GRAFFITE: DAS RUAS PARA O TERRITÓRIO VIRTUAL Lídia Borges/ 1 Resumo:² O graffite surgiu na década de 1960 nos Estados Unidos e criou uma nova linguagem artística que não estava presa às galerias de arte e nem ao universo acadêmico. Seu espaço de manifestação eram as ruas e seu caráter, efêmero. Nos anos 2000, com a popularização da Internet, muitos artistas começaram a fazer registros fotográficos de suas obras e a disponibilizá-los no universo digital. Essa estratégia, além de possibilitar que a arte se perpetue, provocou uma (re)significação do graffite, pois agora pode-se acompanhar o trabalho de um artista sem que haja a necessidade de se transitar pela cidade. Basta acompanhar páginas e redes sociais na Internet para interagir com o graffite e com os grafiteiros. Intenciona-se neste trabalho, refletir sobre esses novos processos de interações e acesso a essa nova escola do graffite. Palavras-chave: graffite, internet, redes sociais, arte urbana, interação. Introdução O presente artigo tem como propósito refletir sobre as transformações pelas quais o graffite vem sofrendo através da apropriação de recursos digitais e tecnológicos, ou seja, a intervenção urbana além do seu habitat natural as ruas- a partir de novos espaços conquistados por essa arte urbana. Farei então uma breve contextualização histórica do graffite, que é uma expressão artística que nasce na cidade e para a cidade e teve sua origem no final dos anos 60 nos Estados Unidos, 1 Graduanda em Ciências Socias pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás ² Trabalho desenvolvido sob a orientação da Professora Doutora Izabela Tamaso 1
especificamente na cidade de Nova Iorque. Estava estritamente ligado ao movimento Hip Hop, compondo um dos quatro elementos desse movimento que são: B-boy, MC, DJ e o Graffite (CASTLEMAN, 1982). 2 Porém dentre esses elementos, o graffite conseguiu se destacar e se tornar uma arte independente do movimento Hip Hop, sendo hoje em dia uma arte muito mais ligada a grupos juvenis independente de gostos musicais, classe, escolaridade, raça. Nos dias atuais o graffite é umas das expressões artísticas que mais cresce nas cidades, pois não necessita estar inserido em um circuito de arte tradicional, seja ele acadêmico ou comercial para realizá-lo, expô-lo e apreciá-lo. Não se precisa estar dentro de uma galeria de arte para que se possa ser um artista, ou simplesmente ter a oportunidade de ter contato com o graffite, pois afinal, seu local de exposição são os espaços públicos da cidade. É uma arte urbana que utiliza a cidade como uma arena comunicacional. Segundo Campos, o graffiti urbano possui um lugar de destaque. Não porque possui um papel dominante nos circuitos de comunicação, mas precisamente pelo oposto, porque revela a capacidade de actuação dos indivíduos e grupos à margem de corporações e entidades poderosas, apropriando-se de enclaves citadinos para manifestações culturais singulares (CAMPOS, 2008). O graffite é uma arte que está em sua essência ligada fortemente ao espaço territorial da cidade, utilizando-o de diversas maneiras e modificando a visualidade da mesma, mas de uma maneira diferente de outros mecanismos de comunicação legal (outdoor, fachadas de lojas) que utilizam o espaço urbano. Porém, nos dias atuais, é preciso compreender o graffite além desse espaço físico, estático que ocupa no centro urbano e tomar como parte de reflexão dessa arte urbana, os espaços não-físicos que vêm ocupando: universo virtual, digital. Dois espaços distintos, mas que se complementam e se relacionam constantemente para esses artistas urbanos. Dos muros à tela do computador 23 Referência essencial para traçar a história deste movimento, é a obra do sociólogo Craig Castleman (1982) Getting Up Subway Graffiti in New York. 2
O graffite por ter como habitat as ruas, é uma arte efêmera, pois a arte inscrita em muros, viadutos e becos etc., está sujeita a circunstâncias que são inerentes aos agentes das obras urbanas, fatores climáticos, dentre outros. Há também o fato de que o graffite possa ser apagado, seja pelo dono do muro, ou pelos agentes políticoadministrativos da cidade ou mesmo por outros artistas. Além de que o graffite na rua é uma arte estática,,cuja a visibilidade dependa que as pessoas circulem, transitem pelos locais onde essas intervenções urbanas estão inseridas. Sendo assim, a fotografia tornou-se uma maneira de se perpetuar as obras, o único registro possível dessa arte que amanhã pode não mais fazer parte da paisagem urbana. Com a popularização da internet e das redes sociais, muitos artistas começaram a disponibilizar um grande acervo fotográfico que até então era pessoal - dos seus graffites nesse universo virtual. A partir desses compartilhamentos de imagens, o graffite ganha uma nova dimensão. A sua visibilidade não precisa agora necessariamente que seja in loco, basta um clique nas páginas pessoais desses artistas ou um passeio virtual pela internet (PENNACHIN, 2007). A partir dessas reflexões proponho discutir na pesquisa que realizo, quais efeitos essas ferramentas contemporâneas têm sobre essa arte que até então era marginalizada, restrita ao espaço físico da rua e muitas vezes invisibilizada. As ferramentas no qual vou me utilizar sãofacebook e Fotolog. Utilizo essas duas redes sociais, pois nelas encontram-se imagens dos trabalhos desses artistas, além de informações sobre os graffites, permitindo aos grafiteiros interações distintas. O Fotolog tem a peculiaridade das fotos publicadas alcançarem mais os próprios artistas. Já o Facebook, o alcance dessas fotos é de proporção maior, atingindo também pessoas não ligadas ao movimento. A partir dessas redes sociais desenvolverei minha metodologia, que consistirá em analisar durante um período de três meses, a divulgação de imagens de graffite pelos artistas nas redes sociais escolhidas. Observarei os comentários postados sobre as imagens de graffite e realizarei entrevistas com alguns grafiteiros de Goiânia, que façam uso dessas ferramentas virtuais. (PIENIZ, 2009) Suponho que a disponibilização pública desse material fotográfico faça surgir uma interação entre os próprios grafiteiros de dimensão internacional, pois agora, não existe mais uma barreira geográfica para se acompanhar o trabalho de outro artista, 3
ou mesmo conhecer o que é realizado por colegas. As fronteiras espaciais são quebradas, permeáveis, tornando acessível ao olhar produtos visuais que de outro modo estariam inacessíveis (CAMPOS, 2008). Por outro lado, agora não há mais uma ligação física com o local no qual essas obras estão inseridas. Além de uma interação com outros artistas que compartilham dos mesmos signos e universo, há a possibilidade também de uma interação grafiteiro-público e uma abrangência maior dessas imagens a uma gama de pessoas que até então não tinham contato com o graffite. Possibilita uma interação com indivíduos que antes passavam desatentos aos graffites na cidade, ou seja, com a visibilidade na web o graffite conquista um público novo ou até inacessível, se estivesse presente somente em meio ao caos urbano. Conclusão As presentes transformações da forma como o graffite pode ser visto e compartilhado nos dias atuais, nos permite refletir sobre a possibilidade de uma (re)significação dessa arte urbana. Os espaços urbano e virtual estão intrinsecamente ligados e nos parece não poderem mais existir separados, dando uma nova dimensão para o graffite, que seria a junção desses dois espaços. Dessa forma, o graffite passa a ser uma arte híbrida, globalizada e deslocalizada (CANCLINI, 2006). Referências CAMPOS, Ricardo. Pintando a cidade. Uma abordagem antropológica ao graffiti urbano. 2007. Tese (Doutorado em Antropologia) - Universidade Aberta de Lisboa. Disponível em: http://repositorioaberto.univ-ab.pt/bitstream/10400.2/765/1/lc392.pdf. Acesso em: 15 ago. 2011 CASTLEMAN, Craig. Getting Up - subway graffiti in New York. Massachusetts: MIT Press, 1982. CANCLINI, Nestor Garcia. Culturas hibrídas estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo: EDUSP, 2006. GITAHY, Celso. O que é graffiti. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1999. PENNACHIN, Deborah Lopes. Do spray aos pixels: um estudo semiótico sobre a ciberculturalização do graffiti. Artigo. Disponível em: 4
http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs2.2.2/index.php/revislav/article/viewfile/2167/1316. Acesso em:12 ago. 2011 PIENIZ, Mônica. Novas configurações metodológicas e espaciais: etnografia do concreto à etnografia do virtual. In: Revista Elementa - Comunicação e Cultura, v. 1, n.2, jul/dez 2009. Sorocaba: Universidade de Sorocaba, 2009. RAMOS, Célia Maria Antonacci. Grafite, Pichação & Cia. São Paulo: Annablume, 1994. 5