A utilização de plantas medicinais em medicina veterinária: um resgate do saber popular



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Transcrição:

64 A utilização de plantas medicinais em medicina veterinária: um resgate do saber popular MARINHO, M.L.; ALVES, M.S.; RODRIGUES, M.L.C.; ROTONDANO, T.E.F.; VIDAL, I.F.; SILVA, W.W.; ATHAYDE, A.C.R. Universidade Federal de Campina Grande UFCG. Caixa postal 64, cep: 58708110, Bairro: Santa Cecília, Patos, cstr@cstr.ufcg.edu.br - Ivana Fernandes Vidal. Av. Dom Pedro I, 582, São José. Campina Grande, PB.Fone: (83) 3322-3556. RESUMO: O presente artigo consta de uma pesquisa desenvolvida no município de Patos-Paraíba, com o objetivo de investigar o conhecimento popular e a utilização de plantas medicinais no tratamento de doenças nos animais domésticos. A amostra constou de quarenta entrevistados, selecionados aleatoriamente, que utilizavam fitoterápicos em práticas rotineiras. Os dados foram coletados mediante questionários. Destacou-se nos resultados que o conhecimento sobre as vantagens do uso de fitoterápicos encontrava-se em torno das principais características: natural, eficaz, saudável e de baixo custo. A utilização das plantas medicinais para o tratamento de doenças constitui um vasto campo de pesquisas que podem fornecer importantes subsídios geradores de mudança, reaproximação do homem com a natureza e a valorização e recuperação do saber popular. Palavras-chave: etnobotânica, fitoterápico, medicina alternativa, plantas medicinais ABSTRACT: The use of medicinal plants in veterinary medicine: rescuing the popular knowledge. This research, developed in the municipality of Patos, Paraíba State, Brazil, aimed at the investigation into the popular knowledge and the utilization of medicinal plants in the treatment of diseases in the domestic animals. The sample consisted of forty interviewees, randomly selected, who have used phytotherapics in routine practices. Questionnaires were employed for building a database. The results revealed that the knowledge about the advantages over of the phytotherapics utilization are the followings: natural, effective, and healthy nature of it, besides its low cost. The utilization of the medicinal plants against diseases constitutes a vast research field, which might generate change of habits, the man s re-approach to the nature and the valorisation and rescue of the popular knowledge. Key words: ethnobotany, phytotherapic, alternative medicine, medicinal plants INTRODUÇÃO Não se sabe ao certo quando se iniciou o uso de plantas medicinais e aromáticas com propósitos curativos. Há evidências de que, já no período neolítico, as ervas aromáticas eram usadas em culinária e medicina e que ervas e flores eram enterradas com os mortos (Berwick, 1996). O descobrimento das propriedades curativas das plantas foi no início meramente intuitivo ou, pela observação dos animais quando doentes que buscavam nas ervas a cura para as suas afecções (Oliveira & Silva, 1994). Toda a sociedade humana acumula acervo de informações sobre o ambiente que a cerca, que vai lhe possibilitar interagir com ele para promover suas necessidades de sobrevivência (Amoroso, 1996). No Brasil, historicamente, quando os portugueses aqui chegaram, no começo do século XVI, encontraram índios que usavam urucum para pintar e proteger o corpo das picadas dos insetos e também para tingir os objetos feitos de barro. Sabemos, desde a famosa carta de Caminha que em se plantando tudo dá bem como da grande quantidade de plantas nativas que nascem espontaneamente do Amazonas até o Rio Grande do Sul, que poderiam servir de base para a alimentação, medicamentos, cosméticos e temperos de nossa população e ainda ser exportada (Bornhausen, 1996; Amoroso, 1996). Martins et al (1995) citam que, no Brasil, a utilização de plantas no tratamento de doenças, Recebido para publicação em 06/12/2005 Aceito para publicação em 05/02/2007

65 apresenta fundamentalmente influências da cultura indígena, africana e, naturalmente européia. Os índios utilizavam a fitoterapia dentro de uma visão mística em que o pajé ou feiticeiro da tribo fazia uso de plantas entorpecentes para sonhar com o espírito que revelaria a erva ou o procedimento a ser seguido para cura do enfermo e também, pela observação de animais que procuram determinadas plantas quando doentes. Os negros procuravam expulsar a doença por meio de exorcismo e rodutos, muitas vezes de origem animal. Os europeus, por meio dos padres da companhia de Jesus, chefiados por Nóbrega, em 1579, elaboraram receitas chamadas botica dos colégios, a partir de plantas para o tratamento de doenças. Essas influências constituíram a base da medicina popular que vem sendo retomada pela medicina natural, apresentando caráter científico e integrando-as num conjunto de princípios que visam não apenas curar algumas doenças, mas restituir o homem à vida natural. Tal conjunto de conhecimentos sobre o uso de plantas forma hoje a fitoterapia popular, uma prática alternativa optada por milhares de brasileiros que não tem acesso às práticas médicas oficiais, devido aos altos custos, principalmente no que diz respeito às consultas médicas e aquisição de medicamentos (Albuquerque, 1989). Di Stasi (1996) cita que no Brasil, cerca de 20% de nossa população consome 63% dos medicamentos disponíveis e o restante encontra nos produtos de origem natural especialmente nas plantas medicinais, a única fonte de recurso terapêutico. O Brasil é privilegiado neste aspecto, abriga 55 mil espécies de plantas, aproximadamente um quarto de todas as espécies conhecidas. Destas, 10 mil podem ser medicinais, aromáticas e úteis, tendo no mercado mundial de produtos farmacêuticos, cosméticos e agroquímicos, perspectivas de ganhos em torno de 400 bilhões de dólares ao ano (Barata, 1995). Desta forma torna-se essencial inventariar o potencial medicinal da flora do país para sua preservação e uso sustentável, ressaltando ser indispensável a busca pela conservação da espécie medicinal ameaçada (Guarrera & Marignoli, 2005). Miller (1998) alertou que o crescimento do mercado de fitoterápicos com o uso indiscriminado, baseado na crença da ausência de efeitos colaterais, tem gerado certa preocupação entre os cientistas, que alertam sobre o grande número de plantas medicinais e chás não licenciados vendidos no mundo. Há ainda a falta de regulamentação e controle de qualidade adequado para a comercialização, visto que muitos utilizam plantas que nasceram nos próprios quintais ou as coletam em terrenos baldios ou florestas; e eventualmente essas plantas são confundidas com outras que possuem características semelhantes, como o mesmo tipo de folha, flores, fruto, caules ou raízes. A utilização inadequada dos fitoterápicos, como a auto-medicação, pode trazer uma série de efeitos colaterais. Entre os principais problemas, causados por seu uso indiscriminado e prolongado, estão as reações alérgicas, os efeitos tóxicos em vários órgãos e mesmo o desenvolvimento de certos tipos de câncer. Portanto é de grande importância educar a população, conscientizando-a sobre o uso adequado das plantas e medicamentos ditos naturais (Carlini, 2004). Diante da carência financeira, a fitoterapia é uma alternativa viável para a maioria dos brasileiros. Se por um lado existe a necessidade de intensificação de estudos com potenciais florísticos do Brasil, visando a descoberta ou comprovação de plantas usadas popularmente, por outro é preciso reverter os conhecimentos adquiridos em benefícios das pessoas e obter um maior envolvimento da classe médica (Albuquerque, 1998). Desta forma, diante da importância da fitoterapia e da escassez de pesquisas em Medicina Veterinária, torna-se necessário estudar e aprofundar os efeitos terapêuticos das plantas inseridas no contexto agro-ecológico e social da população, pois mudanças no uso da terra devido à urbanização destroem muito o habitat das plantas úteis, e os raizeiros tradicionais não propagam seus conhecimentos. Assim a perda do conhecimento medicinal tradicional em uma cultura que submetida a uma mudança rápida é tão irreversível quanto a perda da espécie da planta. Conseqüentemente, esforços devem ser feitos para documentar o uso medicinal das plantas antes que muitas destas sejam eliminadas, ou ainda que curandeiros abandonem suas práticas médicas (Joshi & Joshi, 2000). O objetivo deste trabalho foi, portanto, contribuir no sentido de preservar o conhecimento popular do uso de plantas medicinais, resgatando da população que detêm esse conhecimento, as diversas formas de uso de plantas medicinais no que diz respeito as suas propriedades de cura e sua forma de utilização, nos tratamentos de enfermidades nos animais domésticos. MATERIAL E MÉTODO Este levantamento foi realizado no município de Patos-Paraíba, no período de março a maio de 2004. Foram entrevistadas 40 pessoas que mantém contato com algum tipo de criação de animais domésticos (pequenos criadores, acadêmicos e profissionais de medicina veterinária, vaqueiros, tratadores, curandeiros e raizeiros) e que realizam práticas rotineiras com plantas medicinais. Foi elaborado e aplicado um questionário, com a finalidade de traçar um perfil dos usuários da

66 fitoterapia quanto as suas experiências e conhecimentos do uso de plantas medicinais como terapêutica para os animais enfermos. Além disso, foram colhidas informações sobre as plantas existentes na região e nome popular. RESULTADO E DISCUSSÃO A Tabela 1 apresenta os resultados das plantas medicinais utilizadas pelos entrevistados com o nome popular, nome científico, indicações, parte utilizada, forma de uso, nas práticas rotineiras para o tratamento de enfermidades dos animais domésticos no município de Patos. TABELA 1. Relação das plantas medicinais citadas pelos entrevistados, em pesquisa realizada no município de Patos, no período de março a maio de 2004.

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68 Entre os entrevistados, os homens representaram 72,5% e as mulheres 27,5%, resultados que divergem dos de Joshi & Joshi (2000), que afirmaram que as mulheres têm um conhecimento mais amplo e melhor sobre plantas medicinais, devido a sua associação constante com o natural e a transmissão de conhecimentos por gerações. Os resultados obtidos neste trabalho, talvez se expliquem devido o potencial humano envolvido com práticas veterinárias, na região, ser representado em sua maioria por homens (Joshi & Joshi, 2000). Foram citadas 61 plantas medicinais com as mais variadas indicações terapêuticas. Dentre elas, 31% foram citadas por mais de um entrevistado podendo-se destacar a Babosa, citada por 12% dos entrevistados, com um grande e variado número de indicações, que vão de vermífugo a cicatrizante; e o Cajueiro, citado por 10% dos entrevistados, contudo, indicado por todos apenas como antiinflamatório. Vale ressaltar que, todas são plantas conhecidas e de fácil acesso à população da região estudada. Com relação às partes da planta, utilizadas no preparo dos fitoterápicos, estas variaram de acordo com a planta. Quanto à administração do medicamento, em geral, foi recomendado o uso oral e tópico, sendo utilizada a água para a obtenção da forma de maceração e chá. Nos dados obtidos dos questionários, constatou-se que 100% dos entrevistados não só utilizavam plantas medicinais na terapêutica dos animais domésticos, como também aceitariam esta forma de tratamento como prescrição do médico veterinário. Diante da diversificação de informações, observou-se a necessidade de esclarecimentos à população quanto à utilização das plantas medicinais, principalmente no que diz respeito à hora da colheita, modo de preparo, tempo e freqüência de utilização, além da origem, qualidade, conservação e higienização da matéria prima a ser utilizada na produção dos fitoterápicos, corroborando com Joshi & Joshi (2000) que afirmaram que a pesquisa aperfeiçoa e reformula o conhecimento já existente na sociedade, visto que a mesma já faz uso em larga escala de plantas, mostrando discernimento na relação de toxicidade e dose administrada. O uso das plantas medicinais na terapêutica veterinária foi ressaltado como uma alternativa de tratamento viável, segura, de fácil obtenção e baixo custo. Da mesma forma, foi observado nos entrevistados, que os conhecimentos acumulados, foram repassados para gerações. Este fato é citado por Amoroso (1996), que diz que a sociedade humana acumula um acervo de informações sobre o ambiente

69 que o cerca, possibilitando-o a interagir com ele e promovendo suas necessidades de sobrevivência. Os entrevistados ressaltaram ainda, a importância da aproximação do homem com a natureza, o resgate de conhecimentos anteriores e as possíveis descobertas de novos medicamentos para restituir ao homem e aos animais uma vida mais natural e saudável, destaque, também, enfatizado por Barata (1995) quando afirmou que o homem esqueceu da natureza, para a cura de suas enfermidades e isto teve origem com a necessidade de medicamentos com efeitos mais rápidos e produzidos em grande escala, contudo, aplicando os conhecimentos populares acumulados, como a extração dos princípios ativos das plantas medicinais para a fabricação de seus fármacos. A utilização dos fitoterápicos em medicina veterinária está retomando gradativamente o espaço ocupado em tempos remotos. A procura por esta terapia milenar parece estar associada ao fato de que os produtos da indústria farmacêutica que, sabidamente, causam efeitos indesejáveis, que em geral, são de alto custo o que leva também a prejuízos em decorrência do uso abusivo dos medicamentos. No entanto, é necessário ter a consciência de que os fitoterápicos são medicamentos, necessitando, portanto de critérios para a sua comercialização e consumo. O ressurgir desse recurso terapêutico nos dias de hoje, apresenta-se como uma alternativa de cura, menos agressiva ao paciente e viável para os animais e a maioria da população brasileira. A partir da metodologia utilizada foi possível chegar as seguintes conclusões: - A utilização dos fitoterápicos em medicina veterinária está retomando gradativamente o espaço ocupado em tempos remotos. - Os entrevistados confiam na medicina tradicional para suas necessidades preliminares, no cuidado da sua saúde e dos animais. - O saber e as práticas tradicionais são enraizadas profundamente em sua cultura. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ALBUQUERQUE, J.M. Plantas medicinais de uso popular. Brasília: Ministério da Educação, 1989. 96p. AMOROSO, M.C.M. A abordagem etnobotânica na pesquisa de plantas medicinais. In: DI STASI, L.C. (Org.). Plantas medicinais: arte e ciência. São Paulo: UNESP, 1996. p.47-68. BARATA, L.E.S.; QUEIROZ, S.R.R. Contribuição efetiva ou potencial do PADCT para o aproveitamento econômico sustentável da biodiversidade. Campinas: [s.n.], 1995. BERWICK, A. A aromaterapia holística. Rio de Janeiro: Record, 1996. 270p. BORNHAUSEN, R.L. As ervas do sitio. São Paulo: UNESP, 1996. p.15-21. BORNHAUSEN, R.L. As ervas do sítio. São Paulo: UNESP, 1996. p.15-21. CARLINI, E. Entre conhecimento popular e cientifico. Disponível em:<http.www.comciencia.br>. Acesso em: fev. 2004 DI STASI, L.C. Plantas medicinais: arte e ciência. Um guia de estudo interdisciplinar. São Paulo: Ed. UNESP, 1996. 230p. GUARRERA, P.M.; MARIGNOLI, G.F.S. Ethnobotanical and thnomedicinal uses of plants in the district of Acquapendente (Latium, Central Italy). Journal of Ethnopharmacology, v.96, p.429-44, 2005. JOSHI, A.R.; JOSHI, K. Indigenous knowledge and uses of medicinal plants by local communities of the Kali Gandaki Watershed Area, Nepal. Journal of Ethnopharmacology, v.73, p.175-83, 2000. MARTINS, E.R. et al. Plantas medicinais. Viçosa: UniversitáPria, 1995. 220p. MILLER, L.G. Herbal Medicinals: Selected clinical considerations focusing on known or potential drug-herb interactions. Archives of Internal Medicine, v.158, p.2200-11, 1998. OLIVEIRA, R.A.G. ; SILVA, M.S.H. Plantas medicinais na atenção primaria à saúde. João Pessoa: UFPB, 1994. 64p.