UFABC - Física Quântica - Curso 2017.3 Prof. Germán Lugones Aula 3 Espectros atômicos e modelo atômico de Rutherford Uma versão de alta resolução do espectro do nosso Sol. Cada uma das 50 faixas cobre 60 angstroms. O espectro completo corresponde ao intervalo de luz visível entre 4000 e 7000 angstroms. 1
Espectros atômicos Final do século XIX e início do século XX estudos da radiação característica emitida pelos átomos dos elementos ao serem aquecidos em uma chama ou serem submetidos a descargas elétricas. Quando visto ou fotografado através de um espectroscópio, esta radiação aparece como um conjunto de linhas discretas, cada uma de uma determinada cor ou comprimento de onda. (a) Source (b) Lens Source of wavelengths 1 and 2 ( 2 1 ) Slit Slit Prism Prism Screen 2 1 Spectrum Screen 2
As posições e intensidades das linhas são características de cada elemento. Os comprimentos de onda dessas linhas podiam ser determinados com grande precisão, e muitos esforços foram dedicados para encontrar e interpretar regularidades nos espectros. Um grande avanço foi feito em 1885 por Johann Balmer, quem descobriu que as linhas do hidrogênio nas regiões da luz visível e do ultravioleta próximo podiam ser calculadas através da fórmula empírica n 2 n 364.6 n 2 4 nm (Equação de Balmer) onde n é um inteiro que pode assumir os valores n = 3, 4, 5,.... 3
A Figura é uma foto do conjunto de linhas espectrais de emissão do hidrogênio (agora conhecido como a série Balmer). As linhas aparecem na região da luz visível e no ultravioleta próximo. As linhas aparecem escuras porque o espectro foi fotografado; portanto, as linhas brilhantes são áreas expostas (escuras) no filme. Se mostram os nomes das primeiras cinco linhas, assim como o ponto além do qual nenhuma linha aparece, H, chamado limite da série. 656.3 486.1 434.0 410.2 397.0 389.0 364.6 Hydrogen (a) H H H H H f H - Os comprimentos de onda são dados pela fórmula de Balmer. - Por exemplo, o comprimento de onda da linha H α pode ser encontrado usando n=3 na Equação de Balmer (verifique!) - As outras linhas correspondiam a outros valores inteiros de n. - O limite da série é obtido usando n=. 4
Outros elementos químicos também apresentavam linhas de emissão: D 1 D 2 (b) 589.5 588.9 546.1 435.8 330.3 253.6 285.3 f 268.0 259.4 Sodium Mercury (c) f 5
Balmer sugeriu que sua fórmula poderia ser um caso especial de uma expressão mais geral aplicável aos espectros de outros elementos. Tal expressão, foi encontrada de forma independente por J. R. Rydberg e W. Ritz e por isso é chamada de fórmula de Rydberg-Ritz, 1 R 1 mn m 1 for n m 2 2 n onde m e n são números inteiros e R, a constante de Rydberg, é a mesma para todas as linhas do espectro de um elemento e varia apenas ligeiramente, e de forma regular, de elemento para elemento. Para o hidrogênio, o valor de R é R H =1.096776 10 7 m -1. Para elementos muito pesados, R se aproxima para o valor limite R =1.097373 10 7 m -1. Essas expressões empíricas foram bem sucedidas na predição de outras séries de linhas espectrais ainda não conhecidas, como as linhas do hidrogênio fora do espectro visível. 6
O modelo nuclear de Rutherford No final do século XIX sabia-se que um átomo tinha cerca de 10-10 m de diâmetro, que continha elétrons muito mais leves do que o átomo como um todo, e que ele era eletricamente neutro. O problema era construir um modelo do átomo que, além de satisfazer todos esses requisitos, fosse compatível com as fórmulas de Balmer e Rydberg. O modelo mais popular era o modelo de J. J. Thomson. Nesse modelo, os elétrons de carga negativa, estão distribuídos uniformemente num volume esférico contínuo de carga positiva. (a) (b) 7
Ele então procurou configurações que fossem estáveis e tivessem modos normais de vibração correspondentes às freqüências conhecidas das linhas espectrais. Este modelo apresentava problemas teóricos: - com essa distribuição de cargas, forças eletrostáticas não são capazes de manter o sistema no equilíbrio estático. - se as cargas elétricas estiverem em movimento no interior do átomo, teriam que estar aceleradas, o que resultaria em emissão contínua de radiação (que não é observada). (a) (b) 8
Em 1909, H. W. Geiger e E. Marsden, alunos de E. Rutherford, realizaram uma série de experimentos colindindo partículas α (He++) em uma folha delgada de ouro, no intuito de sondar o núcleo atômico. Colimador Folha de ouro Blindagem de chumbo 9
A maioria das partículas não sofria nenhuma deflexão ou foram defletidas em ângulos da ordem de 1 grau. Inesperadamente, no entanto, algumas partículas foram defletidas em ângulos grandes, de 90 graus ou mais. Se o átomo fosse uma esfera carregada positivamente de raio 10-10 m, na qual os elétrons estavam embebidos como no modelo de Thomson, o choque de uma partícula α com um átomo, poderia resultar apenas em uma deflexão muito pequena, mesmo que a partícula penetrasse profundamente no átomo. O modelo atômico da Thomson não podia explicar o número de dispersões em grandes ângulos que o Rutherford observava. Rutherford disse: "Foi a coisa mais incrível que aconteceu em toda a minha vida. Era tão incrível como se você atirasse uma bala contra um pedaço de papel e o projetil ricocheteasse de volta". 10
Rutherford concluiu que as grandes deflexões obtidas experimentalmente poderiam resultar apenas de encontros das partículas α com uma carga positiva confinada em um volume muito menor que o átomo como um todo. Supondo que este "núcleo" fosse uma carga pontual, ele calculou a distribuição angular esperada para as partículas α após a colisão. Suas previsões sobre a variação da probabilidade de espalhamento em função do ângulo, da carga do núcleo e da energia cinética das partículas α foram amplamente confirmadas em uma série de experimentos realizados em seu laboratório por Geiger e Marsden. 11
Modelo de espalhamento de Rutherford: - o núcleo é uma carga pontual Q na origem. - Inicialmente, a partícula α se aproxima com a velocidade v ao longo de uma linha reta a uma distância b da reta COA que passa pela origem. - De acordo com a lei de Coulomb a forca que age sobre a partícula α é F=kq α Q/r 2 v z F φ m α B φ φ m α b m α v r b θ C O A 12
- Depois do espalhamento (longe do núcleo), a partícula α se move com a mesma velocidade v em uma trajetória paralela à linha OB, que faz um ângulo θ com a linha COA (Consideramos, como fez Rutherford, que o núcleo permanece fixo durante a dispersão. Logo, como a energia potencial é novamente zero, a velocidade final deve ser igual à velocidade inicial, por conservação de energia). - A distância b é chamada de parâmetro de impacto. - O ângulo θ é chamado de ângulo de espalhamento. v z F φ m α B φ φ m α b m α v r b θ C O A 13
Usando as leis da mecânica clássica, é possível mostrar que a trajetória da partícula é uma hipérbole e que existe a seguinte relação entre b e θ: b = kq Q m v 2 cot( /2) Naturalmente, não é possível escolher ou conhecer o parâmetro de impacto para uma partícula α em particular. De acordo com a equação acima temos: θ=0 b= ; θ=180 b=0. Em geral, quanto maior o angulo de espalhamento, menor o parâmetro de impacto. Partículas com parâmetro de impacto menor que b se espalham a ângulos maiores do que θ (ver figura ao lado). 14
Seja I 0 a intensidade do feixe de partículas incidentes por segundo e por unidade de área. I 0 = num. partículas cm 2 seg O número de partículas α espalhadas por UM NÚCLEO por segundo cujo ângulo de espalhamento é maior que θ deve ser igual ao número de partículas α espalhadas por um núcleo por segundo cujo parâmetro de impacto é menor que b(θ). Esse número é πb 2 I 0. A quantidade πb 2, que tem dimensões de área, é chamada de seção de choque e é representada pela letra grega σ. A seção de choque é definida como o número de partículas espalhadas por núcleo e por unidade de tempo dividido pela intensidade do feixe incidente. O número TOTAL (i.e. por todos os núcleos) de partículas espalhadas por segundo é obtido multiplicando πb 2 I 0 pelo número de núcleos da folha de metal. 15
Seja n o número de núcleos por unidade de volume: n g cm3 N A atoms mol M g mol N A M atoms cm 3 Seja A a área por onde passa o feixe e t a espessura da folha de metal. O número total de núcleos na área coberta pelo feixe é: n (A t) 16
O número total de espalhamentos por segundo a ângulos maiores do que θ é: b 2 I 0 nat Dividindo por pelo número de partículas α que atravessam a área A por segundo, i.e., I 0 A, tem-se a fração espalhada a ângulos maiores que θ: f = πb 2 n t = σ n t A fração espalhada entre o ângulo θ e θ+dθ é obtida diferenciando a relação acima: df = 2πb db nt = n t dσ dσ = 2πb db Nessa relação db deve ser negativo pois a medida que o ângulo aumenta f diminui. 17
A seção de choque diferencial dσ/dω é definida como d Número de espalhamentos por unidade de I 0 d = d tempo entre o ângulo sólido Ω e Ω + dω O número de partículas espalhadas deve ser tal que I 0 d d d = I 0d = I 0 (2 b db ) Eq. (*) onde usamos dσ = 2πb db (ver slide anterior). O módulo foi tomado para que se integre do ângulo mínimo até o ângulo máximo. Repare que ao se diminuir b o ângulo θ cresce. Agora, diferenciando a expressão para b obtida antes (slide 14) obtemos: b = kq Q m v 2 cot( /2) ) db = kq Q m v 2 ( 1/2) sin 2 ( /2) d 18
Substituindo as expressões para b e db na Eq (*) e usando dω=2πsinθdθ, obtemos: d d = kq Q 2m v 2 2 1 sin 4 ( /2) que é a seção de choque diferencial de espalhamento de Rutherford. Agora, lembremos que a fração de partículas espalhada em ângulos maiores que θ é f = σ n t (veja slide 17); logo: df d = nt d d = kq Q 2m v 2 2 nt sin 4 ( /2) 19
O número de partículas espalhadas entre θ e θ+dθ por segundo é obtido multiplicando pela área A do feixe e pelo número de partículas incidentes por unidade de área e tempo, I 0 : N = I 0 A df d = kq Q 2m v 2 2 I 0 Ant sin 4 ( /2) Essas partículas atravessam a região anular maior na figura por unidade de tempo. 20
Se dividirmos pela área da região anular maior temos o número de partículas espalhadas entre θ e θ+dθ por segundo por unidade de área. N Área = 1 Área kq Q 2m v 2 2 I 0 Ant sin 4 ( /2) Isso é o que um detetor colocado em um ângulo θ pode medir. Geiger e Marsden confirmaram todas as previsões da expressão acima: a dependência com o ângulo θ, com a carga elétrica, com a velocidade e com a espessura do alvo. Isso mostrou que o modelo atômico nuclear era a base correta para o estudo dos fenômenos atômicos e nucleares. 21
No entanto, o modelo de Rutherford é previsto ser instável pela física clássica! A emissão de radiação contínua impede a estabilidade de um sistema clássico assim! 22