Cana de açúcar para indústria: o quanto vai precisar crescer



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Transcrição:

Cana de açúcar para indústria: o quanto vai precisar crescer A demanda crescente nos mercados interno e externo por combustíveis renováveis, especialmente o álcool, atrai novos investimentos para a formação de novas áreas de cultivo da cana de açúcar para indústria. A maioria desses investimentos é nacional, formada de grupos com larga experiência no setor e que já possuem outras usinas no Brasil, o que confirma a tendência concentradora do setor canavieira. Existem também, em pequeno número, investidores principiantes com muita vontade de entrar na atividade canavieira atraídos pela febre do álcool e pela possibilidade de lucros extraordinários. Entretanto, cerca de 5% do total são de investimentos de grupos internacionais com experiência na produção de açúcar, bem como de fundos de investimentos sem experiência específica na atividade. Estima se que só no Estado de São Paulo venham a ser investidos cerca de R$10 bilhões nos próximos cinco anos. O crescimento da área de cana para indústria tem superado as fronteiras das regiões e dos estados mais tradicionais no plantio da matéria prima. São os casos da região da zona da mata no nordeste brasileiro, distribuída nos estados da Paraíba, Pernambuco e de Alagoas, e das regiões de Piracicaba e de Ribeirão Preto no Estado de São Paulo. Os novos investimentos avançam em áreas da região centro oeste, nos estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás. No sul do Brasil, o Paraná já é o segundo maior produtor de cana de açúcar do país. No sudeste brasileiro, a forte expansão em São Paulo dá se no noroeste e no oeste do Estado, com cerca de 39 novas usinas. Com Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo, bem como Bahia e Maranhão no nordeste do Brasil, chega se a cerca de 90 novos projetos (UNICA) 1. A oferta mundial de álcool (carburante e industrial) para 006 deve ficar em torno de 8 bilhões de litros/ano. Desse total, o Brasil participa com 35,%, um aumento de,35% em relação a 005, que registrou um volume de 6 bilhões de litros/ano. Na comparação com 00, este percentual sobe para 13,7%, já que aquele ano registrou um volume de, bilhões de litros. Este aumento da oferta é reflexo do crescimento da produção de etanol nos Estados Unidos a partir do milho, da oferta brasileira de álcool e de maior demanda por combustíveis renováveis. Com esse forte incremento na demanda por etanol, a área estimada para a safra de cana 015/16, no Brasil, deve ser de 1, milhões de hectares. O país produzirá cerca de 90,8 milhões de toneladas de cana de açúcar para indústria, o suficiente para gerar cerca de 36 bilhões de litros de álcool. Para estimar a área e a produção de cana de açúcar, foram utilizadas variáveis como preço e demanda de açúcar e álcool nos mercados interno e externo, preço da terra, produtividade varietal e de processos. O desenvolvimento de tecnologias para produção de álcool a partir do uso da palha e do bagaço, através de hidrólise, pode alterar para baixo a estimativa de expansão da área de cana para indústria. Outra variável que precisa ser avaliada é a disponibilidade de mão de obra e a capacidade do setor metal mecânico de fornecer máquinas colhedoras próprias para a cana de açúcar. No entanto, algumas variáveis externas podem arrefecer a expansão, como o atraso na implantação de programas de uso de etanol e barreiras protecionistas em

países da Europa; as barreiras econômicas para a entrada do álcool nos EUA, como argumento de proteção aos seus produtores este país tem buscado sua auto suficiência na produção de etanol com a utilização do milho e, principalmente no futuro, com a hidrólise celulósica ; o preço e a demanda por açúcar no mercado internacional e as barreiras técnicas. Algumas intempéries podem ocorrer ao longo do tempo, tais como superprodução, que gera queda nos preços; queda abrupta no preço do petróleo (pouco provável); e novas tecnologias para produção de combustíveis verdes. O que vai prevalecer, no entanto, é a necessidade de substituição das fontes fósseis por outras mais limpas e renováveis. Nesse sentido, o álcool está no topo dessa lista como uma alternativa viável ao petróleo e que por isso mesmo está impulsionando o avanço canavieiro dentro e fora do Brasil. Estima se que no futuro cerca de 0% do consumo de combustíveis sejam a partir de biomassas energéticas. O mais provável, segundo o cenário atual, é a concretização da expansão da área canavieira no Brasil, devido à grande avidez dos mercados de EUA, Japão e Europa por biocombustíveis. A estimativa de expansão da área de cana de açúcar no Brasil, se confirmada, significa mais que dobrar a área atual nos próximos 10 anos. Esta expansão se dará de forma contínua e linear nos próximos anos, visto que, da agregação da terra até sua produção, são decorridos pouco mais de dois anos. Além disso, a aprovação da licença ambiental do projeto leva um certo tempo (gráfico 1). Gráfico 1 Estimativa de crescimento da área plantada no Brasil com cana para indústria para produção de álcool e açúcar no período de 006/07 a 015/16 1 1 10 8 õ es de ha 6 0 Com o crescimento da área e da produtividade dos canaviais, haverá também um aumento da produção (gráfico ). Gráfico Estimativa da produção brasileira de cana para indústria no período de 006/07 a 015/16

1000 900 800 700 õ es de ton. 600 500 00 300 00 O Estado de São Paulo, em 006, responde por 60,7% da área total de cana deaçúcar para indústria no Brasil. Em 015, esta participação poderá cair para 5,9% devido, principalmente, à maior disponibilidade e ao menor preço da terra em outras regiões. Além disso, poderá contribuir para a maior expansão no centro oeste brasileiro a melhoria da logística de escoamento da produção, com a possível construção por parte da Transpetro de dutos que interligariam o terminal São Simão em Goiás à refinaria de Paulínia e ao terminal de Guararema em São Paulo (gráfico 3). Gráfico 3 Estimativa da área de cana para indústria para produção de álcool e açúcar em São Paulo no período de 005/06 a 015/16 9 8 7 6 5 3 õ es de ha 1

Para atender à crescente demanda por etanol, a produção anual de São Paulo, que é atualmente o maior produtor e consumidor desse combustível, deverá ter um acréscimo de 71,5% nos próximos 10 anos (gráfico ). Gráfico Estimativa da produção de cana para indústria em São Paulo no período de 005/06 a 015/16 700 600 500 00 õ es de ton. 300 00 100 0 A principal forma de expansão canavieira está ocorrendo por meio de arrendamento de terras. O crescimento da área de cana de açúcar para indústria no Brasil, em especial em São Paulo, tem avançado sobre áreas de pastagem que ficaram mais eficientes e, assim, utilizam menos terras para o mesmo tamanho de rebanho, desocupando mais áreas úteis. A cana também avança sobre algumas áreas outrora ocupadas por laranjais que, em alguns casos, ficaram menos rentáveis, bem como sobre o milho e a soja. Essa febre na demanda por biocombustíveis, impulsionada pelo aumento no primeiro semestre de 006 do preço da commodity açúcar, bem como por possibilidades de produção de energia elétrica a partir do bagaço da cana além de inúmeras outras finalidades, mostra que têm ficado mais rentável produzir ou arrendar terra para a canade açúcar do que para algumas outras culturas. Isto pode ser verificado pelo aumento de 7,9% no preço da tonelada da cana para indústria, na safra 005/06, em relação à safra anterior 3.

Portanto, a grande escalada de demanda por combustíveis renováveis nos mercados nacional e internacional abre espaço para uma expansão canavieira sem precedentes históricos no Brasil. Há quem diga que o Brasil vai virar um mar de cana. Esse fenômeno também vem ganhando força em outros países da América do Sul, assim como na Ásia e na África, fortalecendo dessa forma o mercado de combustíveis renováveis. Para concretizar a liderança como principal fornecedor de biocombustíveis, o Brasil precisa de planejamento da produção no longo prazo, de políticas públicas de regulação do abastecimento interno e das exportações e da consolidação do mercado futuro através da Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F). Porém, algumas indagações precisam ser feitas. Qual é o mercado prioritário: o interno ou externo? O mercado definirá o preço e o volume a serem produzidos? Qual o papel do estado e da sociedade na definição dessas prioridades? É preciso lembrar sempre que o crescimento da área de cana para suprir a demanda por parte da indústria não deve impor altos custos ambientais, tanto agora quanto para as futuras gerações, sob pena de inviabilizar os benefícios gerados pelo uso de combustíveis limpos. É que o direito de usufruir dos recursos naturais deve ser garantido a todos, indistintamente. 1 ÚNICA: www.portalunica.com.br Mais detalhes, podem ser verificados no artigo de SACHS, Caruso R.C. Preços recebidos pela cana de açúcar e perspectivas para a safra 006/07. Disponível Em: http://www.iea.sp.gov.br/out/vertexto.php?codtexto=78 3 Para mais detalhes, ver artigo de Gonçalves, J.S. Defesa da Reserva Legal e complexidade da agropecuária paulista. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/out/vertexto.php? codtexto=615 Artigo registrado no CCTC IEA sob número HP 98/006. Sérgio Alves Torquato storquato@iea.sp.gov.br Pesquisador do IEA