INTERVENÇÃO DO GOVERNADOR DO BANCO DE PORTUGAL NA ABERTURA DO 16 ENCONTRO DE BANCOS CENTRAIS DOS PALOP, DE PORTUGAL E DE TIMOR-LESTE

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Transcrição:

1 INTERVENÇÃO DO GOVERNADOR DO BANCO DE PORTUGAL NA ABERTURA DO 16 ENCONTRO DE BANCOS CENTRAIS DOS PALOP, DE PORTUGAL E DE TIMOR-LESTE 12 de Setembro de 2006 Senhores Embaixadores Senhores Governadores Minhas Senhoras e meus Senhores Agradeço a presença de todos neste 16 Encontro de Bancos Centrais dos PALOP e Timor-leste. Uma vez mais damos continuidade a uma tradição que tem reforçado os laços de cooperação entre as nossas instituições. As acções desenvolvidas ao longo de 2006 pelos nossos bancos centrais e autoridades monetárias reflectem de forma directa as necessidades e os desafios decorrentes da consolidação de novas áreas e processos de actuação em cada uma das instituições, nomeadamente no que se refere ao desenvolvimento dos mercados monetários e cambiais, ao aprofundamento da actividade de supervisão do sistema bancário e ao reforço das suas estruturas humanas e organizativas, de forma a poderem contribuir activamente para o desenvolvimento dos respectivos sistemas financeiros.

2 A cooperação durante o ano em curso abrangeu no essencial todas as principais áreas de actuação que caracterizam a actividade dos bancos centrais, tendo envolvido, no nosso caso, praticamente todos os principais Departamentos do Banco. Naturalmente que se regista uma significativa continuidade dos projectos iniciados em anos anteriores, dada a natureza complexa e evolutiva dos desafios com que estas instituições são confrontadas. À semelhança do ano anterior, verificou-se um acréscimo do peso relativo das acções de natureza regional e multilateral, consubstanciadas nomeadamente em Encontros e Seminários, cuja ênfase consiste essencialmente na troca de informações e experiências e na reflexão conjunta sobre temas que, embora possam apresentar expressões diferentes conforme a dimensão e o grau de desenvolvimento de cada banco central, evidenciam a similitude de propósitos e a analogia dos objectivos que presidem à actividade das instituições participantes. Esta circunstância reflecte a maturidade já atingida pela generalidade das nossas instituições, que implica, por sua vez, que todos tenhamos a ganhar com a experiência de outras autoridades monetárias. Durante 2007 continuaremos os esforços de cooperação que têm sido desenvolvidos nas áreas já referidas, através de missões técnicas, estágios de formação e seminários temáticos, nomeadamente nos domínios dos Sistemas de Informação e de Emissão e Tesouraria.

3 2. Como habitualmente, este Encontro de Lisboa ocorre nas vésperas da reunião anual do FMI e do Banco Mundial, o que proporciona que na reunião de trabalho das nossas Delegações, ontem ocorrida, se analisem os problemas que constam neste momento da agenda das duas Instituições internacionais. Este ano as atenções concentram-se nos riscos que ameaçam a evolução da economia mundial e na reforma estratégica do FMI, nomeadamente o início da revisão das quotas dos países membros e a concretização do novo processo de monitorização multilateral das políticas macroeconómicas e cambiais responsáveis pelos grandes desequilíbrios mundiais. Apesar dos vários tipos de riscos que tem enfrentado, a economia mundial tem continuado a apresentar em 2006 um crescimento de cerca de 5 por cento, semelhante ao alcançado nos últimos três anos. As condições monetárias e financeiras têm permanecido favoráveis ao crescimento, apesar do processo de normalização das taxas de juro levada a cabo pela generalidade das autoridades monetárias e da revisão dos prémios de risco, que causou alguma volatilidade nos mercados financeiros no segundo trimestre. As taxas de juro de médio e longo prazo, bem como os spreads das taxas do crédito a empresas ou a países emergentes, continuam em geral em níveis reduzidos. Um aspecto importante a sublinhar é a circunstância do crescimento ter sido mais generalizado e bem distribuído, uma vez que a Europa e o Japão têm vindo a apresentar um maior ritmo de crescimento que permitiu compensar a

4 desaceleração da economia norte-americana no segundo trimestre. Verificou-se, assim, a plena confirmação do cenário central previsto pelo Banco Central Europeu relativamente à economia da área do euro. A normalização das taxas de juro a que temos procedido desde Dezembro passado não impediu a recuperação económica em curso. Para além dos resultados do último trimestre revelarem uma assinalável dinâmica de crescimento, é importante sublinhar também que em resultado de recentes revisões estatísticas do crescimento passado, o aumento do Rendimento por habitante foi em média igual nos últimos dez anos na União Europeia e nos Estados Unidos. Confirma-se também que o nível e o crescimento da produtividade por hora trabalhada têm sido superiores em vários países europeus aos verificados na economia norte-americana. Finalmente, a taxa de crescimento do emprego nos últimos dez anos tem também sido superior na Europa. Recordo estes resultados porque eles deveriam fazer reflectir os que apressadamente têm enunciado conclusões definitivas sobre as chamadas ineficiências europeias e a suposta prevalência do paradigma americano em todos os aspectos da vida económica e social. A Europa realizou nos últimos anos bastantes reformas estruturais e, para além de manter o essencial do seu modelo social, começa a ver alguns resultados positivos no plano do crescimento económico, apesar de as enormes incertezas da actual situação internacional não nos permitirem ter garantias seguras sobre a evolução futura.

5 Na verdade, é possível que a economia mundial conheça alguma desaceleração no próximo ano numa dimensão que é difícil de prever e sobre a qual existem, como sempre, posições muito diferentes. A perspectiva mais consensual até ao momento é a de que a redução do crescimento será muito ligeira e terá efeitos benéficos sobre a evolução dos desequilíbrios económicos globais. Tudo, porém, está dependente da extensão da queda do sector imobiliário nos Estados Unidos e da dimensão dos seus efeitos na economia americana. É conhecido como o empolamento dos preços nos mercados de activos tem passado sucessivamente das acções para as obrigações e, finalmente, para o imobiliário, que, de acordo com Robert Shiller, o inventor da expressão «exuberância irracional», poderia vir a «ser a maior bolha especulativa da história americana». A quebra da produção e dos preços ameaça vir a ser a maior em muitas décadas com um efeito-riqueza negativo sobre o comportamento do consumo nos Estados Unidos. Os analistas dividem-se, porém, sobre a dimensão desse efeito-riqueza e sobre o seu eventual efeito de contágio ao resto da economia americana. Existe uma minoria de economistas que prevê mesmo uma recessão no próximo ano e outros temem que ao problema da quebra do imobiliário se possa juntar um ajustamento abrupto nos mercados cambiais associado aos desequilíbrios externos globais. A propósito de o défice americano requerer cerca de 800 mil milhões de dólares de financiamento e absorver mais de 70 % da poupança mundial, Kenneth Rogoff, ex-economista chefe do

6 FMI, referiu recentemente a necessidade de «medidas difíceis se se pretender evitar um colapso económico global». A manutenção dos denominados desequilíbrios globais traduz-se, como é bem conhecido, num enorme défice externo norte-americano e numa muito substancial acumulação de reservas cambiais por diversos países, nomeadamente os grandes exportadores de petróleo e a China. Um dos mais temidos efeitos que esses desequilíbrios poderiam provocar uma quebra abrupta do valor cambial do dólar não se verificou até ao presente e, pelo contrário, temos assistido a uma evolução gradual nos mercados cambiais. Por outro lado, tem sido aparentemente fácil assegurar o financiamento do défice americano. Na verdade, face à profundidade e eficiência dos mercados financeiros internacionais, que a globalização tornou possível, o financiamento de fortes défices tornou-se simples, o que possibilita que a sua correcção possa ser bastante gradual. Esta é, aliás, a base de uma visão benigna dos actuais desequilíbrios, a que aponta para a existência de um espontâneo excesso de poupança sobre o investimento no resto do mundo e a sua aplicação em activos americanos, por razões de segurança ou maior retorno. Este afluxo de capitais sustentaria o dólar em valores elevados, que explicariam, por sua vez, o défice da balança corrente. Os problemas com esta interpretação decorrem sobretudo do facto de nos últimos anos o financiamento da balança americana ter sido assegurado de forma significativa por autoridades monetárias estrangeiras e não apenas como consequência do

7 sector privado externo colocar as suas poupanças nos Estados Unidos. Após o papel importante desempenhado pelas autoridades monetárias asiáticas temos agora o contributo de vários países produtores de petróleo que acumularam, em média, excedentes externos de cerca de 18% do respectivo PIB. A correcção ordenada e gradual dos desequilíbrios existentes passa, assim, necessariamente por um aumento da poupança nos Estados Unidos e uma desaceleração do seu crescimento no imediato; em segundo lugar, por uma maior flexibilidade cambial nos países asiáticos e nos países produtores de petróleo e, finalmente, por uma aumento das despesas de investimento destes últimos. A Europa, por sua vez, está agora a cumprir a parte que lhe competia no indispensável ajustamento mundial ao acelerar o seu crescimento assente também na dinâmica da sua procura interna. A Europa, que não tem responsabilidade no acumular dos desequilíbrios mundiais, dada a sua permanente preocupação com a estabilidade e os equilíbrios macroeconómicos, está agora a contribuir para a sua gradual resolução. No imediato, também os países emergentes têm contribuído para compensar a desaceleração da economia americana, apresentando taxas de crescimento muito assinaláveis, nomeadamente nos casos da China, da Índia e de vários países produtores de petróleo que têm beneficiado dos elevados preços do crude. Igualmente em África tem-se verificado uma sustentação da actividade económica claramente acima da tendência histórica, o que reflecte na

8 generalidade destes países os progressos alcançados nas políticas macroeconómicas e estruturais. Importa saudar como muito positivo que isso também se aplica aos países africanos aqui presentes, que apresentam taxas de crescimento estimadas para este ano entre 4 a 15%, consoante os casos, ao mesmo tempo que têm alcançado sucesso no controle da inflação, revelando, assim, assinaláveis progressos na condução das suas políticas macroeconómicas e na realização de algumas reformas estruturais. No conjunto da África Sub-Saariana o crescimento irá pelo terceiro ano consecutivo exceder 5%, prevendo-se mesmo que esse valor seja ainda mais acentuado em 2007, graças aos acréscimos previstos da produção de petróleo em Angola e na Guiné Equatorial. O aumento generalizado dos preços das matérias primas (petróleo, metais, café) também tem beneficiado significativamente algumas destas economias, embora, para outros países africanos, nomeadamente aqueles cujos principais bens de exportação são o algodão ou o cacau, a subida do preço de importação do petróleo seja prevalecente e, portanto, a evolução dos seus termos de troca seja de sentido claramente negativo. Para os países que enfrentam esta circunstância, o reforço dos fluxos de ajuda internacional são de fundamental importância para contrabalançar os efeitos adversos da deterioração dos seus termos de troca. Nesta perspectiva seria também importante que a recentemente criada Facilidade de Resposta a Choques

9 para países de baixo rendimento, no âmbito do FMI, tivesse maior flexibilidade e automatismo de utilização, como acontecia com a antiga Facilidade Compensatória (CFF). A referida subida do preço do petróleo e, em geral, das matérias-primas, bem como a sua manutenção prolongada em patamares elevados, se tem efeitos positivos para alguns países, não pode deixar de constituir um elemento de preocupação, na medida em que condiciona de forma relevante a evolução e o comportamento da economia mundial. No entanto, apesar destas subidas, a inflação temse mantido razoavelmente contida, quer nas economias mais desenvolvidas quer na generalidade das economias emergentes e nas de baixo rendimento, o que é indissociável da credibilidade ganha pelos bancos centrais nas últimas duas décadas e dos efeitos da concorrência internacional potenciada pela globalização e pelo contributo da entrada no comércio internacional de produções industriais com origem em países de mais baixos custos de produção. A recente desaceleração do crescimento também contribuiu para uma redução dos preços das matérias-primas e para aliviar as tensões e reduzir o risco de efeitos de segunda ordem na subida da inflação. Como referi anteriormente, a principal incógnita da actual situação refere-se ao grau de desaceleração que poderá sofrer a economia americana e seu possível efeito na economia mundial. É no contexto desta incerteza que se compreende a recente referência da OCDE à necessidade de a

10 normalização das taxas de juro na Europa continuar a ser gradual. Na verdade, penso que o essencial é que a política monetária continue vigilante, mas dependente dos dados concretos da evolução da economia europeia e da análise dos riscos presentes na actual conjuntura. Não devemos, pois, especular com base em cenários hipotéticos para o futuro mais próximo do ano que se aproxima, tanto mais que não existe qualquer compromisso antecipado com uma trajectória precisa para a evolução das taxas de juro. 3. Como é natural para uma pequena economia aberta como é a portuguesa, a recuperação europeia tem tido efeitos muito positivos na nossa evolução económica este ano. Em particular, o comportamento das exportações conduziu a um crescimento no segundo trimestre acima do esperado. Este desenvolvimento veio confirmar o fundamento da previsão que o Banco de Portugal divulgou em Julho de um crescimento anual de 1,2%, contra a opinião dos que acharam esse número demasiado optimista. É possível que a dinâmica do segundo trimestre venha a justificar uma nova revisão em alta das nossas previsões. Devemos, no entanto, aguardar prudentemente por mais informação, nomeadamente a relativa a Agosto, um mês de habitual quebra de actividade, antes de procedermos a qualquer revisão, tanto mais que o crescimento de 0,9% do

11 último trimestre excede apenas em 0,2 pontos percentuais o crescimento que estava implícito para esse trimestre nas nossas previsões anuais de 1,2%. Um aspecto importante do padrão de crescimento verificado é o mesmo resultar apenas das exportações líquidas ao mesmo tempo que se reduzia a procura interna. Isto significa a concretização de um ajustamento inevitável após anos de crescimento assente no endividamento crescente dos agentes económicos, incluindo o Estado. Não poderíamos, na verdade, continuar por um caminho que fez passar o país de uma situação credora internacional em cerca de 7 mil milhões de euros em 1996 para uma posição de dívida externa de cerca de 65 mil milhões no final do ano passado. A fase actual de ajustamento da despesa interna tem o efeito de conter a expansão do endividamento e de pressionar as empresas para se reestruturarem e procurarem orientar as suas produções em maior escala para os mercados externos. A quebra do consumo público em termos reais prenuncia também que parece agora provável que o Estado consiga cumprir o objectivo definido para o défice orçamental, em consequência da evolução favorável das receitas, mas também do controle da despesa pública. Tratase de um desenvolvimento positivo, uma vez que o controle do défice é um importante factor de credibilidade e uma

12 condição do aumento da poupança interna e crescimento económico futuro. O caminho da recuperação sólida da economia passa essencialmente pela dinâmica das exportações e do investimento empresarial em bens e serviços transaccionáveis, dadas as limitações das despesas de investimento público e a fase inevitavelmente menos activa do investimento em habitação. Os recentes anúncios por parte de empresas estrangeiras de novos investimentos em Portugal fundamentam a expectativa de que estamos perante uma fase de alguma alteração da estrutura produtiva e da composição das exportações portuguesas. Como afirmei aqui o ano passado, «A melhor contribuição que as políticas públicas podem dar nesta fase é a de porem ordem nas contas públicas e diminuir a burocracia para libertar a força da iniciativa dos agentes económicos». As melhorias conseguidas nestes domínios são de assinalar, mas o caminho do ajustamento real necessário para vencermos os desafios da nova concorrência internacional será longo e difícil. Determinação e rigor nas políticas públicas e dinamismo das empresas são, assim, essenciais para mais rapidamente regressarmos a uma percurso de convergência com os nossos parceiros europeus. Lisboa 12 de Setembro de 2006