CONSEQUÊNCIAS DE TRAUMA CRANIANO NA INFÂNCIA: RELATO DE EXPERIÊNCIA

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Transcrição:

CONSEQUÊNCIAS DE TRAUMA CRANIANO NA INFÂNCIA: RELATO DE EXPERIÊNCIA Halana Batistel Barbosa 1 Solânia Durman 2 RESUMO: Este é um recorte do estudo de caso de uma paciente do sexo feminino, 54 anos de idade, com diagnóstico de epilepsia em decorrência de uma queda sofrida na infância, por volta dos dois anos de idade, de uma altura de aproximadamente dois metros. Por conta deste episódio, a paciente apresenta quadros agressivos (surtos de raiva) e crises convulsivas. Foi internada várias vezes em hospitais psiquiátricos, sendo atualmente acompanhada pelo Centro de Atenção Psicossocial III (CAPS III). Este relato teve como objetivo descrever as conseqüências geradas por um trauma craniano na infância e seus reflexos na vida adulta. Utilizou-se para tanto, como instrumento para coleta de dados a entrevista de ajuda terapêutica e visita domiciliar. Palavras chave: Epilepsia; saúde mental; família. INTRODUÇÃO: A epilepsia é a neuropatia mais comumente encontrada na população em geral. Consiste em um distúrbio do sistema nervoso que abruptamente interfere no comportamento, na percepção, no movimento, na consciência e em outras funções corticais, que por sua vez leva à desadaptação do doente no meio ambiente em que está inserido e ao comprometimento de sua qualidade de vida (MACHADO; FRANK; TOMAZ, 2008). Tal comprometimento decorre de uma alteração neurológica muitas vezes de causa desconhecida, mas pode ter origem em ferimentos na cabeça ou não (www.epilepsia.org.br). Esta possui repercussões de ordem psicológica e neuropsicológica importantes a serem considerados na prática clínica, principalmente quando ocorrem na infância, como é o caso da paciente em questão (ZANINI; PORTUGUEZ; COSTA, 2007). Neste contexto o papel da família, como cuidadora, se evidencia posto que a família tem como uma de suas funções o cuidado de seus membros. A família desempenha papel 1 Acadêmica do 3º ano do Curso de enfermagem da UNIOESTE- Cascavel. Telefone para contato: (45) 88018776. Email: halanabarbosa@hotmail.com 2 Enfermeira. Docente do Colegiado de Enfermagem da UNIOESTE- Cascavel 1

central na vida do paciente e é parte importante do contexto de sua vida. É dentro das famílias que as pessoas crescem, são nutridas, obtém uma sensação de si próprio, cultivam crenças e valores sobre a vida, e progridem através dos vários estágios de desenvolvimento (D INCAO, 1992). OBJETIVO: Relatar as conseqüências geradas por um trauma craniano na infância e seus reflexos nos comportamentos na vida adulta, considerando seus aspectos sociais e familiares. METODOLOGIA: Este é um estudo do tipo estudo de caso, caracterizado por investigar uma pessoa ou um grupo, no caso a paciente e sua família. Utilizou-se como instrumento para coleta de dados a entrevista de ajuda terapêutica, a qual se refere à relação interpessoal desenvolvida entre um profissional enfermeiro e aquele que precisa de ajuda: o paciente, na qual o enfermeiro valendo-se de seus conhecimentos e habilidades assume a responsabilidade pelo processo de ajuda (DURMAN, 2000), bem como sua família. Nesse sentido, utilizou-se de visita domiciliar para conhecer o espaço familiar onde a paciente está inserida, bem como seu comportamento neste espaço. RESULTADOS: De acordo com Zanini; Portuguez; Costa (2007), há muitas mudanças cognitivas e comportamentais decorrentes da epilepsia, na qual a sintomatologia pode ser muito variável, conforme a localização e extensão da lesão, podendo ocasionar transtornos afetivos, de personalidade e atencionais. Segundo os mesmos autores, a função executiva é um termo que descreve os processos requeridos para o controle consciente do pensamento, da emoção e da ação, que sejam centrais à gerência da vida cotidiana. Portanto, a disfunção 2

executiva de alguns pontos do cérebro resulta, em danos no regulamento da cognição, da atenção, dos comportamentos, da estimulação e da emoção que tem conseqüências sérias no funcionamento ao longo da vida. Estes déficits executivos da função são tipicamente difíceis de tratar, melhorar ou remediar. Um dos fatores que predispõe à disfunção executiva é o ferimento traumático, o que se encaixa no perfil da paciente em estudo. Existem vários tipos de epilepsia, e as alterações delas decorrentes, também diferem dependendo do local do cérebro em que se encontra o foco epiléptico. Nesse sentido, compreende-se que os quadros agressivos e também as crises convulsivas apresentadas pela paciente em estudo, decorrem do traumatismo que sofrera quando criança. O epiléptico apresenta, geralmente, situação de dependência dos pais, vinculadas as crises e a seus sistemas de relações afetivas. Por esta razão, as dificuldades de comportamento evidenciam-se principalmente no ambiente familiar (GRÜNSPUN, 1982). No que tange aos quadros agressivos, Farias (2008), escreve que este é um sintoma associado à epilepsia. Grünspun (1982), concorda com essa afirmação ao escrever que distúrbios da motricidade como instabilidade e hipercinesias, são encontrados com freqüência em pacientes epilépticos, somados a manipulações, hábitos e tiques principalmente na epilepsia temporal, onde o lobo temporal do cérebro se encontra alterado. A agressividade é considerada um distúrbio evolutivo da conduta da sociabilidade, que surge precocemente, podendo, contudo, em alguns quadros, principalmente epilepsia, perdurar por toda a vida, tornando-se mesmo um traço definitivo da personalidade (GRÜSPUN, 1982). É condição normal também que o portador de epilepsia possa usar da agressividade como um mecanismo de defesa contra a depressão. Segundo Coelho (1978), uma pessoa com epilepsia pode ser caracterizada, principalmente por irritabilidade, agressividade ou instabilidade de humor. A característica essencial é a dificuldade em resistir a um impulso ou tentação de executar um ato perigoso para si ou para outros. Na maioria dos transtornos, o epiléptico sente uma crescente tensão ou excitação antes de cometer o ato. Após cometê-lo, pode ou não ter sentimentos de arrependimento, auto-recriminação ou culpa. Alguns autores determinaram um possível envolvimento de fatores orgânicos nos distúrbios dos impulsos. 3

E determinadas experiências demonstram que as regiões específicas do cérebro podem apresentar atividade impulsiva e violenta, bem como ocorreu com o caso descrito. De acordo com Oliveira (2009), os transtornos do humor, são as comorbidades psiquiátricas mais freqüentes na epilepsia, o que vai de encontro com o ocorrido em alguns momentos da entrevista terapêutica, quando a paciente apresentou humor atordoado e autodenegridor ao relatar que gostaria de fazer/aprender coisas como crochê, por exemplo, porém não se julga capaz de desenvolvê-las. Kraepelin e Bleurer, citado por Oliveira et al (2009), descreveram transtornos do humor em indivíduos com epilepsia em que coexistiam sintomas afetivos como irritabilidade intermitente, euforia, medo e ansiedade, bem como anergia, dor e insônia. Segundo os mesmos autores, a ansiedade e a depressão são entidades psiquiátricas distintas. Repentinas e imprevisíveis crises epilépticas causam ansiedade, restringem atividades cotidianas e podem gerar baixa auto-estima, estigma e rejeição social. A ocorrência simultânea de transtornos ansiosos e do humor é freqüente e pode elevar o risco de suicídio. Paciente apresentava-se normalmente responsiva, porém falava pouco, respondendo somente o que era perguntado, falava lentamente e de forma clara facilitando a compreensão por parte do entrevistador. Distúrbios como dislalia e taquilalia segundo Grünspun (1982), tomado como referencial teórico podem ocorrer em pacientes epiléticos. Pode-se dizer então que a paciente em estudo apresenta leve dislalia devido a sua fala lenta. A linguagem é uma habilidade complexa e multifacetada que caracteriza-se pela formação de sons, pelo desenvolvimento de sofisticados sistemas de regras e pela existência de uma vasta quantidade de informação, de sentidos e significados (FONTOURA et al, 2005). Segundo estes autores, a epilepsia tanto de lobo temporal direito quanto de lobo temporal esquerdo, pode acarretar prejuízos lingüísticos. Indivíduos com formas de epilepsia grave têm maior risco de apresentarem alterações de linguagem. No que diz respeito ao processo e forma do pensamento bem como seu conteúdo, tem-se que a paciente em estudo demonstrou no decorrer da entrevista, pensamento lento sem muitas idéias respondendo somente às perguntas feitas e não expressou capacidade de pensamento objetivo. Não apresenta pensamentos de causar mal a si, porém apresenta tais pensamentos para causar danos a outros durante um quadro agressivo. 4

A deficiência cognitiva ou comportamental tem sua origem relacionada, freqüentemente, com os danos estruturais sofridos pelo cérebro durante crises convulsivas. Um fator importante que influencia o impacto da epilepsia em funções cognitivas, como a memória, é o efeito colateral das drogas anticonvulsivantes usadas no tratamento da epilepsia. Estas podem acarretar processamento central de informações mais lento, um prejuízo da atenção e da memória operacional e alguns distúrbios de linguagem (MACHADO; CARLOS, 2008). Esta teoria é confirmada por Zanini; Portuguez; Costa (2007), quando estes afirmam que, quando a epilepsia se manifesta no sujeito ainda criança, este apresenta maiores chances de manifestar déficits cognitivos específicos, como na memória. Quanto ao nível de consciência, a paciente relata perder a mesma quando da ocorrência de uma crise epiléptica. A paciente em estudo apresenta vocabulário simples e algumas vezes pronuncia não corretamente algumas palavras. Não passou pelo ensino formal, já que seu comportamento agressivo e as crises de convulsão assustavam as demais crianças a mãe optou por não mandá-la à escola. De um modo geral, pessoas que sofrem de epilepsia independente da forma de manifestação que apresenta, está sempre ameaçada ou pela rejeição social ou pela superproteção familiar, situação essa que se agrava consideravelmente quando se trata de crianças. As crises clássicas como quedas e perda de conhecimento, convulsões e outros sintomas dramáticos, dificultam a admissão ou mesmo a permanência, destes alunos no ambiente escolar. Freqüentemente, as escolas não desejam conservá-los em classe, não só pelo receio dos acidentes, que possam ocorrer durante as crises, como também para evitar às outras crianças a forte emoção que lhes causaria presenciar uma convulsão (GRÜSPUN, 1982). No entanto, sabe-se que atualmente o uso de medicamentos anticonvulsivantes em doses adequadas, pode controlar os possíveis ataques além de proporcionar às crianças à possibilidade de freqüentarem a escola com menores riscos de acidentes. Segundo o mesmo autor, há duas condições que interferem no desenvolvimento da inteligência na criança epiléptica: a precocidade da instalação de crises convulsivas e a manutenção inevitável por longos anos, de medicamentos. 5

Nessa perspectiva, considerando que a paciente iniciou com terapia medicamentosa aos dois anos de idade quando da ocorrência das primeiras crises convulsivas, seu fundo de informação e inteligência, portanto foram de sobremaneira comprometidos. Rondin, citado pelo referido autor, refere que quanto mais precoce for o inicio do quadro, mais comprometido é o QI, e quanto mais longa a duração da terapia anticonvulsivante, maior lentidão e dificuldade na aprendizagem, sem, contudo chegar a deterioração. No que tange ao posicionamento social, tem-se que a família possui boa relação social, no sentido de estabelecer boa comunicação com outras pessoas, são estimadas pelos vizinhos e se reúnem para tomar chimarrão. Dos quatro componentes da família apenas o padrasto da paciente trabalha, esta juntamente com a mãe recebem beneficio de prestação continuada. A mãe da paciente também faz trabalhos com crochê para vender e por vezes a própria paciente em estudo sai para vender os trabalhos da mãe o que comprova a boa relação que estabelecem com outras pessoas. CONCLUSÃO: Segundo Taylor (1992), de todas as instituições sociais, a família é a mais elementar. Tal afirmação se baseia na tendência que os seres humanos têm de se organizar em uma estrutura familiar e também na crença de que experiências que o individuo enquanto criança tem com a família, são influências com grande poder de decisão sobre o tipo de adulto que será no futuro. Nesse sentido, compreende-se o peso que uma estrutura familiar bem alicerçada, exerce sobre a formação de seus integrantes e conseqüentemente sobre a sociedade. Nesse sentido, compreende-se o peso que uma estrutura familiar bem alicerçada, exerce sobre a formação de seus integrantes e conseqüentemente sobre a sociedade. Assim é fator determinante na saúde mental de seus membros, bem como de suas crenças o que pode levá-los a desencadear distúrbios psíquicos. Neste sentido o papel da enfermagem, enquanto educadora no cuidado da família portadora de um membro com sofrimento psíquico, se evidencia. Uma das questões que devem ser consideradas são as crenças, valores e ideais que permeiam a estrutura da família para que se busque um modelo de educação do cuidado do portador de doença mental de forma humanística, 6

inserindo-o efetivamente como integrante da família, e não como uma carga a mais para a mesma (WALDOW, 1998). Para os pacientes com epilepsia (estudo em questão), bem como para aqueles com quaisquer outros comprometimentos mentais, o acompanhamento, compreensão, carinho e apoio da família são de extrema relevância, visto que essa relação auxilia na adaptação deste individuo na sociedade, como é o caso da paciente em estudo, que por apresentar um sofrimento psíquico adquirido na infância, necessitou de sobremaneira do aporte familiar para que pudesse lidar da melhor maneira possível com a nova situação. Após o inicio do acompanhamento da paciente pelo CAPS, a mãe desta diz que o relacionamento em casa esta sendo mais tranqüilo e que não incomoda tanto, a não ser quando se torna agressiva como, por exemplo, quando ameaçou a mãe e o filho com um espeto. No decorrer da conversa, a mãe da paciente relata que se casou jovem quando ainda tinha 18 anos e ele 26 (pai de seus 10 filhos), este era alcoólatra e a agredia com freqüência, em decorrência desse fato se separou com 25 anos e diz se arrepender por ter se casado tão cedo e refere também que tinha muito medo de que um de seus filhos também tivesse problemas com alcoolismo, o que felizmente não aconteceu. Hoje ela é casada há um ano com um homem que conheceu na igreja. De toda essa história, conclui-se que desde há muito, o relacionamento intrafamiliar em análise foi/é conturbado, no entanto no momento da entrevista o que se constatou foi um aparente bom relacionamento, cordial e educado por parte de ambas. REFERÊNCIAS : COELHO, L. Epilepsia e Personalidade. São Paulo: Ática, 1978. D INCAO, M. A. Doença mental e sociedade. Rio de Janeiro: Ed. Graal, 1992. DURMAN, S. Enfermeiros assistenciais construindo a relação de ajuda terapêutica em hospital geral. (Dissertação de mestrado) Mestrado Interinstitucional UFSC/ URPG. Florianópolis, 2000. FARIAS, A.C. O valor do eletroencefalograma na abordagem dos disturbios de aprendizagem e do comportamento (2008). Disponível em 7

<http://www.neuropediatria.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=84:ovalor-do-eletroencefalograma-na-abordagem-dos-disturbios-de-aprendizagem-e-docomportamento&catid=50:outros-temas&itemid=109> Acesso em 07/08/2009. FONTOURA et al. Dissociação Entre Alterações de Linguagem e Preservação da Musicalidade em uma Criança com Epilepsia Refratária. J Epilepsy Clin Neurophysiol, Porto Alegre: 2005. GRÜNSPUN, H; GROSSMAN, A.P. A criança epiléptica. IN Distúrbios Psiquiátricos da Criança. São Paulo: Atheneu, 1982. Liga Brasileira de Epilepsia. Disponível em <http://www.epilepsia.org.br/epi2002/show_tema.asp?tema=3> Acesso em 07/08/2009. MACHADO, L.V; FRANK, J.E; TOMAZ, C. Alteração de Memória na Epilepsia de Lobo Temporal. Brasília Méd, Distrito Federal, 2008. OLIVEIRA et al. Transtornos Neuropsiquiátricos da Epilepsia do Lobo Temporal. Rev. Bras. Neurol, v.45, n.1, jan-fev-mar, Belo Horizonte: 2009. ZANINI, R.S; PORTUGUEZ, M.W; COSTA, J.C. Epilepsia do Lobo Frontal na Infância: Aspectos Psicológicos e Neuropsicológicos. Scientic Médica, v.17, n.2, p.93-96, abr-jun, Porto Alegre: 2007. WALDOW, V. R.; et al. Maneiras de cuidar, maneiras de ensinar: a enfermagem entre a escola e a prática profissional. Porto Alegre: Artes Médicas,1995. 8