto no ciberespaço. Por outro lado, as pessoas não se politizam apenas porque sofrem com determinadas injustiças sociais. Elas se engajam nas lutas a partir do momento que compreendem a si próprias como atores sociais que podem e devem se articular na busca pelo cumprimento de direitos, na luta por melhores condições de trabalho entre outras 7 Entende-se identidade aqui no sentido de aquilo que promove identificação, algo que pode ser comum a mais de um sujeito e por este mesmo motivo, tornar possível a união de forças em prol de lutas também comuns. Patrícia Bernal (PERUZZO; COGO; KAPLUN, 2002, p. 313), manifesta que la identidad puede convertirse em agente movilizador para la acción social y política de los actores sociales (...).

Movimentos Sociais na Internet: Possibilidades e Desafios 5 razões públicas 8. Esta sensibilização da sociedade, no entanto, ocorre em grande parte graças às ações protagonizadas por movimentos sociais, seja pelo agendamento de temas relacionados às suas lutas, seja por outras formas de intervenção social. Para Bernal (PERUZZO; COGO; KAPLUN, 2002, p. 314), a rede se configura como uma ponte para a ação política, enquanto um espaço simbólico que se justapõe ao espaço público físico, favorecendo a ampliação do raio de ação dos atores sociais. Assim, as ações públicas destes ativistas podem ocorrer nestes dois meios, de forma complementar. Rousiley Maia ressalta que o interesse político e o engajamento cívico não são elementos dados (EISENBERG; CEPIR, 2002, p. 65). Para a autora: As oportunidades oferecidas pela rede (...) devem ser vistas de modo associado às motivações dos próprios atores sociais e aos procedimentos da comunicação estabelecida entre eles. Os atores da sociedade civil podem beneficiar-se da comunicação mais horizontal e interativa proporcionada pelas novas tecnologias da informação, afim de estarem melhor informados e conhecerem o posicionamento dos diversos atores sociais a respeito de questões específicas. (...) Os atores da sociedade civil (...) devem ser competentes politicamente, estabele- 8 Rousiley Maia (2006, p. 154) considera que na democracia deliberativa, os cidadãos oferecem razões uns aos outros que sejam mutuamente aceitáveis e acessíveis a todos, com o propósito de se chegar a uma conclusão que produza vínculos entre todos no presente, mas aberta ao desafio, no futuro, A justificação pública é o cerne da deliberação (...). cendo pontes comunicativas entre os diversos atores sociais e ambientes de conhecimento, articulando de modo consequente demandas específicas. (EISEN- BERG; CEPIR, 2002, p. 66) A autora Rousiley Maia considera ainda que os fatores acima descritos se tornam possíveis através de práticas interativas concretas. Cooptando as colocações da estudiosa, é possível reforçar a idéia de que os movimentos sociais, antes de disputarem espaço de interação na internet, devem estar investidos de credibilidade conquistada graças às ações efetivadas no espaço público físico. 4 Considerações finais Partindo do pressuposto de que com o advento das tecnologias de comunicação e de informação, em especial com o avanço das redes de comunicação através da internet, os movimentos sociais passam a contar com mais um campo de ação. Diferente do espaço público físico, o ciberespaço se configura como um espaço simbólico que se justapõe a este último, exigindo assim que os atores sociais se articulem e promovam ações nestas duas esferas. Porém, ainda que a internet esteja resignificando as formas de comunicação, ao encurtar as distâncias e assegurar a liberação do pólo emissor na comunicação, o acesso ao ciberespaço é condicionado a aparatos tecnológicos, pressupondo instâncias de nãoinclusão. Assim sendo, os atores sociais que pensarem em se utilizar dos benefícios da rede no que tange à comunicação, além de se manterem ativos e responsivos também no

6 Aline de Oliveira Rios espaço público físico, devem buscar favorecer o engajamento de novos atores também neste âmbito. Com isso, ao mesmo passo que existe uma exposição e teste constante de razões públicas para despertar interesse e garantir engajamento, os articuladores de movimentos devem se preocupar em vencer as barreiras digitais, incluindo novos sujeitos neste cenário. Entretanto, para cumprir esta premissa não basta que haja uma interação entre redes, visando garantir a inclusão digital com o apoio de ONGs, por exemplo, sem que haja uma reflexão sobre a forma com que esse processo deve ser gestado. Antes de apenas ser capaz de manipular a máquina, o cidadão precisa desvendar o ciberespaço também como um espaço que ele pode conquistar e se projetar como um efetivo ator social. ; CASTRO, Maria Ceres. Mídia, esfera pública e identidades sociais. Belo Horizonte. Ed. UFMG. 2006. BERNAL, Patrícia in PERUZZO, Cicilia; COGO, Denise; KAPLUN, Gabriel. Comunicacion y movimientos populares: Cuáles redes? São Leopoldo. Ed. UNISINOS. 2002. RIBEIRO, Gustavo Lins. in ALVAREZ; S. DAGNINO, E; ESCOBAR, A. Cultura e política nos movimentos sociais latino-americanos. Ed. UFMG. 2000. 5 Referências Bibliográficas BURCH, Sally. Sociedade da informação. Sociedade do conhecimento. 2006. Disponível em: http://vecam. org/article519.html Acesso em: 23 Nov. 2008. LEMOS, André. Cidades digitais: portais, inclusão e redes no Brasil. Salvador. EDUFBA. 2007.. Cibercultura, tecnologia e vida social na cultura contemporânea. Porto Alegre. Ed. Sulina. 2002. MAIA, Rousiley. in EISENBERG, José; CEPIR, Marco. Internet e política. Belo Horizonte. Ed. UFMG, 2002.