Ressecção Endoscópica de Nasoangiofibroma

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Transcrição:

Artigo Original Ressecção Endoscópica de Nasoangiofibroma Endoscopic Surgery of Nasopharyngeal Angiofibroma Elise Zimmermann*, Ian Selonke**, Fabiano Bleggi Gavazzoni*, Rodrigo Guimarães Pereira**, Silvio Machado***, Tatiane Kimmi Tanamati****. * Mestrado. Médico(a) Otorrinolaringologista. ** Médico Otorrinolaringologista. *** Médico. Neurocirurgião. **** Médica. Plantonista. Instituição: Hospital Infantil Pequeno Príncipe. Curitiba / PR Brasil. Endereço para correspondência: Elise Zimmermann Rua Líbia, 64 - Casa 5 Bairro: Atuba Curitiba / PF Brasil CEP: 82630-070 Telefone: (+55 41) 9156-3271 E-mail: elidani@terra.com.br Artigo recebido em 4 de Março de 2010. Artigo aprovado em 21 de Abril de 2010. RESUMO Introdução: O nasoangiofibroma juvenil (NAJ) é um tumor com componente vascular, de crescimento lento, benigno, porém muito agressivo devido sua invasividade local. O NAJ é de ocorrência rara, respondendo por 0,05% de todos as neoplasias de cabeça e pescoço. A tríade clássica de epistaxe, obstrução nasal unilateral e uma massa na nasofaringe sugere o diagnóstico de NAJ, sendo então complementado pelo exame de imagem. Nos últimos 10 anos o tratamento desta afecção vem sendo discutida com a finalidade de desenhar um protocolo de manejo. Atualmente a cirurgia parece ser a melhor forma de tratamento dos NAJ. Outros métodos como a hormonioterapia, a radioterapia e a quimioterapia são hoje modalidades terapêuticas usadas ocasionalmente como tratamentos complementares. Objetivo: Apresentar a casuística desta afecção no Hospital Infantil Pequeno Príncipe entre outubro de 2007 e agosto de 2008. Método: Estudo de casos retrospectivo de cinco casos de NAJ submetidos a cirurgia exclusivamente endoscópica com técnica de dois cirurgiões. Classificados entre IIA e IIIA. Todos os pacientes foram submetidos a angiografia com embolização do tumor 3-4 dias antes da cirurgia. Seguimento após a cirurgia para detecção de recidivas. Resultados: Houve duas recidivas no seguimento de 2 ano após a cirurgia. Conclusão: Tendo em vista o curto período de seguimento dos pacientes, houve apenas duas recidivas em um ano. Portanto há necessidade de um maior seguimento para afirmar que essa técnica tem um baixo índice de recidiva, já que a recidiva está provavelmente relacionada à ressecção incompleta do tumor inicial. Palavras-chave: angiofibroma, terapêutica, endoscopia, recidiva. SUMMARY Introduction: Juvenile nasopharyngeal angiofibroma (NAJ) is a tumor with vascular component, slow growing, benign but very aggressive because of its local invasiveness. The NAJ is rare, accounting for 0.05% of all head and neck cancers. The classic triad of epistaxis, unilateral nasal obstruction and a mass in the nasopharynx suggests the diagnosis of NAJ and is then supplemented by imaging. Over the past 10 years the treatment of this disease has been discussed with the aim of designing a management protocol. Currently, surgery appears to be the best treatment of the NAJ. Other methods such as hormone therapy, radiotherapy and chemotherapy treatment modalities are now used occasionally as complementary treatments. Objective: To present the cases of this disease in the Hospital Infantil between October 2007 and August 2008. Methods: A retrospective case study of five cases of NAJ underwent surgery solely with endoscopic technique of two surgeons. Classifieds between IIA and IIIA. All patients underwent angiography with embolization of the tumor 3-4 days before surgery. Follow-up after surgery to detect recurrence. Results: There were two relapses in the following two years after surgery. Conclusion: Given the short period of patient follow-up, there were only two relapses in one year. So there is need for further action to claim that this technique has a low recurrence rate, since the recurrence is probably related to incomplete resection the initial tumor. Keywords: angiofibroma, therapy, endoscopy, recurrence. 206

INTRODUÇÃO As primeiras descrições deste tumor foram feitas por HIPÓCRATES e datam do século 5 AC; FRIEDBERG foi o primeiro a denominá-lo de angiofibroma no ano de 1940. Outras denominações já foram utilizadas como fibroma nasofaríngeo, fibroma sangrante do adolescente e fibroangioma (1). O nasoangiofibroma juvenil (NAJ) é um tumor com componente vascular, de crescimento lento, benigno, porém muito agressivo devido sua invasividade local (2,3,4,5,6,7,8). Acomete quase que exclusivamente pré-adolescentes e adolescentes do sexo masculino, talvez por responder aos androgênios (2,3,4,5,9). O NAJ é de ocorrência rara, respondendo por 0,05% de todos as neoplasias de cabeça e pescoço (2,3,5). Atinge principalmente jovens do sexo masculino e hoje considera-se o grupo sanguíneo do tipo O+ como um marcador racial (10). A etiopatogenia continua controversa, porém algumas teorias foram propostas, como a teoria congênita; a hormonal; a vascular e a genética (2,3,11). Segundo ANDRADE e col. a seletividade do tumor pelos indivíduos do sexo masculino pode ser explicada por acúmulos intranucleares do receptor androgênico e de beta-catenina, um coativador que aumenta a sensibilidade do tumor a androgênios. As alterações genéticas observadas acometem mais frequentemente cromossomos sexuais. Inúmeros fatores de crescimento parecem estar implicados na patogênese do tumor. O fator II de crescimento insulina-like é altamente expressado, enquanto o fator de crescimento do endotélio vascular (VEGF) e o fator beta transformador do crescimento (TGF-ß) são liberados por células estromais e podem influenciar o crescimento e a vascularização do NAJ (12). Outro estudo recente, de SCHLAUDER e col propõe que a enzima aromatase é responsável pela conversão local de androgênios em estrogênios, o que consequentemente relaciona-se com o papel dos receptores de estrogênio no crescimento do tumor (13). Atualmente acredita-se que o tumor tenha sua origem na parede póstero-lateral da cavidade nasal, onde o processo esfenoidal do osso palatino encontra a lâmina horizontal do vômer e parte do processo pterigoide do osso esfenoidal. Essa junção forma a margem superior do forame esfenopalatino, onde repousa a porção posterior do corneto médio. A partir do seu ponto de origem começa então seu crescimento por debaixo da mucosa, estendendo-se inicialmente à porção posterior da cavidade nasal e da rinofaringe (4,5). Seu suprimento sanguíneo é feito pela artéria maxilar interna, podendo também haver ramos da artéria carótida interna ipsilateral (4,6). A tríade clássica de epistaxe, obstrução nasal unilateral e uma massa na nasofaringe sugere o diagnóstico de NAJ, sendo então complementado pelo exame de imagem (2,4,7,14). A tomografia computadorizada (TAC), a ressonância magnética (RM) e a endoscopia nasal são os exames de eleição para definir a extensão e a localização do tumor, permitindo dessa forma, um estadiamento preciso. O estadiamento pode ser feito através da classificação de RADKOWISKI et al, a qual se baseia em critérios clínicorradiológicos (2,3,4,9,11,14,15). Nos últimos 10 anos o tratamento desta afecção vem sendo discutida com a finalidade de desenhar um protocolo de manejo. Atualmente a cirurgia parece ser a melhor forma de tratamento dos NAJ. Outros métodos como a hormonioterapia, a radioterapia e a quimioterapia são hoje modalidades terapêuticas usadas ocasionalmente como tratamentos complementares (9,14,16,17,18). A abordagem cirúrgica pode ser feita pela via aberta, como a via transpalatal, transmaxilar, rinotomia lateral, degloving médio-facial e osteotomia de Le Fort tipo I (3,6,8,9,16,19). Com o advento de técnicas minimamente invasivas, a cirurgia endoscópica tem sido usada para tratamento de NAJ em anos recentes (19), sendo ideal para tumores limitados à nasofaringe, cavidade nasal, seios da face e esfenoidal com mínima extensão para fossa pterigopalatina (2,4,6,8,14,20). A primeira menção de uma ressecção endoscópica data do ano de 1996. A partir daí uma série de casos foram descritos e todos mostraram que uma exérese endoscópica tinha menor morbidade para estádios precoces da doença (2). Amostra MÉTODO Estudo retrospectivo de cinco pacientes tratados com cirurgia exclusivamente endoscópica no período de outubro de 2007 a agosto de 2008, no Hospital Infantil Pequeno Príncipe de Curitiba / PR - Brasil. Sendo que segundo a sua classificação nos diversos sistemas de estadiamento estão tabulados na Tabela 1. 207

Tabela 1. Classificação nos diversos sistemas de estadiamento. Pacientes Andrews Fisch Chandler Sessions Radkowski Idade Tempo Cirurgia 1. M.G.P 2 2 3 2-A 2-A 14a00m 150 min 15/10/2007 2. C.E.G. 3-A 3 3 2-C 2-C 07a02m 310 min 5/11/2007 3. A.S.M. 3-A 3 3 2-C 2-C 12a04m 210 min 10/12/2007 4. C.K. 2 2 3 2-B 2-B 14a00m 160 min 4/8/2008 5. F.M. 3-A 3 3 2-C 2-C 14a04m 110 min 11/8/2008 Técnica Os cinco pacientes desta série tiveram tratamento do nasoangiofibroma por acesso endoscópico sendo que para tal foi realizada a cirurgia com acesso pelas duas narinas, técnica de dois cirurgiões ou técnica de quatro mãos. Foi realizada uma incisão intersepto columelar (semelhante a do acesso ao pericôndrio do septo na septoplastia) do lado contrário ao nasoangiofibroma. Para que após a septoplastia, fosse confeccionada uma janela no septo cartilaginoso, permitindo introduzir através desta passagem mais um ou dois instrumentos sob manuseio do segundo cirurgião. Este artifício trouxe-nos mais espaço para acesso ao tumor Todas as cirurgias foram realizadas sob anestesia geral, 3 a 4 dias após angiografia com embolização do tumor. Durante o procedimento cirúrgico foi utilizada solução de lidocaína 2% com adrenalina 1:80.000 para infiltração da parede lateral do nariz assim como da fossa pterigopalatina através do canal palatino maior. A seguir foi utilizada solução tópica de adrenalina 1:4000 aplicada à mucosa nasal com auxílio de cotonoides para vasoconstricção local, após 10 a 15 minutos de espera foram retirados os cotonoides iniciando-se a dissecção cirúrgica Devido ao tamanho e extensão dos tumores (ver Tabela 1) optamos por realizar uma maxilectomia medial endoscópica para podermos trabalhar no tumor com segurança até sua extensão mais lateral. Iniciamos a dissecção cirúrgica do lado do tumor através de uma uncifectomia, etmoidectomia anterior e posterior com exposição ampla da lâmina papirácea e teto do etmoide. Assim como turbinectomia média parcial e antrostomia maxilar ampla abrindo toda fontanela posterior. Estes procedimentos foram realizados logo no início da cirurgia para podermos nos ancorar em parâmetros e marcos anatômicos bem conhecidos. Após esta sequência foi realizada turbinectomia inferior o mais próximo a inserção do corneto inferior a parede lateral do nariz, com retirada subsequente da parede medial da maxila. Com isto conseguimos acesso amplo até a porção lateral do seio maxilar, facilitando bastante a ressecção de tumores com extensão lateral à fossa infratemporal. Realizamos abertura da parede posterior do seio maxilar, com auxílio de uma pinça Kerrison delicada. Após a exposição da fossa pterigopalatina e infratemporal foi realizada, sob tração constante do segundo cirurgião, a minuciosa dissecção do tumor das estruturas anatômicas que os circundavam até identificação do pedículo do tumor. O qual foi cauterizado com cautério bipolar (Figura 2). Nos pacientes números dois e três (ver tabela), devido ao grande tamanho do tumor foi realizada uma secção do mesmo em duas partes (dividido ao meio). Sendo que a divisão do tumor foi realizada preferencialmente a porção de menor diâmetro quase sempre na altura do forame esfenopalatino próxima à parede lateral da cavidade nasal E este ato da divisão somente foi realizado após controle das estruturas adjacentes como septo, corneto médio e parede lateral nasal. No seguimento de dois anos houve duas recidivas sendo justamente nos pacientes dois e três (Figuras 1 e 3). Entretanto estes pacientes tinham as seguintes características, o numero dois é o paciente de menor idade no grupo estudado, o que para alguns autores relaciona-se com uma maior agressividade do tumor. O paciente de número três nas vésperas da cirurgia internou por quadro de insuficiência respiratória alta pela ocupação da rino e orofaringe pelo nasoangiofibroma. Foi submetido à traqueostomia prévia para assegurar via aérea por caráter provisório. Este paciente está aguardando exame para estadiamento e subsequente planejamento terapêutico. DISCUSSÃO O nasoangiofibroma, apesar de sua benignidade, é altamente invasivo e recidivante e tem hoje como tratamento de eleição, a ressecção cirúrgica para todos os estadios (1). Tradicionalmente o NAJ tem sido ressecado por via transfacial, transoral ou acesso craniofacial combinado. Todos esses procedimentos levam a alterações do crescimento do terço médio da face e até mesmo deformi- 208

Figura 1. Tomografia dos seios paranasais. Figura 2. Nasoangiofibroma. dades craniofaciais devido à osteotomias realizadas durante esses procedimentos. Ao longo de anos a via de acesso para o tratamento dos NAJ vem se modificado com a finalidade de desenvolver técnicas com menor morbidade e menor incidência de recidivas. Figura 3. Tomografia dos seios paranasais. Recentemente, a abordagem endoscópica surgiu como opção cirúrgica para o tratamento desses tumores (4). Inicialmente usada para tratamento de doenças não neoplásicas como polipose e sinusopatias, o aperfeiçoamento da técnica possibilitou a exérese de tumores benignos e mais recentemente tumores malignos localizados (5). A ressecção endoscópica tem sua melhor indicação para tumores pequenos, limitados à nasofaringe, cavidade nasal, seios etmoidais e esfenoidal, podendo em alguns casos, de tumores com extensão à fossa pterigopalatina (4). Em um estudo publicado com uma série de pacientes classificados como estágios IA e IIB de RADKOWSKI, foram considerados por todos os autores como apropriado para ressecção endoscópica (21). Mais recentemente alguns autores têm relatado ressecção endoscópica em estágios I até IIIA de RADKOWSKI por demonstrar-se segura, efetiva, diminuir a perda sanguínea intraoperatória, bem como menor índice de complicações, tempo de hospitalização e taxa de recorrência do 209

tumor, principalmente em tumores sem extensão intracraniana (9,17,22,,23). A principal vantagem da cirurgia endoscópica é a possibilidade de se obter uma visão ampla da lesão e sua relação anatômica com as estruturas adjacentes, promovendo maior acurácia, completa dissecção e melhor controle do sangramento (9,14,23). Outras vantagens incluem redução do tempo cirúrgico, de hospitalização, ausência de cicatriz visível, evita complicações como epífora, disestesias, trismos e deformidades craniofaciais (2,5,14,20). A grande preocupação em relação a escolha da via de acesso é a taxa de recidiva do tumor, o que tem gerado grande discussão. A recorrência do tumor a longo prazo tem sido motivo de frustração. Contudo, a recorrência reflete uma ressecção inicial incompleta. A taxa de recorrência de tumores ressecados por via endoscópica tem se mostrado baixa. MANN et al (21) em estudo retrospectivo encontrou uma taxa de recorrência de 6,6% em 15 pacientes com estadios I e II da doença. NICOLAI et al (9) em sua série de 15 pacientes encontrou apenas um paciente com lesão residual em um seguimento de 24 meses. SHEPHERD et al (5) em seu estudo comparativo entre acesso externo e endoscópico de 65 pacientes, encontrou uma taxa de 24% dos 49 pacientes submetidos à rinotomia lateral e dos 5 pacientes submetidos à cirurgia endoscópica nenhuma recorrência. KENNEDY et al (24) reportam que a cirurgia endoscópica é a mais indicada para casos classificados em ANDREWS I, II e selecionados casos IIIa com menor taxa comprovada de sangramento e tempo de internação. Talvez possamos atribuir a menor taxa de recorrência dos tumores ressecados por via endoscópica pelo fato destes serem de estadios precoces, o que possibilita sua completa ressecção, já que para tumores mais avançados, como os de estadio III com maior extensão para fossa craniana média e estádio IV, esse tipo de acesso esteja contra-indicado (5,6,21,24). HUANG et al (25) demonstram que a técnica com dois cirurgiões através da via transseptal posterior apresenta menos morbidade e a menor taxa de recorrência pela ressecção adequada do tumor. SAYLAM et al (26) em um estudo de peças de recidiva tumoral encontraram a presença de antígeno nuclear de proliferação celular (PCNA) e fator de crescimento do endotélio vascular (VEGF) e fator de necrose tumoral beta (TGF-ß) como promotores da angiogênese e da proliferação do NAJ, mas ainda não foi encontrada uma relação sólida para considerarmos estes como marcadores tumorais. Os cinco pacientes deste estudo foram submetidos a ressecção endoscópica quatro dias após arteriografia com embolização. Para a retirada do tumor, em dois pacientes, foi realizado secção do tumor em duas metades, sendo que a maior foi retirada por via transoral. Manobra que forneceu mais espaço para continuarmos a dissecção do pedículo tumoral concordando com o relato de SOLOMON et al (27). CONCLUSÃO O maior avanço no tratamento do NAJ foi a introdução da cirurgia endoscópica, pois esta modalidade terapêutica permite completa ressecção de lesões apropriadas com o mínimo de morbidade. A indicação de ressecção endoscópica está bem estabelecida para tumores de estádios mais precoces da doença, já para tumores mais avançados como, IIIA e IIIB de RADKOSKI, tem sido pouco relatado. Os cinco pacientes do estudo tinham estadios IIA, IIB ou IIC. Devido à maior extensão do tumor, em dois pacientes, foi realizado a secção do tumor em duas partes sendo retirada a maior parte pela via transoral como na técnica de adenoidectomia. Essa técnica foi relatada por SOLOMON et al (27), numa série de quatro casos e se mostrou efetiva para a completa excisão do tumor e controle do sangramento segundo o autor. Podemos observar que essa técnica permite maior facilidade de ressecção de tumores grandes estadiados como IIC. Tendo em vista o curto período de seguimento dos pacientes, houve apenas duas recidivas em dois anos. Portanto há necessidade de um maior seguimento para afirmar que essa técnica tem um baixo índice de recidiva, já que a recidiva está provavelmente relacionada a ressecção incompleta do tumor inicial. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Tewfik TL, Al Garni MA. Juvenile Nasopharyngeal Angiofibroma. Am J Rhinol Allergy. 2009, 23(1):95-99. 2. Bernal-Sprekelsen M, Alobid I, Guilemany JM. Angiofibroma Juvenil. Acta Otorrinolaringol Esp. 2007, 58(1):84-95. 3. Hervé S, Portier F, Chapot R et al. Fibroma Nasofaríngeo. Encyclopedie Medico-Chirurgicale-Otorrinolaringologia. 2001- E-20-585-A-10. 4. Luiz ACR, Romualdo SLT, Fava AS. Angiofibroma 210

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