EMPREGABILIDADE DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: ensaio crítico sobre a lei de cotas



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Transcrição:

EMPREGABILIDADE DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: ensaio crítico sobre a lei de cotas Francine de Souza Dias 1 Jaqueline Lopes 2 Tatiana Maria Fonseca 3 Resumo: Este artigo tem por objetivo primeiro apresentar o desenvolvimento dos serviços, projetos e políticas em geral, que deram forma à legislação atual sobre o direito à inclusão social da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, para então observar, de forma crítica, através da análise da realidade na garantia desse direito, o seu acesso à cidadania e o estudo da lei de cotas. Palavras chave: Deficiência. Empregabilidade. Cotas. Abstract: Firstly this article aims to present the development of services, projects and policies in general that based the current legislation on the right of social inclusion of people with disabilities in the labor market, and then observe critically, through the analysis of reality in securing this right, their access to citizenship and the study of the quota law. Keywords: Deficiency. Employment. Quotas. 1 Estudante de Pós-Graduação. Associação Fluminense de Amparo aos Cegos (AFAC).Email:ffrancinedias@yahoo.com.br 2 Estudante de Pós-Graduação. Associação de Pais e Amigos dos Deficientes da Audição (APADA). 3 Mestre. Associação de Proteção e Amparo Social (APAS).

1 INTRODUÇÃO Os documentos criados para ampliar os direitos das Pessoas com Deficiência (PcD) de modo que seu acesso aos serviços e espaços públicos sejam facilitados e respeitados, tanto no que se refere à equipamentos e espaço acessível quanto sobre os recursos humanos qualificados, não são práticas recentes, embora recebam maior atenção da mídia e do público em geral, nos dias atuais. A legislação brasileira é reforçada também através das convenções e demais documentos e pactos internacionais que o Brasil ratifica, haja vista sua importância na garantia dos Direitos Humanos em todo o mundo. É fundamental o entendimento de que a discussão da empregabilidade da PcD está ligada diretamente a um conjunto de garantias que devem ser respeitadas e viabilizadas para que, de fato, seja possível alcançar este direito de forma digna e real para o segmento. Tornar este processo algo tangível e funcional para ambas as partes é dever de todos. Se existe a força da lei e as ações fiscalizadoras estão começando a acontecer nesse sentido, seja por meio do Ministério Púbico (MP), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e dos conselhos de direito, a conscientização da sociedade é fundamental para a consolidação dessas ações. Portanto, há de se fazer um trabalho que alcance a estrutura da sociedade e do mercado, uma verdadeira mudança nos valores desses atores sociais. 2 A LEI DE COTAS Existem inúmeras legislações que tratam da reserva de vagas por cota para PcD no mercado de trabalho. Entre elas, pode-se citar como as principais: a- Lei N 8.112, de 11 de Dezembro de 1990 (Reserva de Vagas no serviço Público) b- Lei N 8.213, de 24 de Julho de 1991 (Cota e Reabilitação Profissional)

c- Decreto N 3.048, de 06 de Maio de 1999 (Cumprimento da Cota e Reabilitação Profissional) d- Instrução Normativa N 20, de 26 de Janeiro de 2001 do MTE.(Orienta a fiscalização das condições de trabalho no âmbito dos programas de aprendizagem) e- Portaria MPS N 142, de 11 de Abril de 2007 DOU de 12/04/2007 (Definição anual do valor das multas em caso de descumprimento da lei de cotas) f- Portaria N 1199, de 28 de Outubro de 2003 (Percentual das multas pelo descumprimento da reserva de cotas pela empresa) g- Portaria N 4.017, de 27 de Novembro de 1995 (Redução da Jornada de Trabalho) Os documentos supracitados são reforçados junto a dezenas de leis que tratam do assunto de forma geral, conforme exposto anteriormente. O quantitativo da reserva de vagas é estabelecido da seguinte forma: de 100 a 200 empregados: 2%. de 201 a 500: 3%. de 501 a 1000: 4%. de 1001 em diante: 5% (BRASIL, 1991) No caso da reserva de vagas no serviço público a regra existe independente do número de vagas abertas, qual seja 20% do total das vagas oferecidas no concurso. (BRASIL, 1991). O cálculo é exercido sobre o número total de colaboradores da organização, caso resulte em número fracionado, deverá ser aproximado ao número acima. Neste caso, tanto funcionários terceirizados quanto os aprendizes, não entrarão na contagem, isso não exclui a possibilidade da empresa contratar aprendizes com deficiência ou mesmo os terceirizados, caso as competências do candidato sejam compatíveis com o cargo. A lei pode ser cumprida de duas maneiras: com o preenchimento do quadro por funcionários com deficiência ou com profissionais reabilitados pelo programa de reabilitação profissional. Apesar de a informação estar destacada claramente na legislação, muitas empresas desconhecem essa possibilidade.

Essa flexibilização na contratação de PcD é alvo de muita crítica pelo segmento, haja vista que dezenas de organizações optam por contratar profissionais reabilitados que, na maior parte das vezes, sofreram lesão leve devido os riscos ou esforços realizados decorrentes de sua função. As leis estabelecem as definições de deficiência, conforme os critérios e as limitações físicas e/ou sensoriais. Ainda assim, existe um amplo contingente de pessoas que não se enquadram nessas características, sendo contratadas pela reserva de vagas. Os casos de maior polêmica são os monoculares (pessoas com lesão parcial ou total em um olho, fazendo uso ou não de correção óptica, que não possuem perda na acuidade visual suficiente para ser reconhecida pela lei como deficiência) e pessoas com perda auditiva bilateral (ou apenas perda unilateral) inferior aos 41dB conforme determina a lei. Vejamos as definições conforme a redação oficial: Art. 5 o 1 o Considera-se, para os efeitos deste Decreto: I - pessoa portadora de deficiência, além daquelas previstas na Lei n o 10.690, de 16 de junho de 2003, a que possui limitação ou incapacidade para o desempenho de atividade e se enquadra nas seguintes categorias: b) deficiência auditiva: perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (db) ou mais, aferida por audiograma nas freqüências de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz; c) deficiência visual: cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60 o ; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores. (BRASIL, 2004) Esses casos ocorrem tanto no âmbito público quanto no privado. Nos casos de concurso público, alguns candidatos sem deficiência, de acordo com os termos da lei, foram aprovados nos exames de conhecimento geral e específicos e, ao realizarem os exames de saúde, não foram classificados por não se tratar de PcD, portanto, não fazendo jus ao preenchimento do cargo. Após divulgação dos resultados, os mesmos entraram com recurso e posteriormente, com mandado de segurança; após intervenção da justiça, foram autorizados a ocupar os cargos em questão. Essas decisões são discutidas em todo o país, pois sabese que, podendo contratar um monocular, a empresa não deverá optar por um candidato

cego ou com baixa-visão, ou mesmo por um surdo, havendo a possibilidade de preencher o cargo por uma pessoa com perda auditiva leve (fora dos critérios legais). Ressalta-se ainda que a pessoa sem deficiência que tem o cargo garantido por meio de processo legal, ocupa o cargo de todas as outras que concorrem à vaga por meio do regime de cotas, não somente daquela que tem a mesma deficiência nos termos da lei. Por outro lado, esses cidadãos que não são PcD têm se organizado no sentido de lutar pela garantia de tratamento diferenciado, pela justificativa de que também não conseguem colocação no mercado de trabalho, se concorrendo aos cargos juntamente com pessoas que não possuem nenhuma lesão/limitação física ou sensorial. Este é um debate polêmico que se estenderá pelos espaços de participação popular por um longo período, a sociedade deverá aguardar (ou lutar) pelas prerrogativas que julgam corretas ou melhores para todos. Vale ressaltar que a posição do Supremo Tribunal Federal (STF), até o presente momento, é a favor deste tipo de contratação. As leis de cotas foram criadas no início da década de 90, apesar de ter completado 20 anos, seu conteúdo nunca esteve tão em voga como na atualidade. Isto se deve à organização e legitimação do movimento de PcD que ao longo desses vinte anos, finalmente conquistaram visibilidade por parte de toda a sociedade. Para concorrer aos processos seletivos com vistas ao cumprimento das vagas reservadas pelo sistema de cotas, é imprescindível que o candidato seja diagnosticado como pessoa com deficiência ou tenha passado pelo processo de reabilitação profissional. A definição dos termos deficiência, deficiência visual e deficiência auditiva, foi destacada no item anterior, existe ainda a deficiência física, mental (intelectual) e múltipla, nas definições a seguir: a) deficiência física: alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções; b) deficiência mental: funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como: comunicação; cuidado pessoal; habilidades sociais; utilização dos recursos da comunidade; saúde e segurança; habilidades acadêmicas; lazer; e trabalho;

c) deficiência múltipla - associação de duas ou mais deficiências; (BRASIL, 2004) Para que uma empresa realize o cumprimento da lei da forma correta e não sofra as sansões relativas ao seu descumprimento, os funcionários deverão ser contratados dentro dessas definições, comprovada por laudo médico com número do CID Código Internacional de Doenças. O Código em vigor é o CID 10. Nem todo médico estará apto a fornecer este documento, pois o tipo de deficiência pode exigir conhecimento especializado e exames diferenciados, que deverão ser feitos e avaliados por um médico especialista. Mister consignar que o movimento dos profissionais da rede social ligados ao trabalho com pessoas com deficiência, luta pela adoção do CIF Código Internacional de Funcionalidade, pois acredita-se que a utilização do CID reforça a discriminação quando se trata de empregabilidade ou educação, por exemplo, haja vista o foco na deficiência, no diagnóstico, não nas competências, habilidades e capacidades do indivíduo. Voltando ao laudo médico, este deve ser elaborado de forma detalhada e legível para que não deixe dúvidas sobre a existência da deficiência dentro das normas assinaladas. O médico é um profissional de grande importância na garantia deste direito. A reabilitação Profissional é o processo pelo qual trabalhadores beneficiários, afastados por incapacidade, têm acesso aos meios e recursos para se readaptarem profissional e socialmente visando o retorno ao mercado de trabalho. De acordo com a legislação vigente, a reabilitação profissional compreende: o fornecimento de aparelho de prótese, órtese e instrumentos de auxílio para locomoção quando a perda ou redução da capacidade funcional puder ser atenuada por seu uso e dos equipamentos necessários à habilitação e reabilitação social e profissional; a reparação ou a substituição dos aparelhos mencionados no inciso anterior, desgastados pelo uso normal ou por ocorrência estranha à vontade do beneficiário; o transporte do acidentado do trabalho, quando necessário. (BRASIL, 1991) Este processo é acompanhado pelo setor de recursos humanos que, muitas vezes, tenta estabelecer parcerias com o INSS e com organizações de atendimento especializado a PcD, com o objetivo de ampliar sua rede de contatos e ter acesso a um número maior de candidatos elegíveis.

A fiscalização sobre o cumprimento das leis de cotas é exercida pelo MTE e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). A forma como esse processo ocorre gera bastante discussão por conta da necessidade de denúncia, por parte da sociedade, das empresas que estão em situação irregular no que tange o assunto, para que de fato, ela aconteça na prática. Os departamentos responsáveis pela fiscalização são as Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego (SRTE), a Procuradoria-Geral, com sede em Brasília (DF) e as Procuradorias Regionais do Trabalho. Além de fiscalizar os órgãos supracitados também tem o papel de trabalhar a conscientização e o combate à discriminação. O não cumprimento da lei prevê a sansão da organização, através da estipulação de multa. Os valores são calculados na seguinte proporção: I - para empresas com cem a duzentos empregados, multiplicar-se-á o número de trabalhadores portadores de deficiência ou beneficiários reabilitados que deixaram de ser contratados pelo valor mínimo legal, acrescido de zero a vinte por cento; II - para empresas com duzentos e um a quinhentos empregados, multiplicar-se-á o número de trabalhadores portadores de deficiência ou beneficiários reabilitados que deixaram de ser contratados pelo valor mínimo legal, acrescido de vinte a trinta por cento; III - para empresas com quinhentos e um a mil empregados, multiplicar-se-á o número de trabalhadores portadores de deficiência ou beneficiários reabilitados que deixaram de ser contratados pelo valor mínimo legal, acrescido de trinta a quarenta por cento; IV - para empresas com mais de mil empregados, multiplicar-se-á o número de trabalhadores portadores de deficiência ou beneficiários reabilitados que deixaram de ser contratados pelo valor mínimo legal, acrescido de quarenta a cinqüenta por cento. (BRASIL, 2003) Foram estabelecidos valores: mínimo e máximo para aplicação das multas. Em 2009 o teto era R$ 132.916,84. Em 2011, foi atualizado para mínimo de R$1.523,57 e máximo de R$152.355,73, de acordo com a Portaria Interministerial MPS/MF nº 568 publicada no Diário Oficial da União de 04/01/2011. Apesar dos valores estabelecidos pela legislação no caso de descumprimento da lei, o que se espera das organizações é a percepção de que o ato de incluir uma PcD no seu quadro profissional não pode (nem deve) ser representado através desses números, mas que seja concebido com um passo na efetivação de um direito social, como um ato de

justiça que não representa uma punição para a empresa, mas uma possibilidade de rever seus conceitos sobre os recursos humanos responsáveis pelo seu progresso. 3 CONCLUSÃO Observa-se que a legislação de cotas, embora seja um documento de extrema importância na garantia dos direitos das PcD, não tem sido visto com bons olhos por parte das empresas, além de interpretado de forma errônea. O Brasil reforça uma cultura onde a legislação faz-se necessária para que o respeito entre os cidadãos se torne realidade, buscando equiparar as condições de acesso e oportunidades, embora existam constantes demonstrações de que a lei nem sempre é funcional nesse aspecto. A mudança na cultura nacional é um dos principais pontos a se repensar, a sensibilização social se faz urgente para que os cidadãos percebam o direito deste segmento como um benefício para todos, não para minorias, conforme reprodução da mídia e do poder público. É necessário que a população e, consequentemente, as organizações de qualquer natureza, percebam na legislação, na inclusão social da PcD no seu quadro funcional, uma possibilidade de aprendizado, de exercício da cidadania e da justiça social e, sobretudo, como um crescimento em todos os aspectos sociais e financeiros, pois a adoção de medidas que facilitem seu acesso não podem ser vistas como prejuízos, mas como oportunidades de crescimento do profissional e organizacional. Desprender-se do diagnóstico e da valorização da deficiência é o primeiro passo rumo ao sucesso na contratação desses candidatos. Mas para compreender este universo é preciso buscar as informações sobre o assunto e, junto aos gestores, aos funcionários da organização e aos profissionais especializados, as soluções para enfrentamento deste constante desafio. REFERÊNCIAS

BRASIL. Congresso Nacional. Lei N 8.112, de 11 de Dezembro de 1990. Brasília-DF, 1990.. Congresso Nacional. Lei N 8.213, de 24 de Julho de 1991. Brasília-DF, 1991.. Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado. Portaria N 4.017, de 27 de Novembro de 1995. Brasília-DF, 1995.. Ministério da Previdência Social. Portaria MPS N 142, de 11 de Abril de 2007. Brasília-DF, 2007.. Ministério do Trabalho e Emprego. Instrução Normativa N 20, de 26 de Janeiro de 2001. Brasília-DF, 2001.. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria N 1199, de 28 de Outubro de 2003. Brasília-DF, 2003.. Ministério do Trabalho e Emprego. A inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. 2 ed. Brasília-DF, 2007.. Presidência da República. Decreto N 3.048, de 06 de Maio de 1999. Brasília-DF, 1999.. Presidência da República. Decreto Nº 5.296 de 02 de Dezembro de 2004. Brasília- DF, 2004. DIAS, F. Empregabilidade da Pessoa com Deficiência Desafios para o Mercado Contemporâneo. Monografia de Especialização do Curso de Gestão Pública, Universidade Candido Mendes, IAVM. Rio de Janeiro, 2011. FONSECA, T.M.A. Pessoas com Deficiência Mídia, Visibilidade e Preconceito. In: Mídia, Questão Social e Serviço Social. São Paulo: Ed. Cortez, 2009.