Abordagem Subcostal nas Laparoscopias de Pacientes com Suspeita de Aderências. Suspicion of Adhesions

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Volume 5, N. 1 Abordagem Subcostal nas Laparoscopias de Pacientes com Suspeita de Aderências Comunicação Preliminar 27 Artigo Original Abordagem Subcostal nas Laparoscopias de Pacientes com Suspeita de Aderências Subcostal Aproach in Patients Laparoscopies with Suspicion of Adhesions Betânia Müller,, Carlos Alberto Link, Rosilene Jara Reis Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas - Porto Alegre - RS RESUMO Objetivo: Avaliar a incidência de aderências na parede abdominal em pacientes com cirurgia prévia e as possíveis complicações da abordagem subcostal na introdução do primeiro trocarte em laparoscopias. Pacientes e método: É uma análise retrospectiva 477 videolaparoscopias, efetuadas por equipe especializada do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas localizado em Porto Alegre RS, no período de 19 de março de 2001 a 10 de agosto de 2005, onde foram selecionadas 28 pacientes submetidas à laparoscopia com abordagem subcostal, para avaliação e revisão de prontuário. Resultados: Foram encontradas aderências em cicatriz abdominal prévia em 12 (38,6%) das 28 pacientes estudadas. Esta casuística, utilizando a técnica de abordagem subcostal no ponto de Palmer, não apresentou complicações. Conclusão: A abordagem subcostal mostrou-se um método seguro em pacientes com suspeita de aderências. Palavras-chave: LAPAROSCOPIA, ADERÊNCIAS, PONTO DE PALMER, CIRURGIAS PRÉVIAS ABSTRACT Objetive: To evaluate the incidence of adhesions in the abdominal wall in patients with previous surgery and the possible complications of the subcostal approach in the introduction of Veress needle and first trocar in laparoscopies. Material and Methods: It is a retrospective analysis of 477 videolaparoscopies, made by a specialized team of the Service of Gynecology and Obstetrics of the Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas, localized in Porto Alegre - RS, on the period of March 19, 2001 to August 10, 2005. There were selected 28 patients, submitted to the laparoscopy with approach subcostal, for evaluation and handbook revision. Results: We found adhesions in previous abdominal scar in 12 (38,6%) of the 28 studied patients Subcostal approach in the Palmer s point, as observed in this article, did not provoke complications. Conclusion: The subcostal approach was shown a safe technique in patients with suspicion of adhesions. Key words: LAPAROSCOPY, ADHESIONS, PALMER POINT, PREVIUS SURGERY MÜLLER B., LINK C.A., REIS R.J. Abordagem Subcostal nas Laparoscopias de Pacientes com Suspeita de Aderências. Rev bras videocir 2007;5(1):27-32. Recebido em 31/05/2007 Aceito em 10/06/2007 A laparoscopia é muito utilizada para diagnóstico e tratamento de afecções ginecológicas. Tem como vantagens o menor tempo de internação e a melhor recuperação pós-operatória¹. As avançadas técnicas de acesso tornaram-na uma alternativa atrativa a laparotomia. Entre as principais contra-indicações encontravase a cirurgia prévia². Nesta situação, são poucas as complicações, geralmente associadas com a entrada na cavidade. A mais comum é a falha na realização do pneumoperitônio que pode ocorrer devido à obesidade, aderências e falha na insuflação³. Aderências intra-abdominais entre a cicatriz e as vísceras são conseqüências comuns da laparotomia. Pacientes submetidas à laparoscopia, após laparotomia prévia, devem ser consideradas de 27

28 Müller B. e cols. Rev bras videocir, Jan./Mar. 2007 risco para a presença de aderências, envolvendo a cicatriz e o intestino ou omento 4 ; por conseguinte, há maior risco de lesão de intestino ou vasos mesentéricos na introdução da agulha de Veress ou primeiro trocarte umbilical³. O estudo realizado por KREBS 5, examinando a incidência de lesão intestinal em cirurgias ginecológicas, encontrou uma incidência maior em laparotomias (8,4/1000) comparado com laparoscopias (3/1000). McDANALD e cols 6 mostraram que esta lesão e de grandes vasos também podem ocorrer também na técnica aberta para a colocação do primeiro trocarter na laparoscopia. Existem técnicas alternativas visando reduzir o risco de dano relacionado com a entrada na cavidade: a transuterina, a de fundo de saco vaginal, a paravaginal, a abordagem subcostal e as áreas suprapúbicas na introdução do primeiro trocarte ou agulha de Veress³. AUDEBERT e GOMEL 7 utilizaram a abordagem subcostal, na inserção do primeiro trocarte, para avaliar a distribuição e a gravidade de aderências em pacientes com cirurgia abdominal prévia. Os achados de aderências periumbilicais foram maiores em pacientes com cirurgias prévias, independente do tipo de incisão, maior em pacientes com cicatriz mediana e menor em pacientes sem passado de cirurgia. A abordagem subcostal, utilizando o ponto de Palmer (ponto localizado 2-3 cm abaixo do arco costal esquerdo na linha hemiclavicular), é utilizada nas mesmas indicações de laparoscopia aberta, com o objetivo de reduzir o risco de perfuração intestinal e lesão de grandes vasos, visto que os acidentes ocorrem, com maior freqüência, em pacientes com história de incisões abdominais na linha média 8. O presente estudo tem como objetivo avaliar a incidência de aderências na parede abdominal em pacientes com cirurgia prévia, bem como as possíveis complicações da abordagem subcostal na introdução do primeiro trocarte em laparoscopias. MATERIAL E MÉTODOS A amostra foi constituída por pacientes submetidos a videolaparoscopia (VLP) no Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Materno- Infantil Presidente Vargas de Porto Alegre RS. Trata-se de estudo retrospectivo, através de questionário padrão, preenchido após cada procedimento videolaparoscópico, e avaliação de prontuário médico das pacientes selecionadas. Este questionário foi sempre preenchido pelo médico auxiliar, com base nos dados do prontuário e achados transoperatórios. Foram realizadas 477 VLPs, no período de 19 de março de 2001 a 10 de agosto de 2005, incluindo tanto pacientes selecionadas para ligadura tubária quanto pacientes sintomáticas ou em investigações clínicas. Os procedimentos foram realizados por médicos residentes acompanhados pelo preceptor responsável. A avaliação préoperatória incluiu exame físico, anamnese, avaliação laboratorial e consentimento informado sobre a indicação cirúrgica, considerações sobre a cirurgia, e a decisão da abordagem subcostal para a inserção do primeiro trocarte. No presente estudo, das 477 laparoscopias realizadas, 28 (5,8%) utilizaram a abordagem subcostal, opção preferencial quando as pacientes apresentavam cicatriz mediana, correção de hérnia umbilical ou de colecistectomia aberta. Todos os procedimentos foram realizados sob anestesia geral. A introdução da sonda nasogástrica, antes da inserção da agulha de Veress e trocarte, foi mandatória, com a finalidade de evitar acidentes punctórios no estômago. A abordagem subcostal consiste na realização da introdução da agulha de Veress no ponto de Palmer, localizado 2-3 cm da margem costal esquerda, na intersecção desta com a linha hemiclavicular 9. Figura-1 A agulha de Veress foi introduzida perpendicularmente na parede abdominal até a passagem de dois pontos de resistência. Após a diminuição da resistência no segundo ponto, foi realizado o teste com seringa e ar, confirmando a entrada na cavidade peritonial. Então, iniciou-se o pneumoperitônio com o CO até uma pressão de 14 2 mmhg. Um trocarte de 10mm, metálico e piramidal, reutilizável, foi introduzido neste mesmo local seguido da endocâmera.

Volume 5, N. 1 Abordagem Subcostal nas Laparoscopias de Pacientes com Suspeita de Aderências 29 Na avaliação das aderências ocorrida no transoperátorio, foi considerada a presença das mesmas quando se encontravam no local da incisão abdominal prévia, englobando peritônio ou alças intestinais. O diagnóstico final foi apresentado, considerando apenas a presença de aderência em cicatriz prévia. RESULTADOS Os dados demográficos das 28 pacientes submetidas à laparoscopia com a abordagem subcostal encontram-se na Tabela-1. A média de idade das pacientes foi de 38,8 anos. Todas apresentavam pelo menos uma cicatriz abdominal prévia: três pacientes com cirurgia de correção de hérnia umbilical, uma com incisão de colecistectomia aberta e as demais com, pelo menos, uma cicatriz mediana prévia. O procedimento não foi realizado em pacientes apresentando somente cicatriz de Pfannestiel. As indicações da VLP foram: investigação de dor pélvica crônica em 11 pacientes; excisão de massa anexial em nove; ligadura tubária em quatro; investigação de infertilidade em três e um estadiamento de câncer de ovário. Tabela 1 Dados demográficos. Número de pacientes 28 Média de idade (em anos) 38,8 (23-64) Cirurgia prévia Herniorrafia umbilical 03 Colecistectomia 01 Outras cirurgias (incisão mediana) 24 Indicação da VLP Dor pélvica crônica 11 Tumor anexial 09 Ligadura tubária 04 Infertilidade 03 Outras 01 O achado de aderências no local de cicatriz anterior ocorreu em 12 (38,6%) das 28 pacientes avaliadas, sendo que, nas pacientes com herniorrafia umbilical prévia ou colecistectomia, não foram evidenciadas aderências. As cirurgias não apresentaram nenhum acidente de punção relacionado com a introdução da agulha de Veress, ou mesmo do trocarte de 10mm no ponto de Palmer. Ocorreu apenas uma complicação cirúrgica, decorrente da lise de aderências medianas, extensas, envolvendo alças intestinais. Após a reintervenção, a paciente apresentou evolução satisfatória. Uma VLP foi convertida para laparotomia, pois havia tumor anexial aderido ao sigmóide, e optou-se por diminuir os riscos de injúria intestinal. DISCUSSÃO A realização do pneumoperitônio pela abordagem subcostal tem sido demonstrada como alternativa à insuflação transumbilical em pacientes com risco de aderências periumbilicais 8. O achado de aderência no local da cicatriz abdominal prévia já havia sido relatado por vários autores 4,7,8,10. A nossa incidência de 42,8% é semelhante ao estudo de BRILL 4 que encontrou 36%, considerando apenas cirurgia prévia em 360 pacientes. Ele analisou grupos diferentes e encontrou maior freqüência em pacientes com cicatriz mediana, quando comparada a Pfannestiel (P<0,1), sendo 27% de 258 no grupo com Pfannestiel, 55% de 87 em mediana infraumbilical e 67% de 15 em medianas supraumbilical. LAM e cols 10 em uma série de 24 pacientes com critérios semelhantes ao nosso estudo apresentou 58,3% de aderências. LEVRANR e cols 11 utilizando a técnica de abordagem umbilical em 124 pacientes com cicatriz prévia, sendo 45 laparoscopias, 29 medianas e 39 suprapúbica transversa, encontrou aderências somente nos dois últimos grupos, 59% e 28% respectivamente. Possíveis fatores etiológicos para as aderências incluem infecção pós-operatória, técnica de fechamento, material de sutura,

30 Müller B. e cols. Rev bras videocir, Jan./Mar. 2007 dissecção e manipulação de tecido e contaminação por corpo estranho. Um estudo realizado por TULANDI e cols 12 em pacientes com Pfannestiel prévia, submetidas à laparoscopia para fins reprodutivos, avaliou a incidência de aderências quanto ao fechamento do peritônio. Encontraram-se 22% de aderências no grupo com fechamento comparado com 15,8% em pacientes sem fechamento de peritônio. A presente série, como foi realizada com base na revisão de prontuários, não dispunha de dados completos como número de laparotomias prévias, indicações de cirurgias anteriores e técnicas utilizadas, este fato impossibilitou a análise de mais variáveis e mesmo a elaboração de hipóteses índice de adesões ora encontradas. DAVIS 13, utilizando a abordagem subcostal em 103 pacientes com cicatriz abdominal prévia encontrou uma prevalência de 57% de aderência com uma incisão de Pfannestiel, 66% com duas e 92% com cicatriz mediana. Uma prevalência alta comparada com outras séries. Neste estudo não ocorreram complicações, semelhantes aos nossos casos. CHANG e cols 14 utilizaram o ponto de Palmer para a abordagem laparoscópica em 12 pacientes com suspeita de aderências abdominais, sendo em 3 a agulha de Veress, introduzida na região umbilical. Todas as pacientes apresentavam adesões periumbilicais. Nove pacientes realizaram a lise de aderências via laparoscópica; em outras três houve conversão para laparotomia - duas devido a extensas aderências e uma devido à lesão de alça intestinal durante a lise de bridas laparoscópica. Esta pequena série tem achados semelhantes à casuística, pois o mesmo critério de conversão para laparotomia foi utilizado (risco de provocar uma lesão maior). Avaliando a técnica da abordagem subcostal em 267 pacientes de uma amostra de 3314 laparoscopias, houve falha de conseguir a insuflação em quatro pacientes (1,5%), sendo estas obesas com IMC>30, e complicação em outras três com punção do lobo esquerdo do fígado com a agulha de Veress 6. Todas as complicações foram diagnosticadas e tratadas no mesmo momento da laparoscopia com sucesso. Conclui-se que a presença hepatoesplenomegalia seja uma contra indicação a esta abordagem. A técnica utilizada por McDANALD e cols 6., foi a inserção da agulha de Veress e do primeiro trocarte junto à margem subcostal esquerda, motivo pelo qual provavelmente observaram-se tais complicações. A microlaparoscopia com ótica de 1,2mm de diâmetro foi estudada como uma alternativa para diminuir o índice de complicações, em pacientes com cirurgia prévia, em uma série com 814 pacientes divididos em quatro grupos: sem cirurgia (469), com laparoscopia (125), com incisão horizontal suprapúbica (131) e com mediana (89). Aderências intensas com possível complicação na introdução do trocarte periumbilical foram encontradas nos grupos respectivamente, 2/469; 1/ 125; 9/131 e 28/89. A única complicação encontrada foi lesão de vasos da parede abdominal que foi facilmente resolvida, confirmando a técnica como uma ótima opção em pacientes selecionadas, com maior risco de aderências 7. CHAPRON e cols 15 em estudo retrospectivo analisou a ocorrência de lesões intestinais em laparoscopias ginecológicas: um terço das lesões (18) ocorreram na primeira fase da laparoscopia; em nove, na introdução do trocarte umbilical; seis,na agulha de Veress e três no trocarte suprapúbico. Somente em 35,7% o diagnóstico foi realizado no momento laparoscopia, o tempo médio para o diagnóstico destas lesões foi de 4 5 dias. Pensando em evitar lesões do trato gastrointestinal, a abordagem subcostal com minilaparoscopia, na visão dos autores, seria uma opção a ser considerada. Em 2003, GOLAN e cols 16 confirmaram a minilaparoscopia e a abordagem subcostal, como uma ferramenta importante na prevenção de acidentes envolvendo o trato gastrointestinal em pacientes com alta probabilidade de aderências. Neste estudo nos 31 casos estudados não houve intercorrências. Este estudo utilizou a ótica de 10mm para realização das videolaparoscopias e não evidenciou complicações. No entanto, não há dados suficientes para afirmar que esta técnica é tão segura quanto a minilaparoscopia para evitar acidentes de punção.

Volume 5, N. 1 Abordagem Subcostal nas Laparoscopias de Pacientes com Suspeita de Aderências 31 Em recente série relatada de 477 laparoscopias dividida em dois grupos, um sem cirurgias prévias e abordagem umbilical, com 368 pacientes, e o outro com cirurgias prévias e a abordagem subcostal, com 109 pacientes, as complicações ocorreram somente no segundo grupo (p<0,5). Entre as complicações houve apenas uma maior com perfuração de alça intestinal durante a introdução da agulha de Veress. Outras menores (6,4%) foram relacionadas com a falha de realizar o pneumoperitônio: subpneumoperitônio ou enfisema de omento. Isso evidencia que as cirurgias prévias são fatores complicadores para uma abordagem laparoscópica 17. Pacientes com herniorrafia umbilical prévia podem ter um risco aumentado de aderências nesta região, o que justificaria um preparo intestinal pré-operatório e seleção adequada do primeiro sítio de punção para diminuir o risco de lesão visceral 18, confirmando critério atual de seleção para abordagem subcostal. Uma pequena série analisou 23 laparoscopias com abordagem subcostal e 81 com a abordagem umbilical, em pacientes selecionadas, sendo que, em nove havia adesões importantes, sete do grupo subcostal e duas do umbilical. Duas complicações foram relatadas no grupo controle, sangramento no local da inserção da cânula e lesão de vasos mesentéricos 19. Na nossa série de casos, encontramos aderências no local de cicatriz mediana prévia em 12 pacientes. A técnica convencional de introdução da agulha de Veress ou do primeiro trocarte, na abordagem umbilical, poderia ter resultado em lesões de alças intestinais ou de vasos mesentéricos, conforme os achados de HOWARD e cols 9. CONCLUSÃO O hipocôndrio esquerdo é um local seguro e de fácil acesso para laparoscopia, em pacientes com laparotomia prévia, pois geralmente é livre de aderências. A nossa incidência de 38,6% de aderências periumbilicais valida o critério de seleção para a abordagem subcostal na presença de cicatriz mediana prévia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Lopes RGC, Santos ES, et al., Pré-operatório em videolaparoscopia IN: Donadio Albuquerque Neto LC. Editores. Consenso Brasileiro de Videoendoscopia Ginecológica. São Paulo: FEBRASGO 2001: 23. 2. Cheng I, Felddblum P, Ballsh S: Previus abdominal surgery as a risk factor in internal laparoscopc sterilization. Am J Obstet Gynecol 1983; 145:841-3. 3. Pasic RP, Kantardzic M, Templeman C, Levine RL. Insufflation techniques in gynecologic laparoscopy. Surg Laparosc Endosc Percutan Tech 2006; 16: 18-24. 4. Brill AI, Nezhat F, Nezhat CH, Nezhat C. The incidence of adhesions after prior laparotomy: a laparoscopic apprail. Obstet Gynecol 1995; 85 (2): 269-72. 5. Krebs HB. Intestinal injury in gynecologic surgery: a ten years experience. Am J Obstet Gynecol 1986; 155: 509-14. 6. McDanald Dm, Levine RL, Pasic R. Left upper quadrant entry during gynecologic laparoscopy. Surg Laparosc Endosc Percutan Tech 2005; 15: 325-7. 7. Audebert AJ, Gomel V. Role of microlaparoscopy in the diagnosis of peritoneal and visceral adhesions and in the prevention of bowel injury associated with blind trocar insertion. Fertil Steril 2000; 73(3): 631-5. 8. Chielders JM, Brezechffa PR, Surwit EA. Laparoscopy using the left upper quadrant as the primary trocar site. Gynecol Oncol 1993; 50(2): 221-5. 9. Palmer R: Safety in laparoscopy. J Reprod Med 1974; 13: 1-5. 10. Lam KW, MBBS, MRCOG, Pun TC, FRCOG, FHKAM. Left upper quadrant approach in gynecologic laparoscopic surgery with reusable instruments. J Am Assoc Gynecol Laparosc 2002; 9(2): 199-203. 11. Levrant SG, Biebr EJ, Barnes RB. Anterior abdominal wall adhesions after laparotomy or laparoscopy. J Am Assoc Gynecol Laparosc 1997; 4(3): 353-6. 12. Tulandi et al. Clousure of laparotomy incisions with or without peritoneal suturing and second-look laparoscopy. Am J Obstet Gynecol 1988; 158: 536-537. 13. Davis CJ. Prospective use of Palmer s point entry for therapeutic laparoscopy in women with previous abdominal surgery. J Am Assoc Gynecol Laparosc 2005; Open comunications 6 155. 14. Chang FH, Chou HH, Lee CL, Cheng PJ, Wang CW, Soong YK. Extraumbilical insertion of the operative laparoscope in patients with extensive intraabdominal adhesions. J Am Assoc Gynecol Laparosc1995; 2(3): 335-7. 15. Chapron C, Pierre F, Harchaoui Y, Lacroix S, Béguin S, Querleu D, Lansac J, Dubuisson JB. Gastrointestinal injuries during gynecological laparoscopy. Human Repruduction 1999; 14 (2) 333-7. 16. Golan A, Sagiv R, Debby A, Glezerman M. the minilapaoscope as a tool for localization and preparation

32 Müller B. e cols. Rev bras videocir, Jan./Mar. 2007 for cannula insertion in patients with multiple previus abdominal incisions or umbilical hernia. J Am Assoc Gynecol Laparosc 2003; 10(1): 14-16. 17. Raffi A, Camatte S, lelièvre l, Daraï E, Lécuru F. Previus abdominal surgery and closed entry for gynecological laparoscopy: a prospective study. BJOG 2005; 112 (1):100-2. 18. Bieber EJ, Levrant S. The risk of anterior abdominal wall adhesions in patients with previus umbilical hernia repair. J Am Assoc Gynecol Laparosc 1994; 1(4, part 2): S4 19. Howard FM, EL Minawi AM, DeLoach VE. Direct laparoscopic cannula insertion at the left upper quadrant. J Am Assoc Gynecol Laparosc 1997; 4 (5): 595-600. Endereço para correspondência BETÂNIA MÜLLER Rua Dinarte Ribeiro 212 apto 84 Moinhos de Vento- Porto Alegre-RS CEP 90570-050 Fone: 92688417 Fax (51) 32127433 E-mail: betaniago@hotmail.com Revista Brasileira de Videocirurgia v.5.5 n.1 Jan/Mar 2007 ISSN 1678-7137: impressa ISSN 1679-1796: on-line Assinaturas:+ 55 21 3325-7724 E-mail: revista@sobracil.org.br SOBRACIL - Editora Prensa - Rio de Janeiro, RJ - Brasil