EDUCAÇÃO CRISTÃ COMO ALIADA À CONSTITUIÇÃO SAUDÁVEL DO CARÁTER.

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Transcrição:

EDUCAÇÃO CRISTÃ COMO ALIADA À CONSTITUIÇÃO SAUDÁVEL DO CARÁTER. Roney Ricardo Cozzer 1 RESUMO O tempo presente traz o grande desafio de pensar e repensar a constituição do sujeito que está inserido no meio. Esse sujeito tanto é reflexo do meio, como ele mesmo contribui de alguma forma para a constituição desse meio. Portanto, é necessário aquilo que poderia ser chamado de "olhar macro" e também "olhar micro". O primeiro focando a sociedade em sua coletividade, o segundo mirando o indivíduo. São duas realidades que não podem ser analisadas de maneira isolada cada uma. Há uma dependência mútua. A Educação Cristã, com os seus pressupostos e fazeres educativos, pode ser uma importante aliada ao processo de constituição do sujeito, nessa cadeia concatenada de eventos que perfaz essa formação do ser. E mais ainda, ela pode ajudar também na compreensão de como se dá essa construção. Diversos fatores estão envolvidos neste processo de assimilação e equilibração que formam o caráter do indivíduo, como a vivência familiar, a vivência eclesial, os valores que lhe são transmitidos, dentre outros. A estruturação de uma cosmovisão, que por sua vez será geradora de uma conduta ética no mundo, precisa andar de mãos dadas com a Educação Cristã. É até legítimo perguntar se é possível construir assim um caráter ético cristão sem a colaboração da Educação Cristã, ainda que em suas mais simples manifestações. Palavras-chave: Educação. Caráter. Sujeito. 1 Mestrando em Teologia pelas Faculdades Batista do Paraná (FABAPAR) e membro do Grupo de Pesquisa Perquirere: Práxis Educativa na Formação e no Ensino Bíblico. Orientadora: Dra Gleyds Domingues. E-mail: roneycozzer@hotmail.com.

INTRODUÇÃO Há dois importantes desafios sobre o qual a Igreja e a sociedade devem se debruçar: entender o tempo presente e entender como se dá a formação do sujeito neste tempo, isto é, que está inserido nesta era e ele é, num certo sentido, resultado também deste momento histórico. Mas não se pretende concluir na presente reflexão que o ser humano seja assim tão passivo. Ele de fato interage, assimila, acomoda e acomoda-se em sua estruturação psíquica e intelectual. Tendo isso em vista, fica aberta a porta para que se recorra à Educação Cristã como uma grande aliada na construção do caráter na pós-modernidade. I. CONCEITUAÇÃO DO QUE É A EDUCAÇÃO CRISTÃ. A Educação Cristã, adequadamente entendida, não visa somente a comunicação de conceitos ao discente. Ela pode ser definida como um esforço educativo para a vida, para a concretude da realidade humana, orientado sob a luz das Escrituras. Nesse sentido, Educação Cristã e Discipulado são dois processos indissociáveis. A preocupação precípua de um ensino orientado por uma visão bíblica e cristã é ensinar para a vida de fato. Trata-se da acumulação de saberes que poderão e deverão ser utilizados na vivência, em favor de si mesmo e da coletividade, seja essa coletividade eclesial e social 2. Nesse sentido, ela pode ser entendida como uma modalidade de ensino com vistas à formação moral que buscar formar um indivíduo que é autônomo, mas não independente da sociedade, da outridade, de modo que ele está submetido ao "conformismo do grupo social a que ele pertence", para pegar emprestada uma colocação de Jean Piaget 3. Nessa esteira, Carvalho (2015, p. 68) reconhece que a "Bíblia, acima de tudo será sempre o ponto de partido e o Livro Texto por excelência, da Educação Cristã". Lopes (2010, p. 68) afirma que "a Educação Cristã [...] contempla princípios cristãos de educação, que se centralizam na Bíblia Sagrada". A compreensão é que a Palavra de Deus, em sua perspicuidade, é norteadora da cosmovisão do cristão, cosmovisão essa que não deixa de perceber o tempo no qual o sujeito está inserido, mas que procura contribuir para modificá-lo para melhor de alguma forma. Notar os problemas e desafios pós-modernos é um caminho necessário de ser trilhado pela Educação Cristã no seu exercício pedagógico. De fato, torna-se inviável 2 Embora as duas estejam, inevitavelmente, imbricadas. 3 PIAGET, Jean. Cinco estudos de educação moral. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1996, p. 1.

pensar qualquer tipo de educação que não responda de alguma forma às demandas de seu próprio tempo. A pertinência do trânsito entre saberes e disciplinas é inegável também neste esforço. A convergência entre formação integral, Educação Cristã e espiritualidade, como abordado neste texto, é claramente perceptível. Os educadores cristãos precisam também considerar que o seu trabalho vai na contramão da tendência da pós-modernidade de destruir cânones, marcos referenciais e valores perenes. O valor maior na pós-modernidade é a ruptura com os valores. A Educação Cristã, no entanto, é um ensino pautado justamente por valores. Zygumund Bauman (2003) acertadamente define a pós-modernidade como a "modernidade líquida", já que nada é sólido, duradouro, de contornos fixos nesta era. Este abandono de referenciais, contudo, tem gerado problemas gravíssimos para o homem, como o esfacelamento da família, a incapacidade de compartilhar, a falta de sentido da vida, dentre outros. Edgar Morin (2000) aponta um dos grandes problemas deste tempo: a incompreensão. A situação é paradoxal sobre a nossa Terra. As interdependências multiplicaram-se. A consciência de ser solidários com a vida e a morte, de agora em diante, une os humanos uns aos outros. A comunicação triunfa, o planeta é atravessado por redes, fax, telefones celulares, modems, internet. Entretanto, a incompreensão permanece geral. Sem dúvida, há importantes e múltiplos progressos da compreensão, mas o avanço da incompreensão parece ainda maior 4. A Educação Cristã deve ser vista como uma aliada à Igreja, que tem diante de si o desafio de entender o seu tempo para poder comunicar o Evangelho às pessoas que sofrem os influxos da pós-modernidade. Ela pode diminuir esse fosso da incompreensão, conforme indicado por Morin, justamente numa era que conecta cada vez mais as pessoas, por meios e veículos digitais, mas paradoxalmente as distancia cada vez mais. E claro, este é um dos desafios. E esta é uma das possibilidades de contribuição para a Educação Cristã 5. 4 MORIN, Edgar. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. 2ª ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO: 2000, p. 93. 5 David Allen Bledsoe, por exemplo, analisa a relação entre a educação teológica e a atividade missionária. Citando o caso dos batistas, o autor menciona que "evangélicos norte-americanos começaram a usar seminários teológicos há mais ou menos 300 anos para treinar seus vocacionados, tanto pastores quanto missionários... Pode-se dizer que eles tem utilizado ambientes acadêmicos por cerca de 200 anos" (BLEDSOE,

II. A FORMAÇÃO DO SUJEITO. A formação do sujeito passa por diversos fatores. Podem ser colhidas contribuições nas percepções de Sigmund Freud, considerado o Pai da Psicanálise, e do psicólogo suíço Jean Piaget, além de outros teóricos que se esforçaram para entender como se dá essa formação. Fatores culturais, familiares, psicológicos, biológicos e espirituais estão presentes nessa "teia" que é a formação de um ser inserido na sociedade. Sigmund Freud (1969) percebeu cinco fases do desenvolvimento da personalidade humana, ambas atreladas à sexualidade humana. Jean Piaget (1971), por sua vez, destacou o que ele chamou de "estágios" no desenvolvimento cognitivo do sujeito. O ser humano possui uma consciência e um corpo, e ambos são formados em interação com o meio. Ele recebe estímulos e reage à eles. Assim o caráter vai sendo construído à medida em que o indivíduo vai adquirindo conhecimento e valores que lhe são transmitidos pelo meio no qual está inserido. Quando se fala do desenvolvimento da personalidade, pensa-se em gênesi (o começo) e no desenvolvimento dessa personalidade. Cumpre perguntar como se dão esses dois fatos. A Educação Cristã busca justamente ajudar neste processo de desenvolvimento por meio do compartilhamento de saberes que tem implicação direta com a vida da criança e do adulto. Lembrando, é claro, que a Educação Cristã não se destina exclusivamente à criança em seus primeiros anos, mas à todos, em todas as faixas etárias. A formação do sujeito está sujeito à traumas, à fatores psicológicos, à ganhos e à percas, à demandas e à satisfações. Tudo isso e um pouco mais faz parte da constituição e da construção da subjetividade humana. É preciso lançar um olhar sobre todos esses fatores de modo a se produzir um exercício pedagógico que possa alcançar o ser em sua integralidade. Não adianta transmitir conhecimentos à uma pessoa sem que se preocupe com a sua capacidade de reagir à eles, de acomodar-se à eles e reproduzi-los ela mesma, por si mesma e em favor do outro, da coletividade. Isso tornaria o processo educativo absurdamente vazio. Conquanto a Educação, e mesmo a Educação Cristã, possam não ser a resposta final para o dilema que se tornou a Pós-modernidade, elas podem sim criar "pontes" e colaborar David A. Educação teológica e sua parte no cumprimento de missão. in: Via Teológica. v. 17, n. 33, jun. 2016, p. 57ss).

decisivamente para uma sociedade melhor e, por que não dizer, para uma Igreja melhor. III. CONTRIBUIÇÕES DA EDUCAÇÃO CRISTÃ PARA A CONSTITUIÇÃO DO CARÁTER. A Educação Cristã por estar alicerçada nas Sagradas Escrituras, a tem como um manual ético pelo qual o cristão procura orientar sua vida. Desse modo, um dos maiores esforços da prática educativa cristã é justamente transpor esses ensinamentos para a vida do indivíduo. Isso gera práxis, uma práxis cristã. À partir da assimilação de conteúdos oferecidos por esta modalidade de educação, o sujeito é desafiado constantemente à interagir com a realidade à sua volta exercitando o que aprendeu. Doutra maneira, este ensino perde seu sentido. Para pegar emprestado um conceito piagetiano (ainda que direcionado às crianças exclusivamente), o indivíduo não deve apenas copiar, mas se transformar, deve pensar, e não apenas reproduzir de forma mecânica. Isso se vê claramente na atividade educadora cristã que discipula. A Educação Cristã, pensada em interação com outras disciplinas, poderá ser, sem dúvida, uma ciência muito útil, não apenas à Igreja, mas também à sociedade, já que a Igreja vive na sociedade e é, ela mesma, a sociedade. O desenvolvimento de uma espiritualidade e de um caráter sadios passam pela pedagogia cristã em diálogo com outros saberes. Isso é reconhecido por Souza e Kume (2017) quando afirmam que "uma postura interdisciplinar na interpretação da Bíblia pode ser terapêutica à igreja" 6. A Educação Cristã, tendo a Bíblia como livro-texto, contribui diretamente para a formação de uma conduta que seja ética no mundo. O tempo atual, mormente no Brasil, urge por uma ética saudável que impeça a desintegração social. Gleyds Silva Domingues (2017) é incisiva ao afirmar: "Em tempos de incertezas sobre o sentido da vida, dos relacionamentos e da moralidade a ser exercida, falar em princípios éticos pode até soar com certo tipo de romantismo saudosista, principalmente diante 6 SOUZA, José Neivaldo de. KUME, Priscila Rocha. in: SOUZA, José Neivaldo de. SOUZA, Edilson Soares de. (org.s). Teologia e ética no cuidado pastoral. Curitiba: Núcleo de Publicações Fabapar, 2017, p. 37. Souza e Kume, neste texto, discorrem sobre a tensão entre culpa e justificação em sua relação com a formação cristã, buscando contribuições na Psicanálise.

das más notícias que circulam a realidade social do Brasil" 7. Responder às demandas éticas deste tempo se faz necessário com vistas a produzir um agir social justo, igualitário e harmonioso. A construção de um caráter pautado por uma cosmovisão cristã tem uma dependência mútua da Educação Cristã. Conquanto a construção de uma cosmovisão não possa, de fato, estar limitada à um campo de conhecimento apenas, conforme bem indica Domingues (2017, p. 104), ela depende de fomento, de provocações, de estímulos para que seja assim gerada e assimilada no aprendente, no sujeito em construção. E aí está a chave para se perceber e entender a contribuição da Educação Cristão para a formação do caráter no sujeito. CONCLUSÃO A sociedade brasileira, inserida no contexto da pós-modernidade, não fica de fora dessa efervescência religiosa e emocional, típica da Pós-modernidade. Entender o fenômeno religioso é fundamental para a construção da identidade do ser humano. O sujeito constrói suas próprias crenças que irão redundar na concretude da vida, do cotidiano. Por isso a importância de uma cosmovisão alicerçada numa perspectiva que seja bíblica, cristã. Isso, claro, por se compreender que a perspectiva cristã será uma influência benéfica. Esse diálogo é realmente necessário, pois os elementos religiosidade, sujeito contemporâneo e identidade estão imbricados. Dissociá-los é de fato inviável no esforço para a reconfiguração social que se faz necessária. O presente texto contribui no sentido de mostrar a utilidade da Educação Cristã na formação do caráter do sujeito que se insere nesta sociedade marcada por novos desafios, que se apresenta sob novas configurações. Este tempo é caracterizado por surpresa, imprevistos, espantos. Retornar aos cânones da formação cristã continua sendo algo necessário e viável, uma vez que o ser humano necessita de marcos, referenciais, limites. 7 DOMINGUES, Gleyds Silva. in: in: SOUZA, José Neivaldo de. SOUZA, Edilson Soares de. (org.s). Teologia e ética no cuidado pastoral. Curitiba: Núcleo de Publicações Fabapar, 2017, p. 101.

REFERÊNCIAS BAUMAN, Zigmund. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. BLEDSOE, David A. Educação teológica e sua parte no cumprimento de missão. in: Via Teológica. v. 17, n. 33, jun. 2016. CARVALHO, César Moisés. Uma pedagogia para a Educação Cristã: noções básicas da Ciência da Educação a pessoas não especializadas. Rio de Janeiro: CPAD, 2015. LOPES, Edson. Fundamentos da educação cristã. São Paulo: Mundo Cristão, 2010. FREUD, Sigmund. Três ensaios sobre a sexualidade. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. vol. II. Rio de Janeiro: Imago, 1969. MORIN, Edgar. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. 2ª ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO: 2000. PIAGET, Jean. Cinco estudos de educação moral. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1996. PIAGET, J. A epistemologia genética. Trad. Nathanael C. Caixeira. Petrópolis: Vozes, 1971. SOUZA, José Neivaldo de. SOUZA, Edilson Soares de. (org.s). Teologia e ética no cuidado pastoral. Curitiba: Núcleo de Publicações Fabapar, 2017.