A Odontologia nos primeiros anos de vida



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A Odontologia nos primeiros anos de vida A atenção e os cuidados com a saúde bucal dos bebês contribuem para prevenir doenças, como a cárie dentária, e problemas ortodônticos. Para uma vida plena e saudável, os cuidados com a saúde devem começar logo na infância, ou ainda nos primeiros anos de vida da criança. E nesses cuidados está inclusa a saúde bucal, por meio de um trabalho multidisciplinar que envolve o pediatra e o odontopediatra, de forma a prevenir problemas ortodônticos e periodontais futuros. Conforme Carla Todescan, odontopediatra, ortopedista funcional dos maxilares e mestre em Laser na Odontologia, a saúde bucal é parte integrante da saúde geral e do bem-estar do indivíduo. O foco atual da Odontologia, especialmente da Odontopediatria, é a promoção, ou seja, a preservação da saúde bucal por meio de ações educativas e preventivas, informa. O trabalho conjunto de odontopediatras e de pediatras os primeiros profissionais da saúde a terem contato com o bebê para orientar os cuidados com a saúde bucal da criança inicia-se na primeira infância, ressalta. 442 OrtodontiaSPO 2013;46(5):442-8

Ortoinformação Para ela, no entanto, o momento mais oportuno para a mãe ter esses conhecimentos é na gravidez: neste momento, os pais ou responsáveis recebem orientações de como conduzir os primeiros meses de vida do bebê antes deste iniciar a erupção dos seus primeiros dentinhos. Eles são orientados para a criação de hábitos saudáveis, que minimizem a instalação de problemas futuros e a necessidade de tratamentos invasivos. As orientações serão de estímulos ao crescimento e desenvolvimento mais adequados do sistema estomatognático: a importância do amadurecimento das funções orais (respiração nasal, sucção, deglutição e mastigação); importância do aleitamento com a ordenha no peito materno; importância da criação de hábitos alimentares saudáveis; prevenção de hábitos orais deletérios (chupetas, dedos e mamadeiras persistentes); e orientações para a criação de hábitos de higiene bucal, enumera Carla. De fato, é na gestação que os cuidados devem começar, e estes precisam ser centrados na correta alimentação da gestante, como destaca Luiza Lindenberg, especialista em Odontopediatria e Periodontia: isso terá influência direta no desenvolvimento dos dentes do bebê, e é importante que a alimentação seja balanceada, à base de proteínas, cálcio, fósforo e vitaminas. Os dentes de leite começam a se desenvolver a partir da sexta semana de vida intrauterina. Assim, condições desfavoráveis durante a gestação, como uso de alguns medicamentos, infecções e carências nutricionais, podem trazer problemas nos dentes do bebê em formação. Mulheres grávidas com higiene bucal falha podem desenvolver doença periodontal, que eleva a produção de mediadores inflamatórios, os quais, por sua vez, causam contrações uterinas, podendo ocasionar partos prematuros com bebês de baixo peso. Portanto, a gestante deve redobrar os cuidados com os dentes e aumentar a frequência da higiene bucal. Essa higiene deverá ser rigorosa, usando-se escova e fio dental. Convém fazer o acompanhamento da gestante durante o período pré-natal por um cirurgião-dentista especialista, recomenda. Yara Pierangeli Claudio Fonseca, especialista em Odontopediatria, ressalta que a dentição decídua tem dois períodos de desenvolvimento: um pré-natal e outro pós-natal. Portanto, é fundamental que a gestante faça regularmente uma avaliação e seja acompanhada durante a gestação. Os fatores, desde a concepção até o nascimento, que podem interferir no desenvolvimento do feto também podem afetar a dentição decídua. Assim, os cuidados com a saúde bucal da criança se inicia na gestação, assinala. E acrescenta: a gravidez é uma fase ideal para o estabelecimento de bons hábitos, pois a gestante mostra-se psicologicamente receptiva em adquirir novos conhecimentos, as informações sobre o estabelecimento de hábitos saudáveis para a formação adequada do bebê, a importância do aleitamento materno no crescimento e no desenvolvimento dos arcos dentários, o uso adequado da mamadeira e da chupeta, se necessário, além de orientações sobre a primeira consulta do futuro bebê ao odontopediatra. Esse é o momento para que mudanças ocorram em padrões que terão influência no desenvolvimento da saúde do bebê, afirma. Amamentação essencial O aleitamento materno é fundamental para o crescimento e o desenvolvimento do recém-nascido, uma vez que protege o bebê contra infecções gastrointestinais e respiratórias. Além disso, a ordenha (sucção e pressão) no peito materno é um movimento indispensável para o amadurecimento fisiológico de todo o sistema estomatognático. Este processo sincroniza as funções de sucção, deglutição e respiração, desenvolve as capacidades táteis-cinestésicas, térmicas, olfativas, visuais, auditivas e motoras do bebê. Quando esta não for possível, e o bebê fizer uso de mamadeira, a mãe deverá ser orientada, aconselha Carla, cujo pai, Luiz Antonio Todescan, também foi odontopediatra, de 1960 a 2010. Percebendo a realidade brasileira da época, ele criou uma campanha contra a cárie de mamadeira, lançada no 13 o Congresso Internacional de Odontologia de São Paulo da APCD, em 1988, com o slogan: Mamadeira: use, mas não abuse, lembra. Para Luiza, amamentar, além de prover o alimento mais completo para o bebê, gera o hábito correto da respiração nasal, onde o ar é aquecido, filtrado e umidificado, diminuindo assim os riscos de doenças alérgicas e respiratórias. Muitos problemas de adenoide e amígdalas hipertrofiadas ocorrem porque o ar não é filtrado pelo nariz, e estas duas ocorrências podem ser precursoras de um prognatismo para tentar facilitar a passagem do ar. A respiração nasal estimula as terminações nervosas das fossas nasais que, por sua vez, levam estes estímulos aos centros neurais, gerando as respostas adequadas de desenvolvimento (tamanho das fossas nasais, dos seios maxilares e inúmeros estímulos vitais para o organismo). A passagem de ar adequada promove o desenvolvimento transversal do palato, pois o assoalho nasal é o teto do palato. Oriento as mães a, quando encontrarem o bebê dormindo de boca aberta, ajeitar a cabeça ou mudá-lo de posição, para fechar a boca do bebê, e segurar o queixo por um tempo, quantas vezes for necessário. Este reflexo de vedamento labial precisa OrtodontiaSPO 2013;46(5):442-8 443

ser desenvolvido após os três ou quatro meses. Outra dica é, desde cedo, pingar soro fi siológico no nariz do bebê para que este adquira o hábito de puxar o ar pelo nariz. Com a amamentação natural, essa respiração nasal estará mais garantida, uma vez que existe um selamento dos lábios durante a sucção, sem a necessidade de interrupção para entrada do ar, como acontece com a mamadeira, acentua. Luiza destaca também que a amamentação garante o estímulo na região posterior das articulações temporomandibulares simultaneamente, gerado pelo movimento de ordenha que a mandíbula executa. Isto ajuda na diminuição da distoclusão fi siológica do recém-nascido, estabelecendo assim uma relação adequada dos incisivos superiores e inferiores, com aumento na tonicidade muscular. A criança terá, então, condições de apresentar selamento labial, respiração nasal e uma correta postura da mandíbula e da língua. Na mamadeira, a criança não realiza ordenha, somente sucção. O ponto de deglutição na mamadeira é mais anteriorizado, quando comparado ao seio materno, que é mais posterior. Portanto, o estímulo e a força muscular também são diferentes. Na amamentação natural ocorre êxtase neuromuscular, desgaste físico, demora mais tempo e ocorre um grande gasto de energia. É importante ressaltar que os bebês em aleitamento não devem usar chupeta ou outro bico artifi cial antes do primeiro mês de vida, para evitar a confusão de bicos. Apenas após, quando a amamentação já estiver estabelecida e o bebê ganhando peso, é que se poderia iniciar o uso, mas apenas para dormir. O uso indiscriminado da chupeta é, em muitos casos, responsável pelo desmame precoce do bebê, assegura. Segundo Yara, o aleitamento materno é considerado o mais natural e desejável método de alimentação para o crescimento e desenvolvimento do recém-nascido, no que diz respeito aos aspectos nutricional, fi siológico e psicológico. Pela amamentação, a mandíbula posiciona-se mais anteriormente, o músculo temporal, o pterigoide lateral e o milo-hioideo iniciam sua maturação e reposicionamento, a língua estimula o palato, o orbicular dos lábios promove o desenvolvimento da região anterior. A amamentação natural previne a ocorrência da síndrome do respirador bucal, pois reforça o circuito neural fi siológico da respiração nasal, visto que durante o aleitamento o bebê não solta o seio e, portanto, mantém a respiração nasal em sincronia com o ato de sucção. A amamentação natural também previne o desenvolvimento da deglutição atípica e das más-oclusões, adverte. Conforme ela, com o uso da mamadeira, o estímulo anteroposterior da mandíbula deixa de ocorrer, pois para sugar o leite da mamadeira a criança não precisa realizar o exercício muscular que leva à propulsão e à retrusão da mandíbula, mas trabalha com os músculos bucinadores; além disso, a respiração não está necessariamente em sincronia com a deglutição, o que predispõe ao aparecimento da respiração bucal. No momento da amamentação natural, há uma ação coordenada entre as funções de sucção, deglutição e respiração que, nessa fase, são consideradas refl exas, o que leva a um desenvolvimento correto das estruturas bucofaciais, coisa que não ocorre, como dissemos anteriormente, com a mamadeira. Quando o uso da mamadeira se fi zer necessário, é imprescindível que a escolha do bico (da mamadeira) e do furo existente no bico seja cuidadosa para haver uma adequação entre o fl uxo de leite (quantidade de leite sugado), a força muscular exercida e a necessidade alimentar. Havendo uma inadequação desse processo, esse ciclo sofrerá adaptações, assegura. Mamadeiras e chupetas Embora tenham uma grande aceitação, mamadeiras e chupetas devem ser usadas com moderação e bom senso, para não prejudicar a saúde bucal das crianças. Conforme Carla, o uso prolongado e persistente de chupetas e mamadeiras compromete o crescimento e o desenvolvimento facial como um todo, levando à má posição dos dentes. As funções orais básicas fi cam comprometidas (deglutição adaptada, respiração oronasal, fonoarticulação adaptada, perda do vedamento labial, alteração na tonicidade muscular, posicionamento alterado da língua), e morfologicamente observamos a mordida aberta, sobressaliência aumentada, mordida cruzada posterior, retroinclinação dos incisivos inferiores e palato ogival. Além disso, o uso prolongado de líquidos açucarados dentro da mamadeira pode levar ao aparecimento de cáries rampantes, especifi ca. Para Luiza, tanto a chupeta quanto a mamadeira podem interferir no desenvolvimento correto da criança, levando a alterações no posicionamento dos dentes, desvio do crescimento dos ossos da maxila e mandíbula (mordida aberta, mordida cruzada, inclinação e giroversão, diastemas, alterações na fonação, na deglutição e na respiração). Estas alterações dependem da intensidade, da duração do hábito e do padrão 444 OrtodontiaSPO 2013;46(5):442-8

ortoinformação hereditário. Quanto mais cedo ocorrer a remoção da chupeta e da mamadeira, maiores as chances de eventuais alterações regredirem naturalmente. Quando os pais optarem pelo uso da chupeta, ele deverá ser mínimo. Ela não deve fi car à vista, nem à disposição da criança, e é a mãe que deve administrar as horas de uso da chupeta, não a criança. A criança não deve falar com a chupeta na boca, pois ela poderá atrapalhar a pronúncia correta das palavras e o adequado posicionamento da língua e dos lábios. É importante delimitar o tempo de uso e o espaço físico, mostrando à criança que a chupeta é só para dormir e, portanto, não deverá sair do berço. Quando perceber que a criança pegou no sono e está com a chupeta solta na boca, ela deverá ser retirada. A criança não deve saber que a chupeta é vendida na farmácia da esquina. Não é bom colocar várias chupetas à disposição da criança, pois facilita sua recolocação e pode estimular o seu uso, informa. E adverte: o uso prolongado da mamadeira, quando a criança já tem dentes, cria o hábito do consumo de uma dieta mole e adocicada, o que aumenta o risco de cárie de mamadeira. Além disso, a criança tende a recusar alimentos que requerem mastigação. Depois da amamentação, a mastigação correta continuará a tarefa de exercitar ossos e músculos corretamente. O uso da mamadeira noturna sem a posterior limpeza dos dentes provoca a cárie, que atinge a maioria dos dentes, começando primeiro pelos superiores anteriores e, na sequência, os posteriores. clinação dos incisivos inferiores. A morfologia do palato duro também poderá sofrer alteração, adquirindo uma forma ogival. Nas crianças, o hábito de sucção e a presença de alteração oclusal estão associados com mudança na postura da língua em repouso, interposição lingual anterior durante a deglutição e durante a fala. Essas alterações irão prejudicar o padrão mastigatório e a fonação da criança, afi rma. Conforme ela, ainda, a plasticidade dos tecidos duros e moles explica, pelo menos em parte, as alterações e as adaptações observadas nas crianças portadoras de maus hábitos. O mecanismo mastigatório é acentuadamente adaptativo aos padrões funcionais variáveis, mantendo, no entanto, um alto grau de capacidade regenerativa. As diversas más-oclusões presentes na dentição decídua, analisadas individualmente ou em conjunto, quase sempre estão associadas a alterações miofuncionais orais. Os hábitos orais podem ser classifi cados em não nutritivos (sucção da chupeta, do dedo, do lábio, da língua e onicofagia) e nutritivos (mamadeira), e quase sempre esses hábitos são interligados. Como a mamadeira, a chupeta e mesmo a sucção do dedo são hábitos socialmente aceitos e, muitas vezes, instituídos pelos próprios pais, não há um questionamento sobre suas consequências. É na consulta que o odontopediatra deverá mostrar aos pais as alterações presentes e encorajá-los (os pais e a criança) a deixar o hábito, por meio de uma troca agradável e consciente. A retirada do hábito de As lesões evoluem rapidamente de manchas brancas para cavidades, até destruírem totalmente os dentes decíduos. Para uma retirada mais tranquila, pode-se diluir gradativamente a mamadeira noturna, com isso o leite vai fi cando sem sabor até que a criança o rejeite, recomenda Luiza. De acordo com Yara, quase sempre eles levam a um desequilíbrio Mordida aberta anterior com uso da chupeta. Mordida aberta anterior com uso da chupeta. Postura incorreta da língua das arcadas dentárias. As estruturas faciais em desenvolvimento na infância seguem um padrão de crescimento genético que se altera com os estímulos ambientais. Assim, o uso prolongado da chupeta, do dedo e da mamadeira altera a morfologia dos arcos dentários. Observa-se a presença de mordida aberta anterior, Mordida aberta anterior, seis meses sobressaliência aumentada, mordida após a remoção da chupeta. Mordida cruzada com uso da chupeta. cruzada posterior, além de retroin- imagens cedidas por Luiza Lindenberg. OrtodontiaSPO 2013;46(5):442-8 445

sucção do dedo e da onicofagia requer mais consciência, força de vontade e colaboração por parte da criança, o que poderá acontecer um pouco mais tarde, garante. Primeira dentição Os primeiros dentes decíduos a nascerem são os incisivos inferiores, geralmente por volta dos seis aos oito meses de idade, podendo variar de criança a criança, tanto precocemente, aos quatro meses, quanto tardiamente, após um ano de idade. Para Luiza, a primeira dentição é muito importante porque é usada como guia para preparar a erupção dos dentes permanentes, mantendo em equilíbrio harmônico o crescimento das estruturas da face (dentes, ossos e músculos), o que proporciona mastigação e deglutição adequadas dos alimentos, além da consequente digestão destes. Se os dentes de leite forem perdidos precocemente, por cárie ou acidente, poderão ocorrer problemas de má formação, atraso na erupção e má posição dos permanentes. A manutenção dos dentes de leite é importante para que a criança possa se alimentar bem, mastigando com efi ciência os alimentos, para falar e pronunciar corretamente as palavras, e para guardar espaço e orientar no nascimento dos futuros dentes permanentes, informa Luiza. Já Yara lembra ser de suma importância, no desempenho do comportamento motor oral e na aquisição das habilidades mastigatórias, a época em que os dentes decíduos irrompem na cavidade bucal. A cronologia de erupção dos dentes é um indicador para uma série de ocorrências biológicas, e pode ser influenciada por fatores genéticos e ambientais. O exame radiográfi co ao nascimento já mostra a presença dos elementos dentários em formação no interior da maxila e da mandíbula. A tabela clássica sobre cronologia e sequência de erupção dentária é a de Logan e Kronfeld, porém, atualmente temos estudos epidemiológicos, feitos no Brasil, que levam em conta não só a idade, mas fatores raciais, genéticos, geográfi cos e o crescimento somático geral da criança, estabelecendo uma tabela de cronologia de erupção (Haddad & Correa 2001-2005). Os dentes decíduos são muito importantes na mastigação, fonação e estética, além de serem os responsáveis pela manutenção do comprimento dos arcos, mantendo os espaços para os dentes permanentes. Por isso, a perda precoce de um dente decíduo poderá provocar a erupção do dente permanente em uma posição incorreta, além de uma função mastigatória inadequada, promovendo crescimento e desenvolvimento desorganizados da maxila e da mandíbula, avalia. De acordo com Carla, conforme os 20 dentes decíduos vão erupcionando durante a primeira infância, várias etapas de crescimento e do desenvolvimento vão sendo atingidas. Nesta etapa, vamos acompanhando a evolução da alimentação, que deverá passar de líquida a mais sólida, com alimentos naturais, mais secos e fi brosos. Durante os acompanhamentos semestrais neste período, o odontopediatra poderá fazer o diagnóstico precoce dos distúrbios de crescimento orofacial (genéticos, ambientais, anomalias, traumas, enfermidades) e introduzir medidas simples de reorganização. Por meio de orientações simples, podemos estimular ou recuperar a respiração nasal, corrigir hábitos que sejam os responsáveis pelo crescimento e desenvolvimento alterados das estruturas orofaciais, e ainda recomendar estilo de vida menos sedentário, afi rma. E complementa: quando necessário, poderemos fazer uso oportuno de tratamentos por acréscimo ou por decréscimo de estruturas dentais para alterar as superfícies oclusais dos dentes decíduos e, com isso, manter a dinâmica mandibular ideal para um bom desenvolvimento do sistema estomatognático. Além disso, a orientação mastigatória poderá ajudar a alcançar o equilíbrio funcional dos arcos dentários. Quando necessário, em um momento mais tardio, como dois anos, dois anos e meio, poderemos fazer uso dos aparelhos pré-fabricados de silicone, de indicação na primeira Dispositivo em silicone auxilia o desenvolvimento dos dentes e maxila nas crianças de dois a cinco anos. 446 OrtodontiaSPO 2013;46(5):442-8

Ortoinformação infância, para nos auxiliar neste processo. Podemos optar por um tratamento mais global, observando as curvaturas corporais e encaminhando esta criança para um tratamento de reorganização funcional, com o Método Padovam de estímulos corporais para recuperações da funcionalidade perdida. Ou, nestes casos mais precoces, podemos falar em instalação de funções nem adquiridas, orienta Carla. Higiene bucal do bebê Após o nascimento do bebê, a limpeza da boca deve ser iniciada antes mesmo da erupção dos dentes decíduos. Oriento a limpar suavemente, duas vezes ao dia, as gengivas, as bochechas e a língua do bebê, procurando remover os restos de leite ou alimentos acumulados, utilizando para a limpeza uma gaze ou a ponta de uma fralda envolta no dedo indicador, embebida em água filtrada e fervida. Pode-se também usar as dedeiras de silicone, que são dispositivos especiais de borracha ou silicone com pequenas elevações imitando as cerdas de uma escova de dente. Desta maneira, preparamos o ambiente para a chegada dos futuros dentinhos e habituamos o bebê ao ato da higiene bucal, ensina Luiza. Já com a erupção dos dentes do bebê, Luiza explica que a higienização torna-se fundamental e deve ser realizada utilizando-se escova dental, pois a gaze e a fralda não atingem determinadas superfícies dos dentes, principalmente quando nascerem os molares. A escovação dos dentes após as refeições deve ser incentivada, e a escovação antes de dormir é a mais importante para a eliminação dos resíduos alimentares, evitando-se assim o surgimento de cáries precocemente, adverte. Para Yara, os dentes decíduos devem ser escovados pelos pais ou responsáveis, com uma escova infantil, podendo utilizar creme dental. E a presença ou não de flúor neste dependerá dos fatores de risco, em relação à doença cárie, que a criança está sujeita. O controle do biofilme dental, pela escovação, deve ser feito após as mamadas, refeições e, sobretudo, à noite, antes de dormir. As crianças aprendem muito pela imitação: se os pais mantêm hábitos saudáveis quanto à sua própria saúde bucal, os filhos terão seus pais como exemplo. Trabalhos mostram que quando os pais fazem sua higiene bucal na presença dos filhos, e aproveitam esse momento para explicar a importância desse hábito, as crianças ficam com uma motivação maior para fazer a sua higiene bucal. O odontopediatra, nas consultas, irá orientar a técnica de escovação, o creme dental, o tipo de escova, de cerdas, o uso da fita dental, a necessidade de aplicação de flúor, e mesmo a necessidade da aplicação de selante, especifica. Outro cuidado especial é com a alimentação. De acordo com Luiza, os hábitos alimentares de uma pessoa se consolidam geralmente na fase pré-escolar, dos dois aos seis anos de idade. Portanto, quanto mais precoce for o acesso da criança aos alimentos saudáveis, melhor será o resultado. Acostumar a criança ao sabor natural dos alimentos, não adoçando sucos e leite com açúcar nem mel; não criar desde cedo na criança o hábito da ingestão de alimentos adocicados. O consumo excessivo de açúcar não é somente prejudicial aos dentes, mas também à saúde geral. Não dá para ser radical e cortar totalmente o açúcar da vida da criança. Contudo, deve haver regras para restringir sua ingestão. Oriento os pais a estipular os horários e os dias em que serão permitidos doces, balas e chocolates, refrigerantes e sucos artificiais, além de prestar atenção aos açúcares ocultos em salgadinhos, como batatas fritas, catchup, pães, bolachas e xaropes. Estimular as crianças a comerem frutas, dando exemplo, é claro, e eleger um dia na semana em que é permitido comer doces e chocolates já ajuda bastante!, assegura. Conforme Yara, orientações também devem ser dadas em relação a alimentos cardiogênicos. Leite, sucos ou chás devem ser ingeridos, de preferência, sem açúcar. As crianças que dormem com uma mamadeira (de suco ou leite) na boca podem adquirir a cárie de mamadeira, ou cárie rampante, constituída de lesões de cárie de rápida progressão e que atingem vários dentes ao mesmo tempo. Ao iniciar a alimentação pastosasólida, a criança deve ser acostumada aos sabores naturais não adoçados. O uso do açúcar deve ser limitado às refeições principais, evitando que a criança coma doces entre elas. Com a erupção dos primeiros dentes decíduos, temos a transição alimentar líquido-pastoso-sólido. A sucção é reflexa e automática até, em média, o sexto, sétimo mês de vida da criança, depois passa a ser voluntária. A mastigação é, desde seu início, uma função adquirida e depende de estímulos ambientais, isto é, deve ser incentivada. A mastigação é uma das funções mais OrtodontiaSPO 2013;46(5):442-8 447

importantes do sistema estomatognático, e é responsável pelo desenvolvimento das arcadas dentárias, ressalta. Luiza também destaca que o regime alimentar moderno, com alimentos pobres em fi bras, industrializados e de textura pastosa é um dos grandes responsáveis pelas atrofi as e desequilíbrios funcionais e de desenvolvimento das crianças. É um erro comum achar que o bebê deve comer papinhas batidas e peneiradas por muito tempo. Esse tipo de consistência não estimula a força dos músculos e o desenvolvimento dos ossos faciais. É preciso mastigar! A falta de alimentos duros, secos e fi brosos elimina a necessidade de uma mastigação mais vigorosa, o que acaba causando profundas alterações nos estímulos necessários ao desenvolvimento adequado do sistema estomatognático, garante. De fato, a mastigação é fator fundamental no crescimento equilibrado das arcadas dentárias e da face da criança. Ela é responsável por tonifi car os músculos do rosto, modelar a forma dos ossos e a posição dos dentes, além de ser a primeira fase da digestão dos alimentos. É necessário que haja uma transição alimentar entre a amamentação e a mastigação efetiva de alimentos duros e secos, a fi m de estimular a efi ciência da função da mastigação. Aos seis meses de idade, quando ocorre o início de alimentação, os alimentos devem ser mais pastosos, como sopas de legumes amassados e frutas raspadas. Entre oito e nove meses começam a ser introduzidos os alimentos semissólidos, alimentos cozidos e em pedaços. Por volta de um ano, entram os sólidos e a criança já deve ser capaz de mastigar arroz, carnes, saladas e frutas. A introdução de alimentos duros e mais secos irá necessitar de esforço muscular, o que contribui para o perfeito desenvolvimento da fala e dos ossos da face da criança. É um momento que requer muita paciência, pois as crianças cospem, engasgam, fazem caretas. Muitas mães pensam que é uma rejeição da criança ao alimento, mas é apenas uma adaptação às novas texturas e aos novos sabores, esclarece Luiza. E recomenda: durante a mastigação, os lábios devem estar selados e os movimentos mandibulares devem ser unilaterais alternados. Isso signifi ca que a criança deve ser capaz de mastigar do lado direito e do lado esquerdo com a mesma facilidade. O ideal é haver variação e dar preferência a alimentos mais consistentes, que precisam ser mastigados com mais intensidade e duração. Qualquer difi culdade ou preferência mastigatória por um lado irá desencadear um desenvolvimento assimétrico que, de início, será apenas muscular, mas que com o tempo poderá levar à assimetria óssea. Primeira consulta Muitos pais se debatem nessa dúvida, de quando e qual a melhor época para se levar o fi lho ao dentista. De acordo com Carla, a primeira consulta do bebê ao odontopediatra deve ser quando do nascimento do primeiro dente decíduo, sempre que houver a primeira orientação aos pais nos últimos meses da gestação e do exame oral do recém-nascido. Se algum destes dois momentos tiverem sido negligenciados, deverão ser imediatamente executados independente da idade do bebê, antes do nascimento dos primeiros dentes. Se a primeira visita ao nascimento dos primeiros dentes não for possível, os pais deverão levar seu fi lho o quanto antes para iniciar seu programa de promoção de saúde com visitas periódicas a um especialista, a cada seis meses, orienta. Segundo Luiza, é fundamental que a primeira consulta ocorra antes da erupção dos dentes decíduos, para que a mãe seja orientada corretamente quanto à importância da amamentação, da dieta, da transição alimentar, da higiene bucal e dos hábitos bucais prejudiciais. O que acontece, na maioria das vezes, é o pediatra encaminhar a criança para avaliação após a erupção de todos os dentes decíduos (cerca de dois anos de idade), quando várias crianças já apresentam muitos problemas. O odontopediatra deve realizar um acompanhamento periódico, pois à medida que a criança vai se desenvolvendo, a sua boca passa por modifi cações importantes e, portanto, cada fase de desenvolvimento requer atenção e cuidados diferentes, aconselha. Conforme Luiza, ainda, a American Academy of Pediatric Dentistry e a Associação Brasileira de Odontopediatria recomendam que se faça um exame na época da erupção do primeiro dente decíduo. A prática dessa medida e os cuidados iniciados entre o sexto mês (embora em alguns bebês o primeiro dente decíduo pode erupcionar por volta do quarto ou quinto mês) e o primeiro ano de vida permitem que o odontopediatra forneça orientações específi cas em relação à sequência de erupção, ao aleitamento, aos hábitos bucais, à dieta, à mastigação, à higiene bucal e mesmo em relação ao traumatismo dental. A criança que tem o acompanhamento de um odontopediatra terá menos possibilidade de desenvolver a doença cárie e, no caso de haver necessidade de uma intervenção, o vínculo estabelecido entre a criança, o profi ssional e os pais proporcionará uma consulta mais tranquila. Atualmente, a Odontopediatria trabalha com o conceito de determinar qual o possível risco que a criança tem para desenvolver precocemente lesões cariosas, a fi m de mantê-la livre da doença, conclui. 448 OrtodontiaSPO 2013;46(5):442-8