1 INTUSSUSCEPÇÃO DE CORNO UTERINO EM CADELA Leandro William BORGES¹; Plínio Mendes de OLIVEIRA²; Marcelo Carrijo DA COSTA²; Francisco Claudio Dantas MOTA 3 ; Aracelle Elisane ALVES³; 1 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias (PPGCV) - Universidade Federal de Uberlândia (UFU). (leandro_william@hotmail.com) 2 Residente em Clínica Cirúrgica de Animais de Companhia Programa de Residência Uniprofissional em medicina veterinária - Universidade Federal de Uberlândia (UFU). 3 Docente do Departamento de Cirurgia de Pequenos Animais, Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Federal de Uberlândia. Resumo A intussuscepção uterina em cadelas é uma patologia rara. Este relato tratase de uma cadela SRD (sem raça definida), parida há 22 dias, com presença de corrimento vaginal sanguinolento há 15. O exame ultrassonográfico, revelou estrutura tubular (cerca 2,17 cm de diâmetro), com superfície irregular e parede espessa (cerca de 0,49 cm) no corno uterino esquerdo. O animal foi então submetido a ovariosalpingohisterectomia, onde foi confirmada a intussuscepção do mesmo. Portanto pode-se concluir que a intussuscepção uterina é uma patologia que deve ser considerada como diagnóstico diferencial nos casos de afecções do trato reprodutivo em cadelas. Palavras-chave: patologia, ovariosalpingohisterectomia, invaginação, intussuscepto, Keywords: pathology, ovariosalpingohysterectomy, invagination, intussusceptum, Revisão de literatura O útero é um órgão muscular que abriga o feto durante a gestação. Os cornos uterinos constituem a porção mais alongada do útero e o local onde ocorre o desenvolvimento embrionário. O corpo uterino apresenta comprimento relativamente curto, e sua principal função é direcionar o feto para a cérvix no momento da expulsão. A cérvix uterinaé uma região muscular mais espessada, e que separa o útero e a vagina. Ela mantém o útero fechado durante a maior parte do ciclo estral, mantendo sua condição de esterilidade (FELDMAN e NELSON, 2009). Intussuscepção é definida como o encaixe ou invaginação de um segmento deórgão tubular, para dentro do lúmen do segmento adjacente. O segmento que ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0350
2 envolve o outro é denominado intussuscipiente, enquanto que o segmento envolvido é chamado de intussuscepto (MACPHAIL, 2002). A intussuscepção intestinal tem como fatores predisponentes a hipermotilidade secundária a enterites virais, bacterianas ou parasitárias, a manipulação inadequada durante laparotomia exploratória prévia e neoplasias intestinais ou corpos estranhos (TILLEYe SMITH, 2003). Poucos são os relatos de intussuscepção uterina em cadelas. Gorham e Spink (1975) relataram a ocorrência em uma cadela da raça Chow Chow. Além deste caso há descrição de intussuscepção do corno uterinode uma cadela SRD (Beck et al., 2008), e outra da raça Cocker Spaniel (ISQUIERDO e CUETO, 2013) e em uma cadela Yorkshire Terrier (PINTO FILHO et al., 2015). O objetivo deste trabalho foi relatar um caso de intussuscepção de corno uterino em uma cadela SRD, bem como o tratamento realizado. Descrição do Caso Uma cadela SRD, com aproximadamente 5 anos de idade, 12 kg, foi atendida no Hospital veterinário da Universidade Federal de Uberlândia, com queixa de corrimento vaginal sanguinolento há 15 dias. O proprietário relatou parição de dois fetos mortos há 22 dias. Durante exame físico observou-se baixo escore corporal, apesar do proprietário relatar apetite normal. Exames complementares tais como hemograma revelou anemia normocítica normocrômica, o exame bioquímico apontou normalidade tanto na função renal quanto na hepática. Na ultrassonografia o útero apresentava uma estrutura tubular com cerca de 2,17 cm de diâmetro, com parede espessa +/- 0,49 cm e superfície irregular. Após avaliação dos resultados obtidos o tratamento de escolha foi a realização de ovariosalpingohisterectomia. O protocolo anestésico utilzado foi: medicação pré-anestésica, Morfina 0,5mg/kg por via intramuscular (IM) e Diazepan 0,5mg/kg por via endovenosa (IV); indução com Propofol 5 mg/kg (IV), seguida da colocação da sonda endotraqueal, para manutenção anestésica com gás Isofluorano diluído em oxigênio 100%. Após o estabelecimento do plano cirúrgico, e assepsia de rotina; iniciou-se a laparotomia Foi realizada incisão de pele, subcutâneo e musculatura retro umbilical na linha média abdominal, seguida da localização dos cornos uterinos na cavidade abdominal. Ao expor os cornos uterinos constatou-se a presença de estrutura ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0351
3 compatível com intussuscepção no corno uterino esquerdo, já que o segmento cranial do mesmo encaixava-se (intussuscepto) no lúmen do segmento localizado logo a seguir no sentido caudal proximo à transição com o corpo do útero (intussuscipiente). Na tentativa de se desfazer a intussuscepção manualmente, o corno uterino se rompeu e revelou área sensível. Esta era uma área necrosada e ulcerada com hemorragia ativa em toda a circunferência da borda do intussuscepto, o qual encontrava-se encarcerado, o que poderia justificar a necrose e a úlcera devido a isquemia. Após reposicionamento dos cornos uterinos em sua conformação anatômica, foi realizada a ovariosalpingohisterectomia (OSH) seguindo técnica descrita por Stone (2007). As recomendações para o pós-operatório constaram de: Amoxicilina com clavulanato de Potássio na dose de 20mg/kg; 12/12 horas por 07 dias, Ranitidina 2mg/kg; a 12/12horas por 07 dias, cloridrato de Tramadol 3mg/kg; 8/8 horas por 05 dias, meloxican 0,1 mg/kg 01 a cada 24 horas por 05 dias, ambos via oral e curativo local com solução Nacl 0,9% estéril para limpeza da ferida local e Rifamicina tópica por duas vezes ao dia até a retirada dos pontos. Discussão Os sinais clínicos e achados no exame ultrassonográfico levaram a cogitar possíveis diagnósticos diferenciais tais como: anexos fetais remanescentes, tumores, endometrite, hiperplasia de endométrio com hemometra e torção uterina. No entanto, a possibilidade de intussuscepção uterina não foi considerada por se tratar de uma afecção rara, e pela imagem ultrassonográfica não ser suficiente para o diagnóstico definitivo desta patologia. Segundo Hecht (2011), a ausência da identificação das camadas uterinas no exame ultrassonográfico ajuda a diferenciar cornos uterinos de alças intestinais, já que o intestino possui cinco camadas identificáveis na imagem ultrassonográfica. Assim, de acordo com Bradley et al. (2009) a intussuscepção intestinal é visualizada como uma imagem multicamadas ao ultrassom. A ausência de alterações na imagem ultrassonográfica do útero pós-parto não exclui a intussuscepção uterina, conforme caso relatado por Isquierdo e Cueto (2013), cujo o diagnóstico foi por laparotomia exploratória. ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0352
4 Acredita-se que a causa da ocorrência de intussuscepção seja devido à uma motilidade exacerbada da parede intestinal. Pode estar associada com enterite secundária a parasitas, vírus e bactérias, corpos estranhos lineares, massas intestinais ou cirurgia abdominal previa e em animais mais velhos muitas vezes está associada a neoplasia (TILLEY e SMITH, 2003). De acordo com estas causas, é possível que as contrações uterinas favorecem uma alta motilidade e contração dos cornos uterinos durante a parição e no puerpério imediato, somada à uma hipertrofia, edema e elasticidade aumentada da camada muscular da parede uterina, fato este consequente do aumento de estrógeno nesta fase do ciclo estral. Assim, acredita-se que a presença de altos níveis de estrógeno que leva a maior elasticidade das fibras musculares uterinas entremeadas na parede; somada à presença de contrações uterinas e involução uterina pós-parto favorecerem a ocorrência de intussuscepção de cornos uterinos como ocorrido nesta paciente. O caso aqui discutido se assemelha ao relatado por Gorham e Spink (1975) no que diz respeito ao corrimento vaginal sanguinolento, a diferença é que neste caso a paciente tinha 5 meses de idade, o que nos mostra que esta afecção não tem correlação com idade ou raça dos animais e provavelmente pode ter outras causas. O quadro hemorrágico descrito em ambos os casos está relacionado à necrose devido à isquemia causada pelo encarceramento de um segmento uterino dentro do outro. No caso relatado por este trabalho, além da necrose havia também uma área com ulceração e com sangramento ativo, verificado como corrimento vaginal. O hemograma revelou anemia normocítica normocrômica, provavelmente pela perda de sangue na hemorragia. O tratamento cirúrgico indicado de OSH e realizado para a resolução deste caso é definitivo, seguro e eficiente já que evita recidiva. Conclusão Conclui-se que a intussuscepção uterina em cadelas está associada a alterações fisiológicas e apesar de rara deve ser considerada durante diagnóstico diferencial de patologias do trato reprodutivo de cadelas. Referências ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0353
5 BECK, C.; CARDONA, R.O.C.C.; COSSETIN, G.M.P.; ZANCHI, V. Intussuscepção uterina em um canino. In: 35º Congresso Brasileiro De Medicina Veterinária, Gramado, Anais: 264-265, 2008. BRADLEY, K. In: O BRIEN, R.; BARR, F. Manual de Diagnóstico por Imagem Abdominal de Cães e Gatos. São Paulo: Roca, 2009, p. 135-161. FELDMAN, EC.; NELSON, RW. Ovarian cicle and vaginal citology. In: Feldman EC, Nelson RW. Canine and feline endocrinology and reproduction. 23.ed. Philadelphia: W.B Saunders, 2004. p.752-774. GORHAM, M.F.; SPINK, R.R. Modern Veterinary Practice, 56: (1), 1975. HECHT, S. In: PENNINCK, D.; D ANJOU, M.A. Atlas de Ultrassonografia de Pequenos Animais. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011, p.395-414. ISQUIERDO, D.; CUETO, E. Intususcepción uterina. Relato de um caso clínico;http://www.seleccionesveterinarias.com/es/articulos/reproduccionanimal/intususcepcion-uterinarelato- de-un-caso-clinico, em 29/09/2013. MACPHAIL, C. Gastrointestinal obstruction. Clinical Techniques in Small Animal Practice, New York, v. 17, n. 4, p. 178-183, 2002. PINTO FILHO, S.T.L.; CARUS. D.S., DALMOLI. F.; ANJOS. B.L.; SEGATTO. T.; KRABBE. A.; OLIVEIRA. M.T.; PIPPI. N.L.; BRUN. M.V. Intussuscepção uterina em uma cadela Yorkshire Terrier. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.67, n.1, p.37-40, 2015. STONE, E.A. Ovário e útero. In: SLATTER, D. Manual de cirurgia de pequenos animais. 3.ed. São Paulo: Manole, 2007. Cap. 98, p.1487-1502. TILLEY, L.P.; SMITH, W.K.F. Jr. Consulta Veterinária em 5 minutos espécie canina e felina. 2.ed. São Paulo: Manole, 2003. p.870-871. ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0354