Notas de Pesquisa. Lenita Maria Marques* Valéria Villa Verde**



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Transcrição:

Notas de Pesquisa AVALIAÇÃO DE IMPACTO SOCIOECONÔMICO DAS ATIVIDADES COMUNIDADES RURAIS POBRES E VILAS RURAIS DO COMPONENTE DESENVOLVIMENTO DA ÁREA SOCIAL DO PROJETO PARANÁ 12 MESES Lenita Maria Marques* Valéria Villa Verde** O Projeto Paraná 12 Meses, resultante do Acordo de Empréstimo 4060-Br firmado entre o Banco Mundial e o Governo do Estado, que esteve em vigor de dezembro de 1997 até março de 2006, foi estruturado nos Componentes Desenvolvimento da Área Social, Desenvolvimento da Área Produtiva, Fortalecimento Institucional e Desenvolvimento Tecnológico, desmembrados em Subcomponentes e Atividades. Segundo o Manual Operativo do Projeto, o objetivo geral foi o de Aliviar a situação de pobreza rural no Estado numa ação sustentável, apoiada na modernização tecnológica, na geração de novos empregos, na proteção ao meio ambiente e na melhoria das condições de habitação e saneamento básico da família rural. 1 Ao Ipardes coube avaliar, junto ao público beneficiário, os efeitos das ações sociais, econômicas e ambientais previstas no desenho original do projeto. As avaliações de impacto socioeconômico estão voltadas a acompanhar e medir as transformações ocorridas no âmbito familiar e no âmbito produtivo. Esta nota técnica dá destaque para alguns aspectos da metodologia e principais conclusões que a avaliação final pode estabelecer para o subcomponente Combate à Pobreza nas duas atividades avaliadas: Comunidades Rurais Pobres e Vilas Rurais. O componente Desenvolvimento da Área Social do Projeto Paraná 12 Meses, apoiado no subcomponente Alívio da Pobreza no Meio Rural, atuou em dois âmbitos específicos: Comunidades Rurais Pobres e Vila Rural. 2 * Economista, mestre em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), pesquisadora do IPARDES. E-mail: leni@pr.gov.br ** Socióloga, mestre em História Social pela UFPR, pesquisadora do IPARDES. E-mail: valeriav@pr.gov.br 1 PARANÁ. Governo do Estado. Projeto Paraná 12 Meses: manual operativo. Curitiba, 1996. p.10. 2 A equipe responsável pela avaliação das Atividades Comunidades Rurais Pobres e Vilas Rurais era composta, além das autoras desta nota, por Louise Ronconi de Nazareno (socióloga), Angelita Bazottii (socióloga) pesquisadoras do IPARDES e Luana Libório Geraldo (estagiária, acadêmica de Ciências Sociais). REVISTA PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO, Curitiba, n.112, p.187-193, jan./jun. 2007 187

Notas de Pesquisa Avaliação de Impacto Socioeconômico das Atividades Comunidades Rurais... A atividade Comunidades Rurais Pobres esteve assentada em três grandes linhas de atuação: 1) infra-estrutura social familiar: reforma/construção de residências; abastecimento de água e saneamento básico; 2) desenvolvimento comunitário: construção de galpões comunitários; organização dos grupos de beneficiários nas comunidades para o acesso aos serviços sociais (saúde, educação, creche); 3) geração de renda: aumento da renda na unidade produtiva e na comunidade por meio de empreendimentos comunitários atividades desenvolvidas coletivamente pelos agricultores (atividade agrícola ou não-agrícola, na propriedade ou fora desta); fomento agrícola; e capacitação/ profissionalização. A atividade Vilas Rurais visou implantar moradias em locais próximos aos centros mais dinâmicos do Estado, com o objetivo de melhorar as condições de vida dos trabalhadores rurais volantes. A atividade esteve orientada por três grandes linhas: (a) infra-estrutura social familiar: moradia; (b) desenvolvimento comunitário: galpões comunitários; e (c) geração de renda: capacitação/ profissionalização. As pesquisas de campo 3, em ambos os casos, foram realizadas em dois momentos, sendo que a primeira (ex-ante) resultou em um diagnóstico inicial sobre as famílias e sobre o local onde essas famílias viviam. A segunda pesquisa estabeleceu o parâmetro comparativo sobre o qual a avaliação final se assenta. Esta nota técnica apresenta a metodologia e resultados selecionados e específicos, relativos às Comunidades Rurais Pobres e às Vilas Rurais, e finaliza apresentando algumas considerações gerais. 4 1 COMUNIDADES RURAIS POBRES Os critérios adotados pelo projeto para a seleção dos beneficiários da atividade Comunidades Rurais Pobres foram os seguintes: produtores classificados como Produtor de Subsistência (PS) e Produtor Simples de Mercadoria - Classe 1 (PSM1) 5 ; área inferior a 25 hectares; benfeitorias produtivas inferiores a R$ 12.150,00; equipamento agrícola inferior a R$ 9.720,00, e participação da mão-de-obra familiar igual ou superior a 80%. Para selecionar a público a ser investigado, o IPARDES ultilizou o cadastro: Perfil da Unidade Produtiva (PUP), fornecido pela SEAB. Na época, este cadastro era composto por 604 comunidades, localizadas em 274 municípios do Estado, totalizando um públicoalvo de 12.263 produtores. A amostra selecionou aleatoriamente, a partir desse cadastro, 750 famílias, em 341 comunidades, localizadas em 199 municípios. Em março de 2000, realizou-se o levantamento de campo da primeira etapa da avaliação, estabelecendo o marco inicial da avaliação de impacto. É preciso ressaltar que, no momento em que a pesquisa se efetivou, as ações do projeto já haviam sido iniciadas, o que inviabilizou apreender uma condição propriamente ex-ante da população-alvo. 3 Os levantamentos de campo foram realizados por técnicos da Emater-Pr. 4 O relatório técnico da avaliação final pode ser encontrado em comunidades e vilas. 5 A metodologia de classificação utilizada pelo Projeto Paraná 12 Meses foi desenvolvida pelo Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR). Para mais informações, consultar IPARDES. Avaliação institucional do Projeto Paraná 12 Meses. Curitiba, 2006. 188 REVISTA PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO, Curitiba, n.112, p.187-193, jan./jun. 2007

A segunda etapa foi realizada em outubro de 2005 e retornou aos mesmos estabelecimentos pesquisados em 2000. Das 750 famílias pesquisadas em 2000, foram encontradas e responderam ao formulário 562 famílias; as demais haviam saído do estabelecimento, não foram encontradas ou se recusaram a responder ao formulário. A avaliação final partiu de uma concepção conceitual e metodológica em que a pobreza é definida, a priori, como a ausência de condições dignas para viver, ou seja, ter acesso a uma determinada quantidade de bens materiais e imateriais. Para atribuir resultados e medir impacto adotou-se, como modelo, uma metodologia de avaliação proposta por Garcia 6. Este autor vem produzindo trabalhos nos quais propõe e discute avaliações de programas de governo com vistas a monitorar, acompanhar e aperfeiçoar a ação pública expressa nos Planos Pluri-Anuais (PPAs). A avaliação socioeconômica dos beneficiários da atividade Comunidades Rurais Pobres parte da idéia de que a pobreza é a ausência de eqüidade entre os segmentos sociais e a ausência de condições dignas para viver, ou seja, em que há acesso limitado a uma determinada quantidade de bens materiais e imateriais. Nesse sentido, o projeto atuou para modificar esse quadro, interferiu sobre algumas das condições que construiriam um Patamar Mínimo de Existência com Dignidade (PMED), que, segundo Garcia (2001, p.56), se expressaria pela posse de uma quantidade mínima de patrimônio e renda. A operacionalidade do conceito adotado, para avaliação de impacto, foi construída pelos indicadores: Renda Familiar per capita acima de ½ salário mínimo mensal; Patrimônio Material Mínimo Necessário (PMMN) propriedade de domicílio/estabelecimento permanente 7, com densidade de até dois moradores por dormitório, dispondo de abastecimento de água com canalização interna, banheiro e esgotamento sanitário por meio de rede coletora ou fossa séptica, destino adequado do lixo (orgânico enterrado, demais separados e com destino adequado), acesso à energia elétrica, meios de produção e a posse dos seguintes bens duráveis: fogão, geladeira, rádio ou TV; Patrimônio Não- Material Mínimo Necessário (PNMMN) escolaridade adequada; acesso a seguridade social (aposentadorias, pensões e benefícios continuados); associativismo (sindicato, cooperativa, associações comunitárias ou de interesse). 8 Através dos indicadores parciais, pôde-se medir as ações específicas voltadas para a atividade avaliada. A leitura desse conjunto de indicadores permitiu identificar as modificações ocorridas na realidade da família, ou seja, permitiu saber o quanto de modificação houve, considerando o período analisado de cinco anos, quantificando as famílias que atingiram ou ultrapassaram o PMED. 6 Consultar GARCIA, Ronaldo Coutinho. Iniqüidade social no Brasil: uma aproximação e uma tentativa de dimensionamento. Brasília : IPEA, 2003. (Texto para discussão, 971), e GARCIA, Ronaldo Coutinho. Subsídios para organizar avaliações da ação governamental. Planejamento e Políticas Públicas, Brasília: IPEA, n.23, p.7-70, jun. 2001. 7 Neste estudo, todos os produtores que declararam deter a propriedade da terra, com ou sem documentação, foram considerados proprietários. 8 As fórmulas utilizadas sofreram adaptações para essa avaliação. Os leitores interessados no tema devem consultar a publicação de Ronaldo Coutinho Garcia, citada anteriormente. REVISTA PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO, Curitiba, n.112, p.187-193, jan./jun. 2007 189

Notas de Pesquisa Avaliação de Impacto Socioeconômico das Atividades Comunidades Rurais... Depois de observar os indicadores parciais, aplicou-se a fórmula de Iniqüidade 9, cuja intenção foi dimensionar o quanto ainda precisa ser feito, em termos de políticas públicas, para atender a um segmento específico da sociedade paranaense, tendo em vista a redução da pobreza e a inclusão social. INIQ. = 1 N. o de famílias em situação >= PMED Total de famílias O indicador de iniqüidade, pautado no conceito de que a pobreza é a ausência de eqüidade entre os segmentos sociais e a ausência de condições dignas para viver, retrata uma condição complexa que depende de uma ação também complexa para que se possa colocar as famílias dentro de um patamar digno de existência. Quanto a isso, observou-se a ausência de simultaneidade nas condições que constroem esse mínimo, o que torna as famílias extremamente vulneráveis, pois estão sujeitas a circunstâncias adversas de várias naturezas. Para esse público, de carência quase absoluta, qualquer ação torna-se impactante em um primeiro momento, mas o desafio está na continuidade, no prosseguimento de ações e medidas que gerem um crescimento ou adequação contínuos. Tendo em vista que as ações desenvolvidas estiveram orientadas para três grandes linhas de ação, e com base no que foi observado e medido, pode-se afirmar que as ações da atividade Comunidades Rurais Pobres, do Projeto Paraná 12 Meses, produziram impactos mais perceptíveis através dos indicadores adotados na primeira linha de atuação, ou seja, na infra-estrutura social familiar com a reforma/construção de moradias e adequação sanitária. As duas outras linhas não tiveram a mesma eficácia e/ou não se pode creditar somente ao projeto o que foi observado. É importante ressaltar que, no transcurso do projeto, não estava havendo política pública voltada para a habitação rural, constituindo esta, na verdade, uma das mais prementes demandas da população rural. Nesse sentido, o Projeto Paraná 12 Meses teve uma atuação aderente às necessidades apresentadas pelo público a ser atendido. As ações voltadas para o desenvolvimento comunitário proporcionaram um maior acesso a serviços sociais. Esse fato pode ser explicado, em parte, pelo projeto, uma vez que este mobilizou as comunidades e autoridades locais, mas é de conhecimento geral que, no mesmo período, houve uma intensificação de programas de combate à pobreza em todos os níveis governamentais. É na estratégia para a geração de renda, terceira linha de atuação da atividade, que se percebeu uma maior dificuldade, por parte do projeto, de intervir com efetividade. As ações concebidas para o aumento da renda familiar dialogam com as ações de desenvolvimento comunitário diretamente. A condição de acesso a uma renda mínima que coloque a família dentro de um patamar de existência livre dos rigores da pobreza continua sendo um dos aspectos mais desafiadores, senão o mais, para programas e projetos voltados a esse segmento da população. 9 Indicador de Iniqüidade é a relação entre os que estão acima e abaixo do patamar mínimo de existência digna, criando uma escala de 0 (zero) a 1 (um), em que zero significa que toda a população alcançou ou ultrapassou o patamar. 190 REVISTA PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO, Curitiba, n.112, p.187-193, jan./jun. 2007

Verificou-se que a renda da família é dependente da renda advinda da venda da força do trabalho e dos programas da seguridade social e de transferência de renda, ficando a renda do estabelecimento em segundo plano. Nesse aspecto, tem-se que a grande maioria das famílias não detém os meios de produção mínimos para produzir aquilo que declararam, situação esta incompatível com a necessidade de inserir o agricultor no mercado. Cerca de 50% das famílias pesquisadas tinham ao menos uma pessoa trabalhando fora do estabelecimento, sendo que mais de 60% dessas ocupações estavam na categoria diaristas em atividades agrícolas, com a renda média do trabalho girando em torno de 1 salário mínimo. A avaliação aponta que, entre o segmento pobre da população domiciliada no rural, existe um contingente que se distancia, cada vez mais, das atividades agrícolas ou a elas relacionado diretamente. Parece fundamental que os próximos projetos levem em consideração esses dois aspectos básicos, a ausência de padrão tecnológico mínimo precondição para uma atividade mercantil e a presença de famílias domiciliadas no rural, mas desvinculadas da atividade agropecuária seja por falta de condições ou por opção, dada por uma nova configuração da apropriação do espaço rural, mesmo em municípios pequenos. 2 VILAS RURAIS A atividade Vila Rural, enquanto parte do subcomponente Alívio à Pobreza no Meio Rural, teve por objetivo atender a um segmento específico da população paranaense. Este caracteriza-se fundamentalmente pelo seu caráter de despossuído das condições elementares de moradia e de renda. Esta última, vinculada a uma condição instável do ponto de vista de inserção no mercado de trabalho. No Paraná, segundo o Censo Demográfico de 2000, menos de 20% da população paranaense estava domiciliada no rural. No entanto, a economia do Estado ainda estava, e está, fortemente vinculada ao setor primário. Uma significativa parcela da população paranaense, segundo o Censo Demográfico de 2000 e outras fontes, não tinha acesso a uma renda mínima, a domicílios adequados, nem a um nível educacional ou formação profissional adequados 10. Dados expressos no Manual Operativo do Projeto Paraná 12 Meses 11 apontam a existência de cerca de 300.000 trabalhadores rurais volantes residindo em periferias urbanas ou em distritos rurais, em condições precárias. O projeto criou um programa habitacional acompanhado das seguintes intervenções: (i) apropriação produtiva do lote; (ii) desenvolvimento comunitário; (iii) atividades conjuntas; e (iv) capacitação/profissionalização. As ações propostas tiveram a intenção de a) diminuir a migração rural-urbana e vice-versa; b) possibilitar a melhoria das condições de vida; c) facilitar a posse da terra e moradia própria; d) possibilitar a qualificação da mão-de-obra; e) aumentar a organização social; f) melhorar o acesso a bens e serviços; g) melhorar as condições alimentares; h) aumentar a renda líquida familiar; i) melhorar a integração social e familiar. 12 10 Consultar IPARDES. Famílias pobres no Paraná. Curitiba, 2003, e IPARDES. Atlas das necessidades habitacionais do Paraná. Curitiba, 2004. 11 PARANÁ. Governo do Estado. Op cit. 12 Ibid., p.193-194. REVISTA PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO, Curitiba, n.112, p.187-193, jan./jun. 2007 191

Notas de Pesquisa Avaliação de Impacto Socioeconômico das Atividades Comunidades Rurais... Os critérios de seleção para o ingresso no projeto corroboram com essa percepção, uma vez que, para ser beneficiário, era preciso que fosse trabalhador rural volante; residir em subabitação; exercer atividade remunerada, de caráter temporário, nas áreas rurais do município; idade máxima de 55 anos; renda familiar entre 1 e 3 salários mínimos. Em termos técnicos e operacionais as Vilas Rurais foram implantadas em áreas divididas em terrenos de 5 mil metros quadrados com uma casa de 44 m², com acesso a energia elétrica, saneamento e água encanada. O terreno deveria ser agricultável, permitindo a pequena exploração para subsistência e, se possível, gerar excedentes para comercialização. Ainda, de acordo com o objetivo geral desta atividade, a proximidade com centros urbanos deveria ser observada quando da escolha da área para localização da Vila Rural, facilitando, assim, o acesso a serviços sociais básicos como saúde e educação, e, ainda, estar próxima a sistemas viários, o que facilitaria o acesso a locais de trabalho e a centros consumidores. No contexto geral das avaliações de impacto socioeconômico desenvolvidas pelo IPARDES, a atividade Vilas Rurais guarda particularidades, uma vez que a ação inicial, o assentamento, gera impacto imediato na família. Dessa forma, a avaliação final volta-se para a condição dada por uma vivência acumulada nos seis anos que se seguiram à primeira pesquisa. No ano de 1998, data em que se dá a definição da amostra, havia 120 Vilas Rurais, implantadas e em funcionamento, no Paraná, e cerca de 4.700 beneficiários. A amostra selecionou, aleatoriamente, 732 famílias no universo das 120 Vilas Rurais. A avaliação socioeconômica da atividade Vilas Rurais do Projeto Paraná 12 Meses desenvolveu-se nos anos de 1999 e 2005. A pesquisa realizada em outubro de 2005 acompanhou os mesmos beneficiários já pesquisados na primeira etapa, mas não pôde ser realizada com 296 famílias, 40,4% da amostra inicial. Desse total de famílias não pesquisadas, em 284 casos as famílias haviam emigrado; nos demais casos, o beneficiário recusou-se a responder ou, após sucessivas tentativas, deu-se como casa fechada. Mesmo tendo sido expressiva a emigração registrada, o instrumento de pesquisa utilizado não permite discorrer sobre as causas ou motivações que estão por trás da saída das famílias. O impacto socioeconômico da Atividade Vilas Rurais orientou-se pelas categorias analíticas presentes na proposta do projeto para a atividade analisada: 1) a família; 2) o domicílio e o lote; e 3) a inserção socioeconômica da família, na Vila Rural. Dada a condição de ingresso da família em um assentamento financiado pelo Projeto Paraná 12 Meses, as famílias pesquisadas são, na sua totalidade, beneficiárias. Nesse sentido, a avaliação final mostrou, numa perspectiva de continuidade e de acumulação de experiências, produtiva e social, o quanto as ações desenvolvidas foram capazes de gerar ou acrescentar qualidade de vida e autonomia financeira para a família beneficiária. As ações de habitação, devido a sua concretude, permitem que se sustentem e creditem ao projeto os impactos gerados nas famílias beneficiadas. O Projeto Paraná 12 Meses, ao encerrar em 2006, havia assentado 15.609 famílias em 403 Vilas Rurais, podendo-se sustentar que, devido à ação específica de assentamento, e no caso das 436 famílias analisadas, todas elas saíram de uma situação de risco social para uma outra condição, melhor, sem dúvida, quanto à moradia. 192 REVISTA PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO, Curitiba, n.112, p.187-193, jan./jun. 2007

As seguintes alterações puderam ser observadas: o acesso a bens duráveis, que apresentaram um salto qualitativo na vida das famílias analisadas; a exploração do lote, que, em parte, realizou o seu intento de subsistência e, em parte, voltou-se para a comercialização; e o aumento da renda familiar per capita. Os aspectos negativos, do ponto de vista produtivo, estão relacionados a problemas de erosão do solo e a atividades agregadoras de renda. No primeiro caso, a erosão apresentou um aumento significativo entre 1999 e 2005. Esse é um tema que deve ser objeto de avaliação, acompanhamento e propostas específicas, dado o seu caráter técnico-ambiental. No segundo caso, as atividades produtivas voltadas à geração de renda e/ou agregação de valor tiveram pouca efetividade. CONCLUSÃO É preciso reconhecer que o Projeto Paraná 12 Meses apresentou uma orientação inédita para projetos voltados à população rural, desenvolvidos pelo Estado do Paraná. Pela primeira vez foram pensadas ações para além do manejo, conservação e produtividade ao apoiar o segmento mais pobre da população domiciliada no rural, com infra-estrutura básica. Nesse sentido, cabe ressaltar a percepção, baseada nas visitas de campo, nos treinamentos e nos dados, de que o extensionismo rural precisou, em um primeiro momento do projeto, adaptar-se para orientar e atender a uma clientela praticamente ausente nesse tipo de atuação. A ida da extensão rural até o segmento mais pobre do rural paranaense, no contexto de uma economia agrícola exportadora, não é pouca coisa. Entende-se que este é um ponto fundamental na avaliação socioeconômica da atividade, sendo, em si mesmo, um aspecto positivo. A avaliação socioeconômica das atividades do Sub-componente Combate à Pobreza apontou o importante papel que o Projeto Paraná 12 Meses teve, não só ao apontar necessidades e propor políticas para um segmento quase esquecido da sociedade paranaense, mas também por ter possibilitado a essa parcela da população o acesso a bens e serviços. Se a avaliação mostrou que persistem demandas, mostrou, também, a importância do que foi executado. Tem-se, assim, a convicção de que, sem a ação do projeto, certamente as condições de vida de parte significativa da população rural pobre do Paraná estariam piores. REVISTA PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO, Curitiba, n.112, p.187-193, jan./jun. 2007 193