FORMAÇÃO E FORMA DE ATUALIZAÇÃO DE TREINADORES DA 2ª DIVISÃO DO FUTEBOL GAÚCHO RESUMO Antônio Evanhoé Pereira de Souza Sobrinho URCAMP/Bagé Fábio Bitencourt Leivas URCAMP/Bagé Luiz Fernando Framil Fernandes URCAMP/Bagé Marcelo Cozzensa UFPEL/Pelotas antoniosobrinho@urcamp.edu.br O objetivo do presente estudo foi investigar a formação e a forma de atualização de treinadores profissionais de futebol. A amostra foi formada pela totalidade dos treinadores atuantes na 2ª divisão do campeonato gaúcho de 2013 (n=13). A coleta de dados se deu através de um questionário e entrevista, analisados através de estatística descritiva e análise de conteúdo. Os resultados informam um perfil de formação de treinadores pouco baseado na formação acadêmica em Educação Física e ainda a utilização de situações não mediadas e informais enquanto forma de atualização. Palavras-chave: Treinador; Formação; Futebol. INTRODUÇÃO De acordo com a lei número 8.650 de 20 de abril de 1993, em seu artigo 3º, que trata sobre a profissão de treinador profissional de futebol, está assegurado, preferencialmente tal exercício, aos portadores de diploma em Educação Física, e aos profissionais que, até a data do início da vigência desta Lei, hajam, comprovadamente, exercido cargos ou funções de treinador de futebol por prazo não inferior a seis meses, como empregado ou autônomo, em clubes ou associações filiadas às Ligas ou Federações, em todo o território nacional (BRASIL, 1993), ou seja, neste caso, a formação acadêmica não é obrigatória. No entanto, a formação destes treinadores vem sendo questionada, primeiro pela abrangência dos cursos de bacharelado (MILISTETD et al., 2014), segundo e não menos importante, pela permissividade da lei. Neste momento surge um questionamento que parece de fato bastante importante: será que os treinadores de futebol profissional têm uma formação adequada para o exercício da profissão? Pois hoje, reconhece-se que no esporte de elite, a busca pelos melhores resultados exige excelência na preparação de atletas (MILISTETD et al., no prelo). A literatura tem mostrado que os cursos de formação de treinadores, oferecidos em curtos espaços de tempo, não tem sido suficientes para prepará-los adequadamente (TRUDEL, CULVER & WERTHNER, 2013), e, além disso, há uma tendência entre os
estudiosos das atividades dos treinadores (WERTHNER & TRUDEL, 2006; CALLARY, 2012; WERTHNER, CULVER & TRUDEL, 2012; TRUDEL, CULVER & WERTHNER, 2013; DEEK et al, 2013) em considerar a formação destes, a partir de um olhar de formação ao longo da vida (JARVIS, 2006). Entendendo que existem várias oportunidades de aprendizagem, como a vivência prática, a troca de informações com outros treinadores e a observação de colegas (MILISTETD et al, no prelo), que os treinadores devam se envolver na maior quantidade possível de oportunidades de aprendizagem, sejam elas formais, não formais ou informais (TRUDEL, CULVER & WERTHNER, 2013), e que a orientação de um treinador eficaz parece essencial para o alcance de sucesso por parte dos atletas (KOH, MALLET & WANG, 2013), o objetivo deste estudo foi investigar a formação e a forma de atualização dos treinadores profissionais de futebol da 2ª divisão gaúcha. MÉTODOS O estudo caracterizou-se por ser descritivo exploratório. Para a coleta de dados utilizou-se um questionário estruturado e entrevista. A amostra foi composta pela totalidade de Técnicos de Futebol dos 13 clubes que participaram da 2ª Divisão do futebol profissional do estado do Rio Grande do Sul no ano de 2013. A análise dos dados se deu através da estatística descritiva e análise de conteúdo (BARDIN, 1977). Vale ressaltar que o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Pelotas sob número 475.742. RESULTADOS Segundo os resultados encontrados, verificou-se que os treinadores possuíam uma carreira, entendida aqui como o progresso linear através da vida em relação a um tema específico (CHRISTENSEN, 2014), de 11.3 anos em média (± 7.3 anos), variando de 1 a 22 anos, valores estes que colocam a maioria dos treinadores (10 de 13) na fase de estabilização proposta por Burden (1990), expressa pelo bom comando das atividades de ensino e do ambiente, ou ainda no terceiro estágio de desenvolvimento de Bloom (1985 apud MILISTETD et al, no prelo) marcado pelo total comprometimento com a atividade e pelo desenvolvimento da autonomia no seu próprio desenvolvimento. Com relação à formação acadêmica dos treinadores envolvidos no estudo, 3 possuíam formação em Educação Física, 6 estavam cursando Educação Física, 1 tinha formação em Direito e 3 treinadores tinham ensino médio completo. Quando analisados quanto à formação em cursos específicos para treinadores, 9 possuíam formação e 4 não
tinham frequentado estes cursos específicos. Destes 4 que não possuíam formação acadêmica em educação física, 1 possuía outra graduação, 1 apenas ensino médio e 2 eram alunos do curso de Educação Física. Diferentemente do relatado por Fernandes et al. (2013), que boa parte dos treinadores brasileiros de elite, na atualidade, acumularam horas de estudo, seja em cursos de graduação (Educação Física), ou cursos específicos (p.5), na amostra do estudo, a minoria dos treinadores estudados (3 de 10) possuía formação formal, e ainda, 4 treinadores não possuíam formação alguma. Entretanto, a prática enquanto treinador por si só, não configura qualidade de trabalho, pois as investigações sobre esta temática têm relatado que a experiência enquanto atleta, a assistência a treinadores mais experientes e a formação formal e informal, são fatores importantes na busca pela otimização na carreira (CÔTÉ, ERIKSSON & DUFFY, 2013). Neste sentido, será eficaz o treinador que consistente e integradamente aplicar os conhecimentos profissionais, inter e intrapessoais no sentido de melhorar nos atletas sua competência, confiança, conexão e o caráter em contextos específicos de treino (CÔTÉ & GILBERT, 2009). A Tabela 1, trás os resultados a respeito das formas de atualização dos treinadores. FORMAS DE ATUALIZAÇÃO DOS TREINADORES N = 13 Internet 9 Livros 6 Vídeos 7 Softwares 3 Cursos 3 Assistência a jogos 4 Análise de equipes adversárias 1 Debate ou troca de informações com outros treinadores 3 Observa-se nos achados, com relação às formas de atualização dos treinadores, a clara utilização de situações de aprendizagem não mediadas, onde os treinadores escolhem o que querem aprender e decidem como aprender, e não formais, aquelas
atividades educacionais conduzidas fora do ambiente de aprendizagem (ISCF, 2012), concordando com Gilbert, Côté & Mallet (2006) em seu estudo sobre as vias de desenvolvimento dos treinadores esportivos, os quais verificaram uma baixa procura pela educação formal, ou seja, clínicas, workshops, cursos de certificação. Esses resultados vão ao encontro dos encontrados por Nash & Sproule (2009), onde os métodos de desenvolvimento dos treinadores foram informais, a partir do debate com outros treinadores sendo reconhecidos como essencial para seu progresso. CONCLUSÃO Segundo os objetivos traçados para o estudo de investigar a formação e a forma de atualização dos treinadores profissionais de futebol da 2ª divisão gaúcha, conclui-se que, apesar de os treinadores apresentarem uma carreira estável e comprometida, sua formação acadêmica em Educação Física é reduzida. Além disso, utilizam enquanto estratégias de atualização situações não mediadas e não formais. Sendo assim, apesar de o Brasil legalmente permitir a não formação em Educação Física a partir da comprovação de experiência anterior, a literatura tem mostrado que será mais eficaz aquele treinador que combinar conhecimentos profissionais, interpessoais e intrapessoais e ainda que estes se desenvolvam a partir do aporte a situações de aprendizagens formais, informais e não-formais. REFERÊNCIAS BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 1977. BRASIL, Lei Nº 8.650, de 20 de Abril de 1993. Dispõe sobre as relações de trabalho do Treinador Profissional de Futebol e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1989_1994/l8650.htm Acesso em agosto de 2015. BURDEN, P. R. Teacher development. In: HOUSTON, W.R. (Ed.) Handbook of research on teacher education. New York: Macmillan, 311 327, 1990. CALLARY, B. Exploring the Process of Lifelong Learning: The Biographies of Five Canadian Women Coaches. Dissertation of Doctor of Philosophy in Human Kinetics. School of Human Kinetics Faculty of Health Sciences University of Ottawa. Ottawa, Canada, 2012. CHRISTENSEN, Mette. Outlining a typology of sports coaching careers: paradigmatic trajectories and ideal career types among high performance sports coaches. Sports Coaching Review, 2014. CÔTÉ, Jean, & GILBERT, Wade. (2009). An integrative definition of coaching effectiveness and expertise. International Journal of Sports Science & Coaching, 4(3), 307 323.
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