Ouro do deserto Com clima árido e paisagens exuberantes, Andaluzia desponta como a produtora dos mais premiados azeites do mundo e investe no oleoturismo texto e fotos: Arnaldo Comin, de Jaén, Córdoba e Almeria (Espanha) Éimpossível ficar indiferente ao mar de oliveiras que se espalha por todos os lados até onde a vista alcança. Dos arredores de Córdoba e Granada, as duas joias da antiga Al-Andalus dos árabes, nas praças dos pequenos pueblos, quintais, acostamentos, morros e encostas, a árvore símbolo do Mediterrâneo ocupa cada centímetro da Andaluzia. No Brasil, tamanha onipresença só tem paralelo com a vastidão dos campos de soja do Mato Grosso. Segunda Comunidade Autônoma mais extensa da Espanha, depois de Castela e Leão, a Andaluzia é a maior produtora e exportadora de azeite de oliva do planeta, respondendo por 80% de toda indústria espanhola. No epicentro deste enorme olival está a próspera província de Jaén, com mais 60 milhões de oliveiras plantadas, nada menos que 520 árvores para cada um de seus 115 mil habitantes. Quantidade, porém, nem sempre foi sinônimo de qualidade. Historicamente, o azeite espanhol e Andaluz, portanto sofreu com a pecha de produto inferior, fruto de uma indústria de volume. Grandes cooperativas se acostumaram a iniciar a colheita no auge do inverno, em dezembro e janeiro, quando.227
Andaluzia: comunidade responde por 80% da produção de azeite de toda a Espanha.226
experiências Ouro do deserto Olival do azeite Espírito Santo: produção 100% orgânica as azeitonas já estão muito maduras, resultando em azeites de pouco sabor e, muitas vezes, com defeitos que os impedem de ser classificados como extravirgem, rebaixados a categorias inferiores, como virgem ou sendo diretamente refinados. Ainda hoje, a maior parte das exportações espanholas é feita a granel e absorvida por seus grandes rivais no mercado internacional, os italianos. Assim como faz com o café brasileiro, a Itália se aperfeiçoou em adquirir commodities a bom preço e valorizá-las com boas estratégias de marca e postura comercial agressiva. Se os portugueses dominam o mercado brasileiro de azeites, os italianos são referência absoluta na maior clientela do planeta, os Estados Unidos. Mas este jogo está prestes a mudar. Mais premiados Somente há dez anos nós começamos a vivenciar uma mudança importante nos processos de produção e criação de marcas de excelência mundial. O resultado é que a Espanha hoje ocupa uma posição de liderança nas principais premiações internacionais, explica Brígida Jimenez, diretora do centro de pesquisas agronômicas Ifapa, em Cabra (Córdoba), considerada uma das maiores especialistas em olivicultura da Espanha e jurada frequente nos concursos mais importantes de azeite do mundo. Os prêmios falam por si. Na safra 2015/16, nove azeites espanhóis entraram na lista 10 Best Olive Oils, que reúne a pontuação de todas as grandes premiações internacionais. Só sobrou espaço para um italiano. Em abril deste ano, o celebrado Festival de Nova York deus seis títulos Best in Class e 83 medalhas de ouro para rótulos da Espanha, que dominou a competição de ponta a ponta. Em comum, as marcas mais celebradas da Espanha são feitas bem no começo da colheita, em meados de outubro, quando o rendimento para o produtor cai pela metade, mas gera azeites de grande intensidade e complexidade de sabor, com aromas frutados muito marcantes, aroma e picor que fazem a sensação entre chefs de cozinha e a comunidade de apreciadores, tão apaixonada quanto no mundo do vinho. A variedade mais plantada na Andaluzia é a picual, que corresponde a 50% do total e apresenta azeites de cor verde intensa e picantes. Mas há espaço também para a hojiblanca, com seus azeites de frutado marcante e sabor complexo, que fazem sucesso nos concursos internacionais. Por último está a sempre presente Arbequina, mais suave e com frutado agradável, co-.228
experiências Ouro do deserto nhecida como a oliveira do Novo Mundo e muito apreciada pelos produtores brasileiros. Além do trio, há dezenas de microvariedades regionais que compõem o complexo mundo do azeite, com mais de 1200 tipos de azeitonas. Deserto orgânico A província de Almeria, no extremo oeste da Andaluzia, reside no imaginário dos apaixonados por westerns dos anos 60. Conhecida como o Deserto da Europa, a região ficou famosa como locação de spaghetti italianos e diversos filmes de ficção científica. Sua paisagem árida foi palco das filmagens do clássico Era uma vez no oeste, de Sergio Leone, e no primeiro Guerra nas Estrelas de George Lucas. Não por acaso é comum encontrar nas pequenas cidades ranchos temáticos de faroeste para turistas que desejam se sentir em um pedacinho de Hollywood. Terra de contrastes no caminho de carro o visitante passa pela deslumbrante Sierra Nevada, com seus picos brancos em plena planície de vegetação seca a Almeria oferece algo a mais que cenário de cinema: as condições ideais para a produção de azei- Priego de Córdoba: na pequena cidade são feitos alguns dos azeites mais premiados do mundo.230
experiências Ouro do deserto tes espetaculares. O clima por aqui é tão seco que não temos a incidência de pragas como em outras regiões da Espanha e da Itália. Por isso, decidimos que desde o início da nossa produção, em 1999, faríamos azeites orgânicos, explica Rafael Alonso Barrau, produtor de Oro Del Desierto, eleito como o melhor orgânico do mundo na safra 2015. A marca já passa dos 180 prêmios internacionais, tendo arrematado mais alguns este ano na Espanha, Itália, Grécia e Estados Unidos. Depois de conquistar grandes prêmios, as marcas espanholas de ponta estão apostando alto no mercado orgânico, cuja demanda cresce exponencialmente em países escandinavos e na Alemanha, assim como nos EUA e Canadá. Além da importância como marketing, os azeites ecológicos ou biológicos, como são conhecidos na Europa, tem preço 20% maior em relação ao convencional, no mínimo. Alguns produtores estão indo além com o desenvolvimento de biodinâmicos, um conceito complexo de agricultura que envolve a integração do meio ambiente do entorno, desde plantas a animais, passando pelos ciclos da lua e técnicas tradicio- Prensa e moinhos de pedra se tornaram peça de museu na Almeria.232
Oro Bailén Ptos. Flos Olei: 98 (Máximo) 1º Prêmio Alimentos de España (2016) Origem: Villanueva de La Reina (Jaén) Variedade: Picual Sabor: Frutado Médio Finca possui loja temática e oferece tour pela plantação e área de extração Contato: www.orobailen.com Castillo de Canena Biodinâmico Ptos. Flos Olei: 98 (Máximo) Origem: Úbeda (Jaén) Variedade: Picual Sabor: Frutado Intenso Localizado em um castelo histórico de Úbeda, cidade Patrimônio da Humanidade pela Unesco Contato: www.castillodecanena.com Tesouro Andaluz Uma seleção de azeites com as mais altas pontuações no prestigiado guia italiano Flos Olei 2017, que permitem visitação à finca do produtor durante todo o ano. *À venda no Brasil pelo site e loja Rua do Alecrim Azeites e Gastronomia (www.ruadoalecrim.com.br) **Previsão de lançamento no Brasil em novembro de 2017 pela Rua do Alecrim Finca La Torre Biodinâmico Ptos. Flos Olei: 98 (Máximo) Origem: Bobadilla (Málaga) Variedade: Hojiblanca Sabor: Frutado Intenso Visita a belíssima fazenda biodinâmica e área de extração Contato: www.fincalatorre.com Oro del Desierto Orgânico** Ptos. Flos Olei: 96 Eleito Melhor Orgânico do Mundo (2015) Origem: Tabernas (Almeria) Variedades: Picual, Hojiblanca e Arbequina Sabor: Frutado Médio Possui estrutura de loja e restaurante-museu, com belas paisagens desérticas da Almeria Contato: www.orodeldesierto.com Venta Del Barón* Ptos. Flos Olei: 97 Há três anos eleito o Melhor Azeite do Mundo Origem: DOP Priego de Córdoba (Córdoba) Variedades: Hojiblanca e Picudo Sabor: Frutado Intenso Próximo à cidade histórica de Priego Contato: www.mueoliva.es.234
experiências Ouro do deserto nais de manejo do solo. As pessoas às vezes pensam que isso (biodinâmica) tem algo de magia, mas no fundo é uma maneira de observar os processos que funcionam e seguir aperfeiçoando, diverte-se Víctor Perez, engenheiro agrônomo responsável pela produção de Finca La Torre, 4 medalhas de Ouro este ano em Nova York. Mesmo enfrentando a concorrência pesada dos italianos nos EUA, a indústria espanhola está tentando romper a timidez comercial não só nas Américas, onde atua mais no segmento de grandes volumes, mas também nos mercados mais sofisticados, como a Escandinávia e Japão. A próxima fronteira é a China, onde o jogo continua aberto. Em qualquer cenário, é um problema bom: a demanda mundial por azeite hoje é 13% maior que a oferta, e ninguém consegue atendê-la com a maior relação de quantidade e qualidade do que os espanhóis..236
Nº 17 2ºSEM. 2017 R$ 14,90 Graça Machel, a viúva de Nelson Mandela, inspira líderes no mundo todo com sua luta em defesa da educação na África