TRATAMENTO DO HIPOTIREOIDISMO SUBCLÍNICO NO IDOSO UNITERMOS HIPOTIREOIDISMO SUBCLÍNICO/TRATAMENTO; IDOSO. Fernanda M. Cocolichio Laura Marmitt Luísa Avena Renato Bandeira de Gorga Mello KEYWORDS SUBCLINICAL HYPOTHYROIDISM/ TREATMENT; ELDERLY. SUMÁRIO Doenças da tireóide são mais prevalentes em idosos em comparação com indivíduos adultos. Dentre elas, destaca-se o hipotireoidismo subclínico, que, conforme sugerem estudos observacionais, apresenta implicações clínicas e prognósticas particulares ao idoso. A avaliação diagnóstica no idoso é mais complexa, devido à presença de sintomas atípicos, uso frequente de medicações e comorbidades associadas. Além disso, o papel do tratamento medicamentoso nessa faixa etária é ainda incerto e será abordado nesta revisão. SUMMARY Thyroid disorders are more prevalent in the elderly people when compared to the adults. Among them, stands out the subclinical hypothyroidism, which, as observational studies suggests, presents different clinical implications and prognosis in the elderly. The diagnosis in the elderly is more complicated, because of the presence of atypical symptoms, the use of many drugs and the associated comorbidities. Besides that, the importance of the medication treatment in this age group is uncertainly and it will be broached in this review. INTRODUÇÃO A tireoide é responsável pela produção de hormônios envolvidos no controle metabólico e homeostasia do indivíduo. 1 O hipotireoidismo é uma síndrome clínica caracterizada pela síntese, secreção ou ação inadequada
2 dos hormônios tireoidianos, resultando na lentificação generalizada dos processos metabólicos 1-5 A incidência e a prevalência de hipotireoidismo aumentam com a idade, e essa doença requer especial atenção nessa população em virtude de modificações na apresentação clínica e associação com comorbidades importantes como doenças cardíacas e neurológicas 4. Inicialmente, seus sintomas podem ser confundidos com achados normais do processo de envelhecimento resultando em subdiagnóstico 2. Entretanto há controvérsias sobre o papel prognóstico dessa patologia em idosos, sobretudo em relação ao hipotireoidismo subclínico. O hipotireoidismo subclínico (HSC), definido laboratorialmente pela presença de níveis elevados do hormônio estimulador da tireoide (TSH) com concentrações séricas normais de hormônios tireoidianos (T4 livre) 3-6, está associado a maior incidência de hipotireoidismo franco e sintomático, especialmente em indivíduos com TSH superior 10mU/L e anticorpo anti-peroxidase (anti- TPO) positivos. Estudos observacionais têm demonstrado maior risco de doenças cardiovasculares e maior mortalidade em adultos com hipotireoidismo subclínico. Entretanto, em idosos, tais associações não são encontradas de igual forma, sendo que alguns estudos sugerem menor risco e maior longevidade associada a essa condição. ETIOLOGIA As causas de HSC são as mesmas do hipotireoidismo. Entre elas, destacam-se: tireoidite de Hashimoto (auto-imune),deficiência de iodo, pósablação, pós-tireoidectomia, irradiação de cabeça e pescoço, tireoidites, outras doenças auto-imunes, medicamentos (Amiodarona, Lítio), insuficiência renal crônica e insuficiência adrenal primária 1 EPIDEMIOLOGIA Estima-se que a prevalência de HSC na população geral seja em torno de 4% a 10% 3, podendo variar entre 15-20% em mulheres idosas e 8% dos homens idosos 4. A progressão para hipotireoidismo manifesto varia de 2-5% ao ano. Pacientes do sexo feminino, níveis de TSH >10mU/L, ingesta aumentada de iodo e auto-imunidade tireoidiana são fatores de risco para a progressão da doença. FISIOPATOLOGIA A concentração sérica de TSH pode aumentar fisiologicamente com o envelhecimento, atuando como uma adaptação de proteção ao catabolismo 4. Há um claro decréscimo nos níveis séricos de T3 total e
3 T3livre, enquanto que a concentração de T4 total e livre permanece inalterada. A depuração metabólica de T4 é mais lenta com o avançar da idade, aumentando sua meia-vida. A diminuição dos níveis plasmáticos de T3 deve-se possivelmente á diminuição da conversão periférica de T4 em T3. A capacidade de ligação da tireoglobulina permanece inalterada com o envelhecimento. Porém, a degradação periférica de T4 está diminuída em idosos, em função da menor atividade da 5 deiodinase. 2 Apesar dessas alterações, em geral, a função tireoidiana global não se altera nos idosos saudáveis em comparação a adultos em igual condição. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS HSC costuma ser assintomático. Em idosos, a apresentação clínica geralmente é atípica, facilmente confundida com as características da senescência e pela presença de comorbidades associadas. Em populações específicas de idosos, o HSC não se associou com efeito significativo sobre depressão, ansiedade e função cognitiva. 3 Há divergências na literatura sobre a associação do HSC e dislipidemia, porém TSH>10mUI/L, tabagismo e resistência à insulina são fatores de risco para dislipidemia em pacientes com HSC 3. Há evidências consistentes sobre a associação do HSC com o risco de morte por doença coronariana, mas não em idosos com mais de 65 anos, onde a elevação TSH está associada a menor risco cardiovascular e maior longevidade. 3-4 Os principais sinais e sintomas são apresentados abaixo. Tabela 1 - Sinais e sintomas do hipotireoidismo (Adaptado ref. 5) SINTOMAS Fadiga/Cansaço Mialgia Intolerância ao frio Queda de cabelo Depressão Alterações de memória Constipação Ganho de peso Dispneia/ Rouquidão Parestesias DIAGNÓSTICO SINAIS Pele seca, fria e grossa Edema facial/ Edema de mãos e pés Alopécia difusa Madarose lateral Hipertensão arterial diastólica Bradicardia Síndrome do túnel do carpo Derrame pericárdico Derrame pleural Macroglossia O diagnóstico de HSC é definido pela elevação dos níveis séricos de TSH na presença de concentrações séricas de T4 livre normais. 4 Quando alterados, deve-se repetir os exames laboratoriais em 3 a 6 meses para confirmar HSC, além de excluir causas de elevação transitória do TSH (recuperação de tireoidite subaguda, fase de recuperação da doença de Graves, insuficiência renal, elevação fisiológica do TSH, dentre outras). A
4 determinação de anticorpos anti-tpo pode ser útil na determinação da etiologia do HSC e na predição do risco de progressão para hipotireoidismo manifesto. 3 O valor de TSH sérico normal comumente usado em adultos é entre 0,4 e 4,5mU/L. Em pacientes idosos é importante avaliar os valores de acordo com os intervalos de normalidade para a faixa etária. O perfil lipídico deve ser avaliado, assim como a presença de sintomas de hipotireoidismo. TRATAMENTO Somente pacientes com HSC persistente, com TSH >10mUI/L, anti-tpo positivo, alterações ecocardiográficas sugestivas de autoimunidade tireoidiana devem ser considerados para tratamento, em razão do maior risco de progressão para hipotireoidismo manifesto. Além disso, pacientes com doença cardiovascular prévia e dislipidemia de difícil tratamento também são candidatos a tratamento 3-8. O tratamento do HSC em idosos com >65 anos é recomendado apenas se o TSH se mantiver persistentemente acima de 10mUI/L, em função da ausência de associação com risco cardiovascular e mortalidade nesta faixa etária, e pelo maior risco de desenvolvimento ou descompensação de insuficiência cardíaca 8. A presença de sintomas é usada como critério de tratamento para muitos autores, porém o efeito da reposição de Levotiroxina em idosos não resultou em melhora da função cognitiva, humor e qualidade de vida 3. Portanto, não é recomendado o tratamento de pacientes acima de 65 anos com o objetivo de aliviar sintomas ou melhorar a qualidade de vida. O alvo da terapia de reposição deve ser um nível de TSH entre 4 e 6mUI/L 3-4. Há risco de fibrilação atrial e osteoporose em idosos que usam Levotiroxina em altas doses, portanto, devem ser monitorados clinicamente. 3 REFERÊNCIAS 1. Vilar L. Endocrinologia clínica. 5a. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2013. 2. Freitas EV, Py L, Xavier FA et al. Tratado de geriatria e gerontologia. 2a ed. Rio de Janeiro: Guanabara;2006. 3. Sgarbi JA, Teixeira PFS, Maciel LMZ, et al. Consenso brasileiro para a abordagem clínica e tratamento do hipotireoidismo subclínico em adultos: recomendações do Departamento de Tireoide da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Arq Bras Endocrinol Metab. 2013; 57(3):166-83. 4. Rauen G, Wachholz PA, Graf H et al. Approach of subclinical hypothyroidism in the elderly. Rev Bras Clin Med. 2011; 9(4):294-9. 5. Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Diretrizes clínicas na saúde suplementar: hipotireoidismo. São Paulo: Associação Médica Brasileira e Agência Nacional de Saúde Suplementar; 2011. 6. Romaldini JH, Sgarbi JÁ, Farah CS. Subclinical thyroid disease: subclinical hypothyroidism and hyperthyroidism. Arq Bras Endocrinol Metabo. 2004; 48:147-58.
7. Bensenor IM, Olmos RD, Lotufo PA. Hypothyroidism in the elderly: diagnosis and management. Clin Interv Aging. 2012;7: 97-111. 8. Razvi S, Shakoor A, Vanderpump M et al. The influence of age on the relationship between subclinical hypothyroidism and ischemic heart disease: a metaanalysis. J Clin Endocrinol Metab. 2008;93:2998-3007. 5