O TRONCO MACRO-JÊ EM MS: O CASO DA LÍNGUA TERENA Letícia Reis de Oliveira (Graduando - UEMS) Nataniel dos Santos Gomes (UEMS)



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Transcrição:

O TRONCO MACRO-JÊ EM MS: O CASO DA LÍNGUA TERENA Letícia Reis de Oliveira (Graduando - UEMS) Nataniel dos Santos Gomes (UEMS) Resumo: As línguas indígenas brasileiras estão dividas em troncos ou famílias conforme a suas finalidades linguísticas, segundo a classificação do pesquisador Aryon Rodrigues, são elas: a família Tupi-Guaraní, tronco Tupi, tronco Macro Jê, a família Karib, as famílias Aruak e Arawá, família Guaikurú, família Múra, família Katukína, família Tukano, família Makú, família Yanománi e as línguas isoladas que não se encaixam em nenhuma família ou tronco por ser difícil detectar semelhanças linguísticas, logo quando se trata do Tronco Macro-Jê. Rodrigues (2000) afirma que a maior família pertencente ao tronco é a Jê, mas as famílias Bororo, Botocudo, Karajá, Maxakalí e outras línguas também fazem parte desse tronco. No entanto, nesta pesquisa pretendemos dar ênfase à língua Terena. Palavras-chave: Línguas indígenas; tronco Macro-Jê; Língua Terena. Abstract: Brazilian indigenous languages are divided into trunks or families according to their linguistic purposes. According to the classification of the researcher Aryon Rodrigues, they are: the Tupi-Guaraní family, Tupi trunk, Macro-Je trunk, karib family, Arawak and Arawa families, Guaikurú family, Mura family, Katukína family, Tukano family, Makú family, Yanomami family and isolated languages that don t fit into any family or trunk for being difficult to detect linguistic similarities, just when this is the Macro-Je trunk. Rodrigues (2000) says that the largest family owned the trunk is the Je, but the Bororo, Botocudo, Karajá, Maxakalí families and other languages are also part of this trunk. However in this research we intend to emphasize the Terena language. Keywords: Indigenous Language; Macro-Je Trunk; Terena Language. 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho visa apresentar um panorama do tronco Macro-Jê, visto que é de grande importância explorar as particularidades desse tronco, devido à quantidade de línguas indígenas e o número de falantes. No segundo momento, apresentaremos a família Aruak e o caso da Língua Terena.

A família Aruak, é aquela que abrange a Língua Terena, ela não possui línguas somente no Brasil, mas também nos países vizinhos que têm como língua materna o espanhol, ou seja, em toda a extensão da América. No Brasil, eles estão presentes na região amazônica, ao norte do país e no centro-oeste, que são línguas caracterizadas por terem vindo da região do Chaco, Boliviano e Paraguaio, adentrando as fronteiras brasileiras. De acordo com o Bittencourt & Ladeira (2000, p. 18) essas línguas foram agrupadas nessa família pelos seguintes fatores: Todos estes grupos indígenas que falam a língua Aruak têm diferenças entre si, mas possuem uma mesma língua de origem. Além desta proximidade que indica uma origem comum, estes grupos têm semelhanças na forma de sua organização social. Todos esses grupos possuem ou possuíram formas de organização internas características, sendo tradicionalmente agricultores e conhecedores das técnicas de tecelagem e cerâmica. Nesse sentido, pode-se depreender que muitas das semelhanças linguísticas entre essas etnias estará relacionada a termos que se refiram ao que eles têm em comum, que é a organização das comunidades e o fato de serem agricultores, trabalharem com tecelagem e cerâmica. Mas naquilo que eles se distinguirem os termos provavelmente não serão os mesmos, além do fato de muitos já terem contato com outras etnias e culturas que muitas vezes podem causar influências nos costumes e consequentemente na língua, causando assim a mutação e a variação da mesma. O caso Terena foi enfatizado no presente trabalho, devido a quantidade de falantes que é uma das maiores línguas que está ligada ao tronco Aruak, e também por ter maior número de comunidades no estado do Mato Grosso do Sul, e a diversidade de comunidades que se encontram nessa região do país. Muitas dessas comunidades Terena, situadas em Mato Grosso do Sul, têm um grande contato com não índios, pois algumas comunidades estão muito próximas das cidades, além do fato de essa etnia ser bilíngue, na maioria das escolas das aldeias oferecem aos alunos estudo da língua materna, o Terena, e a segunda língua o Português. O que faremos será em um teor de levantamento de dados, pois ainda não temos um corpus linguístico mais completo para um análise sobre as questões que serão abordadas. 2. O TRONCO MACRO-JÊ

As línguas indígenas são divididas em troncos e famílias, de acordo com as semelhanças que apresentam entre si. Pois é notório que os índios do Brasil não são um povo: são muitos povos (Rodrigues. 2002, p.17) e isso se reflete na língua, que se distingue de acordo com a etnia indígena, com seus costumes e com a região em que vivem. Dessa forma: De acordo com Rodrigues (2002, p. 17): Cada qual tem usos e costumes próprios, com habilidades tecnológicas, atitudes estéticas, crenças religiosas, organização social e filosofia peculiares, resultantes de experiências de vida acumuladas e desenvolvidas em milhares de anos. E distinguem-se também de nós e entre si por falarem diferentes línguas. Por isso a importância de fazer divisões das línguas, e analisá-las de acordo com a particularidade que cada uma apresenta e as relações com a cultura de cada povo indígena. Essa divisão foi estabelecida da seguinte forma: 2 grandes troncos, o Tronco Tupi e Macro-Jê. Em seguida temos as 4 maiores famílias: a família Aruak, a família Karib, Pano e Tucano. Temos também 5 famílias médias, a família Arawa, Nadahup (Maku), Chapacura, Yanomani e a Nambikwara. Há também 3 famílias linguísticas menores a família Mura-Pirahã, Katukina, Chiquitano, Guaikuru, Bora. A última divisão são as línguas isoladas, aquelas que não são classificadas devido à dificuldade de inseri-las em um tipo de estrutura linguística ou adequá-las em uma família de acordo com as semelhanças, são ao todo 7 famílias, a Aikanã, Iránxe, Kanoê, Máku, Trumai e Ticuna. 1 O tronco Macro-Jê relaciona geneticamente doze famílias de línguas, que são consideradas por Rodrigues (2000) hipóteses de línguas que se relacionam, são elas: Jê, Maxakalí, Krenák, Kamakã, Purí, Karirí, Yatê, Karajá, Ofayé, Boróro, Guató, Rikbaktsá. Sobre essas famílias de línguas Rodrigues (2000, p. 219) afirma: Algumas dessas famílias já não têm mais nenhuma língua viva (Kamakã, Purí, Karirí), de outras apenas uma língua subsistente (Maxakalí, Krenák, Yatê, Ofayé, Guató, Rikbaktsá). De todas elas, no entanto, há documentação, se bem que para algumas muito escassa e precária. As ramificações são relacionadas de acordo com suas semelhanças, mas não impede que as línguas apresentem características semelhantes a das línguas do tronco Tupi. Esse fato representa o 1 Dados utilizados são do Museu Paraense Emílio Goeldi citado nas referências.

cuidado e olhar atento que o pesquisador precisa ter para averiguar cada detalhe da língua antes de encaixá-la em determinado tronco ou família linguística, isso tipo de análise, é ainda mais difícil quando o número de falantes é restrito e os registros são praticamente extintos. Essa aproximação linguística entre as línguas, que foram unidas em um mesmo tronco ou família, não se deu aleatoriamente, houve fatores históricos que propiciaram que uma língua influenciasse a outra, visto que quando se trata do estudo de línguas indígenas o pesquisador não pode desconsiderar a cultura desse povo. Sobre esse fator Arantes e Reis (2013, p. 95) afirmam: As línguas presentes nesses trocos ou famílias foram unidas em um mesmo grupo por meio de comparações linguísticas e das semelhanças que elas apresentam entre si, muitas vezes, por estarem próximas, ou devido às guerras entre as tribos, tiveram contato o que causou uma mistura proporcionando essas aproximações linguísticas. As línguas pertencentes ao tronco Macro-Jê estão espalhadas em toda extensão do território nacional, no entanto, no Mato Grosso do Sul, está presente somente no município de Brasilândia onde habita o povo Ofayé, com um número restrito a 60 falantes e os Guató em Corumbá com 350 falantes. 2 3. FAMÍLIA ARUAK: LÍNGUA TERENA A família Akuák apresenta 15 línguas, que se caracterizam por não possuir um grau de semelhança entre as línguas ao ponto de ser agrupada em um dos troncos. Segue uma tabela com o nome e a localização e o número aproximado de falantes, baseada na lista elaborada por Rodrigues (2013). NOME DA LÍNGUA E DO POVO FAMÍLIA LINGUÍSTICA UF NÚMERO ESTIMADO DE FALANTES Apurinã (Ipurinã) Aruak AC, AM 3.250 Baniwa do Içana Aruak AM 5.000 Kámpa (Axaninka) Aruak AC, AM 970 Kuripáko Aruak AM 1.100 2 Segundo lista de levantamento de Línguas Indígenas Brasileiras feita por Rodrigues em 2013.

Maxinéri (Manchineri) Aruak AC 950 Mehináku (Meinacu) Aruak MT 230 Palikúr Aruak AP 1.330 Paresí (Pareci, Halití) Aruak MT 1.400 Salumã Aruak MT 450 Tariána (Tariáno) Aruak AM 2.540 Terena Aruak MS 20.000 Wapixána Aruak RR 6.850 Warekéna (Werekéna) Aruak AM 800 Waurá Aruak MT 400 Yawalapití Aruak MT 220? Os Baré também eram classificados como povo pertencente à família linguística Aruak em uma das primeiras obras de Rodrigues, Línguas brasileiras, para o conhecimento das línguas indígenas sua tese de doutorado datada de 1985, versão utilizada neste trabalho é a 4º edição de 2002. Mesmo assim ainda apresenta algumas informações já se modificaram, como no caso dessa língua, que na listagem de línguas indígenas feita por Rodrigues em 2013, que mostra os Baré não como pertencente à família Aruak, mas sim como Língua Geral Amazônica com aproximadamente 15000 falantes. No Brasil a família Aruak está espalhada por toda parte do país, desde o norte do país até o centro-oeste. Além de haver em torno de 20 línguas em outros países latino-americanos como: Venezuela, Colômbia, Peru, Guiana, Guiana Francesa, Belize, Honduras, Suriname, Guatemala, Nicarágua, Bolívia, Paraguai. Por isso, acreditamos que há aspectos de algumas línguas Aruak que são parecidos com a língua espanhola, devido ao contato com as etnias dos países vizinhos. Segundo a Promotora Espanhola de Linguística (PROEL, 2009) El tronco arahuacano (arawákan, Aruak) contiene más lenguas distintivas que cualquier otra família del hemisferio occidental y es internamente más diverso que cualquier otros grupo genético en Sudamérica. E é devido a essas distinções que não se sabe ao certo quais são as relações que elas possuem entre si de forma detalhada aponta Rodrigues (2002, p.66). No entanto, algo que aparece de forma evidente é a semelhança das palavras, quando são comparadas, uma língua com a outra. Vejamos um dos exemplos demonstrados por Rodrigues (2002, p. 69) no quadro abaixo:

KARÚTANA WAREKÉNA TARIÁNA BARÉ PÍRO PARESÍ WAURÁ TERENA SOL kamui kamol kamoi kamuhu tkatxi kamai Kamy kaxe ÁGUA uni one uni uni honu one une une Selecionamos oito línguas para exemplificar a semelhança das palavras, quando nos deparamos com a palavra sol percebemos uma variação maior nas línguas Píro e Terena, mas com leve semelhança gráfica e fonética. PÍRO [t] [k] [a] [t] [x] [i] TERENA [k] [a] [x] [e] Os Píro estão localizados no Peru e a região amazônica do Brasil. Uma hipótese de semelhanças lexical entre as duas línguas pode ser o fato de que ambas tiveram contato com a língua espanhola em algum momento, por isso, mesmo que ambas as etnias vivam geograficamente distantes uma da outra, podem apresentar algo em comum. Outra hipótese para o Terena seja o afastamento da região em que se concentram a maior parte das etnias de línguas da família Aruak. Já na palavra ÁGUA a única que possui uma variação maior é a Píru, as demais se mantém muito semelhantes. Na região mais afastada das demais línguas da família arahuakana está à língua Terena, na região do chaco paraguaio, na parte central do Brasil, no estado do Mato Grosso do Sul e ao sudeste do estado de São Paulo. O que se sabe a respeito da origem dos povos Terena é que eles têm alguma relação, ou descendem dos povos Guaná, esses viviam no Chaco, sobre esse povo Silva (1949, p.279) afirma: Os Guaná em decorrência da crescente pressão de outras tribos do Chaco ou talvez atraídos pelas vantagens de um comércio com os europeus, no início do século XIX, deslocaram-se para as terras orientais do Rio Paraguai, penetrando em território brasileiro em levas sucessivas, que perduraram até fins do século. Os Terenas são povos remanescentes dos Guaná, eles sobreviveram por tantos anos devido ao fato de viverem de forma mais isolada e durante a guerra do Paraguai toda a população se uniu em prol de defender a tribo, por isso eles não foram dizimados nesse período conturbado. Na guerra do Paraguai

a etnia Terena desempenhou um importante papel no auxilio do exército brasileiro, desbravando os lugares que eram desconhecidos pelos não índios, atuaram como guias e também como responsáveis por reabastecer o estoque de alimentos (Vargas. 2013, p.1), dessa forma eles garantiram além da sobrevivência suas terras por um bom tempo. Hoje os Terena são uma etnia com cerca de 20.000 índios em todo território nacional e no Mato Grosso do Sul eles são a segunda maior população indígena e se localizam nos municípios de Miranda, Sidrolândia, Dois Irmãos do Buriti, Nioaque, Bonito, e Rochedo. A respeito da localização e das aldeias Rosa (2010, p. 37) apresenta os seguintes dados: Em Aquidauana, na estrada de Cipolândia, entre morros do Amparo e Vigia, na serra de Santa Barbára, localizam-se as comunidades Limão Verde e Córrego Seco e os núcleos de famílias indígenas Cruzeiro ou Mangarita e Buriti. No Distrito de Taunay, localizam-se as comunidades Lagoinha, Imbirussu, Colônia Nova, Ipegue, Bananal, Morrinho e Água Branca. Em Anastácio, existe uma comunidade urbana a aldeia Aldeinha. Em Dois Irmãos do Buriti localizam-se as comunidades indígenas, Água Azul, Barreirinho, Buriti, Córrego do Meio, Olho D água, e Recanto. Em Sidrolândia, sirtuam-se Tereré, Oliveira e Lagoinha. Em Nioaque localizam-se as comunidades Brejão, Taboquinha, Água Branca e Cabeceira. Em Miranda na reserva indígena de cachoeirinha, estão as comunidades Cachoeirinha, Babaçu, Argola, Morrinho e Lagoinha; próximas a zona urbana do município de Miranda, nas terras indígenas de Pilad Rebuá, estão as comunidades passarinho e Moreira. A 50 km do município de Miranda, localiza-se a comunidade Lalima. Em Dourados, encontra-se a comunidade Jaguapiru. Em Rochedo, localiza-se a comunidade Básalmo. Em Campo Grande, localiza-se a comunidade Urbana Marçal de Souza. Diante da variedade de comunidades, cada uma delas com certeza apresentam as suas particularidades culturais, que certamente provocam suas influências na língua, além do fato de que hoje as crianças Terenas são alfabetizadas em língua Terena e Língua Portuguesa, sendo assim, elas já crescem sendo bilíngues. Além de costumes terem sido moldados conforme a necessidade do povo, algo que influência de certa forma o desenvolvimento da língua e a preservação da mesma é a educação, os Terenas do MS, tem tido um grande avanço na educação e não é raro encontrarmos muitos deles nas universidades. E quando o acesso à educação aumenta as chances da estrutura da língua ser modificada por meio do uso e das novas inserções na fala são maiores, um exemplo disso, são o uso de gírias, os Terenas

também utilizam dessa variante. Esse aspecto é apontado por Nincao (2012, p.79) quando ela questiona um professor sobre o uso do texto Kóho Yoko Ho-vôvo na escola e então ele afirma: Celinho:...porque hoje, os Terena têm as suas GÍRIAS também... E nesse texto tivemos essa preocupação de colocar as palavras pensando assim numa linguagem que talvez pudesse ser trabalhada na escola. A pesquisadora Nicao, aponta que nas escolas indígenas, há uma discussão a respeito do Terena padrão, do não padrão e a respeito da normatização da língua. Outro fato que é importante enfatizarmos é a questão de que o pesquisador precisa ouvir os indígenas e verificar em conjunto com as comunidades como se dão as variações. A forma como os professores da Língua Terena tratam essas variedades dentro da escola é relevante, pois contribuirá para a manutenção da língua nas aldeias. Diante disso, o que percebemos é que a Língua Terena também apresentará variações internamente, quando analisarmos falantes de lugares distintos e até mesmo dentro de uma mesma comunidade. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Abordamos o tronco Macro-jê a fim de que possamos visualizar as distinções que ocorrem entre as línguas indígenas brasileiras, devido a uma série de fatores, dentre elas os históricos e geográficos. Além disso, pudemos perceber que foi uma ideia utópica e irrisória a tentativa de unificação das línguas indígenas, por meio da criação do Tupi Geral, no período da colonização do Brasil. Mesmo que a língua Terena pertença à família Aruak, verificamos que há distinções entre as línguas pertencentes a uma mesma família, que como já dissemos anteriormente são reunidas devido aos aspectos linguísticos que apresentam em comum, mas que também possuem as suas distinções, que muitas vezes estão relacionadas ao modo de vida da comunidade e a localização geográfica, pois quanto mais uma etnia se afasta do local em que se relacionava com comunidades de mesmo tronco ou família linguística, maiores são as chances de terem suas línguas alteradas, ainda mais quando há a educação bilíngue e um grande convívio com não índios e necessitam comunicar-se utilizando a Língua Portuguesa. Outra questão que precisamos considerar é o fato de que a Língua Terena possui cerca de 20.000 falantes no Mato Grosso do Sul e as comunidades estão divididas em várias cidades diferentes, então

entendemos que pode haver uma variação linguística grande entre os falantes dessas distintas comunidades e por isso considera-se relevante pesquisas em torno desse tema, pois ainda não se tem dados suficientes para se afirmar algo, apenas suspeitas que deixaram essa pesquisa sem muitas respostas, mas apenas com essa hipótese para uma posterior continuidade do trabalho. REFERÊNCIAS ARANTES, Taís Turaça. REIS, Letícia Oliveira. Web-Revista SOCIODIALIETO: Bach., Lic., Mestrado -Letras- UEMS/ Campo Grand, V.4, nº 10, jul. 2013. Disponível em < http://www.sociodialeto.com.br/edicoes/15/31072013035012.pdf> Acesso em 10 de agosto de 2013. BITTENCOURT, Circe Maria. LADEIRA, Maria Elisa. A história do povo Terena. Brasília : MEC, 2000. A classificação das línguas. Disponível em: <http://saturno.museugoeldi.br/lingmpeg/portal/?page_id=259>. Acesso em: 15 de agosto de 2013. NINCAO. Onilda Sanches. A formação de escritores indígenas e a questão da variação linguística na Língua Terena. Revista Língua & Literatura.v. 14. n. 23. p. 77-96, Dez. 2012. Disponível em; < http://revistas.fw.uri.br/index.php/revistalinguaeliteratura/article/view/401/1245>. Acesso em: 21 de agosto de 2013. PROEL, Tronco Arawak o Arahuaco. Promotora Espanhola de Linguística. Dispnível em <http://www.proel.org/index.php?pagina=mundo/amerindia/arawak>. Acesso em: 21 de agosto de 2013. RODRIGUES, Aryon Dall Igna. Flexão relacional no tronco Macro-Jê. Boletim da Associação Brasileira de Lingüística, v. 25, p. 219-231, 2000. Disponível em:< http://biblio.etnolinguistica.org/rodrigues-2000-flexao>. Acesso em: 21 de agosto de 2013. RODRIGUES, Aryon Dall Igna. Línguas indígenas brasileiras. Brasília, DF: Laboratório de Línguas Indígenas da UnB, 2013. 29p. Disponível em: < http://www.laliunb.com.br >. Acesso em: 10 de agosto de 2013. RODRIGUES, Aryon Dall Igna. Línguas Brasileiras: para o conhecimento das línguas indígenas. Ed. Loyola, SP-2002.

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