Danos sociais no ordenamento jurídico brasileiro

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Transcrição:

JURISPRUDÊNCIA NACIONAL Danos sociais no ordenamento jurídico brasileiro sociais. Isso sem que tenha havido qualquer pedido autoral neste sentido. Tais condenações, eivadas de ilegalidade, tem gerado muita polêmica, inclusive no mercado segurador. Como sabido, as indenizações punitivas são comuns no ordenamento jurídico norte-americano e nos países que adotam o Common Law. Essas indenizações têm por objetivo punir o agente causador do dano pelo ilícito por ele praticado, a fim de inibir que ele seja reincidente e que a mesma conduta seja praticada também pela sociedade. ANA PAULA BONILHA DE TOLEDO COSTA Graduada em Direito pelas Faculdades Metropolitanas Unidas em 2010. Cursando Pós- Graduação em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Membro dos Grupos de Trabalho de Saúde Suplementar, Relações de Consumo e Resseguro da AIDA. Sob o argumento de que algumas práticas reiteradas de grandes empresas causariam danos à sociedade e que as condenações por danos morais não têm sido mais eficazes para coibir essas condutas, o Judiciário, em ações individuais, tem condenado empresas ao pagamento de indenização por danos Ocorre, por sua vez, que os chamados danos sociais ou punitive damages não se compatibilizam com o ordenamento jurídico brasileiro, o qual dispõe de outros mecanismos para a defesa de direitos difusos e coletivos, defesa essa a ser exercida por entes específicos, legitimados por lei. Dentre esses legitimados encontram- -se, por exemplo, o Ministério Público, a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, e as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos do Consumidor. 80 RDSEG AIDA BRASIL Dezembro de 2015

Neste contexto, não poderia o juiz, ao analisar causas individuais, impor às empresas condenações por danos sociais, sob o argumento de que as práticas são reiteradas e, por isso, devem ser punidas com a aplicação do instituto do dano social. Isso seria a atribuição ao juiz, por ele próprio, de suprir o que ele entendeu ter sido uma omissão dos entes legitimados para propor a ação cabível. Ações individuais tem por objetivo precípuo a reparação do dano que determinada pessoa sofreu. Assim, eventual indenização paga terá (e deve ter) caráter estritamente reparatório/ compensatório. Na sistemática adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro, àquele que reivindica uma indenização por danos morais, não basta simplesmente afirmar ser titular do direito. Deve, efetivamente, demonstrar os elementos basilares da responsabilidade civil, quais sejam: (i) o ato danoso; (ii) o dano; (iii) o nexo de causalidade estabelecido entre o ato danoso e o dano e; (iv) a culpa do agente, na hipótese de responsabilidade subjetiva. Deve, neste contexto, justificar as razões pelas quais é merecedor de determinada indenização no valor que deve também ser apontado por ele, pois caracteriza- -se como dano moral a lesão do bem integrante da personalidade, tal como a honra, a liberdade, a saúde, a integridade psicológica, causando dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação à vítima. A utilização do instituto do dano social no Brasil, portanto, geraria o enriquecimento ilícito da vítima, o que é inadmissível e vedado expressamente pelo Código Civil, em seu art. 884 abaixo transcrito, e incentivaria uma verdadeira indústria de dano moral : Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido. A par disso, não há previsão no ordenamento jurídico brasileiro para a condenação de empresas ao pagamento de determinada quantia, a título de danos sociais. No direito brasileiro, como já dito, a reparação somente é cabível quando há dano efetivo, não podendo o pagamento de uma indenização se tornar um meio de punição civil. Em muitos casos, ainda, como dito, a empresa é condenada ao pagamento de danos sociais sem que isso tenha sido sequer aventado pela parte autora em sede de petição inicial, o que fere disposições basilares do próprio Código de Processo Civil ( CPC ). O art.128 do CPC é suficientemente claro ao determinar que O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte. No mesmo sentido, o art. 460 do CPC, expressamente veda ao Juiz a possibilidade de proferir sentença, a favor do RDSEG AIDA BRASIL Dezembro de 2015 81

autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que Ihe foi demandado. Aliás, por não ser eventual indenização destinada ao autor da ação, é fato que nenhuma decisão poderia afetar terceiros que não as partes envolvidas no litígio ou mesmo lhe conferir alguma vantagem econômica, nos exatos termos do que dispõe a legislação vigente. Para colocar uma pá de cal no assunto, ainda que tal pedido tenha sido efetivamente requerido em sede de petição inicial, não haveria a possibilidade de condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos sociais, na medida em que ninguém pode pleitear suposto direito da coletividade em nome próprio, tal como estampado no art. 6º do CPC. Não obstante o quanto acima exposto, a título de informação, o STJ ao decidir a Reclamação nº 13.200 - GO (2013/0197835-7) consignou que o artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal - inserindo em nosso ordenamento jurídico a cláusula geral da dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil -, permite o reconhecimento de novos direitos indenizáveis, além dos já previstos no Código Civil. (TARTUCE, Flávio. Ensaios sobre responsabilidade civil na pós-modernidade, v. 2/ Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka e José Fernando Simão, (Coord.) - Porto Alegre: Magister, 2009, p. 178-179). Além disso, no âmbito infraconstitucional, o artigo 944 do Código Civil dispõe que: a indenização mede-se pela extensão do dano. Segundo o STJ, a palavra dano no mencionado dispositivo legal abrange não só os danos individuais, materiais ou imateriais, mas também os danos sociais, difusos, coletivos e individuais homogêneos [...]. (Enunciado 455 da V Jornada de Direito Civil do CJF/STJ). Logo, embora essa Corte aplique a teoria do dano social ainda de forma muito tímida, de acordo com ela, não haveria dúvida de que o instituto teria previsão legal. No entanto, os danos sociais, difusos, coletivos e individuais homogêneos devem ser reclamados pelos legitimados para propor ações coletivas, o que não nos parece ser a interpretação mais adequada do instituto, pelos motivos já expostos acima. Conforme notícia veiculada no seu site, o Tribunal de Justiça de São Paulo, por sua vez, em decisão publicada em 31/07/2013, nos autos da apelação nº 0027158-41.2010.8.26.0564, condenou a Amil Assistência Médica Internacional a pagar indenização punitiva de cunho social, no valor de R$ 1.000.000,00. O valor deverá ser revertido ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 1. Vejamos a ementa do acórdão: PLANO DE SAÚDE. Pedido de cobertura para internação. Sentença que julgou procedente pedido feito pelo segurado, determinado que, por se tratar de situação de emergência, fosse dada a devida 1 Disponível em: http://www.tjsp.jus.br/institucional/canaiscomunicacao/noticias/noticia. aspx?id=19073. Acesso em: 13/09/15 82 RDSEG AIDA BRASIL Dezembro de 2015

cobertura, ainda que dentro do prazo de carência, mantida. DANO MORAL. Caracterização em razão da peculiaridade de se cuidar de paciente acometido por infarto, com a recusa de atendimento e, consequentemente, procura de outro hospital em situação nitidamente aflitiva. DANO SOCIAL. Caracterização. Necessidade de se coibir prática de reiteradas recusas a cumprimento de contratos de seguro saúde, a propósito de hipóteses reiteradamente analisadas e decididas. Indenização com caráter expressamente punitivo, no valor de um milhão de reais que não se confunde com a destinada ao segurado, revertida ao Hospital das Clinicas de São Paulo. LITIGÃNCIA DE MÁ FÉ. Configuração pelo caráter protelatório do recurso. Aplicação de multa. Recurso da seguradora desprovido e do segurado provido em parte. (Apelação nº 0027158-41.2010.8.26.0564, da Comarca de São Bernardo do Campo, em que é apelante/apelado AMIL AS- SISTENCIA MEDICA S A, é apelado/ apelante JOAO ANGELO GARBELIN (JUSTIÇA GRATUITA). 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo. O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores ENIO ZULIANI (Presidente sem voto), FÁ- BIO QUADROS E NATAN ZELINS- CHI DE ARRUDA) Grifo nosso. Na ação acima mencionada, o segurado ingressou com ação em face da empresa, pois esta teria recusado lhe prestar atendimento médico. Em primeira instância, a ação foi julgada procedente, sendo fixada indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00. Houve a interposição de recurso por parte da Amil, a qual alegou que o período de carência de 24 meses estabelecido no contrato deveria ser respeitado, razão essa pela qual houve a recusa no atendimento. Já o segurado, autor da ação, também interpôs recurso, sob o fundamento de que, pela angustia e pelo sofrimento que teve, a indenização por danos morais deveria ser majorada para 200 salários mínimos. Para a Turma julgadora, restou caracterizada a ocorrência do dano social, pois a prática da recusa dos atendimentos é reiterada e precisa ser coibida. Quanto ao dano moral, a Turma entendeu pela sua majoração, pois o paciente infartado precisou procurar outro hospital, ante a recusa do atendimento. Segundo os Desembargadores, a empresa teria utilizado tese ultrapassada em sua defesa, já que o artigo 35-C, I e II, da Lei 9.656/98 (acrescentados pela MP 2.177/01-44), impõe a obrigatoriedade de cobertura de atendimento nos casos de emergência ou urgência, e a Súmula nº 103 do TJ/SP dispõe que: É abusiva a negativa de cobertura em entendimento de urgência e/ou emergência a pretexto de que está em curso período de carência que não seja o prazo de 24 horas estabelecidos na Lei nº 9.656/98. Como visto, a utilização da teoria dos danos sociais e sua aplicação no direito brasileiro é um tema bastante controverso. Há quem defenda sua aplicação, RDSEG AIDA BRASIL Dezembro de 2015 83

e quem não. Nos Tribunais Brasileiros, também vemos essa divisão, mas os adeptos da tese, suportados por decisões do próprio STJ, como também visto, vêm crescendo. Portanto, esse assunto merece atenção, inclusive do mercado segurador, pois a indenização não pode se tornar um meio de punição civil, pois esse tipo de interpretação não se compatibiliza com o ordenamento jurídico brasileiro e pode gerar gastos vultosos para as seguradoras, especialmente pelo fato de que as negativas, pautadas sempre na legislação e nos contratos de seguro, podem ser entendidas como práticas reiteradas e, no entendimento do judiciário, que necessitam ser coibidas. 84 RDSEG AIDA BRASIL Dezembro de 2015