REFLEXÕES SOBRE O PROCESSO DE TRADUÇÃO-INTERPRETAÇÃO PARA UMA LÍNGUA DE MODALIDADE ESPAÇO-VISUAL



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Transcrição:

REFLEXÕES SOBRE O PROCESSO DE TRADUÇÃO-INTERPRETAÇÃO PARA UMA LÍNGUA DE MODALIDADE ESPAÇO-VISUAL 1 Carla Couto de Paula Silvério Carlos Henrique Rodrigues Davi Vieira Medeiros Sônia Aparecida Leal Vitor Romeiro Universidade Federal de Juiz de Fora UFJF Resumo Considerando as especificidades da tradução e da interpretação entre línguas de diferentes modalidades, investigamos o processo de tradução da língua oral para a de sinais, quando este assume certo caráter de interpretação simultânea. Para este texto, tomamos como foco os primeiros 1 51 da tradução para a Libras de um vídeo institucional do Centro de Educação à Distância da UFJF, os quais foram analisados, observando-se a produção da tradução, ou seja, o estudo do texto fonte, seguido da elaboração do projeto de tradução, e o registro da tradução. Verificamos no processo em questão a presença de características intrínsecas à interpretação, as quais nos levaram a refletir sobre esse momento singular com base no Modelo dos Esforços (GILE, 1995) e na Teoria Interpretativa da Tradução (SELESKOVITCH, 1978). Observamos que o processo realizado pode ser identificado como tradutório-interpretativo, pois guarda características operacionais e cognitivas tanto da tradução quanto da interpretação. Enfim, esta investigação contribui com a compreensão do processo de tradução entre línguas de modalidades distintas, evidenciando o efeito de modalidade sobre esse tipo de tradução-interpretação. Nesse sentido, propomos algumas estratégias que podem potencializar e enriquecer o processo de tradução para uma língua de modalidade espaço-visual. Introdução As pesquisas em tradução e interpretação de línguas de sinais (LS) são bem recentes, principalmente no Brasil. Um rápido panorama dessas pesquisas evidencia que a grande maioria delas não tem como foco a investigação do processo de tradução e/ ou interpretação em LS. Sem dúvidas, essa lacuna precisa ser preenchida, visto que investigações empíricas do processo de tradução e, também, do desempenho dos tradutores e dos intérpretes são centrais para a melhor compreensão dos processos mentais subjacentes à tradução e à interpretação em LS e, por conseguinte, para a formação de futuros profissionais. Considerando essa demanda de pesquisas processuais e o fato de o processo de tradução e/ ou interpretação de LS envolver diferentes modalidades, problematiza-se, neste texto, o caráter da tradução de um texto em Português Oral para a Língua de Sinais Brasileira (Libras). É interessante notar que tanto o texto fonte (TF) quanto o texto alvo (TA) não estão escritos, embora devidamente registrados em vídeo. Esse aspecto já exige que se entendam os conceitos de tradução e interpretação, assim como os efeitos da modalidade sobre o processo em questão. Para apoiar a análise utilizaremos também noções propostas pela Teoria Interpretativa e pelo Modelo dos Esforços, as quais têm como alvo o processo de interpretação. Diferenças entre tradução e interpretação Segundo Pagura (2003, p.210), embora não haja dúvidas de que a interpretação envolva um processo de tradução, no sentido geral desse termo, a maioria dos teóricos e profissionais da área

2 usa os termos tradução e interpretação para se referir a duas atividades distintas (ALVES, PAGURA, 2002; PÖCHHACKER, 2004, ALBIR, ALVES, 2009). Para ele, a compreensão dessa diferença pode ser traçada inicialmente a partir da idéia de que o tradutor trabalha com a palavra escrita (o enunciado) e o intérprete com a palavra falada (a enunciação). Seguindo essa mesma compreensão, Gile (1998, p.40) distingue o discurso oral e a palavra escrita abordando a interpretação como sendo a tradução oral do discurso oral. Entretanto, para Pöchhacker (2004, p.10), a interpretação não tem que necessariamente ser equiparada à tradução oral, visto que tal definição poderia, inclusive, excluir a interpretação em LS. Assim, ele afirma que se considerando aspecto imediato da interpretação, é possível diferenciá-la de outras formas de tradução, sem se recorrer à dicotomia oral versus escrito. Nessa perspectiva, Pöchhacker assume a conceituação elaborada por Kade na década de 1960, a qual define a interpretação como uma forma de translação, na qual o texto 1 fonte é apresentado apenas uma vez e, portanto, não pode ser revisto ou reproduzido, e o texto alvo é produzido sob pressão de tempo, com pouca possibilidade de correção e revisão (KADE, 1968 apud PÖCHHACKER, 2004, p.10, tradução nossa). E, então, com base em critérios de oferecimento efêmero e produção imediata, conceitua a interpretação como uma forma de Tradução em que a versão inicial e final em outra língua é produzida com base no tempo de oferecimento de um enunciado na língua fonte (PÖCHHACKER, 2004, p.11, grifos do autor, tradução nossa). Com base nos autores citados acima, pode-se afirmar que o que define os conceitos de tradução e interpretação não se restringe à modalidade do texto que será transladado, visto que existem outras questões a serem consideradas para a conceituação desses processos. Pode-se afirmar, a priori, que os tradutores possuem o TF escrito ou registrado em vídeo e/ ou áudio e têm tempo para construir e refinar o TA sendo que eles mesmos definem o ritmo de seu trabalho; já os intérpretes não possuem muito tempo para trabalhar o TF, pois, como enunciação, ele está sendo proferido no momento da interpretação, e o TA deve ser oferecido imediatamente, sendo que quem dita o ritmo do trabalho é o orador e não o intérprete. É importante salientar, também que, diante de problemas de tradução, os tradutores podem recorrer a dicionários, assistentes de tradução, livros de referência, outros tradutores e, até mesmo, adiantar-se no texto. Em suma, o intérprete, diferentemente do tradutor, precisa dar conta de uma série de processos simultânea e ininterruptamente. Vale destacar, também, o fato que o domínio do texto oral e do 1 Pöchhaker (2004) considera que uma definição mais apropriada poderia empregar os termos enunciados (utterances), atos do discurso (acts of discourse), mensagens (messages), ao invés de texto (text).

3 texto escrito pressupõe diferentes habilidades, sendo que o intérprete precisa não somente conhecer a língua, mas dominar as sutilezas, nuances e especificidades da expressão oral das línguas em que atua, ainda que não domine bem a escrita dessas línguas. Refletindo sobre a interpretação A Teoria Interpretativa, conhecida como Teoria do Sentido (Théorie du Sens) parte do pressuposto de que o processo de tradução/ interpretação não se detém no nível lingüístico, pois incorpora aspectos contextuais, culturais e situacionais. Para Seleskovitch (1978), o intérprete trabalha com a mensagem, com o sentido por trás do enunciado. O propósito da interpretação é apreender o que foi expresso em uma língua e transportar essa mesma realidade, ou sentido, de modo fidedigno em outra língua (SELESKOVITCH, LEDERER, 1989, p.21 apud FREIRE, 2009, p.154, grifo das autoras). Para tanto, o processo de interpretação se realizaria em três estágios: 1. Percepção auditiva de um enunciado lingüístico que é portador de significado. Apreensão da língua e compreensão da mensagem por meio de um processo de análise e exegese; 2. Abandono imediato e intencional das palavras e retenção da representação mental da mensagem (conceitos, idéias, etc.); 3. Produção de um novo enunciado na língua-alvo, que deve atender a dois requisitos: deve expressar a mensagem original completa e deve ser voltado para o destinatário (SELESKOVITCH, 1978, p.9 apud PAGURA, 2003, p.219). Numa perspectiva semelhante, na década de oitenta, Daniel Gile, propôs um arcabouço conceitual importante à abordagem da interpretação, o chamado Modelo dos Esforços (Effort Models). A proposta de Gile, entendendo a interpretação como um conjunto de múltiplas operações cognitivas, estabelece que esse Modelo dos Esforços (veja, por exemplo, GILE, 1995, 1997) associa componentes operacionais da interpretação em três esforços, denominados: L esforço de audição e análise P esforço de produção (produção simultânea de fala e de anotações durante o primeiro estágio da modalidade consecutiva, quando o intérprete está ouvindo, mas ainda não interpretando) M esforço da memória de curto prazo, essencialmente como lidar com as operações da memória do momento em que um segmento do discurso é ouvido até o momento em que ele é reformulado no discurso alvo ou desaparece da memória (1999, p.154, tradução nossa). Na perspectiva proposta pelo Modelo dos Esforços, para um bom desempenho durante a atividade interpretativa, os esforços exigidos precisam estar aquém da capacidade de processamento total disponível para os mesmos. Assim, para que o intérprete consiga realizar a interpretação com qualidade ele precisa articular seus esforços por meio de um esforço de coordenação, não permitindo que se foque em um ou mais esforços em detrimento de outros.

4 Tanto a Teoria do Sentido quanto o Modelo dos Esforços, são propostas consistentes de abordagem do processo de interpretação. Podemos afirmar que ambos tratam a interpretação como um processo reflexivo e de tomadas de decisão que envolve esforço cognitivo e que se realiza em etapas específicas de (1) percepção - compreensão do sentido na língua fonte; (2) desverbalização - retenção desse sentido e (3) reverbalização/ reexpressão - (re)produção desse sentido na língua alvo, ainda que as duas últimas etapas possam ser vistas em ordem inversa. O processo de tradução-interpretação para a Libras É importante explicitar como se deu o processo de tradução-interpretação que é o foco de nosso texto. Num primeiro momento, assistimos ao TF em vídeo, com o objetivo de conhecê-lo. Então, procedemos à construção de um projeto de tradução, o qual se pautou em análises minuciosas com o objetivo de se destacarem os termos técnicos, as expressões idiomáticas e outros aspectos textuais e contextuais. Realizamos, portanto, consultas aos dicionários on-line e, também, aos responsáveis pela produção do vídeo. Percebemos que esse momento inicial pode ser identificado como uma fase de orientação, comum aos processos de tradução, na qual os tradutores familiarizam-se com o texto, preparando-se para traduzi-lo (JAKOBSEN, 2002). Figura 1 O processo de tradução-interpretação Entretanto, percebemos que pelo fato de o TA ser registrado em uma língua de outra modalidade e em vídeo, a redação da tradução foi marcada pela construção de um projeto de tradução, no qual indicamos, com o apoio de um sistema de transcrição em glosas, como seria a tradução para a Libras. Após isso, ampliamos esse projeto com o registro em vídeo da tradução em Libras. Pode-se dizer que esse projeto inicial corresponde a uma primeira etapa da fase de redação, visto que sobre essa primeira versão do TA, registrada em blocos de tradução, foram feitas diversas alterações e correções. Sendo que depois, registramos o TA final em vídeo, no qual não foram mais realizadas alterações, as quais poderiam ser definidas como uma fase de revisão, subsequente à redação e comum aos processos de tradução escrita.

F1 O Cead Centro de Educação a Distância - funciona num prédio anexo ao Critt - Centro Regional de Inovação e Transferência de Tecnologia. PT1 LOCALIZAR* #C-R-I-T-T APONTAR2 CONSTRUIR2 CASA* #C-E-N-T-R-O-E-D-U-C-A-Ç-A-O-A-D-I-S-T-A-N-C-I-A #C-E-A-D RT1 LOCALIZAR* APONTAR1 #C-R-I-T-T APONTAR2 CONSTRUIR2 CASA* #C-E-N-T-R-O-E-D-U-C-A-Ç-A-O-A-D-I-S-T-A-N-C-I-A APONTAR1 SINAL1 #C- E-A-D F2 O Cead é um órgão suplementar da Universidade Federal de Juiz de Fora responsável pelas atividades e Ead da instituição. PT2 APONTAR1 #C-E-A-D AJUDAR3 LOCAL* UFJF* #C-E-A-D RESPONSAVEL* EDUCAÇAO-A-DISTANCIA2 RT2 APONTAR1^#C-E-A-D QUE AJUDAR3 LOCAL* UFJF* GRUPO QUE EDUCAÇAO-A-DISTANCIA2 F3 A história da educação à distância na UFJF começou na década de 90, quando a universidade ofereceu cursos na modalidade para a capacitação dos próprios funcionário e formação de professores. PT3 ANO-PASSADO* 1-9-9-0 9-9 DURAÇAO* UFJF* COMEÇAR* CURSO EDUCAÇAO-A-DISTANCIA2 ESTIMULAR* PESSOA* TRABALHAR* PROFESSOR* DESENVOLVER RT3 ENTAO* PASSADO* 1-9-9-0 DURANTE1 9-9 DURAÇAO* COMEÇAR* CURSO XEDUCAÇAO-A-DISTANCIA2X VARIEDADE GRUPO PROFESSOR* PESSOA* TRABALHAR CURSO ENSINAR DESENVOLVER PROFISSIONAL2 É* GRUPO CURSO EDUCAÇAO-A-DISTANCIA2 F4 O projeto Veredas, uma grande experiência, graduou cerca de 1.800 professores no estado de Minas Gerais. PT4 #P-R-O-J-E-T-O-V-E-R-E-D-A-S APONTAR1 É* EDUCAÇAO-A-DISTANCIA2 GRUPO FACULDADE* FORMATURA3 AS-VEZES 1-8-0-0 PROFESSOR* MINAS-GERAIS LOCAL* RT4 ENTAO* #P-R-O-J-E-T-O-V-E-R-E-D-A-S GRUPO FACULDADE* JÁ* FORMATURA3 AS-VEZES 1-8-0-0 PROFESSOR* MINAS-GERAIS LOCAL* F5 A realização e a participação em Congressos, Simpósios e eventos similares também são da responsabilidade do centro. PT5 TAMBEM #C-E-A-D APARECER4 ORGANIZAR1 SEMINARIO1 CONGRESSO PALESTRA COISAS2 RT5 TAMBEM #C-E-A-D APARECER4 ORGANIZAR1 QUE CONGRESSO APONTARV>1 SEMINARIO1 PALESTRA COISAS2 F6 Os avanços na educação fazem com que o Cead, hoje, desempenhe um papel muito importante na UFJF. PT6 HOJE3 #C-E-A-D DENTRO1 UFJF* IMPORTANTE2 ENSINAR DESENVOLVER JA* RT6 ENTAO* APONTAR1^#CEAD IMPORTANTE2 DENTRO1 UFJF* PORQUE ENSINAR JA* DESENVOLVER F7 Trabalhamos pelo ensino superior público, gratuito de qualidade e principalmente por um espaço de diálogo da educação a distância com a educação presencial. PT7 NOS* LUTAR4 COMBINAR2 QUE GRUPO FACULDADE* POSSIVEL APONTAR1>1 #P-U-B-L-I-C-O APONTARV>2 GRATIS APONTARW>3 PERFEITO* ESTIMULAR* IMPORTANTE2 LOCALIZAR* EDUCAÇAO-A-DISTANCIA2 LOCALIZAR* ENSINAR PRESENCIAR* TROCAR3 RT7 FOCO* LUTAR4 POR-QUE GRUPO FACULDADE* APONTAR1>1 #P-U-B-L-I-C-O APONTARV>2 GRATIS APONTARW>3 PERFEITO* TAMBEM PRINCIPAL1 QUE GRUPO EDUCAÇAO-A-DISTANCIA2 XGRUPOX MAIS1 GRUPO ENSINAR PRESENCIAR* TROCAR3 F8 Essa integração entre as modalidades é visível principalmente no que diz respeito à possibilidades técnicas e pedagógicas que sejam inovadoras. PT8 APONTAR1 TER GRUPO PROFESSOR* AJUDAR3 COISAS2 TER GRUPO TECNOLOGIA2 MATERIAL1 UNIR* AJUDAR4 TROCAR3 RT8 ENTAO* TROCAR3 IMPORTANTE2 POR-QUE POR-QUE TER TECNOLOGIA2 INTERNET3 COMPUTADOR1 COISAS2 UNIR* GRUPO PROFESSOR* PEDAGOGIA3 AJUDAR3 UNIR* POSSIVEL AJUDAR4 TROCAR3 F9 Esse desenvolvimento de novas tecnologias de informação e comunicação implica em pesquisas muito proveitosas para a educação no nosso país. PT9 APONTAR1 TECNOLOGIA2 GRUPO COMPUTADOR1 INTERNET3 INFORMAÇAO* COMUNICAR1 POSSIVEL PESQUISAR ENCONTRAR AJUDAR4 BRASIL ENSINAR DESENVOLVER RT9 JA* XAPONTAR1>1X COMPUTADOR1 INTERNET3 MUNDO TROCAR3 INFORMAÇAO* COISAS2 POSSIVEL PESQUISAR AJUDAR4 BRASIL QUE ENSINAR DESENVOLVER F10 Indo além de promover formação e inclusão, nosso compromisso se estende para provocação de mudanças nas práticas de ensino e aprendizagem. PT10 CURSO VARIEDADE TAMBEM #I-N-C-L-U-S-A-O APROVEITAR EDUCAÇAO-A-DISTANCIA2 PESSOA* POSSIVEL ESTUDAR1 SO1 NÃO #C-E-A-D COMPROMISSO ESTIMULAR* MUDAR2 MENTE* ASPAS1 #E-D-U-C-A-Ç-A-O RT10 SO1 #I-N-C-L-U-S-Ã-O APONTARV>2 CURSO VARIEDADE #C-E-D SO1 ESTIMULAR* SO1 DIFERENTE2 #C-E-A-D PRINCIPAL1 QUE É* MENTE* MUDAR7 ASPAS1 #E-D-U-Ç-Ã-O Diferenças no texto alvo final em relação ao projeto de tradução/ F frases do texto fonte / PT projeto de tradução/ RT registro da tradução Tabela 1 Texto Fonte e Texto Alvo (Projeto de Tradução e Registro da Tradução). O projeto inicial, registrado por escrito e em vídeo, visava minimizar possíveis equívocos durante o registro final do TA. Como a tradução já havia sido realizada, esperava-se que fosse possível ao tradutor recuperar o projeto, previamente elaborado, durante o registro do TA, propriamente dito. Contudo, percebeu-se que somente o acesso à memória como forma de resgatar a tradução não foi um mecanismo eficiente de recuperação para o registro final da tradução. O que ficou evidente foi que as marcas da oralidade presentes no TF, no texto em fluxo, fez com que o tradutor re-elaborasse o TA a partir do acesso à tradução anteriormente proposta, a qual estava na memória, adaptando-a ao fluxo do TF e a pressão de tempo imposta pelo mesmo. Esse processo evidenciou que a tradução de uma língua oral para uma LS, quando o registro é realizado em vídeo, para ser veiculado numa janela de interpretação, não permite que após o registro final sejam realizados pequenos ajustes, como ocorreria num texto escrito, ou num áudio orientado pela escrita. Uma língua de modalidade espaço-visual exige que o TA ao ser registrado, mesmo com a possibilidade de se realizarem edições, esteja em sua versão final. Isso pelo fato de que pequenas alterações, em um sinal, por exemplo, ou em uma expressão, demandam que os enunciados sejam inteiramente refeitos. Ainda que se queira apenas alterar 5

uma expressão afirmativa para interrogativa, faz-se necessária a regravação de todo o enunciado onde essa expressão está. No momento de registro final do TA, é possível afirmar que o tradutor o otimizou, tornando-o mais funcional e mais fluente em Libras, como se fizesse uma revisão da tradução anteriormente proposta. Vale dizer que no momento de registro final, o tradutor teve que lidar com uma situação de interpretação simultânea, o que exigiu dele muita atenção, memória e um grande esforço de coordenação. Vale citar um trecho do protocolo verbal retrospectivo (Think-Aloud Protocol - TAP) do tradutor, o qual evidencia as características de interpretação simultânea do registro final do TA e o esforço do mesmo para coordenar sua memória e atenção com a recuperação da tradução e com seu ajuste ao fluxo do TF. [ ] eu não consigo lembrar do que a gente combinou, e eu não consigo simplesmente escutar a frase e interpretar porque a minha preocupação é, tem que fazer o que combinou [ ] Só que quando o áudio entra e como a gente fez constru- a gente inverteu algumas construções e tal, eu ficava desesperada, eu ficava assim, eu tinha que pensar no que a gente combinou e escutar o áudio. Eu não desprezava o áudio, mas também não consegui focar no áudio. Então minha cabeça tá assim: o que nós combinamos e o que o áudio tá dizendo. O que o áudio tá dizendo? Ah! Eu tenho que voltar lá no que a gente combinou. Por isso que às vezes dá arrependimento, eu começar a fazer o sinal e fazer outro, dá essa expressão que não condiz com o áudio original. Entendeu? Verificamos também que os enunciados do TA final não estão estruturados como no projeto de tradução, sendo que esse texto possui mais sinais que aqueles previstos inicialmente para a tradução (Tabela 1), fato que pode demonstrar, nesse caso, certo esforço de tornar o texto mais fluente e mais compreensível, já que o tradutor parece operar mais com o sentido dos enunciados e com a comunicação da mensagem em detrimento da construção da forma do TA. Embora tenhamos apresentado somente uma parte de nossas reflexões, é possível perceber que o processo em questão mescla características da tradução e da interpretação simultânea, ainda que com significativos insumos prévios, exigindo do tradutor habilidades específicas para o monitoramento do processo. Acreditamos que novas investigações sobre como o tradutor se comporta frente ao oferecimento da pré-redação como insumo dirigido no momento do registro final do TA, assim como sobre as interferências do oferecimento da pré-redação em glosas em relação o da pré-redação em Libras, podem evidenciar outros aspectos do processo tradutóriointerpretativo contribuindo com o seu aperfeiçoamento. Além disso, essas pesquisas poderão realizar uma análise mais apurada dessa redação final do TA com base no Modelo dos Esforços e na Teoria Interpretativa, por exemplo. Considerações finais Com base nas reflexões realizadas, acreditamos que algumas estratégias podem potencializar e enriquecer esse processo de tradução-interpretação para uma modalidade espaço-visual, visto 6

que as mesmas podem restringir o processo à tradução ou à interpretação, minimizando o dispêndio cognitivo exigido do tradutor no momento de registro do TA final. Para tentar restringir o processo às características de uma tradução, poderíamos: (1) realizar a gravação trecho a trecho, considerando-se blocos de enunciados, buscando-se eliminar a pressão do tempo, do texto em curso, sobre o processo e viabilizando a revisão; (2) buscar minimizar a influência do áudio sobre a tradução, gravando a tradução em sinais sem o insumo do áudio, editando e sincronizando, posteriormente, os TF e o TA. Por outro lado, poderíamos tentar restringir o processo às características da interpretação: (1) considerando as fases iniciais de orientação e de pré-redação como uma preparação para a interpretação simultânea do TA e não como a proposta de tradução final; (2) lidando com o áudio do TF como sendo a única fonte de insumo, sem o compromisso de recuperar uma tradução anterior do texto, ao contrário, realizando simplesmente uma interpretação simultânea do mesmo, apoiada pelo estudo do TF. Referências ALBIR, A. H.; ALVES, F. Translation as a Cognitive Activity. In: MUNDAY, J. The Routledge Companion to Translation Studies. Routledge, 2009. p. 54-73. ALVES, F.; PAGURA, R. The interface between written translation and simultaneous interpretation: instances of cognitive management with a special focus on the memory issue. Proceedings of the XVI World Congress of the IFT. Vancouver: UBC, 2002. p. 73-80. FREIRE, E. L. Teoria Interpretativa da Tradução e Teoria dos Modelos dos Esforços na Interpretação: proposições fundamentais e inter-relações. Cadernos de Tradução, v.2, n.22, 2009. 151-174. GILE, D. Basic Concepts and Models for Interpreter and Translator Training. Amsterdam and Philadelphia: John Benjamins, 1995. GILE, D. Testing the Effort Models tightrope hypothesis in simultaneous interpreting - A contribution. Hermes, Journal of Linguistics no. 23, 1999. GILE, D., Conference and simultaneous interpreting. In: M. Baker (org.) Routledge Encyclopedia of Translation Studies. Londres e Nova York: Routledge, 40-45, 1998. JAKOBSEN, A. L. Translation drafting by professional translators and by translation students. In: HANSEN, G. (Ed.). Empirical translation studies: process and product. Copenhagen: Samfundslitteratur, 2002. p.191-204 KADE, O. Kommunikationswissenschaftliche Probleme der Translation. In: Beihefte zur Zeitschrift Fremdsprachen II, VEB Verlag Leipzig, 3-19. PAGURA, R. A Interpretação de Conferências: interfaces com a tradução escrita e implicações para a formação de intérpretes e tradutores. D.E.L.T.A., 19, esp. 2003. p.209-236. PÖCHHACKER, F. Introducing interpreting studies. London: Routledge, 2004. SELESKOVITCH, D. Interpreting for international conferences. Washington: Pen and Booth, 1978. SELESKOVITCH, D.; LERDERER, M. A systematic approach to teaching of interpretation. Tradução de Pédagogie raisonnée de l interprétation. n/c: The RID, 1995. 7