Paulete Maria Cunha Santos



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Transcrição:

Educação Indígena: perspectivas de interculturalidade nas demandas e propostas dos povos indígenas do Tocantins Paulete Maria Cunha Santos Atualmente, entre os problemas enfrentados pelos povos indígenas, a educação é uma das que causam maior preocupação. As Associações Indígenas do país, especialmente as de professores, têm reivindicado uma educação indígena diferenciada e, nesse contexto, os representantes das Associações do estado do Tocantins vêm se organizando, e manifestando suas angústias e desejos, registrados em documentos e apresentados ao Governo estadual. Para citarmos um, que data do dia 10 de julho de 2003, no qual as lideranças indígenas afirmam, entendemos que através de programas específicos direcionados às áreas indígenas possibilitem a melhoria da qualidade de vida e, também, oportunize o preparo de jovens para participarem no processo de desenvolvimento de suas sociedades. No início do mês de abril do presente ano, foi realizado em Palmas capital, o I Fórum Social Indígena do Tocantins, com a finalidade de implementar políticas públicas para atender, efetivamente, as demandas destes povos. Entre as suas reivindicações, no que se refere à educação, pode-se citar desde as mais abrangentes, como adequação do calendário escolar e de material didático, elaboração de concurso para professores indígenas,até a merenda escolar condizente com a dieta alimentar. Dessa forma, na dimensão política e educacional de processos de organização de Associações Indígenas, pressupomos uma discussão crítica e própria acerca de si mesmas e o lugar da escola que querem para o futuro 1. Sendo assim, nossa pesquisa propõe problematizar a articulação entre a participação das organizações indígenas do Tocantins, enquanto sujeitos políticos de sua própria história, que propõem uma educação escolar indígena diferenciada, e os diferentes agentes não indígenas envolvidos no processo, como as secretarias estaduais 1

e municipais de educação, universidades, ONGs, e organismos/instituições governamentais. Nesse sentido, compreendemos o espaço da escola nas aldeias, enquanto um palco de experiências, vivências e, especialmente, de fricção, entre indígenas e não indígenas, onde os primeiros são os principais agentes. Diante desse contexto, pode-se inferir algumas reflexões, que pretendemos tratar. Como o estado do Tocantins, representado pela secretaria de educação, dentre outras, incorporou políticas públicas prescritas no plano institucional e de legislação da educação indígena? Quais são os mecanismos, forjados por estas secretarias, no que diz respeito à autonomia dos movimentos sociais indígenas? Como se constituem a luta política e o processo de autodeterminação das organizações indígenas desse estado? Ou, ainda, como são tratadas as especificidades de cada povo, isto é, na efetiva prática educacional nas aldeias? Algumas inquietações, após nossa participação na I Conferência Internacional sobre Ensino Superior Indígena (2004), em Barra do Bugres-MT, na UNEMAT, nos levou a realizar algumas reflexões. Precisamos aceitar que existem conhecimentos distintos, é preciso desaprender e, portanto, re-aprender outras formas de saberes. Como construir com os povos indígenas uma outra proposta de educação que reconheça a diversidade de fato e direito? Os povos indígenas do Brasil continuam resistindo e, lutando por seus direitos. Pode-se ponderar que, é quase compulsória a mudança de mentalidade, enquanto via norteadora da Reforma Universitária. Essa postura significa re-conhecer a cultura do outro, suas formas de pensar e sentir. Enfim, talvez possamos arriscar uma pergunta no escuro, a tradição oral venceu? O estado do Tocantins, a mais nova unidade da Federação, é formada pela separação do antigo norte de Goiás. Esta região foi ocupada pelos conquistadores europeus a partir do início do século XVIII com atividades de mineração e pecuária. Diversos povos indígenas habitavam-no. Informações documentais indicam a existência de treze povos indígenas 2

diferentes ocupando a área entre os rios Araguaia e Tocantins: Kayapó, Xavante, Xerente, Noroquajê, Akroá, Xakriabá, Avá-Canoeiro, Karajá, Javaé, Xambioá, Weré, Apinajé e Krahô. No processo de conquista e colonização da região, alguns povos foram exterminados (Akroá, Weré e Noroquajê), outros foram expulsos ou migraram (Xakriabá, Xavante e Kayapó) e outros permaneceram que são os Xerente, Apinajé, Krahô, Karajá, Javaé, Krahô-Canela, Xambioá, e os Avá-Canoeiro, estes últimos, com um número reduzido de sobreviventes (quatro pessoas), totalizando uma população de aproximadamente nove mil pessoas. Com o advento da independência do Brasil (1822), planos e projetos foram realizados para tentar definir uma política indigenista. Na década seguinte, com a descentralização administrativa, as Províncias ganham autonomia para atuar na política indigenista. Contudo, o ato da elaboração de um conjunto de normas (1846), conhecido como Regimento das Missões 2, foi que definiu as relações do Império com os povos indígenas. Nesta política, a educação escolar indígena é confiada aos religiosos, sobretudo aos Capuchinhos. Desde que o governo imperial e da província de Goiás optaram, nos anos 1840, pelo emprego dos Capuchinhos na catequese dos povos indígenas da região, estes vêm mantendo algum tipo de educação escolar formal. Esta atuação foi mais intensa entre os Krahô e os Xerente, pois os freis Rafael de Taggia (entre os Krahô) e Antônio de Ganges (entre os Xerente), fundaram aldeamentos que se tornaram, posteriormente, núcleos urbanos, respectivamente, Pedro Afonso e Tocantínia. No final do século XIX, os Xerente tiveram a presença da professora Leolinda Daltro, que deixou o Rio de Janeiro e atuou na região 3. Após a criação do SPI, o governo passou a oferecer educação formal aos Xerente. Entre os Krahô, entretanto, somente a partir da década de 1940, quando o SPI passou a atuar na área, foi viabilizado o acesso à educação formal. No entanto, outros povos indígenas como os Apinajé, Karajá, Javaé e Xambioá, 3

tiveram uma relação menos intensa com os Capuchinhos e a educação formal, naquele período. Dessa forma, somente nos anos 1940-50, o SPI instalou escolas formais nessas áreas indígenas. Após o fim do Império, a instauração da república brasileira, ainda mantém indefinida sua política indigenista até os anos 1910, quando se cria o Serviço de Proteção aos Índios e Localização dos Trabalhadores Nacionais (SPILTN), posteriormente, conhecido apenas como SPI 4. Este órgão torna-se um veículo transmissor e normatizador da educação escolar indígena. Sua sucessora, a Fundação Nacional do Índio FUNAI, a partir dos governos militares (1964), repassa essa incumbência da educação escolar para instituições religiosas, tais como, SIL, Batista, Missões Novas Tribos, dentre outras. Com a promulgação da nova Constituição Brasileira (1988), a educação escolar indígena foi transferida à esfera do MEC e das secretarias estaduais e municipais de educação, a partir de 1991. A educação escolar indígena no Brasil, e o direito as suas formas específicas de viver, pensar e sentir quando acolhidas pela Constituição Federal de 1988, desencadeou o início do percurso para a oficialização de escolas indígenas diferenciadas e de políticas públicas que pontuassem uma educação intercultural e multilíngüe e, posteriormente, referendada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), em 1996, e a elaboração e publicação do Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas, pelo MEC, em 1998. No entanto, estamos diante de um descompasso entre o projeto de uma educação diferenciada e sua efetivação nas escolas indígenas. Pode-se citar, como exemplo, a insuficiente acolhida e compreensão por parte dos órgãos oficiais, de calendários, currículos e regimentos específicos, organizados por comunidades indígenas 5. As propostas encaminhadas pelas representações dos povos indígenas do Tocantins para a formação de políticas públicas nas áreas de educação, cultura, 4

preservação ambiental, saúde, agricultura, infra-estrutura, turismo, dentre outras, são constituídas de reivindicações significativas e relevantes, no que compete a gerações da sustentabilidade e do fortalecimento de suas raízes culturais. A mais recente conquista foi a instituição do Conselho de Educação Escolar Indígena do Estado do Tocantins-CEEI/TO (Decreto nº 2.367 publicado no Diário Oficial do Estado no dia 15 de março de 2005), logrou uma luta de anos, desde sua Minuta em Fórum realizado no mês de outubro de 2001. E, conforme a Ata de Audiência Pública, realizada na Procuradoria Federal do Trabalho, no dia 31 de março de 2005, precisa ser retificado, para incluir os representantes do povo Krahô-Canela. Analisar o processo do agenciamento, em uma perspectiva interétnica, no que se refere a educação escolar indígena, no Tocantins, constitui um desafio, que propõe articular áreas de conhecimento como educação, história e antropologia, compreendendo a complexidade multidisciplinar. Por outro lado, o nosso objeto de investigação e os sujeitos políticos que protagonizam a trama, nos exigem acuidade, demasiada atenção e compromisso. Por isso, partimos do pressuposto, que nós não indígenas somos os outros para aqueles que aqui estavam, minimamente, há 500 anos, nestas terras e nas águas que nelas têm. Nos últimos anos, relevantes publicações vêm tratando da Educação Escolar Indígena. Os trabalhos realizados pelo Centro MARI-Grupo de Educação Indígena, do Departamento de Antropologia da USP, têm se revelado um conjunto dos mais significativos. Nesse contexto, em meados dos anos oitenta, Aracy Lopes da Silva (1987), organizou e publicou Questões Indígenas na Sala de Aula, como referência fundamental na divulgação das questões indígenas nas escolas não-indígenas. Posteriormente, aquele Centro dedicou-se a apoiar os movimentos de professores indígenas pelo Brasil 6. As pesquisas atuais realizadas pelo MARI, resultaram na publicação de um conjunto de obras tanto sobre a educação escolar indígena, quanto sobre educação e pedagogias indígenas 7. Pode-se dizer, que um dos exemplos de agentes não indígenas presentes no 5

processo de educação escolar indígena no Norte de Goiás, é o caso peculiar da professora Leolinda Daltro. Professora no Rio de Janeiro do final do século XIX, Leolinda conheceu um grupo de Xerente em viagem à capital da instaurada República. Catechista leiga, era como se autodefinia para distinguir-se das várias missões religiosas que trabalhavam com grupos indígenas no território nacional. A partir de sua atuação entre os índios, que Leolinda aprendeu a lutar por uma causa. No entanto, há muito tempo os próprios índios procuravam organizar-se com a finalidade de obter representação política, ainda que de modo enviesado 8. Nesse contexto, a nossa experiência educacional, na Aldeia Pedra Branca, com o povo Krahô e, posteriormente, ao longo de cursos de formação para os professores indígenas bilíngües, do Tocantins, nos levam a crer que, a redefinição de programas, material didático, calendário escolar, currículo, dentre outros, pautados na convivência das comunidades indígenas com a sociedade não indígena, priorizando, contudo, aspectos intrinsecamente constituídos pela alteridade da história e da luta sociopolítica destes povos, pode possibilitar um processo de criação e gestão do seu próprio conhecimento, bem como de sua elaboração e transformação no cotidiano da educação escolar nas aldeias. Na temática de educação indígena, insere-se nossa pesquisa, priorizando, a compreensão do processo social de implantação e gerenciamento de formas não indígenas de educação formal. Além disso, ao se conhecer o processo de forma crítica e política, pode-se revelar o agenciamento dos atores envolvidos na educação escolar, tanto os não indígenas, quanto os própios indígenas. ERRATA/Justificativa da Inscrição nº 5947 : Conforme solicitação, via contato telefônico com o secretário Gilberto, em 06/06, às 9h10min, para substituições de título e resumo, fomos informados que esse procedimento seria inviável. No entanto, poderíamos enviar um texto que se adequasse ao simpósio temático: História e Hitoriografia da Educação no Brasil: desafios e perspectivas de pesquisa. Portanto, estamos enviando 6

nosso texto que intitula-se: Educação Indígena: perspectivas de interculturalidade nas demandas e propostas dos povos indígenas do Tocantins. 1 TASSINARI, Antonella Maria Imperatriz. Escola Indígena: novos horizontes teóricos, novas fronteiras da educação. In: SILVA, Aracy Lopes da ; FERREIRA, Mariana K. Leal (orgs.). Antropologia, História e Educação: a questão indígena e a escola. São Paulo: Global, 2001. 2 CARNEIRO DA CUNHA, Manuela. (org.). Legislação Indigenista no Século XIX. São Paulo: Edusp/Comissão Pró-Índio, 1992. 3 CORREA, Mariza. Antropólogas e Antropologia. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, 2003. 4 Ver: GAGLIARDI, José Mauro. O indígena e a república. São Paulo: Hucitec, 1989. ROCHA, Leandro Mendes. A política indigenista no Brasil: 1930-1967. Goiânia: Ed. UFG, 2003. 5 SILVA, Aracy Lopes da ; FERREIRA, Mariana K. Leal (orgs.). Antropologia, História e Educação: a questão indígena e a escola. São Paulo: Global, 2001. 6 SILVA, Márcio F. da ; AZEVEDO, Marta A. Pensando a escola dos povos indígenas no Brasil: o Movimento dos Professores do Amazonas, Roraima e Acre. In: SILVA, Aracy Lopes da ; GRUPIONI, Luís Donizete B.(orgs.). A temática indígena na escola: novos subsídios para professores de 1º e 2º Graus. Brasília: MEC/MARI/UNESCO, 1995. 7 Op. cit. SILVA; FERREIRA... 8 Op. cit. CORREA... 7