Palavras-chave: Contrato Didático; Capital Cultural; Prova Brasil.

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Transcrição:

RUPTURA NO CONTRATO DIDÁTICO NA DISCIPLINA MATEMÁTICA EM UM MUNICÍPIO PARANAENSE Angela Mognon Universidade Tecnológica Federal do Paraná amognon@utfpr.edu.br Doherty Andrade Universidade Estadual de Maringá doherty@uem.br Késia Caroline Ramires Neves Universidade Estadual de Maringá kesiaramires@hotmail.com Resumo: Neste trabalho, apresentamos uma discussão teórica sobre a existência de uma ruptura no contrato didático, observada em alunos do 9º ano que realizaram a Prova Brasil de 2009 e de 2011. Trabalhando com os dados estatísticos dessas Provas, constatamos que cerca de 51% desses alunos de 9º ano (residentes em um município paranaense) declararam, ao responder o questionário da Prova Brasil, que não faziam com frequência as tarefas escolares de casa de Matemática. Esse comportamento foi caracterizado como uma ruptura no contrato didático, segundo Brousseau. Mostramos, ainda, que esse comportamento esteve associado a um menor desempenho dos alunos quando avaliados pela Prova Brasil. Diante dessas evidências, buscamos, no conceito de capital cultural, o que pode ser uma explicação para tal ruptura, sugerindo, aos professores e gestores, algumas alternativas que podem mudar essa realidade. Palavras-chave: Contrato Didático; Capital Cultural; Prova Brasil. 1. Introdução A Prova Brasil, exame aplicado de maneira censitária, é uma avaliação de desempenho que faz parte do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB). Desde sua primeira edição, em 2005, a Prova Brasil aplica testes aos alunos matriculados na última etapa dos anos iniciais (4ª série/5º ano) e aos alunos matriculados nos anos finais (8ª série/9º ano) do Ensino Fundamental de todas as escolas públicas. São provas de Língua Portuguesa e Matemática com foco, respectivamente, em leitura e resolução de problemas. As notas obtidas pelos alunos nestas duas disciplinas, tanto para o 5º ano quanto para o 9º Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 1

ano do Ensino Fundamental, constam nos bancos de dados denominados TS_aluno.txt (em 2009) e TS_resultado_aluno.csv (em 2011), disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira INEP. Durante a aplicação desse exame, são coletadas, por meio de questionários, informações sobre os alunos, sobre seus hábitos de estudos e sobre as suas famílias, o que compõem o questionário do aluno, chamado arquivo TS_quest_aluno.txt. Por sua vez, esses questionários, junto com outros dados sobre professores, diretores e sobre a estrutura da escola, compõem os microdados do SAEB. Esses contêm muitas informações que podem ser utilizadas para compreender, explicar e propor ações visando à melhoria da qualidade da educação no Brasil. Os microdados subsidiam, assim, tanto estudos quantitativos quanto qualitativos, que buscam a detecção e a compreensão de fatores determinantes da qualidade do ensino, subsidiam também ações de cunho educacional que podem ser implementadas por gestores. Com os microdados do SAEB de 2009 e de 2011, disponibilizados pelo INEP, percebemos que os alunos do 5º e do 9º ano mostraram evidências muito peculiares, como a variação na frequência com que realizam suas tarefas de casa. O resultado que chama a atenção tem origem na questão 42, do questionário do aluno de 5º ano da Prova de 2009 (ou 52 na de 2011), e na questão 44, do questionário do aluno do 9º ano da Prova de 2009 (ou 55 na de 2011): Você faz o dever de casa de Matemática? As possíveis respostas que podiam ser assinaladas pelos alunos eram: (A) Sempre ou quase sempre. (B) De vez em quando. (C) Nunca ou quase nunca. Observamos que, no município de Maringá-PR, cidade em que concentramos nossa pesquisa, uma grande parcela dos alunos do 9º ano, que realizou a Prova Brasil em 2009 e em 2011, declarou não fazer com frequência, em casa, as tarefas escolares da disciplina de Matemática. Mostraremos estatisticamente que os alunos que responderam as alternativas B (de vez em quando faz a tarefa de casa) ou C (nunca ou quase nunca faz a tarefa de casa) tiveram proficiência em Matemática inferior aos que responderam alternativa A (sempre ou quase sempre faz a tarefa de casa). Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 2

Na literatura sobre educação, encontramos Bonamino, Alves, Franco e Cazelli (2010) 1, Bourdieu (1998), Ortigão (2008) e Brousseau (2008) corroborando com a ideia de que fatores internos à escola, assim como os externos, interferem no desempenho 2 ou rendimento escolar. Os trabalhos citados revelam conclusões específicas: os dois primeiros mostram que os fatores socioeconômicos e sociais influenciam o desempenho escolar dos alunos; Ortigão destaca a importância da formação dos professores para melhor rendimento dos estudantes; Brousseau apresenta a existência de um acordo entre alunos e professor que condiciona o processo de ensino e aprendizagem, afetando, portanto, o desempenho escolar dos alunos. Entretanto, nenhum deles propõe um diálogo entre o contrato didático, conceituado por Brousseau, e o capital cultural, proposto por Bourdieu. Assim, esta pesquisa abre uma discussão entre os dois conceitos, usando como objeto de investigação os dados da Prova Brasil 2009 e 2011. Partindo, então, desse diálogo e dos dados da Prova Brasil, identificamos três hipóteses: que o não cumprimento dos alunos com os deveres de casa de matemática deve-se a uma ruptura, por parte dos mesmos, com o contrato didático (no sentido empregado por Brousseau, 2008) estabelecido na sala de aula; que o hábito de não realizar a tarefa de casa fora condicionado pela falta de capital cultural vivenciado pelos alunos hipótese sugerida a partir de leituras da teoria de Bourdieu (1998) sobre capital cultural; que a ruptura no contrato didático e a falta de capital cultural podem interferir no baixo desempenho dos alunos, o que se demonstra nos resultados das avaliações em larga escala (particularmente a Prova Brasil) realizadas por eles. Diante dessas hipóteses e do respaldo teórico, buscamos confirmar as evidências estatísticas observadas, tentando explicar o comportamento revelado pelos alunos do 9º ano, mas lembrando que o objetivo maior é alertar aos professores, principalmente os da 1 Os dados disponibilizados pelo SAEB têm favorecido uma série de investigações que buscam compreender os fatores associados à qualidade das escolas brasileiras (FRANCO, SZTAJN e ORTIGÃO, 2007; FRANCO, ORTIGÃO, ALBERNAZ, BONAMINO, AGUIAR, ALVES e SÁTIRO, 2007; SOARES, 2002; ALVES, ORTIGÃO e FRANCO, 2007). Nesses estudos, parte-se do princípio de que as variáveis relacionadas com a composição social dos alunos precisam ser tomadas como controle e a investigação deve buscar compreender quais características escolares estão associadas à eficácia escolar. Assim, esses estudos carregam a idéia de que a escola faz diferença e buscam identificar as características associadas à sua qualidade (ORTIGÃO, 2008, p. 78). 2 Entendemos o desempenho ou rendimento escolar como resultado do processo de aprendizagem do aluno. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 3

série em questão, que providências ainda podem ser tomadas a fim de evitar o baixo rendimento escolar dos alunos e o comprometimento do futuro do jovem estudante. 2. O contrato didático O contrato didático tem sido um conceito propício para se discutir os acordos construídos a partir da relação didática existente entre professor, aluno e saber, relação essa que se molda e remolda durante a vida escolar. Uma relação didática existe a partir do momento em que aprendizes se reúnem com um professor (ou qualquer outro mediador) para realizar atividades (essencialmente atividades de aprendizagem, mas não exclusivamente) de um conteúdo (podem ser saberes pertencentes a disciplinas escolares, saberes profissionais, saber fazer, saber-ser) em um quadro espacial determinado (em geral, um local de aula) e por um prazo limitado (em geral, um horário escolar) (JONNAERT e BORGHT, 2002 apud FOGGIATO, 2006, p. 14). Essa relação, fruto das trocas de conhecimentos, comportamentos e atitudes, estabelece, no seio da sala de aula, um conjunto de acordos que acaba definindo quais são as obrigações dos professores e quais são as dos alunos e isso organiza, de certa forma, o processo de ensino e aprendizagem dos saberes. Esse conjunto de acordos foi entendido por Brousseau como sendo um contrato didático. Numa situação de ensino preparada e realizada pelo professor, o aluno em geral tem a tarefa de resolver o problema que lhe é apresentado, por meio da interpretação das questões colocadas, das informações fornecidas, das exigências impostas, que são a maneira de ensinar do professor. Esses hábitos específicos do professor, esperados pelo aluno, e os comportamentos deste, esperados pelo professor, constituem o contrato didático (BROUSSEAU, 2008, p. 9). Um contrato didático é diferente de um contrato social qualquer. Enquanto no segundo se firma um acordo entre duas ou mais pessoas, estando elas cientes de todas as cláusulas, que são lidas, discutidas e acordadas, o primeiro não pode ser formalmente apresentado, pois é implicitamente estabelecido, é intrinsecamente elaborado durante o processo de ensino e aprendizagem. Por ser um contrato estabelecido implicitamente, nem sempre suas regras são todas integralmente cumpridas ou percebidas, podendo, alunos e professores, ignorar ou romper algumas regras sem observar como afetam a relação com o saber. É o caso da tarefa de casa. Tanto professores quanto alunos sabem da importância da tarefa de casa, da Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 4

relevância do estudo além da sala de aula, como uma pesquisa extra, uma busca por mais conhecimentos, um momento individual de lidar com o saber, talvez uma maneira diferente de trabalhar os conceitos, ou mesmo mais treino, como se costuma ver em matemática. Segundo Brousseau (1986 apud D AMORE, 2007, p.233) O aluno aprende adaptando-se a um ambiente que é fator de contradições, de dificuldades, de desequilíbrios, um pouco como a sociedade humana. Esse saber, fruto da adaptação do estudante, manifesta-se com as novas respostas que são a prova da aprendizagem (...). [O aluno sabe que] (...) o problema foi escolhido para que adquira um novo conhecimento, mas deve saber também que esse conhecimento é inteiramente justificado pela lógica interna da situação e que pode construir sem apelar para razões didáticas (BROUSSEAU, 1986 apud D AMORE, 2007, p. 233 grifo nosso). Porém, ainda que professores e alunos saibam da importância da tarefa de casa, o aluno que deixa de cumprir com suas tarefas escolares em casa, como se o saber dessa situação não fosse o mesmo discutido em meio às aulas, deixa de sanar dúvidas que só aquele que fez a tarefa pode identificá-las durante a correção. Além disso, o aluno que deixa de realizar a tarefa de casa perde um momento único em que o saber poderia ser realmente assimilado. Essa ruptura no contrato didático pode levar a consequências de insucesso, as quais poderiam ser evitadas, e, como discutiremos posteriormente, o capital cultural familiar experimentado ou vivenciado pelo aluno pode ter grande influência nesse comportamento. Mas e se esse tipo de ruptura surgir por motivos externos à sala de aula, que fogem ao controle ou planejamento do professor? A cláusula da obrigação do aluno com suas tarefas escolares é rompida por um grande número de alunos, como mostram os dados da Prova Brasil. Esses dados indicam o percentual de 50,98% dos alunos do 9º ano do município de Maringá em 2009 e 52,48% em 2011 declarando fazer seus deveres de casa de vez em quando ou nunca ou quase nunca ver Tabela 1 logo a seguir. Quais seriam os motivos para isso? Existem interferências externas ao ambiente escolar que afetam os hábitos de estudos dos alunos? O professor teria condições de reajustar o contrato didático se a ruptura fosse motivada por fatores externos à sala de aula? Essas são questões que também procuraremos abordar neste trabalho. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 5

3. Rupturas do contrato didático Acerca da discussão sobre contrato didático, é importante ressaltar que o mesmo preexiste à situação didática e só se explicita no momento das suas rupturas. Isto, não porque o docente procurasse ocultar alguma coisa aos alunos, mas porque tanto ele como estes estão ligados por esse contrato que os ultrapassa e que caracteriza a situação de ensino (ASTOLFI et al, 2002, p.69). Isso quer dizer que o contrato didático permeia o processo de ensino e aprendizagem tão implicitamente que nem mesmo o professor, que é a autoridade da disciplina, tem controle de tudo que poderá acontecer, ficando, também ele, à mercê de possíveis rupturas desse contrato. Entretanto, outras rupturas acontecem com a ciência de alunos e professores, como por exemplo: quando o professor perde a paciência e passa a aplicar retaliações ao aluno, ou quando usa do próprio saber para aplicar essa retaliação (PAIS, 2002, p. 82); quando o professor não deixa os seus alunos desenvolverem as atividades, por inteiro, sozinhos; dá a resposta de tudo porque tem um cronograma com prazo a cumprir; quando o professor, para ver alguns de seus alunos serem bem sucedidos, facilita as questões a ponto de praticamente resolvê-las; quando os alunos não demonstram interesse pela resolução das atividades propostas ou quando não há o envolvimento necessário nas atividades. Nesse caso, a ruptura ocorre porque mesmo que não se tenha dito ou escrito que o aluno deve se envolver e se interessar no desenvolvimento das atividades, o esperado é que isso aconteça dentro de certos limites exigidos pela atividade didática. Dessa forma, perceber tal ruptura, assim como sua superação, é imprescindível para dar continuidade ao processo de ensino e isso requer que se busquem os motivos que geraram esta situação de desinteresse (PAIS, 2002, p. 81). Dentre os motivos anteriormente citados, que resultam em rupturas do contrato didático, o último deles pode ser inferido por meio dos microdados da Prova Brasil de 2009 e de 2011. Pode-se obter por meio de um cálculo estatístico que os deveres de casa da disciplina Matemática têm sido realizados por pouco menos da metade dos alunos do 9º ano, dentre aqueles que responderam ao questionário da Prova Brasil 2009 e da Prova Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 6

Brasil 2011 na cidade de Maringá, decaindo ainda, a taxa da Prova Brasil de 2009 para a de 2011 3. 4. O capital cultural O homem não nasce membro de uma sociedade, mas torna-se membro dela por meio da socialização, definida como a ampla e consistente introdução de um indivíduo no mundo objetivo de uma sociedade ou de um setor dela (BERGER; LUCKMANN, 1985, p.175). Pela socialização, a criança integra-se ao grupo em que nasceu, absorvendo suas crenças, costumes, valores e atitudes e é durante o processo de socialização que se forma o que Bourdieu denominou como habitus. Segundo ele, habitus são sistemas de disposições inconscientes que constitui o produto de interiorização das estruturas objetivas e que, enquanto lugar geométrico dos determinismos objetivos e de uma determinação, do futuro objetivo e das esperanças subjetivas, tendem a produzir prática e, por essa via, carreiras objetivamente ajustadas às estruturas objetivas (BOURDIEU, 2007, p. 201-202). Segundo Nogueira e Nogueira (2002, p. 18), a Sociologia da Educação de Bourdieu defende que os alunos trazem uma grande bagagem social e cultural incorporada, diferenciada e mais ou menos rentável no mercado escolar, resultado do habitus adquirido pelo aluno a partir do contexto em que vive, sobretudo o familiar. Segundo Bourdieu (1998b, p.42), Paul Clerc pesquisador que também discutiu sobre a transmissão do capital cultural observou em uma pesquisa que, com diploma igual, a renda familiar não exerce nenhuma influência sobre o êxito escolar dos alunos e que, ao contrário, com renda igual, a proporção de bons alunos varia de maneira significativa segundo o grau de instrução dos pais. Considerando essa pesquisa, Bourdieu comentou que: a ação do meio familiar sobre o êxito escolar é quase exclusivamente cultural (Ibid, p. 42). Essa bagagem cultural e social, transmitida pelos pais aos filhos, a qual dá condições para a formação do habitus desses últimos, remete a um conceito mais amplo, o qual Bourdieu chamou de capital cultural. De acordo com Bourdieu (Ibid, p. 73), a noção de capital cultural surge para explicar as desigualdades de desempenho escolar observadas 3 A título de observação, o mesmo comportamento, com taxas semelhantes, foi observado com os estudantes do 9º ano deste município participantes da Prova Brasil 2007. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 7

em crianças oriundas de diferentes classes sociais. A ideia é relacionar as vantagens que crianças de diferentes classes sociais ou frações de classe podem obter no mercado escolar com a distribuição do capital cultural entre as classes e frações de classe. Apesar de Bourdieu discutir o desempenho escolar segundo as desigualdades entre classes sociais, nosso estudo se apropria da ideia de capital cultural e de habitus por ambas revelarem a influência que fatores extra-escolares podem causar no desempenho dos alunos. Segundo Bourdieu (1998a, p. 41), tal capital é transmitido pela família aos seus membros de forma mais indireta do que direta. A família transmite também um sistema de valores implícitos e interiores. Tudo isso contribui para definir atitudes diante do capital cultural e à instituição escolar. Para o autor, o capital cultural pode existir sob três estados: incorporado, objetivado e institucionalizado. No estado incorporado, ele se apresenta sob a forma de disposições duráveis do organismo; sua acumulação exige incorporação; para sua assimilação, é necessário um trabalho individual; não pode ser transmitido instantaneamente (diferentemente do dinheiro, por exemplo); sua acumulação leva tempo. Por outro lado, apesar de demorado, o resultado dessa acumulação faz com que o capital se torne parte integrante da pessoa, como um hábito, mobilizando ações que podem melhorar as condições sociais do indivíduo. O capital cultural no estado objetivado se dá sob a forma de bens culturais, tais como quadros, livros, dicionários, instrumentos, máquinas, entre outros, enquanto que, no estado institucionalizado, está ligado aos certificados, diplomas, títulos escolares, etc. Com base na noção de capital cultural introduzida por Bourdieu, entendemos que a ruptura no contrato didático cometida por parte dos alunos que realizaram a Prova Brasil e declararam nem sempre fazerem seus deveres de casa pode ser uma consequência da falta de capital cultural familiar. Mais especificamente, do capital cultural no estado incorporado, uma vez que fazer a tarefa de casa deveria ser um hábito incorporado pelo aluno em decorrência da condição e experiência familiar em que vive. O fato de alunos do 9º ano não mais realizarem suas tarefas de casa (supondo que as realizassem até o (ou no) 5º ano como se observa nos dados estatísticos) pode ser indício de que os próprios pais dos alunos não continuam o acompanhamento que possivelmente acontecia enquanto os filhos tinham menor idade. Isso quer dizer que o capital cultural experimentado pelos filhos sobre a importância dos estudos, que ajuda nos deveres, que Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 8

mostra experiências que podem ajudar na escola e nas tarefas, que instiga a leitura com a compra de livros ou nas idas às bibliotecas, que ensina a ter mais responsabilidades, todo esse capital vai enfraquecendo ou mesmo sofrendo influências externas de diferentes capitais culturais. Em considerações semelhantes, mas discutindo o capital social, Bonamino, Alves, Franco e Cazelli (2010, p. 497) apontam O Diálogo familiar como um fator com grande poder explicativo do desempenho escolar, uma vez que, em média, os estudantes pertencentes a todos os grupos sociais se beneficiam de seu efeito positivo. Daí a importância do diálogo familiar como indicador do papel do capital social (Bonamino, Alves, Franco e Cazelli, 2010, p. 497). 5. Metodologia e resultados Como mencionado na introdução, utilizamos os arquivos TS_aluno.txt (ou TS_resultado_aluno.csv) e TS_quest_aluno.txt que integram os microdados da Prova Brasil de 2009 e de 2011. O primeiro contém a variável NU_THETAT_M (em 2009) e PROFICIENCIA_MT_SAEB (em 2011), que é a proficiência do aluno em Matemática, e o segundo arquivo contém as informações do questionário do aluno. Consideramos separadamente todos os alunos de 9º ano que participaram da prova Brasil de 2009 e de 2011. Foram desprezadas as observações não respondidas pelos alunos que participaram das provas de 2009 e de 2011. O Teste de normalidade de Kolmogorov-Smirnov mostra que a população de 2009 e de 2011 tem distribuição normal ao nível de 10% e, ao nível de 5%, as populações são aproximadamente normais, o que nos permitiu aplicar os testes paramétricos necessários em nosso trabalho. Os arquivos de dados TS_aluno.txt e TS_quest_aluno.txt de 2009 foram unidos utilizando a variável ID_ALUNO. O mesmo foi realizado com os dados de 2011. Temos, portanto, dois bancos de dados: os alunos de 9º ano que realizaram a Prova Brasil de 2009 com 1.889.578 observações e alunos do 9º ano que realizaram a Prova Brasil de 2011 com 1.948.739 observações. Dos participantes da Prova Brasil de 2009 e da Prova Brasil de 2011, consideramos também os alunos de 5º ano e organizamos dois outros bancos de dados: 2.389.322 observações em 2009 e 2.182.078 observações em 2011. Ambos com distribuição normal ao nível de 10% e ao nível de 5% aproximadamente normal, de acordo com o teste de Kolmogorov-Smirnov. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 9

De posse dos bancos de dados de 2009 e de 2011 para o 9º e 5º anos, elaborados a partir dos dados disponibilizados pelo INEP, selecionamos apenas os alunos pertencentes ao município de Maringá-Pr. Por meio de estatística simples, percebemos que os alunos residentes no município de Maringá do 5º e do 9º ano apresentaram respostas muito peculiares para a questão 42, do questionário do aluno de 5º ano da Prova de 2009 (ou 52 na de 2011), e na questão 44, do questionário do aluno do 9º ano da Prova de 2009 (ou 55 na de 2011): Você faz o dever de casa de Matemática? Veja a Tabela 1. Tabela 1 Alunos de 5º e 9º ano, por percentual e frequência de respostas, por edição da Prova Brasil Maringá 2009 e 2011 Percentual de respostas 2009 Percentual de respostas 2011 5º ano - Questão 42 9º ano - Questão 44 5º ano - Questão 52 9º ano - Questão 55 Alternativas % Freq. % Freq. % Freq. % Freq. A 85,24 2 899 49,01 1 538 83,31 2 455 47,52 1 504 B 13,97 475 40,50 1 271 15,00 442 40,60 1 285 C 0,79 27 10,48 329 1,70 50 11,88 376 Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira Microdados da Prova Brasil 2009 e Prova Brasil 2011. De acordo com os dados da Tabela 1, podemos inferir, pelas porcentagens de 85.24% e 83.31%, que alunos do 5º ano demonstram um compromisso maior com os deveres de matemática ditos para casa e revelaram compromisso também com o contrato didático que permeia a sala de aula em que estudam. Já os alunos de 9º ano apresentam um comprometimento diferente e insatisfatório, uma mudança de hábito preocupante se levarmos em conta o amadurecimento escolar desses estudantes. Apenas 47.52% dos alunos em 2011 e 49% dos alunos em 2009, do município de Maringá, declararam fazer a tarefa de casa sempre ou quase sempre, evidenciando assim, a existência de uma clara ruptura no contrato didático cometida pelos alunos. Consideramos importante salientar que tal ruptura não se refere à ausência de tarefas exigidas pelos professores, pois, ao contrário disso, cerca de 85% dos alunos do 9º ano de 2009 e cerca de 77.50% dos alunos de 2011 afirmaram que seus professores propunham tarefas de casa e as corrigiam em sala de aula. Paraná. A Tabela 2 a seguir apresenta as taxas percentuais de respostas no Estado do Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 10

Tabela 2 Alunos de 5º e 9º ano, por percentual e frequência de respostas, por edição da Prova Brasil Paraná 2009 e 2011 Percentual de respostas 2009 Percentual de respostas 2011 5º ano - Questão 42 9º ano - Questão 44 5º ano - Questão 52 9º ano - Questão 55 Alternativas % Freq. % Freq. % Freq. % Freq. A 81,08 118 699 54,27 66 324 80,10 90 891 55,11 69 918 B 17,34 25 385 38,65 47 234 17,79 20 184 36,59 46 421 C 1,58 2 312 7,08 8 651 2,11 2 394 8,29 10 520 Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira Microdados da Prova Brasil 2009 e Prova Brasil 2011. A interpretação dos resultados entre alunos do 5º e 9º anos não se altera ao compararmos as populações do Paraná com a de Maringá Tabelas 1 e 2. Tanto na Prova de 2009 como na de 2011, verificamos uma estabilidade das respostas ou uma tendência de comportamento dos alunos nas faixas etárias pesquisadas que não tem se alterado com o passar do tempo. Sobre a cidade de Maringá, o diagnóstico é ainda mais preocupante, visto que a disparidade entre os alunos do 5º para o 9º ano que dizem fazer seus deveres com frequência é maior que a disparidade ocorrida no Paraná. Essa taxa decrescente do item A do 5º para o 9º ano indica claramente que fazer a tarefa de casa vai deixando de ser parte do contrato didático que envolve os alunos. A Tabela 3 a seguir apresenta as taxas percentuais de respostas no Brasil. Tabela 3 Alunos de 5º e 9º ano, por percentual e frequência de respostas, por edição da Prova Brasil Brasil 2009 e 2011 Percentual de respostas 2009 Percentual de respostas 2011 5º ano - Questão 42 9º ano - Questão 44 5º ano - Questão 52 9º ano - Questão 55 Alternativas % Freq. % Freq. % Freq. % Freq. A 77,59 1 853 882 56,49 1 067 384 76,20 1 662 830 56,60 1 103 103 B 19,90 475 477 37,50 708 638 21,09 460 248 36,37 708 950 C 2,50 59 963 6,01 113 556 2,70 59 000 7,03 136 986 Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira Microdados da Prova Brasil 2009 e Prova Brasil 2011. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 11

Novamente o município de Maringá, agora em comparação ao Brasil, continua apresentando dados preocupantes, tendo em vista que as taxas percentuais de adesão ao contrato didático em Maringá são bem menores no 9º ano em 2009 e em 2011 em relação às taxas do Brasil. Dividimos os participantes da Prova Brasil do 9º ano em dois grupos: grupo 1 aqueles que responderam alternativa A; grupo 2 aqueles que responderam alternativa B ou C. Ao conferirmos o resultado do desempenho dos alunos do grupo 1 e do grupo 2 na proficiência em Matemática, identificamos indícios de um problema que possivelmente permanece ano a ano e que se demonstra nessas avaliações em larga escala, qual seja: os alunos do grupo 2, que declaram não fazer suas tarefas de Matemática, têm desempenho na Prova Brasil (em Matemática) inferior àqueles do grupo 1, que as fazem com frequência. Vejamos a Tabela 4. Tabela 4 Alunos do 9º ano, por média, mínimo e máximo em proficiência em Matemática, por edição da Prova Brasil Maringá 2009-2011 9º ano 2009 PROFICIÊNCIA EM MATEMÁTICA 9º ano 2011 PROFICIÊNCIA EM MATEMÁTICA Alternativas N Média Mínimo Máximo N Média Mínimo Máximo A 1 538 268,83 153,15 410,74 1 504 269,26 135,40 394,57 B 1 271 257,37 146,81 388,29 1 285 254,65 122,06 374,08 C 329 250,38 141,75 375,60 376 250,90 136,08 376,67 Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira Microdados da Prova Brasil 2009 e Prova Brasil 2011. Embora as médias entre o grupo 1 e 2 sejam distintas, não podemos afirmar que são significativamente diferentes. O teste estatístico denominado TTEST, aplicado nas amostras de Maringá de 2009 e de 2011, nos assegura que ao nível de confiança de 5% as médias são significativamente distintas. De fato, para a amostra de 2011, o teste de igualdade variâncias nos dá p-valor igual 0.7746 e que é muito maior do que 0.05 nível de confiança. Desse modo, não temos evidências suficientes para rejeitar a hipótese nula H0: as variâncias são iguais. Assim, assumimos a igualdade das variâncias; agora com a igualdade das variâncias obtemos o p-valor menor do que 0.0001, que é menor do que Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 12

0.05. Portanto, ao nível de significância de 5%, podemos concluir que as médias dos dois grupos são diferentes. Embora tenhamos observado que alunos que dizem fazer a tarefa de casa com frequência tenham obtido melhor desempenho na Prova Brasil (no caso desta pesquisa, em Matemática), não se pode afirmar, com base em testes estatísticos, que o hábito do aluno de cumprir com suas tarefas escolares garanta um melhor desempenho na Prova Brasil na disciplina Matemática. As causas de um melhor desempenho podem ser explicadas por outros fatores, pois a complexidade e a dinâmica da sala de aula não permitem respostas simples. No entanto, a nossa prática e experiência de professor nos leva a crer que um bom desempenho está associado ao tempo dedicado aos estudos. 6. Conclusões Vimos, na seção anterior, que uma grande parcela dos alunos do 9º ano do Município de Maringá, em 2009 e em 2011, declarou não fazer com frequência suas tarefas de casa da disciplina de Matemática, mesmo considerando que o professor propõe e corrige essas tarefas. Essa evidência foi entendida neste trabalho como uma ruptura no contrato didático que envolve a vida escolar dos alunos. Observamos que a média de desempenho desses alunos do 9º ano na proficiência em Matemática da Prova Brasil foi inferior a dos demais que sempre fazem as tarefas. Vimos também que a porcentagem de alunos de 5º ano que declarou cumprir com as tarefas de casa de Matemática foi muito superior à porcentagem de alunos do 9º ano que deu a mesma resposta, tanto em 2009 como em 2011. Mas qual seria o motivo que levaria a uma mudança de hábito dos alunos do 5º para o 9º ano a tal ponto da tarefa de casa de Matemática deixar de ser cumprida frequentemente? Quais fatores, se existem, afetaram os contratos didáticos dos 9 os anos? Na busca de indícios que explicassem a ruptura no contrato didático cometida pelos alunos do 9º ano, os quais declararam não fazer as tarefas escolares de Matemática, encontramos no conceito de capital cultural o que pode ser uma explicação plausível. Para Bourdieu, é natural supor que falte ao estudante ou ao seu grupo familiar (entre outros fatores) uma bagagem de capital cultural suficiente, ou pelo menos com características culturais específicas que lhe permitam, mesmo que inconscientemente, ter hábitos e atitudes de valorização do conhecimento e de importância da escola na sua formação. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 13

Muitos motivos poderiam levar os alunos a romper o contrato didático, alguns possivelmente fora dos limites da sala de aula e, nesse caso, fora do alcance do professor e do aluno. Mas investigar as causas desses motivos e tentar compreendê-los passa também pelo conceito de capital cultural familiar do aluno, pois o fato de fazer a tarefa de casa é ação que circunda o núcleo familiar, por isso o enfoque no capital cultural familiar. Ao admitirmos a existência de uma importante participação do capital cultural familiar na vida escolar dos alunos como boa parte da justificativa para a falta de comprometimento deles com seus deveres escolares, precisamos então desenvolver ações que visem minimizar os prejuízos advindos da ruptura agora detectada. Essas ações podem ser organizadas pelo professor (por exemplo, cobrança e valorização das atividades escolares) e pela a escola e gestores por meio da promoção ao acesso à cultura, ambiente educacional favorável na escola, educação de qualidade, políticas públicas que contemplem as formas de capital cultural, ou mesmo pela aproximação entre pais e a escola. Em todos os sentidos, a discussão apresentada neste trabalho reflete uma realidade em sala de aula, podendo ser seguramente transportada para a sala de aula de Matemática de qualquer ano e com conclusões semelhantes. Faz-se então necessário que o professor se atente aos comportamentos dos alunos que podem ocasionar rupturas nos contratos didáticos e reforce com eles a necessidade do cumprimento das tarefas escolares, procurando, desta forma, restabelecer tal contrato. 7. Agradecimentos CAPES. Agradecemos a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior 8. Referências bibliográficas ASTOLFI, Jean-Pierre. et al. As palavras-chave da Didática das Ciências. Tradução de Maria Ludovina Figueiredo. Lisboa: Instituto Piaget-Horizontes Pedagógicos, 2002. BERGER, P. L.; LUCKMANN, T. A construção social da realidade: Tratado de Sociologia do Conhecimento. 10. ed. Petrópolis: Vozes, 1985. Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN 2178-034X Página 14

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