AUTOR Durval Alex Gomes e Costa Graduado em Medicina pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Especialista em Infectologia pelo Hospital Heliópolis. Doutor em Doenças Infecciosas pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Médico infectologista do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Estadual Mário Covas, Santo André. Médico infectologista do Serviço de Moléstias Infecciosas do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo.
APRESENTAÇÃO Neste guia, cada capítulo aborda um exame diferente, constituindo-se em uma alternativa à literatura especializada na melhor interpretação possível de exames laboratoriais. Essa estrutura oferece ao profissional médico toda a confiança de que ele necessita, e que, muitas vezes, pode vir a sentir falta, no tocante às particularidades e aos procedimentos essenciais antes da abordagem terapêutica.
ÍNDICE 1. Hemograma...9 1. Introdução...9 2. Avaliação da série vermelha...9 3. Características específicas das hemácias...11 4. Leucograma... 13 2. Análise de exames de urina... 17 1. Aquisição do material (coleta de urina tipo I)... 17 2. Características físicas e dos componentes do exame de urina tipo I...19 3. Infecção do trato urinário... 20 4. Diagnóstico laboratorial...21 3. Gasometria arterial e venosa...25 1. Informações do exame...25 2. Análise dos principais distúrbios do equilíbrio acidobásico...27 4. Líquido cerebrospinal liquor...33 1. Introdução...33 2. Punção liquórica... 34 3. Locais de coleta...35 4. Análise diferencial em doenças infecciosas... 36 5. Exames adicionais na coleta... 38 5. Líquido pleural... 41 1. Introdução...41 2. Local de punção da toracocentese... 42 3. Análise do líquido pleural... 43 4. Exsudato versus transudato... 44 5. Cultura no líquido pleural... 46 6. Líquido ascítico...49 1. Introdução... 49 2. Locais de punção... 50 3. Diferenciação entre exsudato e transudato... 50 4. Outros exames do líquido ascítico... 51 5. Cultura do líquido ascítico...52 7. Espermograma...53 1. Introdução...53 2. Características físicas...53 3. Características laboratoriais... 54 4. Condições que podem tornar inadequado o espermograma...55 8. Marcadores tumorais... 57 1. Introdução...57 2. Descrição dos principais marcadores... 58 9. Bioquímica sanguínea...69 1. Introdução... 69 2. Avaliação da glicemia e alterações glicídicas... 69 3. Avaliação da função renal... 71 4. Avaliação dos distúrbios hidroeletrolíticos...72 5. Alterações na concentração de sódio...73 6. Alterações na concentração de potássio...74
7. Alterações na concentração de cálcio...75 8. Distúrbios na concentração de magnésio...76 9. Avaliação de distúrbios relacionados ao ferro...76 10. Avaliação das proteínas totais e frações...77 11. Avaliação de lipídios séricos...79 12. Avaliação das funções hepática e canalicular...81 13. Alterações pancreáticas... 83 14. Avaliação da função cardíaca... 83 10. Diagnóstico laboratorial nas principais doenças infecciosas...87 1. Introdução... 87 2. HIV... 89 3. Hepatite A... 94 4. Hepatite B... 95 5. Hepatite C...97 6. Outras hepatites virais... 98 7. Sífilis... 98 8. Tuberculose...100 11. Exames diagnósticos em fezes...105 1. Protoparasitológico de fezes... 105 2. Diagnóstico das parasitoses pelos exames de fezes... 106 3. Coprocultura...111 4. Outros exames nas fezes...111 12. Exames em Endocrinologia...113 1. Tireoide... 113 2. Paratireoides... 115 3. Hormônios em exames ginecológicos... 116 4. Hormônios masculinos... 120 5. Hormônios da adrenal... 120 6. Hormônios em Endocrinologia e os tumores associados...123 13. Exames de identificação direta... 125 1. Introdução...125 2. Bacterioscopia teste de Gram...125 3. Micológico direto...127 4. Gota espessa... 128 14. Coagulograma...131 1. Introdução... 131 2. Análise inicial... 131 3. Análise de alterações na hemostasia...134 4. Exames complementares...136 15. Antibiograma... 139 1. Antibiograma: quando indicar?...139 2. Analisando um antibiograma: compreendendo as informações apresentadas... 140 3. Bactéria no antibiograma: infectante ou colonizante?...143 16. Exames em Reumatologia...145 1. Introdução...145 2. Ácido úrico e exames relacionados...145 3. VHS, PCR, ASLO, anti-dnase B e anti-hialuronidase... 146 4. Fator reumatoide...147 5. Fator antinúcleo (FAN)... 148
5 Líquido pleural 1. Introdução O espaço pleural é a região entre a caixa torácica e a camada serosa que envolve o pulmão, chamada pleura. Esse espaço é virtual, pois não é ocupado por ar nem líquidos, existindo apenas vácuo para expansão pulmonar durante o ato da respiração. Em várias situações anômalas, pode ocorrer drenagem de líquidos para essa região, formando o que se chama de derrame pleural. Podem- -se acumular líquidos intersticiais, purulentos, sangue ou quilo (líquido proveniente da drenagem linfática). Quando ocorre o derrame pleural, o acúmulo de líquido provoca dificuldade de expansão pulmonar e, com isso, dor ao respirar, o sintoma inicial. A dor é descrita como pontada (dor pleurítica), no ato da inspiração. Em grandes volumes de líquidos, a insuficiência respiratória pode se instalar, sendo necessária ventilação mecânica para o tratamento. Figura 1 - Derrame pleural à direita. Note uma área sem qualquer sinal de aeração na base direita, com escorrimento do líquido para a base (o paciente está em pé no momento do exame). Muitas vezes o diagnóstico acontece por acaso, já que a dor é confundida com dor na coluna ou dor muscular Figura 2 - Em algumas situações o derrame é loculado, e, mesmo com o paciente em pé, não ocorre o escorrimento do líquido para a base. Nesses casos, a loculação está relacionada ao espessamento da pleura na região e a formação de verdadeiros locos de líquido. A punção, nesses casos, pode ser mais complicada, necessitando de exames de imagem para a realização, como a ultrassonografia
42 GUIA DE INTERPRETAÇÃO DE EXAMES Se a punção for feita nesta região, haverá maior risco de sangramentos e de neurites pós-punção, por lesão nervosa. É necessário que a posição do paciente facilite a punção. Assim, ele deve estar sentado (a gravidade ajuda a manter o líquido na parte mais baixa do hemitórax acometido) e fazendo protrusão das costas. Isso quer dizer que o paciente deve ficar abraçando algo. Desta maneira, a punção será mais efetiva. Figura 3 - Tomografia com derrame pleural encistado formando loculação (seta vermelha). Note área de espessamento entre o pulmão (preto) e a loculação (cinza-claro) esta é a causa de estar encistado, podendo ser decorrente de infecção prolongada ou de punções de repetição 2. Local de punção da toracocentese Toracocentese é o nome dado ao procedimento de coleta do derrame pleural. Em situações como essa, pode ser feita punção guiada por ultrassonografia ou outro exame de imagem (como tomografia) em qualquer lugar do tórax. Entretanto, a coleta guiada por exame de imagem é exceção, reservada a casos em que há derrame pleural encistado ou a casos de punção de repetição. Para a maioria, a punção é feita às cegas, com base na clínica do paciente, na semiologia (em locais onde a ausculta está abolida, a percussão é opaca e a pectorilóquia é áfona) e no exame de imagem simples (raio x de tórax prévio). Utilizando esses dados iniciais, consegue- -se determinar o lado do derrame (se direito ou esquerdo) e a sua altura (até que costela está alcançando). Entretanto, o ponto onde está definido o local da punção longitudinalmente é definido como a linha imaginária vertical, que passa na altura da escápula, face medial, com local abaixo dela (da escápula), sempre na face superior da costela (arco costal). A punção deve ser feita na borda superior da costela, pois na borda inferior passam o feixe nervoso e o vascular. Figura 4 - Posição típica para toracocentese às cegas. Lembrar que, apesar de ser às cegas, a semiologia e o exame de raio x são muito importantes no momento da coleta. A recomendação é que se leve o exame de raio x para a beira do leito e se ausculte e percuta exaustivamente antes da punção. Não é incomum erro por tentativa de toracocentese no lado contrário ao do derrame pleural Figura 5 - Além de toda a área demonstrada, a toracocentese deve se preocupar com o local da punção próximo ao gradeado costal. Punções na parte inferior da costela podem ocasionar lesões de vasos sanguíneos ou de nervos intercostais, levando a complicações como neurites ou sangramentos
13 Exames de identificação direta 1. Introdução Diversos exames podem ser identificados de maneira direta, por meio da observação do agente causador. Muitos deles sequer precisam de corantes ou de substâncias que facilitem a visualização, bastando um microscópio e a experiência de um examinador com conhecimento. Por vezes, um hemograma simples está repleto de plasmódios, mas pela falta de experiência o profissional do laboratório não os identifica. Isso também pode ocorrer com blastos numa leucemia (assunto já abordado no capítulo de avaliação do hemograma). Como são inúmeras as possibilidades de diagnóstico de maneira direta, o objetivo deste capítulo não é detalhar todas, mas falar de 3 exames na vida diária do médico: os exames de bacterioscopia (Gram), o micológico direto e a gota espessa. 2. Bacterioscopia teste de Gram de espécies, a bacterioscopia é essencial para evitar óbitos. A realização de bacterioscopia no exame de líquido cerebrospinal (o liquor) permite a identificação e o início do tratamento logo após a coleta, diminuindo a mortalidade por doenças que podem matar em horas. A coloração de Gram (ou técnica de Gram) considera basicamente a estrutura das bactérias. Todas elas têm parede celular, mas a membrana lipídica é diferente entre Gram positivas e Gram negativas. Essa membrana é mais espessa em Gram positivas, por isso, quando essas bactérias são tratadas com determinada substância, não há liberação de corante quando se tenta removê-lo. A técnica utiliza basicamente cristal violeta (corante), lugol (fixador) e etanol acetona (solvente). O procedimento é resumido a seguir: Este exame mudou completamente a noção das bactérias e possibilitou a classificação destas em grupos, o que melhorou o diagnóstico, guiou o tratamento e consequentemente diminuiu a mortalidade de doenças causadas por bactérias. Ainda hoje, na era da automação e da identificação computadorizada Figura 1 - Técnica laboratorial para coloração de Gram
126 GUIA DE INTERPRETAÇÃO DE EXAMES A maneira como o técnico de laboratório faz o método de Gram também é importante. Se o corante de violeta não for colocado de maneira apropriada pelo tempo adequado, poderá ocorrer pouca fixação, o que leva a pensar que uma bactéria Gram positiva possa ser negativa. Ao contrário, se for deixado para descorar com álcool por muito tempo, poderá ocorrer a desnaturação da bactéria, acarretando no diagnóstico incorreto de uma Gram negativa, pela agressividade na descoloração. Além da informação básica do método de Gram (em bactérias Gram positivas ou Gram negativas), a bacterioscopia fornece os dados da morfologia da bactéria, essencial ao diagnóstico. Portanto, avalia-se se uma bactéria é um coco, diplococo, bacilo, bacilococo etc. Algumas bactérias, por serem muito pequenas, não coloram adequadamente pelo método de Gram. É o caso das espiroquetas (como o Treponema pallidum, que causa sífilis, ou Leptospira, que causa leptospirose). Nestes casos, outros métodos diagnósticos devem ser tentados. Outras bactérias, como Nocardia e Mycobacterium, requerem técnicas especiais para coloração, pois no método de Gram seriam imperceptíveis. A despeito dessas exceções, a maioria das bactérias pode ser identificada pelo método de Gram, e este deve sempre ser solicitado. Figura 2 - Coloração feita identificando bactérias Gram positivas. Notar que a morfologia também é vista na imagem (cocobacilos Gram positivos) Figura 3 - Assim como a imagem da Figura 2, esta é de um Gram positivo. Notar a coloração mais roxa. Neste caso, trata-se de cocos Gram positivos aos pares (Staphylococcus) Figura 4 - No caso do Gram negativo, a coloração é mais clara e avermelhada. Neste caso, a morfologia demonstra bacilos Gram negativos (E. coli) É importante dizer que a metodologia de Gram não identifica a bactéria. Para isso, são necessários outros métodos químicos, classificando-a até a identificação. Então, por que o exame é tão importante? Simples: a resposta terapêutica é mais bem guiada ao se saber que determinado antibiótico elimina melhor bactérias Gram positivas ou Gram negativas. No caso específico de uma meningite bacteriana, por exemplo, esse exame é essencial para guiar o perfil da bactéria. Se o laboratório indica que é um diplococo Gram negativo, por exemplo, indica provável infecção por Neisseria meningitidis. Como é uma doença que mata em até 6 horas no sistema nervoso central, essa informação é impor-