A ESCRITA NAS REDES SOCIAIS E SUAS IMPLICAÇÕES SUBJETIVAS

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A ESCRITA NAS REDES SOCIAIS E SUAS IMPLICAÇÕES SUBJETIVAS Caetano da Providência Santos Diniz (DPSI UEPA) 1 caediniz@hotmail.com RESUMO: A internet tem possibilitado o incremento das relações interpessoais de uma forma nunca antes proporcionada por nenhuma outra tecnologia. A comunicação mediada pelo computador tem ocupado um espaço cada vez maior no cotidiano, provocando mudanças nos hábitos e nas formas de seus usuários interagirem. Entretanto, não obstante os diversos recursos como imagens, sons e vídeos, a língua escrita constitui-se na base de uma interação que possibilita, além da comunicação de ideias e da auto expressão, a abertura de um espaço para a identificação e a reflexão acerca de si. PALAVRAS-CHAVES: Internet; Língua; Comunicação. ABSTRACT: The internet has enabled the growth of interpersonal relationships in a way never before provided by any other technology. The communication by computer has occupied an increasing space in daily life, causing changes in the habits and ways of its users interact. However, despite the various resources like images, sounds and videos, the written language constitutes the basis of an interaction that allows, besides the communication of ideas and self expression, opening a space for reflection on the identification of himself. KEY WORDS: Internet; Language; Communication Introdução A língua escrita em tempos de internet tem se constituído um importante meio de comunicação e auto expressão, mesmo em tempos de multimídia como vídeo, som e imagem. Talvez nunca na história da humanidade a escrita tem sido tão utilizada para o fomento das relações interpessoais. A facilidade, a popularidade e a rapidez oferecidas pela internet sem dúvida favorecem este fenômeno e abrem espaço para uma outra utilização além da comunicação: a auto expressão em suas relações com os processos subjetivos. 1 Professor Assistente I da Universidade do Estado do Pará, mestre em Psicologia pela UFPA. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 1

Um novo espaço para relacionamentos O ciberespaço tem características próprias das comunidades em geral (MATEUS-SILVA, ABREU e NICOLACI-DA-COSTA, 2012). Nele criam-se redes sociais, estruturando uma matriz de laços múltiplos baseada na comunicação, reunindo três aspectos que constituem uma cibercultura: informação, comunicação e tecnologia. Segundo Wellman e Boase (2004), Nicolaci-da-Costa (1998), Rheingold (1996) e Castells (2003). É um espaço imersivo, um ambiente que envolve seus usuários fazendo com que se sintam compartilhando um espaço diferente daquele de suas vidas offline (ARAÚJO, 2005). Para Lévy (1999, p.32): A Internet é, na sua essência, um meio de comunicação. E este ciberespaço, cada vez maior, tem alcançado atividades que tradicionalmente tem sido realizadas no modelo face a face. Hoje já se fala, por exemplo, em psicoterapia online, o E-setting. Seja com o objetivo de facilitar a relação terapêutica quando não é possível para o cliente se deslocar até o consultório seja por simples opção por este tipo de mediação, a tecnologia tem ocupado espaço maior no campo de trabalho dos psicólogos. Existem aí uma série de questões éticas, de segurança, de comodidade, de eficiência etc, que precisam ser discutidas, mas a verdade é que é possível observar cada vez mais esta tendência da psicologia a se adaptar aos novos tempos, refletindo e remodelando o seu fazer de forma que seria possível perguntar se as novas ferramentas estariam se tornando uma extensão do próprio consultório. De acordo com Mendes (2014) já existem diversas experiências de terapeutas que tem utilizado a internet como instrumento para iniciar ou dar continuidade ao acompanhamento psicológico, o que, por ser algo novo e ainda experimental, merece certamente bastante estudo e pesquisa a fim de se avaliar os seus prós e contras. A tendência que podemos observar, portanto, é a de que cada vez mais a rede fará parte das vidas das pessoas no que se refere à comunicação, e isto não se restringe ao computador. O celular com seus aplicativos segue a mesma linha e dinamiza ainda mais esta função. O WhatsApp, por exemplo, tem conquistado um espaço cada vez Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 2

maior de interação com o diferencial de ser um aplicativo disponível nos celulares e que, da mesma forma que o pc (personal computer), utiliza a ferramenta internet. Seu sucesso, inclusive, despertou o interesse do próprio Facebook o qual em 2014 anunciou a compra do aplicativo, de forma que temos presenciado a união das duas grandes tecnologias da comunicação pós-moderna, o telefone e a internet. O celular individualizou de maneira bastante marcante o uso da telefonia. Os telefones particulares passaram a ser acessório quase indispensável no dia-dia, proporcionando maior independência na comunicação à distância. O uso dos computadores pessoais conectados à internet proporcionou a interação sem fronteiras, dando-nos a sensação de que fica difícil viver desconectados uns dos outros. Com ferramentas como o WhatsApp, as redes sociais, a formação de grupos, o compartilhamento de informações em diversos formatos, têm elevado a sociabilidade em rede a um nível jamais alcançado. Possuir este aplicativo no celular agrega-lhe um significado que extrapola a possibilidade de realizar uma chamada mais facilmente ou a um custo menor. Ele representa também a possibilidade de estar sempre conectado, sempre online, independentemente de ter que ligar um computador e acionar um modem. Imprime em seu uso um elemento de caráter fortemente afetivo que é o receber atenção dos seus pares através do recebimento de mensagens. Estamos além das redes sociais em processadores e modens, estamos entrando na era das redes sociais ambulantes das quais fica difícil se desligar. Afinal, qual é a maior sensação do WhatsApp senão a de que nunca se desligou a chamada? Ou a de que nem seria preciso começá-la e mesmo assim já estar em contato? Parece ser preciso estar em contato. Comunicar-se é preciso. Ainda que as trocas ocorridas nestes ambientes estejam em geral baseadas nas identificações mútuas, nos interesses comuns, na formação de laços afetivos, a comunicação pode se tornar a própria meta Castells (2006). Rheingold (1996) e Diniz (2008), da mesma forma, afirmam que na vida online as pessoas utilizam o computador como uma forma de estar em contato, de se comunicar. Para eles, algumas pessoas não objetivam fazer negócios ou estudar e sim estar em contato umas com as outras, dedicando algumas horas do seu Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 3

dia e, em alguns casos, muitas horas, para se comunicar com quem está longe ou mesmo perto e assim saber de suas vidas, compartilhar suas experiências, pedir conselhos, solicitar ajuda para resolver problemas, entre outros. Tem-se, muitas vezes, a impressão de que não há nenhuma necessidade de enviar recados, mas envia-se pela simples necessidade de se comunicar num verdadeiro exercício de sociabilidade. As experiências afetivas são em geral alimentadas através do envio e recebimento de recados, mensagens, imagens, vídeos etc. Observa-se nestes uma intensa demonstração de afeto que resulta na elevação da auto-estima, no sentimento de bem-estar e de ser querido. Como escreve Perez (2007, p. 20): O espaço virtual tem o poder de aproximar pessoas, apesar de se encontrarem geograficamente distantes. Essa aproximação parece legitimada a partir da troca de conversas, nas quais os internautas expõem afinidades, trocam elogios, sonham com o par ideal, fantasiam, intermediam sexo, suspiram ao pensar na idealização construída e ainda obtém disso uma atividade considerada prazerosa e de lazer. A escrita e a auto expressão na rede A comunicação à distância possui peculiaridades. Ela pode ser sincrônica ou assincrônica. A sincrônica ocorre predominantemente quando os interlocutores estão conectados ao mesmo tempo, como no Skype. Na assincrônica, apenas um está conectado e aguarda a resposta do outro, como via de regra ocorre nos emails. Com o avanço da nova tecnologia, atualmente dispõe-se de recursos multimídia como texto, som, imagem e vídeo, mas, tradicionalmente, a comunicação mediada pelo computador tem sido baseada na escrita. Este tipo de comunicação talvez nunca fora tão valorizado antes do advento da internet, daí a necessidade de conseguir se expressar utilizando basicamente a língua escrita em vez da fala. Nesta ênfase na comunicação escrita observa-se a criação de uma linguagem particular (NICOLACI-DA-COSTA, 1998), sendo que algumas de suas formas têm penetrado no cotidiano. De acordo com Nicolaci-da-Costa (2002, P. 199): Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 4

O advento dos computadores pessoais e, principalmente, da internet fez com que novos significados fossem atribuídos a antigos vocábulos e enxurradas de novos termos e expressões como, por exemplo, www, rede, ciberespaço, realidade virtual, tempo real, e-mail, listas de discussão, navegadores, mecanismos de busca, hats, spam, windows, menus, deletar, formatar, configurar e uma infinidade de outros invadissem o linguajar contemporâneo em ritmo extremamente acelerado. Pode-se dizer que uma das peculiaridades da Comunicação Mediada pelo Computador (CMC) é a criatividade no uso da língua. De fato, a escrita pode ser mais ambivalente e por isso requer uma certa habilidade da parte do escritor para se fazer entender. Como afirma Zacharias (2005, p. 10): Quando dispomos apenas de um texto escrito, é mais difícil percebermos qual emoção está sendo expressa pelo seu remetente. Se não dispomos de dados suficientes, na própria escrita, que nos deem indicações a respeito, é possível que interpretemos a frase emprestando-lhe um tom de voz que desejarmos, ou escolhermos, o que não necessariamente corresponde à intenção do redator. A mesma frase pode ser dita (ou lida ) de forma agressiva, amorosa, desesperada, cínica, etc. A criatividade entra em cena quando surgem formas diversas de expressar ideias e sentimentos. Segundo Silva (2005) assiste-se a inúmeras maneiras de se comunicar ao outro nosso tom de voz, expressão facial, ritmo. Os emoticons ou smileys, por exemplo, costumam ser usados para expressar emoções nem sempre tão fáceis de serem expressas por meio de palavras escritas, assim como para transmitir expressões faciais que não podem ser percebidas pelo interlocutor. Trata-se do internetês. Uma de suas características é facilitar a comunicação não verbal seja através da utilização de imagens seja através de atitudes como, por exemplo, o ato de curtir determinada postagem ou opinião. Assim, é possível expressar o pensamento sem precisar escrever e sem precisar usar imagens, basta ter um ato, curtir, e já fica claro o que se pensa acerca de algo. Aprova-se ou desaprova-se pessoas e fatos sem precisar discorrer sobre tal como, por exemplo, os casos de violência simbólica. É possível praticá-la através do discurso em sites de rede social como o Facebook. Posta-se uma opinião e logo agrega-se a ela diversos curtir, colocando a vítima da violência numa situação de constrangimento e Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 5

exposição provocada por uma poderosa arma de exposição muito mais rápida que a tradicional fofoca (RECUERO e SOARES, 2013). Outra vantagem, além de facilitar a auto expressão, é a rapidez. Falar é mais rápido do que escrever, por isso são comuns as abreviaturas: vc (você), blz (beleza), abc (abraço), tdb (tudo de bom), bj (beijo), t+ (até mais) e assim por diante, com o objetivo de agilizar a escrita. Estes recursos são bastante utilizados em conversas online e constituem parte do conjunto de expressões que um usuário frequente precisa aprender para facilitar sua comunicação. O ciberespaço, portanto, constitui-se um espaço rico para perceber a dinâmica da língua, sua plasticidade e a variedade de recursos que ela oferece para a expressão de sentidos. Pode-se, por exemplo, gritar com alguém usando!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!, já que a escrita não oferece o som. Pode-se rir de diversas formas, e cada uma delas nos parece como uma risada de diferente, exatamente como ocorre na língua oral: Rsrsrsrsrsrs ou Kkkkkkkkkkkkkk, causando no interlocutor sensações semelhantes às que ele estaria tendo se estivesse face a face com a pessoa. A fim de otimizar a conversa, os interlocutores fazem uso intensivo destes recursos da língua escrita a fim de reproduzir o mais fielmente possível suas emoções e seus pensamentos, como numa tentativa de superar as limitações da comunicação à distância. E os chats são alguns dos espaços de conversas online mais utilizados. São espaços construídos a partir da Internet, com o objetivo de reunir usuários em torno de assuntos de comum interesse (MAIORINO, 2002, p. 29). Os chats associados ao FaceBook, por exemplo, têm se constituído alternativas interessantes para os que apreciem este tipo de interação. A escrita e a reflexão acerca de si na rede A rapidez e a praticidade da comunicação mediada pelo computador levaram as pessoas a usarem frequentemente a escrita a fim de se comunicar. Ela tem se estendido não apenas à troca de informações com um interlocutor tal como acontece nos chats ou Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 6

nos sites de relacionamento, mas também à auto exposição, à escrita acerca de si como ocorre nos blogs, o que tem alcançado proporções nunca antes dimensionadas. Os usuários das redes sociais tendem a se expor frequentemente. Expõe-se pensamentos, sentimentos, experiências de vida, expõe-se até o prato bonito que foi servido na mesa do restaurante. Em cada um destes gestos se percebe a necessidade de tornar público as experiências pessoais, mesmo as mais corriqueiras. O privado tem se tornado cada vez mais público e isto não seria só mais uma manifestação da tendência pós-moderna de proporcionar a cada um os seus 15 minutos de fama, ou uma variação simplificada do Grande Irmão ou Big Brother. Como afirma Bauman (2001, p. 49): Não é mais verdade que o público tente colonizar o privado. O que se dá é o contrário: é o privado que coloniza o espaço público [...] o espaço público é onde se faz a confissão dos segredos e intimidades privadas. Trata-se também de uma necessidade de refletir sobre si, de elaborar e reelaborar conteúdos internos, identificando e retocando a auto imagem, escrevendo e olhando depois, como num espelho, para se reconhecer. Escrevese para ver o que os outros dirão, escreve-se para causar, para receber o feedback, escreve-se mesmo já com a expectativa de receber determinados comentários, seja de afago, seja de repulsa, seja de concordância seja de discordância. Através da escrita nas redes sociais, passamos a enxergar melhor o que se passa com nossos contatos, pois eles estão frequentemente postando comentários, revelando suas disposições de humor, suas atitudes, seus afazeres, como num diário no qual se conversa consigo, compreendendo-se melhor, só que desta vez em público. Esta auto expressão, portanto, constitui-se um exercício de identificação, um exercício no qual o outro ocupa lugar fundamental, pois é aquele que nos confirma, fazendo-nos enxergar a nós próprios por prismas diferentes, descobrindo e construindo nuances, tecendo maneiras de ser, de expressar, de reagir, de acolher ou repudiar, as quais não costumávamos perceber. Nicolaci-da-Costa (1998, p. 223) escreve: Ao nos revelarmos para o outro, estamos, também, nos revelando para nós mesmos. E, ao observarmos, nesse outro, as reações àquilo que revelamos ser, somos informados do quanto vale aquilo que somos. A expressão de si talvez seja um dos pontos marcantes das influências da informática sobre o íntimo. A internet oferece diversas ferramentas que Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 7

possibilitam ao usuário deparar-se consigo, olhar-se através de vários ângulos. Para Carvalho (2000, p. 131): Essa interação entre humanos e computadores resulta em uma produção de subjetividade, que é multiplicidade por excelência, emerge como indivíduo e como coletivo, expressa-se no humano e na máquina. De acordo com Nicolaci-da- Costa (2002, p.193), há uma estreita relação entre tecnologia e subjetivação: [...] embora seja fácil detectar que novas tecnologias têm o poder de alterar nossos hábitos e nossas formas de agir, é bem mais difícil registrar que algumas tecnologias também podem alterar radicalmente nossos modos de ser (como pensamos, como percebemos e organizamos o mundo externo e interno, como nos relacionamos com os outros e com nós mesmos, como sentimos, etc). Tem-se também uma facilidade para ser sincero, pois a língua escrita, uma vez que dispensa a necessidade do olho no olho, diminui a pressão gerada pela autenticidade. As reações contam com um tempo para respirar, escolher as palavras e tentar mais facilmente dissimular emoções que talvez não passassem despercebidas num contato face a face (DINIZ, 2008). As emoções são mais susceptíveis de serem controladas quando a comunicação tem por base apenas a escrita. Os emissores de mensagem selecionam e expressam comportamentos comunicativos avaliados como mais desejáveis para conseguir metas sociais, e isto pode ser útil na hora de expressar tanto desagrados quanto contentamentos. Esta facilidade, se por um lado dá mais coragem para expressar-se com aqueles que fazem parte do círculo de amigos conhecidos, por outro encoraja ainda mais os usuários que optam pelo anonimato. Segundo Diniz (2008), o anonimato possui implicações como o sentimento de liberdade com relação à auto expressão. Longe dos olhos do outro, pode-se mostrar nuances que não se mostraria de outra forma com a mesma facilidade. De acordo com Nicolaci-da-Costa (1998, p. 229) no mundo virtual, onde podemos ser anônimos e nos locomover de um lado para o outro, com facilidade e rapidez, em busca daqueles com quem possamos entrar em sintonia, tudo se torna mais fácil. Anônimos podem se sentir mais livres para agir de forma genuína sem se preocupar tanto com o que os Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 8

outros vão pensar. Se ocorrer um problema sempre haverá como fechar uma janela ou excluir um contato. A comunicação ocorrida no ambiente virtual permite ainda a vivência de papéis no sentido de atuar, revestir-se de uma atitude, de modos, de comportamentos não usuais. De acordo com Dias e De La Taille (2004, p. 191): A proteção do anonimato oferecida por este tipo de comunicação permite ainda a experimentação de papéis e a realização virtual de fantasias que não seriam admissíveis ou possíveis para a maioria das pessoas na vida real [...]. Um arquiteto pode agir como uma colegial, uma idosa como um jovem escoteiro, um adolescente como um homem de 40 anos. Envolvido pelo ambiente virtual, o internauta pode dar asas à imaginação, criar personagens que lhe pareçam interessantes e vivenciá-los de tal forma que para quem está do outro lado pareça autêntico, sendo os perfis fakes, nestes casos, frequentemente utilizados. Considerações finais Interessante é perceber que, se por um lado as redes sociais aproximam, por outro afastam. Parece que tudo depende do referencial. Tomemos por exemplo uma cena muito comum nos dias de hoje: um grupo de amigos reunidos num bar, sendo que cada um possui em mãos o seu celular e interage nas redes sociais. Eles alternam sua atenção, portanto, entre os amigos que estão presentes à mesa e os amigos que estão conectados pela internet. Num primeiro olhar, parece fácil perceber que esta tecnologia se por um lado ajuda a aproximar os que estão distantes, ajuda a afastar os que estão próximos. É claro que isto depende não apenas da ferramenta em si, mas do uso que se faz dela, daí a necessidade de educar para a sua adequada utilização. Da mesma forma que não se deve deixar que o celular atrapalhe uma reunião em um auditório, deve-se atentar para os incômodos que o uso inconveniente do WhatsApp ou do FaceBook, por exemplo, podem provocar nos encontros sociais. Trata-se, portanto, de bom senso. Mas mesmo isto dependeria das disposições dos próprios usuários, não se pode considerar tais situações como sendo necessariamente incômodas, pois pode ser que os presentes não se importem, de maneira nenhuma, com esta divisão da atenção e convivam Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 9

harmoniosamente com seus contatos online e seus contatos off-line. Tendência comportamental do mundo pós moderno? De qualquer forma, vemos claramente que as novas tecnologias têm intensificado o hábito de escrever de maneira geral, e de escrever sobre si de maneira particular. Observa-se mesmo uma certa preferência pela escrita. No caso do WhatsApp, por exemplo, em meu círculo de amizades tenho percebido uma tendência a escrever aquilo que se poderia comunicar oralmente em uma ligação telefônica. O advento dos celulares intensificou a utilização da escrita para a comunicação móvel a qual passou a ser ainda mais utilizada com o surgimento de aplicativos como o WhatsApp, os quais tornaram esta opção mais interessante ao disponibilizar uma interface mais completa ao disponibilizar recursos audiovisuais e maior interatividade aos seus usuários. Segundo Matos-Silva, Abreu e Nicolaci-da-Costa (2012, p. 219): A possibilidade de publicar textos, fotos, vídeos e outros tipos de conteúdo, gerou ambientes que favorecem a união de pessoas. Enfim, com esta intensificação da utilização da escrita no cotidiano dos usuários da rede, pode-se esperar um exercício da habilidade de se expressar, de forma bastante peculiar, e da construção de sujeitos que se pensam, solicitam-se mutuamente, retroalimentam-se e reforçam os laços de sociabilidade. Referências ARAÚJO, Y. R. G. Telepresença: interação e interfaces. São Paulo: EDUC/Fapesp, 2005. BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. CARVALHO, P. S. Interação entre humanos e computadores: uma introdução. São Paulo: EDUC, 2000. CASTELLS, M. A galáxia da Internet: Reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.. A sociedade em rede. 9a ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006. Web-Revista SOCIODIALETO: Bach., Linc., Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 5, nº 13, jul. 2014 10

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