THE JOHNS HOPKINS UNIVERSITY SCHOOL OF MEDICINE Department of Psychiatry and Behavioral Sciences Division of Behavioral Biology Behavioral Biology Research Center, 5510 Nathan Shock Drive Johns Hopkins Bayview Medical Center, Baltimore, Maryland 21224 5 de junho de 2013 A quem interessar possa: É de meu conhecimento que o governo brasileiro está debatendo uma das questões atuais mais urgentes quanto à regulamentação de produtos de tabaco o controle de aditivos que tornam produtos de tabaco mais atraentes e de uso mais fácil, mais viciante ou mais nocivo, especialmente para jovens. À medida que cientistas, formuladores de políticas e outras partes interessadas pelo mundo todo acompanham o que se passa no Brasil, escrevo para oferecer-lhes minha perspectiva quanto à importância crítica de se abordar de maneira abrangente os aditivos em produtos de tabaco na condição de cientista que estuda questões relacionadas ao tabaco há mais de três décadas. Escrevo em meu nome e não como representante das entidades das quais sou membro, para as quais presto consultoria, ou às quais sirvo como voluntário. Para oferecer-lhes a fundamentação de minha perspectiva, sou professor adjunto de Biologia Comportamental no Departamento de Psiquiatria e Ciências Comportamentais na Faculdade de Medicina da Universidade Johns Hopkins e vice-presidente de Política de Pesquisa e Saúde na Pinney Associates. De 1980 a 1996, conduzi e liderei pesquisas sobre o tabaco e outras drogas no National Institute on Drug Abuse (NIDA). No NIDA, servi como superintendente no Laboratório de Desempenho Humano, superintendente da seção de Biologia da Dependência e Avaliação do Potencial de Abusos e superintendente da divisão de Pesquisa de Farmacologia Clínica. Também atuei com frequência como contato para o órgão americano Food and Drug Administration (FDA) em relação a produtos de tabaco e tratamentos de cessação para a dependência do tabaco. Fiz contribuições a diversos relatórios do Surgeon General dos Estados Unidos, bem como relatórios de outras agências. Atualmente, sirvo no Grupo de Estudos de Regulamentação de Tabaco (RegTab) da Organização Mundial de Saúde (OMS), que provê orientação científica para a implementação de diversos artigos do tratado internacional de tabaco, a Convenção Quadro para Controle do Tabaco (CQCT) da OMS. Fui treinado em ciência comportamental, farmacologia e outras disciplinas relevantes à compreensão de substâncias viciantes. O tabaco é a principal causa mundial de mortes que poderiam ser evitadas e o cigarro mata ao menos 200.000 pessoas ao ano no Brasil. i A nicotina, o componente da folha de tabaco usado em cigarros e outros produtos de tabaco, torna esses produtos nocivos altamente viciantes. ii Ao contrário de fabricantes da maioria dos produtos de consumo, que frequentemente conduzem pesquisas detalhadas e usam seu conhecimento para aperfeiçoar a segurança dos produtos e reduzir os riscos, fabricantes de produtos de tabaco deliberadamente os concebem de forma a facilitar seu acesso aos jovens e também a maximizar a dependência e, desta forma, sustentar o uso. iii Produtos de tabaco são sofisticados sistemas de administração de drogas altamente projetados e fabricados para 1
alcançar esses resultados, a despeito dos riscos adicionais de doença ou morte que se sucedem. iv A OMS disse em seu relatório sobre o Dia Mundial Sem Tabaco de 2006, um esforço para o qual contribuí: todo produto de tabaco é letal e viciante sob qualquer forma ou disfarce. v Aditivos introduzidos durante o processo de fabricação têm um papel fundamental na promoção da iniciação dos jovens e sustentação da dependência, fazendo com que produtos já perigosos fiquem ainda piores. vi De acordo com a publicação do Banco Mundial, Curbing the Epidemic: Governments and the Economics of Tobacco Control, é pouco provável que pessoas que evitem começar a fumar na adolescência ou quando adultos, tornem-se fumantes mais tarde, já que a maioria esmagadora de fumantes começam antes dos 25 anos, normalmente durante a infância ou adolescência. vii Empresas de tabaco estão bem cientes disso. Elas também sabem que fumar é desagradável para novos fumantes, então eles criam seus produtos de forma a garantir seu apelo a este mercado vital. viii Os documentos dessas próprias empresas demonstram o esforço considerável que os fabricantes fazem para determinar quais características terão mais chances de atrair novos consumidores e facilitarão que novos usuários tolerem a fumaça do tabaco. ix Na verdade, cada decisão relacionada à fabricação e projeto do produto é tomada após pesquisas detalhadas quanto ao impacto na experiência de consumo do usuário terem sido feitas. x Fabricantes de produtos de tabaco usam aditivos químicos para alterar o sabor e a leveza da fumaça do tabaco em maneiras que tornam esses produtos mais atraentes a fumantes jovens e iniciantes. Por exemplo, certos ingredientes e características (por exemplo, buracos de ventilação para o filtro) são usados para mascarar o sabor áspero da nicotina, produzir um sabor suave e melhorar o aroma da fumaça. xi Estes e outros aditivos que provocam impactos nas características sensoriais de produtos de tabaco em última análise aumentam o risco de se causar dependência e doenças ao encorajar a iniciação no uso e uso repetido. xii Muitos deles também aumentam o impacto da nicotina, o que, por sua vez, torna os produtos ainda mais viciantes. xiii Abaixo encontram-se exemplos específicos que demonstram o papel vital dos aditivos. Sabores artificiais são adicionados para melhorar o gosto e reduzir a aspereza do produto. xiv Já na década de 70 as empresas de tabaco discutiam os benefícios de sabores mais doces. Nas atas de 1974 de uma reunião da RJ Reynolds, uma empresa de tabaco americana, discutiu-se sobre cigarros para fumantes iniciantes e fez-se notar que tais cigarros deveriam provocar baixa irritação e possivelmente conter sabores artificiais para que ficasse mais fácil para quem nunca fumou antes tomar gosto pelo ato mais rapidamente. xv Consultores da Brown & Williamson também examinaram conceitos novos para um cigarro para jovens, inclusive sabores de maçã e refrigerante, e um cigarro de sabor doce, declarando é bem sabido que adolescentes gostam de produtos doces. Podemos usar mel. xvi Estudos que examinaram o uso de cigarros com sabores demonstram a eficácia da estratégia das empresas de tabaco. Uma proporção considerável de jovens usa cigarros com sabores quando comparado a fumantes de vinte e poucos anos ou 2
mais velhos. Especificamente, em um estudo, o consumo de cigarros com sabores era inversamente relacionado à idade à medida em que a idade aumentava, o uso de tais cigarros diminuía. Na verdade, adolescentes de 17 anos eram duas vezes mais propensos a relatar o consumo de cigarros com sabores quando comparados a adultos de 20 a 26 anos. xvii O mentol é usado para refrescar e anestesiar a garganta, fazendo com que a fumaça altamente tóxica não incomode tanto. xviii O Comitê de Assessoria Científica sobre Produtos de Tabaco (CACPT) da FDA emitiu um relatório abrangente sobre o uso de mentol nos cigarros em 2011. O CACPT descobriu que o mentol trazia um gosto agradável de hortelã e provocava sensações refrescantes e suaves. Tais sensações não apenas trazem seu próprio sabor característico, mas também mascaram a aspereza inerente à fumaça de tabaco que de outra maneira faria a experiência de fumar ser desagradável para quem está começando a experimentar o tabaco. O CACPT concluiu que como resultado dessas propriedades sensoriais, a introdução do mentol em níveis cuidadosamente calibrados realmente tornava mais provável que jovens começassem a fumar e portanto ficassem viciados. Além disso, descobriu que jovens que se iniciam consumindo cigarros mentolados têm maiores chances de sofrerem dependência e se tornarem fumantes diários de longo prazo. xix Outros aditivos usados para afetar as características sensoriais dos produtos de tabaco e facilitar o hábito de fumar incluem ácido levulínico, que torna a fumaça mais suave e menos irritante; açúcares e chocolate, que fazem com que a fumaça pareça mais branda, fácil de se inalar e palatável para quem usa pela primeira vez; e glicerina, que possibilita uma exposição profunda no pulmão e também ajuda a suavizar a fumaça. xx Além de seus efeitos suavizantes, o ácido levulínico também altera a química cerebral de forma a torná-lo mais receptivo à nicotina. xxi O cacau expande as vias respiratórias, o que não apenas facilita a inalação, mas também amplia a absorção de nicotina. xxii Isso também deixa o fumante exposto a xxiii altos níveis de alcatrão. Aditivos de sabores também são usados para se compensar pelo gosto diminuído dos chamados cigarros light / com baixo teor de alcatrão, ajudando a perpetuar o uso desses produtos enganadores, que os consumidores acreditam ser menos nocivos que cigarros originais quando não são. xxiv Um quadro de regulamentação eficaz para se alcançar o objetivo da CQCT de proteger as gerações atuais e futuras dos malefícios devastadores causados pelo uso de tabaco e exposição à fumaça do tabaco deve incluir medidas para, no mínimo, enfrentar o uso de aditivos por parte da indústria do tabaco que encorajam jovens a começar a usar o tabaco assim como aqueles que aumentam o risco de desenvolver dependência e a sustentam. Tal abordagem é consistente com o recente relatório do RegTab da OMS que concluiu a redução do potencial de se causar dependência e atratividade dos produtos de 3
tabaco contribuiria com os esforços gerais de se reduzir o uso de tabaco e as doenças causadas por ele. xxv Também é consistente com o reconhecimento das Partes da CQCT, tal como se reflete em sua recente adoção unânime das Diretrizes Parciais para a Implementação dos Artigos 9 e 10 da CQCT, que declaram (...)que não há justificativa para se permitir o uso de ingredientes que ajudam produtos de tabaco a serem mais atraentes. A implementação eficaz do Artigo 9 da CQCT, portanto, incluiria, mas não estaria limitado a, a proibição do acréscimo de aditivos que tornam produtos de tabaco mais palatáveis, fáceis de se inalar, mais propensos a criarem uma falsa ilusão de que são menos tóxicos por causarem menos irritação, e mais propensos a causarem e sustentarem a dependência. Atenciosamente, Jack E. Henningfield, PhD i Ministério de Saúde, Instituto Nacional de Câncer (INCA). Global Adult Tobacco Survey: Brazil Report. Rio de Janeiro: Ministério de Saúde, Instituto Nacional de Câncer (INCA), Pan American Health Organization (PAHO); 2010. Disponível em: http://www.cdc.gov/tobacco/global/gats/countries/amr/reports/brazil/. ii World Health Organization, Study Group on Tobacco Product Regulation ( TobReg ), Report on the Scientific Basis of Tobacco Product Regulation, WHO Technical Report Series 967 (2012); Scientific Committee on Emerging and Newly Identified Health Risks ( SCENIHR ), Addictiveness and Attractiveness of Tobacco Additives (2010); Jack Página 4 de 5 E. Henningfield and Mitch Zeller, Could Science-Based Regulation Make Tobacco products Less Addictive? Yale Journal of Health Policy Law Ethics, 3(1):127-38, 2002. iii Jack E. Henningfield and Mitch Zeller, Could Science-Based Regulation Make Tobacco products Less Addictive? Yale Journal of Health Policy Law Ethics, 3(1):127-38, 2002; Bates C, Jarvis M, Connolly GN, Tobacco Additives, Cigarette Engineering and Nicotine Addiction, 1999; World Health Organization, Study Group on Tobacco Product Regulation ( TobReg ), Report on the Scientific Basis of Tobacco Product Regulation, WHO Technical Report Series 967 (2012). iv World Health Organization, Study Group on Tobacco Product Regulation ( TobReg ), Report on the Jack E. Henningfield and Mitch Zeller, Could Science-Based Regulation Make Tobacco products Less Addictive? Yale Journal of Health Policy Law Ethics, 3(1):127-38, 2002. v all tobacco products are deadly and addictive in any form or disguise. World Health Organization, Tobacco: deadly in any form or disguise, 2006. vi Bates C, Jarvis M, Connolly GN, Tobacco Additives, Cigarette Engineering and Nicotine Addiction, 1999; Rabinoff M, Caskey N, Rissling A, Park C, Pharmacological and chemical effects of cigarette additives, Am J Public Health, 97:1981-91, 2007; Scientific Committee on Emerging and Newly Identified Health Risks ( SCENIHR ), Addictiveness and Attractiveness of Tobacco Additives (2010). vii World Bank, Curbing the Epidemic: Governments and the Economics of Tobacco Control, 1999. viii World Health Organization, Study Group on Tobacco Product Regulation ( TobReg ), Report on the ix Teague, CE, Research Planning Memorandum on Some Thoughts About New Brands of Cigarettes for the Youth Market, R.J. Reynolds memo, 2 de fevereiro de 1973, Bates No. 502987357-7368; Wayne, GF, & Connolly, GN, How Cigarette Design Can Affect Youth Initiation into Smoking: Camel Cigarettes, 1983-1993, Tobacco Control 11:i32 - i39, março de 2002. 4
x Bates C, Jarvis M, Connolly GN, Tobacco Additives, Cigarette Engineering and Nicotine Addiction, 1999; Rabinoff M, Caskey N, Rissling A, Park C, Pharmacological and chemical effects of cigarette additives, Am J Public Health, 97:1981-91, 2007. xi Scientific Committee on Emerging and Newly Identified Health Risks ( SCENIHR ), Addictiveness and Attractiveness of Tobacco Additives (2010); Rabinoff M, Caskey N, Rissling A, Park C, Pharmacological and chemical effects of cigarette additives, Am J Public Health, 97:1981-91, 2007. xii Rabinoff M, Caskey N, Rissling A, Park C, Pharmacological and chemical effects of cigarette additives, Am J Public Health, 97:1981-91, 2007; Scientific Committee on Emerging and Newly Identified Health Risks ( SCENIHR ), Addictiveness and Attractiveness of Tobacco Additives (2010). xiii World Health Organization, Study Group on Tobacco Product Regulation ( TobReg ), Report on the xiv Bates C, Jarvis M, Connolly GN, Tobacco Additives, Cigarette Engineering and Nicotine Addiction, 1999. xv low in irritation and possibly contain added flavors to make it easier for those who never smoked before to acquire the taste of it more quickly. R.J. Reynolds Tobacco Company, Conference report #23, 5 de junho de 1974, Bates No. 500254578-4580. xvi It s a well-known fact that teenagers like sweet products. Honey might be considered. Marketing Innovations, Youth Cigarette - New Concepts, Memo to Brown & Williamson, setembro de 1972, Bates No. 170042014. xvii Klein SM, Giovino GA, Barker DC, Tworek C, Cummings KM, O Connor RJ, Use of flavored cigarettes among older adolescent and adult smokers: United States, 2004-2005, Nicotine Tob Res. 10(7):1209-14, 2008. xviii World Health Organization, Study Group on Tobacco Product Regulation ( TobReg ), Report on the Scientific Basis of Tobacco Product Regulation, WHO Technical Report Series 967 (2012); Scientific Committee on Emerging and Newly Identified Health Risks ( SCENIHR ), Addictiveness and Attractiveness of Tobacco Additives (2010. xix Tobacco Products Scientific Advisory Committee, Menthol Cigarettes and Public Health: Review of the Scientific Evidence and Recommendations, 21 de julho de 2011 http://www.fda.gov/downloads/advisorycommittees/committeesmeetingmaterials/tobaccoproductsscien tificadvisorycommittee/ucm269697.pdf. xx Scientific Committee on Emerging and Newly Identified Health Risks ( SCENIHR ), Addictiveness and Attractiveness of Tobacco Additives (2010); Rabinoff M, Caskey N, Rissling A, Park C, Pharmacological and Página 5 de 5 chemical effects of cigarette additives, Am J Public Health, 97:1981-91, 2007; Bates C, Jarvis M, Connolly GN, Tobacco Additives, Cigarette Engineering and Nicotine Addiction, 1999. xxi Rabinoff M, Caskey N, Rissling A, Park C, Pharmacological and chemical effects of cigarette additives, Am J Public Health, 97:1981-91, 2007. xxii Bates C, Jarvis M, Connolly GN, Tobacco Additives, Cigarette Engineering and Nicotine Addiction, 1999. xxiii Ibid. xxiv Bates C, Jarvis M, Connolly GN, Tobacco Additives, Cigarette Engineering and Nicotine Addiction, 1999. xxv World Health Organization, Study Group on Tobacco Product Regulation ( TobReg ), Report on the 5