Palavras-chave: Educação Infantil, texto coletivo e linguagem escrita.



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Transcrição:

O trabalho de produção de texto coletivo com crianças de 4 a 5 anos Fernanda Michelle Pereira Girão 1 Izauriana Borges Lima 2 Ana Carolina Perrusi Brandão 3 Resumo O presente estudo analisou, através de entrevistas com professoras e observações de salas de Educação Infantil, como são vivenciadas as práticas de produção de texto coletivo com crianças de 4 a 5 anos. Buscou-se identificar as concepções das professoras associadas a este trabalho, bem como os encaminhamentos metodológicos empreendidos na condução de suas propostas. Aponta-se a necessidade de uma reflexão mais aprofundada quanto ao direcionamento da atividade de escrita coletiva nas salas de Educação Infantil, principalmente no que se refere às condições de produção textual, a fim de que tal atividade passe a ser inserida num contexto mais significativo. Palavras-chave: Educação Infantil, texto coletivo e linguagem escrita. Justificativa Consideramos que refletir sobre o desenvolvimento integral da criança, comumente mencionado no âmbito das discussões sobre Educação Infantil significa pensar sobre o fazer pedagógico, através do qual se traduzem concepções teóricas que o fundamentam. Na tentativa de entender melhor o processo de ensino-aprendizagem com crianças pré-escolares, nos interessa, particularmente, as situações da prática pedagógica relativas ao desenvolvimento da língua escrita. Por meio do contato, da observação e análise do dia-a-dia em salas de Educação Infantil, oportunizados nas disciplinas Educação Pré-escolar e Pesquisa e Prática Pedagógica III, foi constatado que o trabalho de escrita freqüentemente 1 Concluinte do Curso de Pedagogia da UFPE. fernanda.michelle@hotmail.com 2 Concluinte do Curso de Pedagogia da UFPE. dainha.borges@hotmail.com 3 Professora Adjunta do Departamento de Métodos e Técnicas de Ensino Centro de Educação UFPE. carol.perrusi@ufpe.br 1

envolve propostas de produção de textos coletivos. Diante da constatação de que muitas professoras já incorporaram essa atividade na rotina das salas de educação infantil, buscamos investigar como esse tipo de atividade vem sendo vivenciado. Embora a proposta de escrita de textos coletivos seja reconhecida como relevante para a formação de produtores de texto, observa-se uma lacuna na bibliografia quanto ao estudo desse tópico. Assim, apesar de existir um grande volume de trabalhos investigando a produção textual de crianças (ver, por exemplo, Geraldi, 1984; Leal, 2003; Smolka e Góes, 1992), pouco se tem pesquisado sobre a produção de texto coletivo, particularmente na Educação Infantil. Conseqüentemente, observa-se na literatura poucas pistas que orientem o trabalho do professor em relação a essa atividade. Num levantamento realizado no site da Associação Nacional de Pós- Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), por exemplo, constatou-se que entre os anos de 1998 e 2001 (dados disponíveis no site) não foi publicado nenhum trabalho sobre produção de textos coletivos no GT da Educação da criança de 0 a 6 anos. Tal escassez de referências bibliográficas que tratem do tema pode estar associada à concepção de que não é possível ou não é relevante ensinar crianças menores de 6 anos a produzir textos. Conclusões desse tipo, possivelmente estão atreladas a uma não diferenciação entre os processos de grafar e produzir um texto, ou ainda a visões equivocadas em que se considera que tratar da produção de textos na educação infantil implica a adoção de um modelo de escolarização precoce. Caminhando, porém, em outra direção o Referencial Curricular para a Educação Infantil (RCNEI, 1998) afirma que: Ditar um texto para o professor, para outra criança ou para ser gravado em fita cassete é uma forma de viabilizar a produção de textos antes de as crianças saberem grafá-los. É em atividades desse tipo que elas começam a participar de um processo de produção de texto escrito, construindo conhecimento sobre essa linguagem, antes mesmo que saibam escrever autonomamente. (1998, p.146) Também compartilhamos dessa concepção: a atividade de produção de textos coletivos pode constituir-se numa atividade fundamental para o desenvolvimento de conhecimentos necessários à compreensão do funcionamento de um texto escrito. Assim, durante a produção de um texto coletivo, ao mesmo 2

tempo em que as crianças entram em contato com os elementos que caracterizam o texto escrito e suas peculiaridades em relação à linguagem oral, elas podem perceber ainda os usos e funções sociais da escrita. Em síntese, consideramos que o momento em que as crianças estão construindo um texto coletivamente, com a ajuda do professor atuando como mediador, é uma situação de extrema relevância para a implantação de uma cultura escrita na escola. Entendemos que essa prática se torna ainda mais importante quando se trata da formação de produtores de textos na Educação Infantil, uma vez que as crianças menores ainda não desenvolveram a autonomia necessária para grafar um texto sem a ajuda de outrem. Por fim, vale frisar que a maneira como a situação é conduzida nos parece um fator determinante para que a atividade de escrita esteja articulada a uma proposta de formação de produtores de textos ativos e reflexivos. Nesse sentido, ao conhecer e analisar o trabalho de professoras atuando em salas de Educação Infantil durante o processo de produção coletiva de textos, esperamos contribuir para orientar a ação docente na condução de tal atividade, de modo mais consistente e informado. 1. Referencial teórico 1.1 Refletindo sobre a situação de produção de texto Conforme recomendado por documentos oficiais e diversos autores e pesquisadores na área de linguagem (ver, por exemplo, PCN, 1997 e RCNEI, 1998) defendemos que o ensino da língua deve estar articulado com o contexto no qual estão inseridos os sujeitos do processo de ensino e de aprendizagem. Em outras palavras, reconhecemos a importância de ações pedagógicas que enfatizem as situações de interação e a formação de alunos autônomos, críticos, reflexivos e competentes em leitura e escrita de textos, orais ou escritos. Nessa perspectiva, entendemos o texto não como um instrumento acabado, concluído, mas como uma ocorrência lingüística falada ou escrita, de qualquer extensão, dotada de unidade sóciocomunicativa, semântica e formal (Val, Graça Costa. 1991, p. 3). 3

Considerando o tema enfocado no presente estudo, tal concepção de texto significa assumir a defesa de que a atividade de produção de texto deve possibilitar a constituição de um espaço dialógico e sócio-interativo, nos contrapondo à visão que insiste em tratar o texto na escola de forma arbitrária, tendo um fim em si mesmo, para ser apenas lido e corrigido pelo professor. Propomos, assim, a idéia de que produzir um texto requer necessariamente a resposta para três questões: para quem escrevo? Para que escrevo? E como devo escrever? Em outras palavras, enfatizamos que ao propor uma atividade de produção textual o educador precisa criar condições para que essa prática tenha sentido para seus alunos, considerando três elementos fundamentais: o destinatário do texto, a finalidade do texto e o gênero textual adotado. Abordaremos, brevemente, cada um desses tópicos. O destinatário Saber para quem dirigimos os nossos escritos é uma informação da qual as crianças devem estar cientes desde o início de uma proposta de produção de texto. Além disso, é fundamental fazer referências ao destinatário de nossos textos durante todo o processo de produção, pois está claro que esta (a situação comunicativa) não é uma relação mecânica. O interlocutor pode ser real ou imaginário, individual ou coletivo, pode estar mais ou menos próximo (Geraldi, 1984, p. 110 e 111). Tomar consciência de que o texto a ser produzido será lido por alguém é, portanto, essencial para que as crianças reflitam sobre a clareza do texto, assim como organizem o quê dizer e como dizer. Leal (2003) ressalta a relevância da dialogia como espaço para a atividade humana de expressão a fim de que o aluno possa aprender a escrever articulando diferentes necessidades e interesses nas práticas sociais de que participa. Nesse sentido, entendemos que os textos produzidos pelas crianças devem ter outros destinatários além da professora, tanto para que possam vivenciar diferentes situações e intenções de escrita quanto para que possam aprender uma atitude inerente a alguém que se propõe a produzir um texto coerente e coeso: revisar a própria escrita com o intuito de melhorá-la levando em consideração as nossas intenções e a idéia de um interlocutor fisicamente ausente. 4

A atitude de revisar o texto deve ser um eixo da atividade de produção de texto coletivo. Nesse processo o professor deve assumir uma postura mediadora já que: [...] a reelaboração dos textos produzidos, realizada coletivamente com o apoio do professor, faz com que a criança aprenda a conceber a escrita como processo, começando a coordenar os papéis de produtor e leitor a partir da intervenção do professor ou da parceria com outra criança durante o processo de produção. As crianças e o professor podem tentar melhorar o texto, acrescentando, retirando, deslocando ou transformando alguns trechos com o objetivo de torná-lo mais legível para o leitor. (RECNEI, 1998, p.146 e 147) Porém, o professor precisa estar atento, para que esse procedimento de negociar, acrescentar e modificar termos e expressões não descaracterize a autoria do texto, pois, não se pode esquecer de que as crianças têm que se reconhecer como autoras do produto final. A finalidade Um dos principais objetivos da atividade de construção de textos coletivos na escola é fazer com que as crianças se apropriem das funções sociais da escrita. Na vida cotidiana, o ato de escrever é sempre motivado por uma necessidade, que se constitui no ponto de partida para a escrita e traz consigo a resposta da questão: para que escrevo? Conforme Leal (2003) uma das respostas possíveis para essa pergunta é: escrevemos para sermos lidos e compreendidos. Dentro dessa resposta mais ampla há, contudo, uma finalidade mais específica, tal como: escrever ou responder uma carta, fazer um bilhete para os pais ou um cartão para alguém, relatar uma experiência que não se quer esquecer... São inúmeras as situações que podem motivar a escrita de um texto coletivo e as crianças devem conhecer essa motivação para que pensem sobre a finalidade do texto que está sendo elaborado conjuntamente. Além disso, na medida em que discutimos com as crianças sobre a finalidade de cada texto que produzem elas vão descobrindo aos poucos que podem provocar reações no leitor e vão, conseqüentemente, refletindo sobre a dimensão simbólica da linguagem que envolve o jogo de interesses, de disputas e poder de persuasão. 5

Em síntese, se a proposta é apresentar o texto como uma ocorrência lingüística dialógica, envolta de fatores sócio-culturais e construída a partir de uma dada situação de interação comunicativa, dentro de uma perspectiva de formação de produtores de texto ativos e reflexivos é, portanto, imprescindível que as crianças estejam conscientes da finalidade do texto que estão produzindo. O gênero De acordo com Marcuschi: Usamos a expressão gênero textual como uma noção propositalmente vaga para referir os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica. (2002, p.23) Constantemente se tem afirmado que a diversidade de gêneros textuais deve estar sempre presente no que se refere às práticas de leitura e escrita. Assim, é papel da escola promover situações que viabilizem o trabalho com diferentes gêneros textuais para que os alunos possam reconhecê-los, produzi-los e aprendam a utilizá-los no seu dia-a-dia, em contextos específicos. À medida que as crianças vão se familiarizando com as características dos diversos gêneros, exercitam a habilidade de utilizá-los adequadamente de acordo com o contexto, com os interesses e com o destinatário previsto para o seu texto. Na verdade, é esse exercício que lhes proporcionará o desenvolvimento da capacidade de participar de diversas situações de comunicação com sucesso. Assim como em relação ao destinatário e a finalidade, a explicitação do gênero textual a ser adotado numa certa situação de comunicação deve se dar no início da atividade de escrita, sendo retomada ao longo do processo de produção do texto. Como já afirmamos, tais referências fornecem pistas para a questão de como o texto deverá ser escrito. É importante também que antes de propor a produção de um texto de determinado gênero, o professor ofereça oportunidades para as crianças entrarem em contato com alguns modelos desse gênero textual. Por fim, vale salientar que os três elementos que discutimos nessa seção e que constituem as condições de produção textual, se inter-relacionam. Por isso, 6

devem ser tratados de maneira articulada, uma vez que constituem um conjunto de fatores indispensáveis para a atribuição de sentido à situação comunicativa. 1.2 Por que propor atividades de produção de texto coletivo? Partindo de uma concepção de produção de texto como atividade cognitiva e social (Melo e Silva, 2006), entendemos que esta pode se dar de maneira mais significativa quando se desenvolve em situações de troca. A produção de texto coletivo é uma atividade em que a interação é condição básica e acontece em duas dimensões: a interação entre o grupo que está produzindo o texto (os alunos e o professor) e a interação que o grupo estabelece com o destinatário do texto. Diante do desafio de produzir um texto coletivamente, o aluno depara-se com um conjunto de situações com as quais terá que lidar de modo interativo com o grupo de modo a construir uma unidade interlocutiva eficiente e eficaz. Esse processo se constitui realmente quando o professor se propõe a criar um espaço de mútua colaboração e comunicação. Para Moro (1991), a intervenção do adulto deve orientar as tarefas entre as crianças, favorecendo o conflito cognitivo, maximizando adequadamente os conflitos e provocando soluções estruturantes (Apud Leal, 2001, p.31). Assim, nos momentos de produção de textos coletivos, as crianças podem confrontar idéias, expressar seus pensamentos, sentimentos, valores e desenvolver competências como selecionar e avaliar as melhores ou mais adequadas idéias/ informações que deverão constituir o texto, bem como utilizar os recursos de coesão e coerência para que o texto tenha sentido. O fato de essa atividade trabalhar de forma muito articulada com as linguagens oral e escrita exige ainda uma outra competência dos produtores: a capacidade de reorganizar o texto com o fim de adotar as características da linguagem escrita. Como tem sido demonstrado por diversos autores (ver, por exemplo, Rego, 1988), durante o ato da construção do texto a criança vai percebendo que a produção da linguagem escrita se dá em condições diferentes da fala. E mesmo não grafando o texto, elas já observam, através do ato da escrita do professor, que há diferenças entre a oralidade e a escrita. Assim, além da interação mental que 7

precisa estabelecer com o destinatário, a criança depara-se com a tarefa de adaptar as idéias selecionadas para compor o texto às convenções de registro. A esse respeito Teberosky e Ribera salientam que: Os meninos e as meninas pré-escolares distinguem entre registros formais e cotidianos, entre diferentes gêneros, e são capazes de relacionar essas diferenças com as modalidades oral e escrita. Reconhecem e produzem as formas discursivas associadas à linguagem escrita mesmo antes de serem capazes de ler ou de escrever por si próprios. (Ribera e Teberosky, 2004,63) A prática de textos coletivos é também imprescindível para a construção de um ambiente alfabetizador na escola, uma vez que ao produzir textos conjuntamente proporcionamos as crianças a oportunidade de eventos de letramento, ou seja, momentos de uso real da escrita. Desse modo: Todas as tarefas que tradicionalmente o professor realizava fora da sala de aula e na ausência das crianças, como preparar convites para reuniões de pais, escrever uma carta para uma criança que está se ausentando, (...) podem ser partilhadas com as crianças ou integrarem atividades de exploração dos diversos usos da escrita e da leitura. (Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, 1998, p.151) Assim, a produção de um texto coletivo pode aparecer tanto no planejamento do professor (através de projetos ou seqüências didáticas) como pode surgir de um acontecimento ou de uma necessidade da turma, desde que seja gerada a partir de um contexto significativo para o grupo. Melo e Silva apontam a produção coletiva de textos como uma modalidade de organização em que os alunos podem observar atos de escrita do professor e isso se torna relevante à medida que eles são expostos a um modelo mais experiente de produtor de textos, sobretudo se ele expressa oralmente as decisões que está tomando durante a escritura do texto (2006, p. 90). Essas decisões podem estar relacionadas aos diversos aspectos do processo de escrita. O professor pode, então, fazer perguntas sobre o conteúdo da mensagem e também chamar a atenção para aspectos gráficos, tais como: as letras, as palavras e a organização gráfica do texto (Ribera e Teberosky, 2004). Em resumo, pensando e construindo coletivamente textos ditados pelo professor... 8

As crianças aplicam conhecimentos, resolvem problemas e, sobretudo, aprendem a usar uma linguagem formal em atividades significativas de escrita, adequando o vocabulário, a estrutura e o conteúdo de seus textos aos objetivos perseguidos. (...) A partir de observar, participar no procedimento, perseguir propósitos e elaborar um texto de forma compartilhada, os meninos e as meninas aprendem aspectos da linguagem escrita que não poderiam aprender com a simples cópia do resultado final. (Ribera e Teberosky, 2004, p. 64) 1.3 Crianças pequenas produzem textos? Como tem sido discutido até aqui a produção de textos coletivos se constitui no desafio de produzir um texto oral com destino escrito. Nesse sentido, entendemos que o papel de escriba é desempenhado pelo professor, mas a tarefa de produzir o texto é de todos. Em outras palavras, concebemos que as crianças são produtoras de textos escritos, ainda que façam isso oralmente. Para tanto, é fundamental que elas participem, sugerindo a inclusão de certas informações, fazendo acordos sobre o conteúdo do texto e argumentando a favor da proposta que lhes parece mais adequada. Evidentemente, o nível de participação do grupo vai aumentando à medida que ele vai se familiarizando com essa prática. Assim, como enfatizam Ribera e Teberosky (2004): Quando o professor se faz de escriba, toma uma posição vicária a respeito de algumas capacidades que meninos e meninas ainda não dispõem, mas dá lugar a que exercitem e melhorem outras que já possuem. Com a sua ajuda, suas perguntas e seu controle sobre o processo, os meninos e as meninas integram conhecimentos novos com outros que já possuíam. (Ribera e Teberosky, 2004, p. 65) Finalmente, um aspecto importante em relação à prática de produção de textos coletivos na Educação Infantil é considerar que tal atividade não substitui a produção de textos de próprio punho. Ou seja, apesar de não saberem escrever convencionalmente, as crianças podem e devem ser estimuladas a escrever da forma como sabem, sozinhas ou em duplas, expressando as suas hipóteses sobre a escrita. Esses momentos são particularmente ricos, pois podem vir a desestabilizar suas hipóteses iniciais acerca do funcionamento da escrita, proporcionando avanços no processo de apropriação do sistema alfabético por parte das crianças. 9

A seguir serão apresentados os objetivos (geral e específicos) do estudo, bem como a sua estruturação metodológica e a análise dos dados coletados. 2. Objetivos da pesquisa 2.1 Objetivo geral: Analisar a prática de produção de texto coletivo com crianças de 4 a 5 anos. 2.2 Objetivos específicos: (1) Verificar se a atividade de produção de texto coletivo é freqüente e está inserida em um contexto significativo para as crianças, ou seja, se está articulada a uma situação de interação em que a escrita tem significado para quem escreve; (2) Observar se o comando dado para a atividade de escrita inclui a explicitação para as crianças do gênero textual a ser produzido, a finalidade do texto e um destinatário além da professora; (3) Verificar se, ao longo da atividade de produção textual, é feita alguma referência ao gênero textual; bem como s à(s) finalidade(s) do texto a ser produzido e para quem será destinado; (4) Observar se as crianças participam da atividade como sujeitos ativos, assumindo o professor uma postura de mediador durante o processo de produção textual, considerando as falas dos alunos e realizando um trabalho de reorganização dessas falas; (5) Observar se é sugerida alguma proposta de revisão (em processo e ou do produto final) e como esta é encaminhada; (6) Observar, através de entrevista com a professora, qual a sua concepção sobre produção de texto coletivo e se ela consegue materializá-la na prática. 10

3. Metodologia Foram conduzidas 6 observações de produção de textos coletivos realizados por duas professoras de escolas municipais do Recife, sendo uma do grupo IV e uma do grupo V. De cada professora foram, portanto, observadas três atividades. A escolha de crianças entre 4 e 5 anos justifica-se pelo fato de que nesta idade elas já utilizam a linguagem oral para plena comunicação, assim como já, possivelmente, vivenciaram mais situações envolvendo tanto a oralidade quanto os usos e funções sociais da escrita. Tais fatores possibilitam, portanto, uma maior participação e autonomia no momento da produção coletiva do que a que seria esperada em se tratando de crianças mais novas. Também foi realizada uma entrevista com as duas professoras (aqui chamadas de professora A e professora B, sendo respectivamente, uma do Grupo IV e a outra do Grupo V) visando à obtenção de informações sobre as suas concepções a cerca da produção de textos e à verificação de como fazem a transposição dessas concepções na prática. As entrevistas e as 6 observações de sala de aula foram audiogravadas e posteriormente, transcritas literalmente. Além disso, todo processo de produção foi acompanhado e registrado por escrito pelas pesquisadoras no momento das produções. Vale salientar que as professoras ficaram livres para inserir a atividade de produção dos textos no momento em que achassem pertinente. Ou seja, a proposta era de que as professoras seguissem normalmente com o seu planejamento, nos e avisando quando fossem realizar a produção coletiva de um texto, não havendo nenhum tipo de intervenção das pesquisadoras quanto ao dia em que seria realizada a atividade ou qualquer outro aspecto referente aos encaminhamentos da mesma. Esse procedimento foi adotado para que se pudesse verificar a freqüência e o contexto em que era proposta a atividade. 4. Análise dos resultados Para melhor visualização e análise dos dados coletados optou-se por apresentá-los agrupando-os em tópicos de discussão. Tais tópicos foram emergindo das leituras das transcrições das atividades de produção coletiva 11

observadas, considerando-se também os objetivos do estudo descritos no item 2, acima. Ao longo da análise apresentada a seguir, foram extraídos trechos das entrevistas e das observações com vistas a fundamentar os nossos comentários. Além disso, com base nas transcrições das atividades de produção de textos coletivos das professoras A e B elaboramos dois quadros-síntese (ver Anexos I e II, respectivamente). Tais quadros resumem informações que julgamos relevantes e que serão, portanto, retomadas e aprofundadas na análise. Caracterização geral da situação de produção dos textos Professora A Grupo IV A sala onde foram realizadas as observações era estreita e alongada e as crianças estavam organizadas em grupos de quatro por mesa. O grupo estava sempre composto por uma média de 17 crianças nas três aulas observadas. Durante as três atividades o procedimento da professora consistia em escrever o texto no quadro junto com as crianças e em seguida transcrevê-lo num papel grande, enquanto as crianças realizavam outra atividade. A forma em que a turma era organizada gerava dispersão entre as crianças. Porém, a escrita do texto realizada no quadro proporcionava uma visualização melhor das crianças acerca de aspectos importantes do processo de produção como a notação e a organização espacial do texto. Professora B Grupo V A sala era ampla e as crianças sentavam-se em cadeiras de braço, sempre organizadas em círculo. O grupo estava composto por uma média de 18 alunos por atividade observada. O procedimento utilizado pela professora consistia em escrever. Durante a produção dos textos, as crianças e a professora ficavam sentadas em círculo no chão da sala, enquanto ela escrevia o texto numa folha de papel tamanho ofício. Ao final da atividade o texto escrito na folha de ofício era guardado pela professora. Observou-se que o procedimento de organizar o grupo em roda possibilitava uma maior interação das crianças com a atividade. Entretanto, consideramos que o fato da professora escrever o texto numa folha tamanho ofício limitou o acesso das crianças ao processo de produção. 12

4.1. A freqüência de produção de textos coletivos nas salas de Educação Infantil e as situações de escrita propostas Nas duas salas observadas constatou-se uma baixa freqüência de atividades de escrita coletiva de textos. Na sala da professora B a produção de texto aparece num intervalo de aproximadamente um mês entre uma atividade e outra. Consideramos que isso ocorre porque a professora não costuma propor a produção de textos coletivos aproveitando situações de uso da escrita que, geralmente, surgem no cotidiano escolar. Assim, não se observou nenhuma tentativa de gerar contextos de comunicação em que surgisse a necessidade de produzir um texto coletivamente com finalidade clara para as crianças e dirigido a um destinatário real. Vejamos o que diz a professora sobre a maneira como insere a produção de textos coletivos em sua prática: (...) eu trabalho bastante o tema. Eu não faço texto coletivo assim: vou jogar. Vamos ler esse livro agora e fazer um texto coletivo, não. Eu trabalho a semana todinha o tema e incluo o texto coletivo, entendeu? Quando eu acho que eles estão envolvidos com o tema, então eu puxo o texto coletivo 4. A professora, corretamente, acredita que para escrever sobre um tema precisamos ter conhecimentos sobre este. Entretanto, sua fala também reflete uma visão um tanto limitada acerca das diversas finalidades de um texto, já que ela não parece perceber que a construção de textos coletivos também pode estar associada às diversas situações de uso da escrita, tais como elaborar um bilhete ou um comunicado aos pais, produzir listas de coisas que não queremos esquecer, construir uma carta para um aluno que faltou, entre outras diversas situações de uso social da escrita que podem ser inseridas no cotidiano escolar. Ao contrário, a professora B propõe apenas a escrita coletiva de histórias nas três situações observadas (ver Anexo II). Nas situações de produção 2 e 3 propôs a reescrita de história a partir de um texto lido e a escrita de história a partir de uma imagem, respectivamente. Na situação 1 é interessante perceber que a intenção da professora era escrever sobre o que as crianças aprenderam acerca do tema trabalhado (proposta que é destacada por ela na entrevista). Nesse contexto, comumente, a produção escrita resulta num texto do gênero redação escolar, com função predominantemente informativa. No entanto, a professora desde o comando 4 Ao longo desta seção todas as falas das professoras estão em itálico. 13

direciona todo o processo de produção no sentido de que a composição do texto assuma características de história (ver Anexo III, texto B1), fato que evidencia a ênfase dada a esse gênero no trabalho da educadora. O uso exclusivo de um determinado gênero textual pode levar a implicações do tipo: limitar a produção e a compreensão do funcionamento dos diversos gêneros. Tal empobrecimento no repertório dos gêneros textuais no exercício da linguagem escrita também pode levar a criança a concluir que a produção textual tem função unicamente escolar e que o exercício da atividade escrita está dissociado de qualquer relação que possa estabelecer com eventos cotidianos de uso da linguagem escrita Em relação à professora A, pode-se perceber que os textos coletivos aparecem com maior freqüência, sendo realizada em média uma atividade por semana. Assim como a professora B, ela também afirma na entrevista que a proposta de textos coletivos se dá geralmente a partir dos assuntos que estão programados. Porém, na entrevista tal professora já considera a possibilidade de construir textos com as crianças partindo de uma situação de sala de aula, ainda que nas três aulas observadas isso não tenha ocorrido (ver Anexo I). Mais uma vez, evidencia-se com a professora A, a predominância de propostas de escrita de histórias. A exceção se dá na escrita coletiva de uma receita de pipoca. Porém, mais uma vez a professora não demonstra preocupação em inserir o texto numa situação real de interação. Escrevemos uma receita culinária em nosso dia-a-dia para ensinar alguém a preparar um determinado prato. Da maneira como foi proposta, a escrita da receita não apresentava uma finalidade, por exemplo: ensinar os alunos de outra turma a prepararem pipoca para comerem juntos durante uma sessão de vídeo na escola. Nesse contexto, a escrita da receita teria, certamente, mais significado para as crianças, já que havia uma finalidade clara e um destinatário real. Além disso, reflexões quanto às características do gênero, ao conteúdo e a clareza do texto também seriam mais facilmente inseridas. Sintetizando, a prática das duas professoras demonstra a necessidade de uma maior consciência sobre a importância de se construir textos na escola reproduzindo práticas sociais de comunicação escrita. Tal tópico será discutido mais detalhadamente no item 4.2, a seguir, referente às condições de produção textual nas salas observadas. 14

4.1.1. A produção de textos coletivos a partir de leitura de imagens Observamos três produções de textos a partir da leitura de imagens, duas com a professora A e uma com a professora B, dado que nos levou a discutir mais detalhadamente sobre esse tipo de proposta. Vale salientar a diferença entre leitura de imagens e produção de textos escritos a partir da leitura de imagens. Lemos imagens cotidianamente quando interagimos com outdoors, charges, panfletos, obras de arte, etc. Entretanto, geralmente não nos deparamos com situações cotidianas em que temos que escrever textos a partir de imagens. Por isso, o trabalho de leitura de imagens na escola é extremamente relevante, mas na produção de textos coletivos a partir de imagens é importante refletir sobre alguns aspectos. Por exemplo, verificou-se que durante a produção dos textos, as professoras tendiam a preocupar-se muito em fazer com que as crianças observassem as imagens, como demonstra o fragmento abaixo da situação de produção 3 com a professora A: Professora: Peraí, vamos olhar pra aqui. Era uma vez um Saci treloso (lendo) que fumava cachimbo... (escrevendo). Criança: E também, e também que pegava no rabo da lagartixa e do coelho. Professora: Ô Emanuel, a gente tem que dizer o que a gente tá vendo aqui! Essa preocupação das professoras também se confirma durante as entrevistas, como se pode constatar na fala da professora B: (...) se for uma produção de texto coletivo de uma leitura de imagem a gente vai explorar bem a imagem, o que é que eles vêem na imagem, o que é que mais chama atenção, quais são as cores daquela imagem. O resultado final foi uma produção textual em que as crianças apenas realizaram uma descrição das imagens apresentadas (ver Anexo III, textos A1 e B3), gerando um texto pobre e uma mensagem pouco compreensível para um destinatário ausente da situação em que o texto foi produzido. De fato, como pudemos observar na leitura dos textos finais das professoras A e B a seqüência dos fatos narrados só podem ser compreendidos se estiverem acompanhados das imagens que deram origem ao enredo. Outro aspecto que deve ser levado em consideração diz respeito à seleção da(s) imagem(s) a ser(em) trabalhada(s). Percebemos que o uso de apenas uma imagem tende a comprometer ainda mais a produção do texto, como pudemos 15

evidenciar com a professora B, que acabou gerando um enredo pouco criativo com seu grupo de crianças (ver Anexo III, texto B3). No caso da situação 3 com a professora A, observou-se que o uso de uma seqüência de imagens que descrevia um episódio incluindo uma situação-problema e um desfecho gerou um texto mais elaborado (ver Anexo III, texto A3). Ao que parece, a professora teve mais oportunidade de extrapolar a mera observação das imagens para ajudar as crianças a anteciparem, fazerem inferências, utilizarem os conhecimentos prévios sobre o personagem folclórico que já conheciam e construírem elos entre a seqüência de imagens para compor uma narrativa mais coerente, como mostram as questões abaixo, formuladas pela professora no processo de produção: Professora: Quem será que vai puxar o chapéu dele? (...) ou ainda: (...) Essa pessoa que puxou... Vocês acham que ela puxou por que, o chapéu do Saci? 4.2. As condições de produção coletiva de textos nas salas de Educação Infantil Em nenhuma das seis produções de textos coletivos observadas as professoras explicitaram a finalidade e o destinatário dos textos no comando para a atividade (ver Anexos I e II). Essas informações também não apareceram ao longo da produção. Quanto ao gênero textual, constatou-se que essa informação é explicitada no comando em cinco das produções. No entanto, percebeu-se que durante o processo de escrita não se retoma em nenhum momento o gênero textual que está sendo produzido e também não se faz nenhuma reflexão acerca das suas características, nem antes da atividade de escrita começar, nem ao longo da atividade. Assim, pode-se afirmar que os comandos dados pelas professoras no momento em que propõem a construção de um texto coletivamente não contribuem para explicitação da situação de escrita ao mesmo tempo em que não trazem as informações necessárias para que essa atividade tenha um maior significado para as crianças. É possível que essa lacuna se deva aos objetivos didáticos atribuídos pelas professoras à atividade de construção de textos coletivos. Nas entrevistas as duas professoras destacam a importância de produzir textos coletivos com as crianças. Porém, quando justificam tal importância não associam a produção de textos coletivos com objetivos relativos à aprendizagem da linguagem escrita, destacando outros tópicos, tais como: (...) desenvolve a 16

oralidade, a concentração do aluno, dele saber a seqüência dos fatos (...) a criatividade, a capacidade de argumentação, de coerência de fatos, a oralidade, saber que tudo começa e no meio tem alguma coisa que aconteceu para que aquela história se desenvolva...(profª A). O mesmo ocorre com a professora B, como mostra esse trecho de sua entrevista: a importância é... Acho que é quando a criança, né, ela se expressar, desenvolver a oralidade, nesse sentido deles expressarem o mundo deles, de como eles compreenderam, fazer uma releitura de um texto, trazer novidades, como eles interpretam um filme ou um texto novo, ou uma história. A expressão mesmo da criança. Quando questionada diretamente sobre os conhecimentos construídos pelas crianças sobre a escrita durante a produção de textos coletivos, a professora A aponta apenas objetivos ligados à apropriação do Sistema de Escrita Alfabética. Vejamos: a produção de textos coletivos mostra que pra escrever se usa letras. Então, o desenho não é a única fonte de comunicação. Tem também a escrita. (...) que pra escrever tem que se usar letras, que o código usado é esse. (...) que há palavras que começam do mesmo jeito, que têm o mesmo som, para que eles (os alunos) analisem, o som das palavras e associem à escrita. Percebe-se, portanto, que objetivos didáticos relacionados aos usos e funções sociais da escrita ou à explicitação de operações cognitivas necessárias à construção de um texto escrito não são destacados pela professora. Em síntese, na fala das professoras não aparece a intenção de demonstrar para as crianças o caráter dialógico da linguagem, em levá-las a refletir sobre as diferentes situações cotidianas que mobilizam a escrita de um texto e ajudá-las a perceber que para realizar essa atividade Buscamos, na memória, os conhecimentos relativos ao tema, à organização e configuração dos textos, adotando gêneros textuais que, usualmente, estão presentes em situações comunicativas (...). Precisamos, pois, gerar conteúdos; organizar tais conteúdos em seqüências lingüísticas, textualizando o que se quer dizer; e notar (registrar o texto no papel). Necessitamos também, coordenar todas essas ações, monitorando as atividades, mantendo acesa, na memória, as finalidades para a escritura do texto. (Leal e Brandão, 2006, p. 46) 17

4.3. A revisão do texto coletivo Constatou-se que nas produções observadas há tentativas por parte das professoras de adequar aquilo que é dito pelas crianças em função das características da linguagem escrita, o que é muito importante para que os aprendizes percebam as diferenças entre a oralidade e a escrita. A professora A preocupa-se em fazer com que as crianças reflitam sobre essa questão, como demonstra o fragmento abaixo extraído da situação de produção 3: Pro fessora: Será que ele deu o chapéu? Criança: Deu. Professora: Olha. Então, como é que a gente pode escrever aqui? Alguém que não gostou puxou o chapéu do Saci. Foi o dono da casa (relendo). Criança: E ele ficou arretado. Professora: E aqui o que foi que ele fez? Como é que a gente pode botar? Perguntas do tipo: Como é que a gente pode escrever esse pedacinho? e Como é que a gente vai escrever isso que vocês estão dizendo? são importantes para que as crianças percebam que ao escrever precisamos estruturar as frases dando-lhes um caráter mais formal do que em situações de comunicação oral. Nos textos produzidos pelo grupo da professora B verificou-se que esse tipo de intervenção também acontece, porém menos freqüentemente. Vale ressaltar que tanto no trabalho da professora A, quanto no da professora B, as tentativas de melhorar os textos produzidos restringem-se a esse esforço de organizar as idéias das crianças e transpor aquilo que é dito oralmente pelo grupo para o plano escrito. Observou-se, portanto, que não há intervenções das professoras no sentido de reelaborar junto com as crianças trechos do texto que não ficaram claros. Essa constatação é, possivelmente, decorrente da falta de um contexto de comunicação significativo nas propostas de produção de textos observadas: se não se há finalidade e destinatário para os textos que estão sendo produzidos, a atitude de pensar sobre o que já foi escrito com o objetivo de torná-lo mais claro para facilitar a compreensão do(s) leitor(es) e para atingir as intenções esperadas perde o sentido. Deste modo, gerar um contexto significativo nas situações de produção textual e trazer para as crianças as informações que constituem tal contexto é fundamental para que se pense na necessidade de reconstruir o que está sendo e o que já foi escrito, pois, baseando-se nessas informações aquele que escreve 18

poderá, então, tomar decisões sobre como irá escrever e o que precisa (re)escrever. Isso significa que as condições de produção textual terão, com certeza, um impacto no trabalho de revisão, que poderá ser feito pelo autor do texto. (Brandão, 2006, p.120). Quando perguntadas sobre o procedimento que adotam durante a produção coletiva de textos nenhuma das professoras cita a revisão textual. Como foi dito pelas docentes, a grande ênfase está em estimular a expressão oral e na organização das idéias em seqüência lógica. A ausência de um trabalho de revisão textual mais consistente teve implicações nos textos finais produzidos, como pode ser visto no Anexo III. No texto 1, escrito com o grupo da professora A, por exemplo, o pronome ele se repete várias vezes e em algumas ocasiões não fica claro a quem está se referindo. Algumas revisões gramáticas também poderiam ter sido encaminhadas como a palavra feliz que deveria ter sido escrita no plural, concordando com o sujeito todos (ver Anexo III, texto B2). Talvez as revisões não ocorram porque as professoras revelam na entrevista uma preocupação em manter as marcas das crianças nos textos para garantir que elas se reconheçam como autores da sua própria produção (profª A). Há, portanto, um receio em modificar o texto e torná-lo aquele texto coletivo perfeito, mas que não são as crianças que fazem, tem muito do professor ali... (profª B). Tal preocupação é extremamente relevante, porém, concordamos com Brandão (2006), quando a autora afirma que Já na Educação Infantil, é possível, durante uma produção de texto coletivo, em que o professor funciona como escriba, fazer indagações do tipo: Vamos reler o que escrevemos?, ou Vocês acham que qualquer pessoa pode entender do jeito que está escrito aqui?, Será que a gente pode melhorar o que foi escrito nesse pedacinho do texto? O que a gente poderia mudar?. Assim, não há por que esperar que os alunos possam grafar seus textos para iniciarmos na escola uma proposta de revisão textual. (p. 122) Ao servir de escriba para a turma, o professor deve, portanto, conduzir o trabalho de revisão textual tendo sempre o cuidado de procurar entender o conteúdo da fala das crianças, suas idéias, opiniões e pensamentos, reorganizando o que dizem e garantindo que o texto em construção está refletindo aquilo que elas querem comunicar. Isto, no entanto, não significa transcrever exatamente o que as 19

crianças dizem com hesitações, repetições, erros gramaticais, etc. Afinal, a escola propõe-se a ensinar a criança a escrever a língua materna com clareza, tarefa longa e trabalhosa que tem início na Educação Infantil e se estende por muitos anos (Carvalho, 2005). 4.4. O papel da professora no processo de produção de textos coletivos Como temos visto até aqui, na proposta de produção de textos coletivos, o papel do professor é fundamental, desde a geração do contexto de produção textual até que se tenha alcançado uma versão satisfatória do texto final para aqueles que o estão produzindo. Nesse processo estão incluídas muitas tarefas, tais como: dar um comando claro e adequado para a escrita do texto, gerar reflexões acerca das condições de produção; estimular a participação e ativar os conhecimentos prévios das crianças; discutir questões referentes ao conteúdo, à estrutura, à organização espacial e à escrita do texto; mediar diferentes opiniões sobre o que se quer dizer e como dizer; notar o texto; questionar, propor e explicitar modificações com o intuito de melhorá-lo. Em se tratando de crianças pequenas, o papel do professor enquanto mediador é ainda mais relevante, uma vez que os aprendizes estão iniciando no processo de construção de conhecimentos sobre a produção de textos escritos. Portanto, além de se apresentar como um modelo de alguém que escreve, durante a produção coletiva de textos é preciso que o professor esteja consciente dos objetivos didáticos que deseja alcançar com o seu grupo de crianças para que possa planejar e fazer as intervenções necessárias à ampliação dos conhecimentos dos educandos (Lerner, 1996). Apesar de termos verificado que as professoras apresentam em seu trabalho com produção textual coletiva alguns pontos que merecem ser repensados, principalmente no que se refere às condições de produção e ao trabalho de revisão textual, observamos uma preocupação por parte das duas docentes em guiar a atividade considerando o que os alunos já sabem, organizando as idéias na configuração do texto e intervindo em momentos pertinentes. De fato, na entrevista, ambas enfatizam a importância de assumir uma postura mediadora durante a produção coletiva de textos. A esse respeito professora A afirma: eu vejo um papel de facilitadora entre o que tá ali e a produção deles. É como se eu fosse uma 20

estimuladora, como se eu fosse uma organizadora. Em certas horas eu tenho que dar aquela minha interferência pra que as coisas possam se arrumar. E também uma espécie de mediação entre o que eles sabem e a organização própria do texto. A professora B, por sua vez, destaca que durante a atividade, o educador deve dar um espaço pra a criança se expressar. Você tem que dar aquele espaço e tentar orientar. Quando você vê que tá se perdendo, tem que puxar, porque o papel do professor é esse: mediar e não é fácil. Vejamos um trecho da observação que confirma o que é afirmado acima pelas professoras (situação de produção 3 com a professora A): Professora: Era uma vez um Saci treloso que fumava cachimbo e pulava, não é? Criança: De um pé só. Professora: E pulava de um pé só (escrevendo). Aonde ele fumava cachimbo e pulava de um pé só? Criança: Na floresta. Professora: Na floresta. Criança: A floresta é dele. Professora: Na floresta dele (escrevendo). Como vimos no trecho acima, por duas vezes a professora incorpora as contribuições dadas pelas crianças (De um pé só e Na floresta dele) na escrita do texto. Outro procedimento importante para que as crianças se reconheçam enquanto autoras dos textos apareceu, principalmente, no trabalho da professora B. Por várias vezes, a docente elogiava as contribuições das crianças, como demonstra o trecho abaixo retirado da situação de produção 3: Professora: Vamos lá gente! Era uma vez (escrevendo). O quê? Criança: Um jogo. Professora: Um jogo (escrevendo). Era uma vez um jogo. Criança: Da Copa do Mundo. Professora: Muito bem! Da Copa do Mundo (escrevendo). Também é evidente o esforço das professoras para reorganizar as falas das crianças. No fragmento, extraído da situação de produção 3, nos trechos em negrito a professora A revela uma tentativa nítida de organizar as informações dadas pelas crianças de maneira solta e sem articulação: Professora: Esse Saci aqui foi parar aonde? Criança: Na janela. Professora: Na janela da onde? Criança: Da casa. Professora: Essa casa. Ele fez o que nessa casa? Criança: Ele jogou no chão. Criança: Entrou. Professora: Ah, o Saci tava na janela da casa e entrou e fez o que nela? Criança: Quebrou. Professora: Quebrou... 21

Criança: O ovo. Professora: Poxa! Quebrou o ovo. No fragmento acima também é possível observar que a professora faz perguntas para estimular a participação das crianças e para fazer com que elas completem o sentido das informações. Esse procedimento foi verificado no trabalho das duas professoras em todas as produções analisadas. Isso é fundamental na proposta de produzir textos coletivos para que se possa garantir uma unidade textual. Além desse trabalho de reorganização das falas, constatou-se que, comumente, as duas professoras procuram reler para as crianças os trechos do texto à medida que vão sendo escritos. Tal procedimento é muito importante porque ajuda a situar as crianças na atividade de produção, possibilitando que identifiquem informações que o texto já tem, percebam onde pararam e possam, então, retomar o curso das idéias que querem expressar. Tal procedimento é imprescindível em se tratando de crianças que ainda não lêem convencionalmente e que, portanto, não podem reler o texto quando assim o desejarem. Um aspecto que deve ser salientado é que nenhuma das professoras relê o texto com o intuito de identificar problemas e melhorá-lo. Além disso, as docentes nem sempre realizam a leitura do texto ao final da produção: a professora A leu o texto final para as crianças em duas das três produções e a professora B leu em apenas uma das produções. Consideramos que ler o texto final para as crianças é tão importante quanto reler o texto durante o processo de produção, pois se isso não é feito, as crianças ficam sem ter uma idéia de como ficou a versão final do texto que produziram. Por fim, vale frisar que as duas professoras se mostraram muito disponíveis para ouvir o que as crianças tinham a dizer, ajudando-as a explicitarem suas falas e comunicarem suas idéias. De fato, na entrevista, as docentes destacam que a prática de construir textos coletivamente só será realmente produtiva se fizer com que as crianças se concentrem e participem (profª B) ou ainda quando os alunos sejam dinâmicos, se sintam estimulados e que eles possam realmente usufruir, mesmo, daquilo ali, daquele momento... (profª A). Ou seja, as educadoras assumem uma perspectiva de que nessa proposta a criança deve ser um sujeito ativo. Uma evidência disso é o fato de ambas apontarem a dificuldade de fazer com que todos os alunos participem, como o principal desafio na proposta de produção 22

de um texto coletivo: muitos alunos não se expressam, ficam com vergonha (profª A). (...) eu espero o máximo que eles se expressem (profª B). Entretanto, cabe aqui questionarmos se essa dificuldade de alcançar uma participação maior da turma não está relacionada ao fato das crianças encontrarem pouco sentido para a realização da atividade de escrita. Em outras palavras, é possível hipotetizar que se a proposta de produção textual estivesse inserida numa situação comunicativa com mais significado para as crianças, haveria um maior grau de participação do grupo. 5. Conclusões Com base na análise das produções textuais realizadas e entrevistas com as professoras é possível concluir que a escrita coletiva de textos nas salas de Educação Infantil observadas, não se mostra inserida em um contexto sóciocomunicativo, fato que tem implicações negativas no processo de elaboração textual. Em outras palavras, a ausência de indicação da finalidade, destinatário e gênero dos textos no comando para a atividade de escrita e ao longo dessa atividade se materializa em propostas sem articulação com situações reais de comunicação e, conseqüentemente, pouco significativas para quem produz o texto, no caso, as crianças. Tais situações de produção textual, que contemplam objetivos puramente escolares, têm um impacto negativo no nível de envolvimento das crianças com a atividade, na freqüência com que se propõe a atividade, bem como na diversidade dos gêneros textuais propostos para a escrita coletiva. Isso não significa dizer que todos os textos coletivos produzidos durante o ano letivo tenham que partir de uma necessidade sóciocomunicativa. Porém, o professor deve tentar articular os seus objetivos didáticos em relação à produção de textos com propostas que revelam o uso social dessa atividade sempre que possível e essa intenção não foi identificada em nenhuma das produções observadas. Verificamos ainda que na concepção das educadoras a importância do trabalho com produção de textos coletivos restringe-se ao desenvolvimento de aspectos relacionados à linguagem oral, à capacidade de expressão e á 23