HUGO DE SÃO VITOR E A IMPORTÂNCIA DA LEITURA E DA ESCRITA

Documentos relacionados
UM ESTUDO SOBRE SÃO BOAVENTURA DE BAGNOREGIO

HUGO DE SAINT-VICTOR: CONSIDERAÇÕES DE UM CLÁSSICO SOBRE QUESTÕES EDUCACIONAIS

Clóvis de Barros Filho

PRINCÍPIOS ÉTICOS E FILOSÓFICOS Introdução a ética aristotélica

Aristóteles, Ética a Nicômaco, X 7, 1177 b 33.

ALBERTO MAGNO E TOMÁS DE AQUINO

O DEBATE POLÍTICO PELA SEPARAÇÃO DOS PODERES E A EDUCAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DE GUILHERME DE OCKHAM

FÍSICA FILOSOFIA. Resumex JáEntendi 1. A FILOSOFIA NA IDADE MÉDIA. Características Fundamentais da Idade Média

FILOSOFIA MEDIEVAL E OUTROS TEMAS PROFESSOR DANILO BORGES FILOSOFIA 9º ANO ENSINO FUNDAMENTAL II

CENTRO UNIVERSITÁRIO CLARENTIANO. Pós Graduação em Filosofia e Ensino da Filosofia. Sergio Levi Fernandes de Souza RA:

O conceito ética. O conceito ética. Curso de Filosofia. Prof. Daniel Pansarelli. Ética filosófica: conceito e origem Estudo a partir de Aristóteles

Você sabe por que vamos à escola? Ensino é responsabilidade do Estado e de que todos têm direito à educação ideias novas.

ÉTICA GERAL E PROFISSIONAL MÓDULO 2

Idade Média, tradução Luísa Quintela; Rio de Janeiro, RJ: Estúdios Cor, 1973, p. 13.

FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA PROFESSOR: REINALDO SOUZA

AULA DE FILOSOFIA. Prof. Alexandre Cardoso

ESCOLÁSTICA A M A T R I Z A R I S T O T É L I C A A T É D E U S

Curso TURMA: 2101 e 2102 DATA: Teste: Prova: Trabalho: Formativo: Média:

Virtudes: conceito e classificação

Bem vindo à Filosofia. Prof. Alexandre Cardoso

MARTINS, Carlos B. O que é sociologia. São Paulo: Brasiliense, Coleção Primeiros Passos.

Prof. Talles D. Filosofia do Direito O Direito e o tema da Justiça

Filosofia Medievil: TomásadeaAquino

Estratificação, Classes Sociais e Trabalho. Sociologia Profa. Maria Thereza Rímoli

HISTÓRIA DA FILOSOFIA ANTIGA I

Unidade 2: História da Filosofia. Filosofia Serviço Social Igor Assaf Mendes

PLANO DE CURSO CURSO: ESPECIALIZAÇÃO EM DIDÁTICA NO ENSINO SUPERIOR

A PRUDÊNCIA NA ÉTICA A NICÔMACO DE ARISTÓTELES

Fonte: SARAT, M.. Fundamentos Filosóficos de Educação Infantil. Maringá: EDUEM Editora da Universidade Estadual de Maringá, p.

Seminário 12 - Leitura e Produção na Educação Superior

FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO. A Geografia Levada a Sério

Prova de Filosofia - Maquiavel e Thomas Hobbes

FILOSOFIA CRISTÃ. Jesus Cristo Pantocrator, Uma das mais antigas imagens de Jesus (séc. VI-VII). Monastério Sta. Catarina, Monte Sinai.

Como se define a filosofia?

Pensar de modo autônomo e A filosofia, a curiosidade e o Capítulo 1: Decifra-me ou te devoro

FUNDAMENTOS HISTÓRICOS, FILOSÓFICOS E SOCIOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO. A Geografia Levada a Sério

SANTO AGOSTINHO - INFLUÊNCIAS

FILOSOFIA RECAPITULAÇÃO

A ORIGEM DA FILOSOFIA

Conversa de Formigas Uma formiga conversando com outra: -Qual é o seu nome? -Fu. -Fu o que? -Fu miga. E você? -Ota. -Ota o que?

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO.. Manual sobre a História da Filosofia Medieval:

Aristóteles, Protrético, fr. 2.

CONHECIMENTO, REALIDADE E VERDADE

ISSN: X COLÓQUIO DO MUSEU PEDAGÓGICO 28 a 30 de agosto de 2013

FILOSOFIA. DISCIPLINA: História da Filosofia Antiga

FÉ E RAZÃO MUNDO MEDIEVAL

MÓDULO 1 O QUE É FILOSOFIA

Ética e Conduta Humana. Aula 5

EMENTAS DAS DISCIPLINAS DO CURSO DE LICENCIATURA EM FILOSOFIA 1º PERÍODO

A IMPORTÂNCIA DO ENSINO RELIGIOSO E SUAS CONTRIBUIÇÕES PARA A PRÁTICA DOCENTE

AULA AO VIVO. Professora Laira Pinheiro

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA HISTÓRIA DA FILOSOFIA MEDIEVAL SOBRE O BEM SUPREMO

Pré Socráticos aos Medievais 1

Responsabilidade Profissional

PROGRAMA DE DISCIPLINA

As transformações de saberes, crenças e poderes na transição para a Idade Moderna. Profª Ms. Ariane Pereira

ENTENDER PARA TRANSFORMAR. Escola Bíblica Dominical Classe Mocidade Luiz Roberto Carboni Souza Luiz Fernando Zanin dos Santos

Inteligência Artificial. Aula 2

O CONHECIMENTO NA TERRA SÃO SOMBRAS PLATÃO (C A.C.)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS- GRADUAÇÃO COORDENAÇÃO GERAL DE PESQUISA INICIAÇÃO CIENTÍFICA VOLUNTÁRIA - ICV

Acadêmicos: Franciele, Gabriele, José Edson e wygner

Conceito da Ética Destacando as teorias da formação dos conceitos, o objeto e o objetivo da Ética

morramos para o mundo e vivamos para Deus.

ESCOLA DA FÉ. Paróquia Santo Antonio do Pari. Aula 9: Jesus, o Filho de Deus -4ªparte.

O DEBATE POLÍTICO PELA SEPARAÇÃO DOS PODERES E A EDUCAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DE GUILHERME DE OCKHAM

UCP - UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PETRÓPOLIS CURSO DE ÉTICA. ÉTICA A NICÔMACO Livro 1

A CONTEXTUALIZAÇÃO COMO AGENTE FACILITADOR NO PROCESSO ENSINO E APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA

FILOSOFIA. Professor Ivan Moraes, filósofo e teólogo

POR QUE ENSINAR GRAMÁTICA

PLATÃO O MUNDO DAS IDEIAS

ENCONTRO DE ESPIRITUALIDADE PARA OS EDUCADORES. Sonho de Dom Bosco e o nosso sonho: Os jovens de hoje e nosso compromisso com eles

Ética e Organizações EAD 791. Prof. Wilson Amorim 13/Setembro/2017 FEA USP

[ÉÅxÅ? VâÄàâÜt x fév xwtwx

ENTRE DOIS MUNDOS 7º ANO

Unidade 2: História da Filosofia Filosofia Clássica. Filosofia Serviço Social Igor Assaf Mendes

Escolas de profetas no Antigo Testamento Material de apoio a aula 12. Fonte: 12.

ÉTICA e CONDUTA PROFISSIONAL

Ética Profissional e Empresarial. Aula 2

Professora: Ana Priscila da Silva Alves Disciplina: Filosofia Série: 1 ª do Ensino Médio Tema: Felicidade

Pedagogia de Jesus parte 2

FORMAÇÃO DE PREGADORES

Teorias éticas. Capítulo 20. GRÉCIA, SÉC. V a.c. PLATÃO ARISTÓTELES

O MAPA é uma metodologia simples que aplicada à vida de cada discípulo o ajudará a aprender de Deus na sua rotina diária.

FILOSOFIA MEDIEVAL: ESCOLÁSTICA 3ªSÉRIE DO ENSINO MÉDIO DRUMMOND 2017 PROF. DOUGLAS PHILIP

O CONCEITO DE HÁBITO EM TOMÁS DE AQUINO: ESTUDO NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO (SÉC. XIII)

AJUDA INTELECTUAL AUTOAJUDA E REFERÊNCIAS

Cerimônia de Ação de Graças de ESALQ. (18 de dezembro de 2014) Reflexão. Francisco de Assis Alves Mourão Filho

CURSO I FUNDAMENTOS CONCEITOS E PRÁTICAS DA EP

PLATÃO E O MUNDO IDEAL

Ética e política da subjetividade: hermenêutica do sujeito e parrhesía em Michel Foucault.

UM ESTUDO SOBRE O CONCEITO DE CONHECIMENTO EM FINS DO SÉCULO XI E INÍCIO DO SÉCULO XII: UMA LEITURA DE SANTO ANSELMO E HUGO DE SAINT VICTOR

Há uma Nova Mensagem de Deus no Mundo

CARACTERÍSTICAS GERAIS

CONCEPÇÕES ÉTICAS Mito, Tragédia e Filosofia

FILOSOFIA. Dos Gregos à Idade Média

Disciplina: HISTÓRIA Professor (a):rodrigo CUNHA Ano: 7º Turmas: 7.1 e 7.2

ÉTICA E PRÁTICA EDUCATIVA, OUTRA VEZ. Cipriano Carlos luckesi 1

RECUPERAÇÃO PARALELA PREVENTIVA DE HISTÓRIA 8º ANO

CAPACITAR PARA SERMOS COMO CRISTO

Apresentação do curso. Prof. Marcos Vinicius Pó Introdução às Humanidades e Ciências Sociais

Transcrição:

HUGO DE SÃO VITOR E A IMPORTÂNCIA DA LEITURA E DA ESCRITA SANTIAGO, Viviane Paes (PIBIC/ Fundação Araucária/UNESPAR/FAFIPA) PERIN, Conceição Solange Bution (UNESPAR/FAFIPA) INTRODUÇÃO Esse trabalho apresenta um estudo sobre a influência do pensamento do mestre medieval Hugo de São Vitor em algumas alterações educacionais ocorridas na primeira metade do século XII e que levaram o homem a buscar outras formas de conhecimento, o que acabou influenciando nas mudanças de pensamento e comportamento do indivíduo. O objetivo é mostrar que o florescimento do comércio e das cidades interferiu de forma significativa na formação do homem, o que aos poucos foi modificando suas ações e pensamentos. As atividades comerciais demandavam um conhecimento que os possibilitava entender o mundo pela própria experiência da razão. Para o homem saber comercializar e se relacionar, diante desta nova realidade de vida, tinha que buscar uma nova forma de se educar para poder conviver em sociedade, o que lhe acarretava dificuldades e sentimentos de dúvidas para acompanhar essas mudanças. Sob essa perspectiva, o propósito é entender que, em momentos de transição, diante de novas formas de comportamentos e atitudes, novos interesses também surgem, e nesse período histórico em questão, metade do século XII, as escolas florescem e com elas os mestres e intelectuais que tiveram um papel significativo para a sociedade. Segundo Verger (2001), esses intelectuais tiveram um papel importante para a sociedade, pois trouxeram outro modo de instrução que iria modificar a formação e o desenvolvimento do homem. De acordo com Verger (2001 p.78), era o contexto de uma Paris em pleno desenvolvimento em que as escolas se multiplicavam e com elas mestres e intelectuais de destaque como Hugo de São Vitor, um expoente na história da educação no ocidente 1

medieval, que valorizava a capacidade ativa e contemplativa, ou seja, a capacidade intelectual e espiritual do homem medieval. Hugo de São Vitor propôs um caminho para o conhecimento por meio da atividade filosófica para se chegar à Sabedoria, que para ele era a Sapiência, a nossa origem, que, no entanto, conhecendo-a conhecemos a nós mesmos, para tanto, apresentou a leitura como instrumento essencial na condução do saber. Dessa forma, a leitura representa para o autor um modo de ser e de viver, uma filosofia de vida, no entanto, há a necessidade de se impor regras e método para que a leitura possa se realizar e atingir a sua finalidade. Nesse sentido, analisaremos a importância dos ensinamentos de Hugo de São Vitor para o seu período histórico por meio do seu pensamento ao asseverar a importância da leitura como instrumento para formação moral e intelectual do homem medieval. OBJETIVOS Objetivo Geral: O objetivo deste estudo é conhecer e entender o pensamento do mestre vitorino Hugo de São Vitor, associando-o às mudanças socioeconômicas, religiosas e educacionais que ocorreram, principalmente, na primeira metade do século XII. OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Analisar as transformações educacionais da primeira metade do século XII; - Compreender o papel dos mestres e intelectuais neste período histórico e, em especial de Hugo de São Vitor, que discursava sobre a importância do estudo e da leitura para a apreensão da Sabedoria, a qual conduziria ao conhecimento de Deus. METODOLOGIA Este estudo foi realizado com leituras e fichamentos das obras de alguns estudiosos que analisam o período que está sendo tratado, como exemplo Le Goff e 2

Verger e de pensadores como Aristóteles, Abelardo e em especial o mestre medieval Hugo de São Vitor. Para tanto, iniciamos com a leitura da obra: Didascálicon: Da Arte de Ler de Hugo de São Vitor onde nos mostra sobre a importância da leitura ordenada na condução do conhecimento divino e para nos pautarmos sobre a importância da ética na aquisição das virtudes fizemos a leitura da obra: Ética a Nicômaco de Aristóteles. Para contextualizar o século XII, visando os intelectuais e as instituições de ensino, fizemos a leitura das obras: Cultura, Ensino e Sociedade no Ocidente nos Séculos XII e XIII de Jacques Verger e Os intelectuais da Idade Média de Jacques Le Goff e para termos o conhecimento do método dialético fizemos a leitura da obra: Lógica para principiantes de Pedro Abelardo. Os estudos dessas obras nos possibilitaram o entendimento do período histórico em questão, a primeira metade do século XII, o que favoreceu a compreensão sobre a importância do conhecimento por meio do estudo, da leitura e do ato de filosofar para alcançar a Sapiência, ou seja, a Mente Divina, que é o conhecimento perfeito de todas as coisas. DESENVOLVIMENTO O ocidente medieval presenciou no século XII um período de renascimento, onde o regime feudal havia se estabilizado e com ele iniciou-se o desenvolvimento comercial, por meio do trabalho artesanal, o que favoreceu a criação de novas cidades e com elas o estabelecimento de novas relações sociais. É importante conceituarmos que os homens desse período histórico, primeira metade do século XII, não estavam preparados para o florescimento dessas cidades, faltavam-lhes condições necessárias para lidar com esse desenvolvimento comercial e cultural exigindo do homem novo comportamento e novos conhecimentos. Conforme o autor, essas mudanças já estavam ocorrendo, mas o fenômeno só atinge amplidão suficiente no século XII (LE GOFF, 2011, p.31), modificando, então, as estruturas sociais, econômicas e políticas do ocidente. No século XII, no ocidente medieval, renasceu a atividade comercial, sendo assim, os negócios demandavam o conhecimento da leitura, da escrita e do cálculo, pois a circulação das mercadorias e do dinheiro exigiam os cuidados para com as correspondências e para com a contabilidade dos ganhos. 3

Para atender às estas necessidades, houve uma grande mudança no aspecto educacional desse período, pois com o desenvolvimento do comércio, o conhecimento, que antes só era para os clérigos, nobres e cavalheiros, também passou a ser privilégio dos filhos dos burgueses, mercadores e artesãos, os quais passaram a ter acesso ao ensino escolar. De acordo com Le Goff, as escolas mais notórias da época ficavam em Paris que recebia estudantes das mais variadas partes do mundo, [...] usando plenamente a contribuição aristotélica e o recurso ao raciocínio, faz triunfar os métodos racionais do espírito: a dialética[...] (LE GOFF, p. 44). Nesse período histórico, primeira metade do século XII, era tempo dos intelectuais mais sublimes, que se reuniam ao redor de seus inúmeros discípulos para transmitir o conhecimento. Nesse sentido, cabe-nos destacar a figura de Pedro Abelardo que, segundo Le Goff (2005), nomeia-o como [...] a primeira grande figura de intelectual moderno, nos limites da modernidade do século XII: Abelardo foi o primeiro professor. A educação escolástica oferecida pelo mestre Abelardo, por meio de suas aulas, tentava acompanhar o desenvolvimento da sociedade desse período, a primeira metade do século XII, ou seja, por meio do seu método escolástico e dialético Abelardo tentava responder às questões postas pelos indivíduos, que como já mencionamos se encontravam em profundas dúvidas e indagações. Diante do método dialético com que discutia as questões o mestre Abelardo tentava mostrar aos homens que eles podiam, por meio de seus pensamentos, entender, refletir, perceber as alterações, enfim, tinham a capacidade de ampliar o conhecimento. Dessa forma, possibilitava aos indivíduos se atentarem a um novo olhar diante dos acontecimentos, levando-os a questionarem. O método dialético era uma forma diferente, pois levava os homens a debaterem sobre algumas questões que até então eram inquestionáveis, ou seja, o conhecimento era imposto pela Igreja e os indivíduos aceitavam como verdades, sem questionamento, pois, sempre a justificativa era de ser tudo a vontade de Deus. Abelardo, sem dúvida, teve um papel significativo no sentido de fazer com que os homens refletissem sobre a sua existência, sobre o mundo e tudo que os cercavam. É nesse contexto de dúvidas e incertezas que Hugo de São Vitor se destaca preocupando-se, na primeira metade do século XII, com a importância do conhecimento 4

e em como instruir, por meio da leitura, tanto intelectualmente quanto moralmente a sociedade que estava alterada pelas modificações no modo de pensar e agir dos homens daquele período histórico. O mestre vitorino discursava, entre outros assuntos, sobre a importância do conhecimento por meio do estudo, da leitura e da reta conduta humana fundamentada em princípios éticos e morais para o conhecimento divino, contribuindo assim, para disseminar entre os indivíduos os bons sentimentos, os quais poderiam ser adquiridos através da Palavra de Deus contida nas Sagradas Escrituras e assimilados pela leitura. Para tanto, o mestre asseverava que qualquer pessoa tinha a capacidade de aprender, pois para o vitorino todo o conhecimento humano residia no próprio homem: [...] Somos reerguidos pelo estudo, para que conheçamos a nossa natureza e aprendamos a não procurar fora de nós aquilo que podemos encontrar dentro de nós (HUGO DE SÃO VITOR, P. 51). Hugo de São Vitor apresentou um caminho para o conhecimento por meio da atividade filosófica para se chegar à Sabedoria que para ele era a Sapiência, a nossa origem, que, no entanto, conhecendo-a conhecemos a nós mesmos e podemos direcionar os nossos atos no contato com o próximo. De acordo com o mestre vitorino De todas as coisas a serem buscadas, a primeira é a Sapiência, na qual reside a forma do bem perfeito (HUGO DE SÃO VITOR, p. 47). A Sapiência é para Hugo a mente de Deus concedida ao homem que deve buscá-la por meio da filosofia, da reflexão. Para Hugo de São Vitor o conhecimento é propiciado através dos estudos e da leitura, que possibilita ao homem procurar e encontrar o que está dentro de si. Para Hugo, tudo começa pelo ato de ler, sendo assim, a leitura foi apresentada pelo mestre como um caminho a ser trilhado pelos homens para adquirir e/ou aprofundar o saber. A leitura representa para o autor um modo de ser e de viver, uma filosofia de vida, no entanto, há a necessidade de se impor regras e método para que a leitura possa se realizar e atingir a sua finalidade. Para tanto, o mestre prega que o aluno precisa ter prudência e humildade ao lidar com a leitura, ou seja, não deve desprezar conhecimento algum pois o desprezo caracteriza um vício: o da vaidade [...] este vício da vaidade ocorre a alguns, porque olham com demasiada diligência o próprio conhecimento [...] (HUGO DE SÃO VITOR, 2001, p. 159). 5

Para o mestre Vitorino, a integridade da natureza humana se realiza de duas maneiras: pelo conhecimento e pela virtude, e esta é a única semelhança que temos com as substâncias superiores e divinas ( HUGO DE SÃO VITOR, 2001, p.61). Conforme Hugo, o homem se humaniza por meio do conhecimento e da prática das virtudes, e adquire a racionalidade através do intelecto e do comportamento virtuoso os quais os conduzem a Deus. Neste sentido, analisaremos o que é a virtude da justiça para Aristóteles. Segundo o pensador, [...] é a disposição de caráter que torna as pessoas propensas a fazer o que é justo e a desejar o que é justo, as faz agir justamente e a desejar o que é justo (ARISTÓTELES, 2011, p.99). Para o filósofo grego, a justiça é uma virtude completa ou é muitas vezes considerada a maior das virtudes. O melhor dos homens é aquele que exerce sua virtude para com o outro, pois essa tarefa é a mais difícil, e no entanto, a mais nobre. Segundo Hugo de São Vitor, em qualquer trabalho são necessárias duas coisas, a saber: a aplicação e o método da aplicação e que estas coisas estão tão interligadas entre si que uma sem a outra é ou inútil ou pouco eficiente. Para Hugo, [...] o método é tão importante, que sem ele qualquer ócio (dedicação ao estudo) é torpe e todo trabalho é inútil (HUGO DE SÃO VITOR, 2001, p. 219). Dessa forma, ao estudante que quiser adquirir sabedoria é importante dedicar-se com afinco. CONCLUSÕES O estudo nos favoreceu a compreensão de que os ensinamentos realizados por Hugo de São Vitor contribuíram para algumas mudanças na educação dos homens na primeira metade do século XII, pois apontou aos indivíduos que o conhecimento, por meio da leitura sobre os ensinamentos divinos, favorecia o aprendizado da reflexão, onde possibilitava o diálogo com Deus através das Escrituras Sagradas e assim o homem poderia corresponder às vontades do Criador contidas na Palavra Sagrada, colocando em prática os sentimentos cristãos, disseminando amor, caridade e paz coletiva. A nosso ver, Hugo de São Vitor foi um intelectual do século XII, que contribuiu para com sociedade da sua época, instruindo-a na busca do conhecimento e da reflexão 6

pautados no uso da razão. Hugo de São Vitor se preocupou na primeira metade do século XII com a importância do conhecimento, e em como instruir, por meio da leitura, tanto intelectualmente quanto moralmente a sociedade que estava alterada pelas modificações no modo de pensar e agir dos homens daquele período histórico. REFERÊNCIAS ABELARDO, P. Lógica para principiantes. São Paulo: Nova Cultural, 2005. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2001. LE GOFF, J. Os intelectuais na Idade Média. Tradução: Marcos de castro, 4ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2011. SÃO VITOR, Hugo de. Didascálicon; da arte de ler. Tradução: Antonio Marchioni. Petrópolis. RJ: Vozes, 2001. VERGER, Jacques. Cultura, Ensino e Sociedade no Ocidente nos Séculos XII e XIII. Bauru, SP: EDUSC, 2001. 7