Influência da rotação de culturas e do consórcio com feijão-de-porco na produção de espigas de milho-verde orgânico Ewerton Dilelis Ferreira 1 ; Izabel Cristina dos Santos 2 ; Silvana da Silva 3 ; Felipe de Carvalho Araújo 1 ; Suelen Francisca Ribeiro 1 ; Marinalva Woods Pedrosa 4 ; Otieres Cirino de Carvalho 1. 1 UFSJ Universidade Federal de São João del-rei. Praça Dom Helvécio, 74, Fábricas, 36301-160 São João del- Rei MG, ewertondilelis@yahoo.com.br, carvalhoaraujo_f@yahoo.com.br, sussaribeiro@yahoo.com.br e otieres@hotmail.com 2 Autor para correspondência. EPAMIG Sul de Minas, Fazenda Experimental Risoleta Neves, Av. Visconde do Rio Preto, s/n, Fábricas, São João del-rei MG, icsantos@epamig.br 3 IFET Sul de Minas, Campus de Machado, Machado-MG, silasilva10@yahoo.com.br 4 EPAMIG Centro Oeste, Fazenda Experimental Santa Rita, marinalva@epamig.br RESUMO A adubação verde e a rotação de culturas são práticas importantes para agroecosistemas sustentáveis. Com este trabalho objetivou-se avaliar a produção e as características das espigas verdes de milho consorciado com feijão-de-porco ( Canavalia ensiformes), após cultivo de cenoura ou beterraba. O experimento foi realizado na EPAMIG, São João Del Rei-MG, no delineamento de blocos casualizados com quatro repetições. Os tratamentos consistiram de três períodos de convivência do milho com a leguminosa, e de três tipos de prática anteriores ao consórcio: cultivo de beterraba, cultivo de cenoura ou pousio. Foram avaliadas as seguintes características: peso de espigas com palha (PECP), comprimento (CECP) e diâmetro (DECP). As espigas apresentaram diâmetro e comprimento com padrão comercial. Concluiu-se que o feijão-de-porco não interferiu na produção de espigas de milhoverde, independente do período de convivência com o cultura. O cultivo de cenoura ou beterraba beneficia a produção de espigas de milho-verde cultivado em sucessão. PALAVRAS-CHAVE: Zea mays, Canavalia ensiformes, adubação-verde, rotação de culturas, cultivo intercalar. ABSTRACT Influence of cultures rotation and intercropping with beans of pig in organic maize green ears yield. The green manure and rotation of cultures are important practice for sustainable agroecosystems. The objective of this work was to evaluate the yield and traits of the maize green ears intercropped with beans of pig (Canavalia ensiformes), after carrot or sugar beet cultivation. The experiment was carried out as completely randomized block design with four replications, on EPAMIG, São João del Rei Minas Gerais State. The treatments had consisted of intercropped maize x beans of pig on three periods, and three previous practices: sugar beet cultivation, carrot cultivation or no cultivation. The following traits had been evaluated: weight of green ears with straw (PECP), length (CECP) and diameter (DECP). The maize green ears presented diameter and length with commercial standard. It was concluded that the beans-of-pig did not intervene with the S4591
production of maize green ears, independent Keywords: Zea mays, Canavalia ensiformes, of the intercropping period. Carrot or sugar beet cultivation benefits the yield of maize cultivated in succession and the traits of green ears. green manure, cultures rotation, intercropping. INTRODUÇÃO A crescente exigência de consumidores por alimentos saudáveis tem aumentado a demanda por produtos orgânicos. O cultivo orgânico preconiza o uso de técnicas conservacionais do solo, da água e da biodiversidade. A utilização de plantas como adubo verde e cobertura do solo tem sido estudada, uma vez que, devidamente manejadas, promovem a proteção do solo contra a incidência direta de sol e chuva, recicla nutrientes e aumenta a diversidade e equilíbrio dos sistemas. A adubação verde pode ser utilizada como alternativa à adubação química, uma vez que contribui para o enriquecimento da fertilidade e aumento da matéria orgânica no solo (Calegari et al., 1993; Alvarenga et al., 1995). Quando o adubo verde é uma leguminosa, que incorpora nitrogênio no tecido vegetal por meio da simbiose com bactérias do gênero Rhizobium, pode fornecer significativas quantidades de nitrogênio para o solo (Franco & Souto, 1984; Calegari et al., 1993; Fornari, 2002). O feijão-de-porco, por exemplo, pode produzir de 14 a 40 t ha -1 de massa verde (Santos & Fontanétti, 2007), com fixação biológica de nitrogênio de 49 a 190 kg ha -1 ano -1 (Franco & Souto, 1984; Calegari et al., 1993). Os adubos verdes podem ser cultivados em rotação ou em consórcio com a cultura principal (Heinrichs et al., 2002; Fontanétti et al., 2006), sendo que o consórcio possibilita a prática da adubação verde sem a perda de uma safra agrícola da cultura de interesse econômico. Heinrichs et al. (2002) e Santos et al. (2004) não verificaram efeito prejudicial no estado nutricional e nem na produção de grãos de milho quando semeado simultaneamente com o feijão-de-porco; no entanto, observaram que o efeito positivo, geralmente, é mais acentuado no segundo ano de adoção do cultivo consorciado. O feijão-de-porco apresenta características favoráveis ao consórcio com outras culturas, por ser uma planta rústica, tolerante ao sombreamento parcial, resistente a altas temperaturas e a seca (Santos & Fontanétti, 2007). Sua raiz pivotante pode atingir 60 cm de profundidade e as raízes axiais são grossas com tendência ao crescimento horizontal (Alvarenga et al., 1995). Assim, acredita-se que esta leguminosa compete menos com a cultura do milho, pois exploram diferentes regiões do perfil do solo. Além disso, apresenta efeito alelopático sobre algumas plantas invasoras, principalmente a tiririca (Cyperus rotundus) (Calegari et al., 1993; Fontanétti et al., 2002). S4592
Com este trabalho, objetivou-se avaliar a influência do consórcio com feijão-de-porco nas características da espiga de milho-verde, em sucessão ao cultivo de cenoura ou beterraba, em sistema orgânico. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi instalado na EPAMIG, Fazenda Experimental Risoleta Neves, em São João Del Rei-MG, com latitude (Sul) de 21 08 08, longitude (Leste) de 44 15 42 e altitude de 910 m. O clima caracteriza-se por verões quentes e úmidos, com uma temperatura média anual de 19,2 C, com mínima de 3 C em julho, e máxima de 38 C em fevereiro. Foi utilizado o delineamento de blocos casualizados, com quatro repetições, para avaliar a produção de espigas de milho-verde, cultivado em consórcio com o feijão-de-porco ( Canavalia ensiformes). O milho faz parte de um plano de rotação de culturas, no qual foram cultivadas cenoura e beterraba no primeiro ciclo e o milho no segundo (Tabela 1). Realizou -se o semeio direto do milho ( cultivar AG 1051) no dia 14/09/10, sobre os restos culturais de cenoura ou beterraba, no espaçamento de 0,70 m entre linhas e aproximadamente 0,20 m entre plantas. No mesmo dia, foi semeada a Crotalaria spectabilis nas entrelinhas do milho. Porém a leguminosa não apresentou emergência uniforme, sendo substituída pelo feijão-de-porco, semeado 15 dias após o milho, com densidade de 5 a 6 plantas por metro linear. O feijão-de-porco permaneceu em consórcio com o milho por diferentes períodos: 44 dias, 62 dias e 99 dias. A parcela foi constituída de seis linhas com três metros, sendo que 10 plantas das duas linhas centrais foram utilizadas para as avaliações. Na adubação de semeio foram aplicados termofosfato Yoorin, equivalente a 0,5 ton ha - ¹ e esterco de bovinos equivalente a 25,5 ton ha -1. Em 12/11/10 (44 dias após semeio do feijão -de-porco) foi feito o corte da leguminosa nos tratamentos 2 e 5, deixando a biomassa sobre o solo como adubação verde. Em seguida foi realizada a primeira adubação de cobertura, utilizando cama de galinha em dose equivalente a 2,74 t ha - ¹. Em 30/11/10 (62 dias após semeio do feijão-de-porco), a leguminosa foi cortada nos tratamentos 3 e 6 e sua biomassa também foi depositada sobre o solo. Após a colheita, realizada nos dias 21 e 22/12/10, foram avaliados: diâmetro da espiga com palha (DECP), comprimento (CECP) e massa (MECP). Os dados foram submetidos à análise de variância e as médias comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. RESULTADOS E DISCUSSÃO Houve efeito dos tratamentos para diâmetro de espiga com palha (DECP), comprimento de espiga com palha (CECP) e massa de espiga com palha (MECP). Em todos os tratamentos as espigas apresentaram diâmetro e comprimento suficientes para classificá-las no padrão comercial, que exige diâmetro maior que 3 cm e comprimento maior que 15 cm. O DECP variou 4,64 a 5,63 cm e o comprimento de 20,66 a 23,89 cm. S4593
Os sistemas de sucessão cenoura/milho + feijão-de-porco ou beterraba/milho + feijão-de-porco (Tabela 2), apresentaram maiores valores de DECP em relação ao tratamento milho solteiro após pousio, o que leva à conclusão de que houve efeito do cultivo anterior sobre o DECP. A semelhança entre a média do tratamento 1 e as médias dos tratamentos 2, 3 e 4 indica que não houve competição entre o milho e o feijão-de-porco, caso contrário ter-se-iam espigas com menor diâmetro nos consórcios. A semelhança entre as médias dos tratamentos 5 a 10 indica que tanto a sucessão cenoura/milho como a sucessão beterraba/milho influenciou positivamente a produção de espigas de milho verde, proporcionando espigas com maior diâmetro. Ou seja, mesmo quando a leguminosa conviveu com o milho até a colheita das espigas verdes (tratamentos 5 e 8), o enchimento de grãos não foi prejudicado. Uma hipótese para explicar este fato foi colocada por Cantarutti & Boddey (1997), em que parte do nitrogênio fixado pela leguminosa pode ser transferida direta ou indiretamente para a gramínea associada, e há evidências de que a transferência direta ocorra por meio de produtos nitrogenados excretados pelas raízes, por fluxo de nitrogênio através de hifas de micorrizas que interconectam as raízes das duas espécies e por reabsorção do nitrogênio volatilizado ou lixiviado da folhagem da leguminosa. De acordo com as revisões de Carvalho (1986), as percentagens médias de transferência de N de diversas leguminosas tropicais para as gramíneas associadas, variam de 10 a 20%, sendo que em alguns casos, 29 a 39% de transferência foram obtidas. Para o comprimento de espigas com palha ( CECP) houve diferença estatisticamente significativa apenas entre os tratamentos 3 e 7, com superioridade do tratamento 7 (Tabela 2). Nos dois tratamentos o milho conviveu com o feijão-de-porco por 62 dias, mas no tratamento 3 o cultivo se deu após pousio e no tratamento 7 após cultivo de cenoura. Então, pode-se concluir que houve efeito do cultivo anterior sobre o CECP, evidenciando o benefício da rotação de culturas. Além da adubação orgânica residual, tem-se o aporte de matéria orgânica pelo fato da parte aérea da cenoura ter sido deixada sobre o solo. Não houve diferença estatística entre a média da massa de espigas com palha do tratamento 1 e as médias dos tratamentos 2, 3 e 4, o que permite concluir que o feijão-de-porco não interferiu na massa de espigas, independente do período de convivência com o milho. A massa de espigas foi significativamente maior nos tratamentos 5 e 9 em relação ao tratamento 3, mostrando mais uma vez que o cultivo do milho em sucessão a beterraba ou cenoura é mais vantajoso que após pousio. Como não houve diferença estatística entre as médias dos tratamentos 5 a 10, conclui-se que tanto o cultivo de cenoura como o de beterraba beneficia a produção de espigas de milho-verde cultivado em sucessão. REFERÊNCIAS S4594
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Tabela 1. Descrição do sistema de rotação de culturas na área experimental (Description of rotation system in the experimental area). EPAMIG, São João del Rei-MG, 2010 Tratamento Primeiro Cultivo Segundo Cultivo Sistema 1 Cenoura Milho+feijão-de-porco por 83 dias Sistema 2 Cenoura Milho+feijão-de-porco por 44 dias Sistema 3 Cenoura Milho+feijão-de-porco por 62 dias Sistema 4 Beterraba Milho+feijão-de-porco por 83 dias Sistema 5 Beterraba Milho+feijão-de-porco por 44 dias Sistema 6 Beterraba Milho+feijão-de-porco por 62 dias Tabela 2. Médias de diâmetro de espigas de milho-verde com palha (DECP), comprimento de espigas com palha (CECP) e massa de espigas com palha (MECP), em função dos tratamentos. (Means of diameter (DECP), length (CECP) and mass (MECP) of maize green ear with straw, in function of the treatments). São João del Rei MG, EPAMIG, 2011 Nº do tratamento Descrição dos tratamentos DECP 1 (cm) CECP (cm) MECP 2 (kg parcela - ¹ ) 1 Pousio / Milho solteiro 4,65 c 21,51 ab 2,20 bc 2 Pousio/ Milho + feijão-de-porco por 44 dias 3 Pousio/ Milho + feijão-de-porco por 62 dias 4 Pousio/ Milho + feijão-de- porco por 83 dias 5 Cenoura/ Milho + feijão-de-porco por 83 dias 6 Cenoura/ Milho + feijão-de-porco por 44 dias 7 Cenoura/ Milho + feijão-de-porco por 62 dias 8 Beterraba/ Milho + feijão-deporco por 83 dias 9 Beterraba/ Milho + feijão-de-porco por 44 dias 10 Beterraba/ Milho + feijão-de-porco por 62 dias 4,64 c 21,86 ab 2,21 bc 4,59 c 20,66 b 1,99 c 4,74 bc 21,65 ab 2,17 bc 5,63 a 23,89 ab 3,24 a 5,53 a 23,26 ab 3,12 ab 5,53 a 24,23 a 3,24 a 5,59 a 23,62 ab 3,15 ab 5,33 ab 23,05 ab 3,32 a 5,49 a 23,59 ab 3,01 abc CV(%) 5,34 5,87 15,25 1 Médias seguidas da mesma letra, na coluna, não diferem entre si pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. 2 Peso de 10 espigas com palha. (Means followed by the same letter in the column do not differ significantly, according to Tukey s test at 5%). 2 Weight of ten maize green ears. S4596