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Transcrição:

R. Bm. 1/2007 DSJ-CT Recorrente: D Recorrida: Conservatória do Registo Automóvel do Sumário: Apreensão de veículo em processo de insolvência Título para Registo - Prova da qualidade de administrador de insolvência. Pela apresentação n.º 8632, de 15 de Maio de 2007, enviada pelo correio, D solicitou na Conservatória do Registo de Automóveis do o registo de apreensão do reboque com a matrícula L, tendo oferecido para o efeito um documento designado por Auto de arrolamento de bens da massa insolvente de Transportes Rápidos Lda, por si subscrito, na qualidade de administradora da insolvência. No requerimento de modelo 5 consta identificado o tribunal e o processo onde corre a insolvência. O registo foi recusado ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 49.º do Regulamento do Registo de Automóveis, aprovado pelo Decreto n.º 55/75, de 12 de Fevereiro, com a redacção que lhe foi dada pelo DL 178-A/2005, de 28 de Outubro e 808.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 3.º da Lei 32/2004, de 22 de Julho, com fundamento em não se ter junto documento emitido pelo Tribunal que comprove a nomeação de administrador de insolvência. Inconformada, D, representada por advogado, interpõe o presente recurso hierárquico no qual alega, em síntese, que o artigo 152.º do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa (CIRE) identifica o documento necessário ao registo: o auto de arrolamento ou do balanço assinado pelo Administrador da insolvência ( ). Esse documento foi apresentado e não é necessário juntar qualquer outro documento emitido pelo tribunal, designadamente certidão judicial. O processo de insolvência não se coaduna com entraves burocráticos e é urgente. Foi proferido despacho de sustentação no qual se invoca o disposto nos artigos 7.º, 36.º, n.º 1, alínea d), 52.º, 55.º, n.º 2, e 150.º do CIRE, bem como o artigo 808.º, n.º 7 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por força do art. 3.º da Lei 32/2004, de 22 de Julho, para concluir que deve ser verificada a legitimidade para requerer o registo de apreensão no processo de insolvência em causa. Acrescenta-se que o auto de arrolamento não é suficiente e que este documento nem sequer menciona o número de processo e juízo onde corre. O processo é o próprio, as partes têm legitimidade, o recurso é tempestivo e inexistem questões prévias ou prejudiciais que obstem ao conhecimento do seu mérito, pelo que cumpre emitir parecer. 1

Dúvidas não existem sobre a registabilidade da apreensão de veículos 1 em processo de insolvência. O facto está sujeito a registo por força do disposto nos artigos 152.º do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa e 5.º, alínea h), do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 178-A/2005, de 28 de Outubro. A apreensão de bens em processo de insolvência é feita mediante arrolamento ou por entrega directa através de balanço, devendo ser lavrado um auto no qual os bens são descritos, se declare o valor fixado por louvado, sempre que conveniente, se destaque a entrega ao administrador da insolvência ou a depositário especial e se faça menção de todas as ocorrências relevantes com interesse para o processo. A apreensão é feita pelo administrador da insolvência, a não ser que se trate de bens sitos em comarca diferente daquela onde corre o processo, caso em que a apreensão pode ser realizada por deprecada, isto é, por solicitação ao tribunal da comarca em cuja área jurisdicional o acto deva ser praticado ao abrigo dos artigos 177.º e 178.º do CPC. O auto é assinado por quem presenciou a diligência e pelo possuidor ou detentor dos valores apreendidos ou, quando este não possa ou não queira assinar, pelas testemunhas a que seja possível recorrer. O administrador da insolvência deve juntar ao processo o auto do arrolamento e do balanço respeitante a todos os bens apreendidos, ou cópia dele, quando efectuado em comarca deprecada cfr. artigos 150.º, n.º s 2, 3 e 4, e 151.º do CIRE. É título bastante para o registo um extracto do arrolamento ou do balanço assinado pelo administrador da insolvência, a quem a lei atribui a obrigação de registar prontamente a apreensão dos bens cuja penhora esteja sujeita a registo cfr. artigo 152.º do CIRE. A lei é clara ao identificar o documento que faz prova do facto a registar, pondo em evidência a necessidade do extracto ser assinado pelo administrador judicial da insolvência. Cremos que o faz, não com o propósito de excluir a prova do facto por outras formas ou meios, mas para acentuar a necessidade de diligência 2 ou de urgência no cumprimento da obrigação atribuída ao administrador da insolvência. A lei determina que ele próprio execute a apreensão - como efeito da sentença da insolvência e sem dependência de despacho judicial que ordene a 1 Sobre o conceito de veículo para efeitos de registo vide artigo 2.º do DL n.º 54/75, de 12.02 2 Ver Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, in Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa Anotado, Quid Juris, Volume I, pág. 509, ponto 3 : o que aqui se anota exige expressamente a prontidão no cumprimento do dever imposto ao administrador da insolvência, o que, aliás, para além de se aceitar em razão dos fins tidos em vista, é coerente com a ideia geral de celeridade que perpassa o processo. 2

apreensão de bens previamente identificados e elabore o documento o extracto - que comprova o facto a registar. O registo da apreensão deve ser solicitado e executado com prontidão, pese embora este registo não ser condição de oponibilidade do facto a terceiros cfr. art.º 81.º, n.º 6, do CIRE. Portanto, a apreensão de bens não depende de nenhuma outra determinação judicial para além da sentença judicial que declara a insolvência 3 e o registo da apreensão de bem a ele sujeito pode ser feito, também, em face de extracto elaborado pelo próprio administrador da insolvência, constituindo este auto o título constitutivo do facto. A compreensão plena do regime simplificado agora instituído exigiria maiores desenvolvimentos, sobretudo por comparação com o regime de penhora de bens anterior à reforma do processo executivo operada pelo Decreto - Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, não sendo esta a sede própria para o efeito. Ainda assim, recordemos a necessidade da penhora exigir um despacho judicial a ordenar o acto e a realização de um auto comprovativo da sua efectivação como documentos essenciais ao seu registo artigos 838.º, n.ºs 1 e 3, 848.º e 849.º do CPC, na redacção anterior ao aludido Decreto-Lei. No caso em apreço, porém, reconheça-se que o documento apresentado não configura um extracto do arrolamento ou do balanço elaborado pelo administrador, sendo, isso sim, uma cópia extraída de um documento (um original, a avaliar pelos carimbos nele apostos) que se identifica como auto de arrolamento. Nem por isso terá menor força probatória conquanto se venha a demonstrar ter sido lavrado pela administradora da insolvência, como melhor veremos adiante, mesmo sem a certificação de que esse documento foi junto ou foi extraído do processo de insolvência. Tentámos atrás definir e caracterizar o documento que se mostra necessário à realização do registo peticionado. Vejamos agora a questão da iniciativa do processo registral, isto é, da legitimidade para o pedido de registo e a seguir a conexão desta questão com a prova do facto pedido pelo documento apresentado. A nossa convicção sobre a necessidade de prova da qualidade de administrador da insolvência é evidente no que respeita à demonstração 3 Também pode servir de base ao registo da apreensão documento que prove a sentença declarativa da insolvência acompanhada de declaração prestada pelo administrador judicial que identifique o bem a apreender. A declaração que identifique o bem é, neste caso, uma declaração principal, formando conjuntamente com o documento judicial o título para o registo. A apreensão de bens integrados na massa insolvente é claramente um efeito executivo que resulta da sentença declaratória da insolvência e que se impõe ao administrador como um dever de cumprimento imediato. O registo lavrado nestas circunstâncias depois da sentença mas antes da efectiva apreensão é provisório por natureza, como resulta da conjugação das disposições do artigo 92, n.º 1, alínea n), do Código do Registo Predial, 7.º, n.º 2 e 29.º do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro. Atente-se ainda que a apreensão, assim como o seu registo, não dependem do trânsito em julgado da sentença de declaração da insolvência, cujo recurso, a ser interposto, sobe em separado e com efeito devolutivo. Portanto, a sentença constitui desde logo título executivo cf. artigos 14.º, n.º s 5 e 6 do CIRE e 47.º, n.º 1, do CPC 3

da legitimidade para o pedido. Ao registo da propriedade automóvel aplicam-se subsidiariamente as disposições do registo predial sobre legitimidade e prova dos factos (cf. artigos 36.º e segs. e 47.º do Código do Registo Predial (CRP)), com as necessárias adaptações e na medida indispensável ao suprimento das lacunas da regulamentação própria e compatível com a natureza de veículos e das disposições contidas nos diplomas próprios que regem o registo da propriedade de veículos (cf. artigo 29.º do DL n.º 54/75). A legitimidade para o pedido de registo ou para a prática de um determinado acto colocam em patamar processual, neste caso no processo de registo, um problema de qualidade do sujeito para a prática desse acto. Ora, afigura-se-nos que a legitimidade do administrador judicial não se afere pelo artigo 36.º do CRP, dado que ele próprio não é sujeito da relação processual insolvente, ou pela imputação de um interesse relevante, do mesmo passo que não se afere por qualquer fenómeno de representação acolhido no artigo 39.º do mesmo Código. A legitimidade do administrador judicial na relação processual registral resulta directamente da lei - regra especial contida na primeira parte do artigo 152.º, n.º 1, do CIRE e é imposta pelo interesse público que no caso sobrepõe à regra geral de que os registos são solicitados pelos interessados (privados). Neste contexto o dever de promoção do registo é para o administrador um acto oficioso, isto é, de cumprimento vinculado. É em sede de apreciação da viabilidade do pedido de registo, a exercer no âmbito delineado pelo artigo 68.º do CRP, que o conservador deve verificar a legitimidade dos interessados. A exigência de prova da qualidade invocada para o pedido de registo afigura-se-nos, pois, bem fundamentada. No entanto, a questão da comprovação da qualidade enquanto pressuposto do processo de registo parece-nos indissociável da questão de saber se o documento apresentado comprova o facto cujo registo se requer. Vimos atrás que o normativo que atribui ao administrador a obrigação de pedir o registo também lhe atribui a faculdade para elaborar o documento que serve de base ao registo. Neste sentido, a legitimidade é também ela medida de capacidade e competência para a produção de um documento, a que a lei atribui força probatória para efeitos de registo. Portanto, a prova da qualidade é também, no caso em apreciação, condição ou pressuposto da força probatória do documento para efeitos do disposto no artigo 43.º, n.º 1, do Código do Registo Predial. A qualidade de administrador judicial no processo de insolvência em causa revela-se como requisito legitimador da subscrição documento que serve de base ao registo e medida da sua força probatória. Por isso, a legitimidade para o pedido de registo e a legitimação para a subscrição do documento são, no caso presente, qualidades indissociáveis e imprescindíveis à certeza da existência dos factos jurídicos dele constantes. Bem se compreende que o legislador continue a preocupar-se com a prova de identidades e qualidades dos sujeitos do processo registal, sobretudo em momento de aceleradas e profundas transformações jurídicas e tecnológicas e particularmente ao nível da implementação de soluções que viabilizam os registos on line e até, especificamente, nas penhoras electrónicas de veículos promovidas ao abrigo dos artigos 851.º, n.º 1, e 838.º do Código de Processo Civil e 40.º, n.º 3 do Regulamento do Registo Automóvel. Em qualquer dos casos, surge até mais forte a necessidade de garantir a identidade e qualidade dos sujeitos e operadores que no caso das penhoras electrónicas se traduz na garantia 4

de autenticação do pedido através de certificado digital associado à assinatura electrónica do solicitador de execução 4. O mesmo tipo de solução se revela nos recentes regimes jurídicos de constituição on-line de sociedades 5, de promoção de actos de registo comercia 6 ou de registo de veículos 7 on-line, de informação empresarial simplificada 8 em que há meios de certificação electrónica da identidade e de qualidade (advogados, solicitadores e notários) ou identificação por senhas atribuídas às entidades e aos técnicos oficiais de contas. Portanto, estes regimes jurídicos confirmam e até reforçam a necessidade de verificação da capacidade e da legitimidade dos sujeitos da relação registal. Confirmada que seja a qualidade de administradora da insolvência da subscritora do auto de arrolamento e requerente do registo, nenhuma forma especial se mostra necessária para comprovar a identificação do processo judicial e do Tribunal onde corre, menções que, aliás, constam do requerimento apresentado. Afigura-se-nos, assim, que reside no princípio da legalidade, na vertente da apreciação da regularidade formal do documento, a exigência de prova da qualidade de administrador judicial enquanto requisito essencial legitimador da subscrição do documento que no caso em apreço serve de base ao registo fotocópia conferida pelo original do auto de arrolamento de bens da massa insolvente 9 e cuja assinatura coincide com a aposta no requerimento de registo, sob pena de estar em causa a comprovação do facto cujo registo se solicita. Não terminamos este parecer sem dar conta que após as alterações ao Regulamento do Registo de Automóveis introduzidas pelo recente Decreto-Lei n.º 20/2008, de 31 de Janeiro, concretamente com o aditamento do artigo 42.º-A e com a disponibilização de acessos a outras bases de dados, a decisão do conservador não seria, imediatamente, a de recusa do registo, mas a de abertura de um procedimento de suprimento de deficiências no âmbito do qual teria sido possível verificar que sobre a sociedade proprietária do veículo apreendido incide já o registo da sentença de declaração de insolvência assim como o registo da designação da administradora da insolvência D. Hoje, portanto, estamos certos de que tal recusa não seria dada. À data, porém, em face do regime legal em vigor e das possibilidades técnicas disponíveis a solução não poderia deixar de ser a de negar à requerente o registo do facto por falta de comprovação da sua nomeação como administradora judicial no processo, condição para se poder dar por demonstrada a sua legitimidade para o pedido de registo e bem assim para a subscrição do documento que serviu de base ao registo. 4 Despacho n.º 26/2007, de 19.12.2007 do Presidente do Instituto dos Registos e do Notariado e art.º 22.º da Portaria n.º 99/2008, de 31.01 5 Artigo 5.º da Portaria n.º 657-C/2006, de 29.06 6 Artigo 4.º da Portaria n,º 562/2007, de 30.04. 7 Artigos 6.º e 7.º da Portaria n.º 99/2008. 8 Artigo 6.º, n.º 2, do DL n.º 8/2007, de 17.01 e Portaria n.º 499/2007, de 30.04 9 De acordo com o texto legislativo, o auto do arrolamento deve ser junto ao processo conforme decorre do artigo 151.º do CIRE, servindo de base ao registo um extracto assinado pelo administrador elaborado a partir desse documento. No caso em apreço foi oferecido para servir de base ao registo uma cópia do próprio auto que a Conservatória certifica ter sido conferida pelo original. 5

Em face do exposto o Conselho Técnico é do entendimento que o recurso hierárquico deve ser indeferido firmando-se as conclusões seguintes: I A apreensão de veículos em processo de insolvência é facto sujeito a registo por força do disposto nos artigos 152.º do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa e 5.º, alínea h), do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12.02, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 178-A/2005, de 28.10. II A apreensão de bens em processo de insolvência é feita mediante arrolamento ou por entrega directa através de balanço, devendo ser lavrado um auto no qual os bens são descritos, se declare o valor fixado por louvado, sempre que conveniente, se destaque a entrega ao administrador da insolvência ou a depositário especial e se faça menção de todas as ocorrências relevantes com interesse para o processo. O auto é assinado por quem presenciou a diligência e pelo possuidor ou detentor dos valores apreendidos ou, quando este não possa ou não queira assinar, pelas testemunhas a que seja possível recorrer. O administrador da insolvência deve juntar ao processo o auto do arrolamento e do balanço respeitante a todos os bens apreendidos, ou cópia dele, quando efectuado em comarca deprecada cfr. artigos 150.º, n.º s 2, 3 e 4, e 151.º do CIRE. III É título bastante para o registo, um extracto do arrolamento ou do balanço assinado pelo administrador da insolvência, a quem a lei atribui a responsabilidade de registar prontamente a apreensão dos bens cfr. artigo 152.º do CIRE. 10 IV A legitimidade do requerente é um pressuposto do processo de registo cuja verificação compete ao conservador por força do princípio da legalidade constante do artigo 68.º do Código do Registo Predial, aplicável ex vi legis do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 54/75, razão pela qual se mostrava necessário, ao tempo, comprovar a qualidade de administrador judicial da insolvência. V - O mesmo princípio exige ainda a prova da qualidade de administrador judicial enquanto condição legitimadora da subscrição do documento que no caso em apreço serve de base ao registo fotocópia 10 Pode também servir de base ao registo da apreensão a junção de documento que prove a declaração judicial de insolvência, acompanhada de declaração prestada pelo administrador judicial que identifique o bem a apreender. A declaração que identifique o bem é uma declaração principal formando conjuntamente com o documento judicial o título para o registo. A apreensão de bens integrados na massa insolvente é um efeito executivo e conservatório, que resulta da sentença declaratória da insolvência e que se impõe ao administrador como um dever de cumprimento imediato. O registo lavrado nestas circunstâncias depois da sentença mas antes da efectiva apreensão é provisório por natureza, como resulta da conjugação das disposições do artigo 92, n.º 1, alínea n), do Código do Registo Predial, 7.º, n.º 2 e 29.º do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12.02. Atente-se ainda que a apreensão assim como o seu registo não dependem do trânsito em julgado da sentença de declaração da insolvência, cujo recurso, a ser interposto, sobe em separado e com efeito devolutivo cfr. artigo 14.º, n.º s 5 e 6 do CIRE. 6

conferida pelo original do auto de arrolamento de bens da massa insolvente 11 e cuja assinatura coincide com a aposta no requerimento de registo, sob pena de estar em causa a comprovação do facto cujo registo se solicita. 2008. Parecer aprovado em sessão do Conselho Técnico de 29 de Abril de Isabel Ferreira Quelhas Geraldes, relatora, Ana Viriato Sommer Ribeiro, João Guimarães Gomes Bastos, Luís Manuel Nunes Martins, Carlos Manuel Santana Vidigal, José Ascenso Nunes da Maia. Este parecer foi homologado pelo Exmo. Senhor Presidente em 06.05.2008. 11 De acordo com o texto legislativo, o auto do arrolamento deve ser junto ao processo conforme decorre do artigo 151.º do CIRE, servindo de base ao registo um extracto assinado pelo administrador elaborado a partir desse documento. No caso em apreço foi oferecido para servir de base ao registo uma cópia do próprio auto que a Conservatória certifica ter sido conferida pelo original. 7