A Tilapicultura como Complementação Alimentar e Renda na Agricultura Familiar The tilapia as a food supplement and Income In Family Farming ZANON, Ricardo Basso 1, CAVALCANTI, Lidiany Doretto 2 ; SILVA, Maria Joyce dos Santos 3 ; COUTINHO, Jean Carlos dos Santos 4, CARRIJO MAUAD, Juliana Rosa 5 Universidade Federal da Grande Dourados, Dourados, MS, 1 ricardobzanon@gmail.com; 2 lidianydoretto@hotmail.com; 3 joyce_santos95@hotmail.com; 4 jeancoutinho11@hotmail.com; 5 julianacarrijo@ufgd.edu.br Resumo: A piscicultura vem ganhando importância no cenário agropecuário do país e o estado do Mato Grosso do Sul apresenta potencial para esta atividade. Além disso, a agricultura familiar precisa ser fortalecida. Assim, o trabalho objetivou caracterizar a viabilidade da implantação da tilapicultura em reservatório de água para irrigação e seus benefícios para a agricultura familiar, promovendo um sistema integrado e sustentável capaz de complementar a produção alimentos e a renda dos produtores. A piscicultura mostrou ser uma forma de diversificar a produção da propriedade gerando renda alternativa e alimento de altíssima qualidade. Palavras-chave: piscicultura, pequeno produtor, sustentabilidade. Abstract: Fish farming has gained importance in the Brazilian agricultural scenario and the state of Mato Grosso do Sul has potential for this activity. Furthermore, family farming needs to be strengthened. Thus, the study aimed to characterize the viability of implantation of tilapia in tanks for irrigation and its benefits for family farming, promoting integrated and sustainable system capable of complementary food production and farmers' incomes. Fish farming proved to be a way to diversify the production of the property generating alternative income and high quality food. Keywords: fish farming, small farmers, sustainability. Contexto A aquicultura é uma atividade em expansão no Brasil, decorrente das condições climáticas favoráveis e da disponibilidade hídrica (MPA, 2014). A produção nacional de pescado em 2014 foi de 474,33 mil toneladas, sendo que o estado do Mato Grosso do Sul contribuiu produzindo 60,95 mil toneladas. A cadeia produtiva de peixes tem se fortalecido no Brasil. Entretanto, em Mato Grosso do Sul, esta ainda encontra-se em construção devido a fatores
como processamento não tecnificado, dificuldades na comercialização, alto custo de produção e licenciamento ambiental, atrapalhando o desempenho produtivo na piscicultura. Neste cenário, dentre os peixes comercializados destaca-se a tilápia Oreochromis niloticus, com a despesca de 198,49 mil toneladas, cerca de 40% da produção brasileira oriunda de piscicultura (IBGE, 2015). A aceitação comercial da tilápia no cenário piscícola, pode ser atribuída por características da carne, tais como, sabor, textura e ausência de espinhos, além do alto valor organoléptico do pescado, adaptabilidade em diversas condições de manejo, crescimento elevado e rusticidade. No estado do Mato Grosso do Sul, as principais fontes lucrativas são a criação de gado, comercialização do leite, produção de grãos e hortifruti, desenvolvida através da agricultura familiar, sendo a piscicultura, geralmente, uma atividade complementar e alternativa de subsídio e geração de renda nas pequenas propriedades. A integração piscicultura com agricultura tem se tornado uma prática viável, sendo um fator primordial que visa a reutilização da água dos tanques de piscicultura como fonte de irrigação. Contudo, o descarte destas águas ricas em nutrientes no meio externo favorece a produtividade e se torna uma prática mais sustentável, além de reduzir os impactos ambientais e o uso de água (AZEVEDO et al., 2008). Neste contexto, o trabalho objetivou caracterizar a viabilidade da implantação da produção de Oreochromis niloticus em reservatório de água para irrigação e avaliar seus benefícios para a agricultura familiar, promovendo um sistema integrado e sustentável capaz de complementar a produção alimentos e a renda dos produtores. Descrição da Experiência A presente iniciativa surgiu no ano de 2015 e está em execução, sendo parte de um projeto de extensão entre a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e o Assentamento Itamarati, localizado em Ponta Porã-MS. A proposta inicial surgiu pelos assentados do Grupo 17 do assentamento, o qual procurou a Instituição de Ensino para apoiá-los em todas as fases de implantação da piscicultura no local, uma vez que outros produtos como hortaliças e algumas culturas já são produzidos pelos agricultores familiares do assentamento. Além da demanda do grupo pelo consumo de pescado, foram observados vários pontos favoráveis para a implantação como: área disponível para os tanques, água disponível, disponibilidade de mão de obra e principalmente a decisão do grupo em querer implantar essa nova atividade na sua rotina.
Nesta parceria a UFGD está participando com alunos do Curso De Ciências Biológicas e ambientais, professores de diferentes áreas e pós-graduandos, todos com conhecimento na área, sendo disponibilizados equipamentos necessários ao desenvolvimento do projeto. Por sua vez, o assentamento disponibilizou os tanques, alevinos e a mão de obra. A extensão engloba assessoria no dimensionamento dos viveiros, viabilidade econômica, preparação da água para receber os alevinos, dimensionamento da produção, densidade de estocagem, fases de crescimento, uso de aeradores, alimentação, controle de qualidade de água, sanidade e despesca. Foram disponibilizados dois tanques lonados de 1.000 m 3 cada para a implantação do projeto. Estes tanques eram reservatórios de água para irrigar a horta da propriedade. Neste sistema, como a água era bombeada para a irrigação e ocorria perdas por evaporação, diariamente teve-se a troca de água, obtida de poço artesiano. Do poço, a água foi armazenada em uma caixa de água suspensa. Acoplou-se um sistema de aeração artesanal à água que chegava por gravidade, aos viveiros. Utilizou-se ração comercial para tilápias correspondente à cada fase de criação: alevino, juvenil e terminação, sendo os peixes alimentados até aparente saciedade, duas vezes ao dia (08:00hs e 15:00hs). Os alevinos de Oreochromis niloticus, já revertidos e pesando 0,5 g, foram obtidos de piscicultura comercial e o povoamento (1250 alevinos por tanque) foi feito prevendo uma mortalidade de 20% em todo o processo produtivo. Para a implantação desta experiência, utilizando mão de obra e maquinário próprio, os produtores tiveram um custo inicial de R$ 3.100,00. Salienta-se que neste montante não estão computados gastos com energia elétrica e com ração para peixes, somente material geral como lona, encanamento, transporte, combustível, participações em treinamentos e capacitações técnicas na área, e a aquisição dos alevinos. Resultados Por ser o primeiro projeto de piscicultura a ser implantado na propriedade, inicialmente optou-se por avaliar a sua capacidade produtiva dos tanques em um sistema intensivo de tilapicultura que possibilitasse a despesca ao final do ciclo produtivo de dois peixes por metro cúbico.
TABELA 1: Dados zootécnicos da tilapicultura em viveiros lonados. Variáveis de desempenho Tanque 1 Tanque 2 Peso médio inicial (g) 0,5 0,5 Peso médio final (g) 625 715 Ganho de peso diário médio (g) 2,44 2,64 Biomassa inicial (kg) 6,25 6,25 Biomassa final estimada (kg) 662,5 715 Ganho de biomassa estimada (kg) 656,25 708,75 O projeto está em andamento e, até o momento, têm-se os dados referentes ao desempenho zootécnico dos animais até os 271 dias de criação (TABELA 1). Estes valores zootécnicos, que auxiliam na avalição dos dados e na formação das conclusões, indicam que o desempenho dos peixes foi de acordo com o esperado para espécie nas condições de produção apresentadas. Por exemplo, o ganho de peso diário ficou próximo ao obtido por Cardoso Filho et al. (2010) e indicados por Kubitza et al. (2004). O peso final médio dos peixes, aos 271 dias experimentais, foi de 625 gramas e 715 gramas para os tanques 1 e 2, respectivamente (Figuras 1; 2 e 3). Estes dados também estão dentro do padrão de crescimento da espécie para este tempo de cultivo. No entanto, destaca-se que a eficiência produtiva poderia ser ainda melhor caso não fosse enfrentado efeitos ambientais negativos sobre o sistema, uma vez que em dois momentos, aos 100-120 e 150-170 dias, a alimentação precisou ser suspensa pois os animais não consumiram alimento devido ao estresse causado por calor (acima de 34 o C). Com isso, não houve crescimento e, consequentemente, ganho de peso nesta fase produtiva (Figuras 4 e 5).
Figura 1: Acompanhamento do peso médio das tilápias, a cada 30 dias, produzidas nos dois tanques (n=10 peixes por análise). Figura 2: Relação peso x comprimento das tilápias do tanque 1, a cada 30 dias (0-271 dias) (n=10 peixes por análise).
Figura 3: Relação peso x comprimento das tilápias do tanque 1 a cada 30 dias (0-271 dias) (n=10 peixes por análise). Figura 4: Ganho de peso por espécimes de tilápias, por período produtivo (n=10 peixes por análise).
Figura 5: Média (a cada 30 dias) do ganho de peso diário individual das tilápias no decorrer da criação (n=10 peixes por análise). Quanto a problemas sanitários e qualidade de água, não houve nenhum surto epizoótico por bactérias ou parasitas, bem como os parâmetros de qualidade de água avaliados estiveram sempre dentro parâmetros considerados normais em piscicultura (TABELA 2). TABELA 2: Média dos valores obtidos para a qualidade da água na tilapicultura. Parâmetro Tanque 1 Tanque 2 O 2 (mg L -1 ) 2,8 3,1 Temperatura ( o C) 21,7 21,6 ph 8,11 7,82 Condutividade (µm/cm) 23,5 25 TDS (ms/cm) 12 12,5 Amônia (mg L -1 ) 0,1 0,1 Nitrito (mg L -1 ) 0,025 0,025 Assim, conclui-se que a piscicultura mostrou ser uma atividade que pode ser implantada nas propriedades de agricultores familiares da região avaliada. Principalmente quando se tem a possibilidade de usar reservatórios já existentes na propriedade. Especificamente neste caso, o fato de utilizar água destinada à
irrigação de produção de plantas, aspectos sustentáveis também são contemplados. O resíduo da piscicultura que é altamente nutritivo para os vegetais pela elevada concentração de compostos nitrogenados e fósforo, principalmente, que acaba sendo tóxico para os peixes, pode ser direcionado para a produção agrícola, aproveitando um resíduo da própria propriedade. Ainda, destaca-se que as pessoas envolvidas aderiram e conseguiram desempenhar a proposta em questão. No entanto, a assistência técnica se mostrou imprescindível para o sucesso da atividade, principalmente relacionados ao manejo alimentar para evitar problemas relacionados à qualidade da água, à saúde dos animais e, consequentemente, à produção. A piscicultura mostrou-se, assim, uma forma de incrementar e diversificar a produção da propriedade gerando renda alternativa e alimento de altíssima qualidade. Como esta experiência está sendo positiva, no ciclo seguinte pode-se recomendar um aumento na densidade para três peixes por metro cúbico para avaliar se o sistema pode ser, ainda, melhor explorado do ponto de vista produtivo. Referências KUBITZA, F.; ONO, E.A.; LOVSHIN, L.L.; SAMPAIO, A.V. 4 ed. Planejamento da produção de peixes. Jundiaí: F. Kubitza, 2004. 58p. AZEVEDO, C. M. D. S. B., SIMÃO, B. R., ALMEIDA, C., SILVA, J. F., & COSTA, M. P. Desempenho produtivo de tilápias em viveiros intermitentemente drenados para irrigação. Revista Caatinga 21.1 2008. CARDOSO FILHO, RUY; CAMPECHE, DANIELA F. B.; PAULINO, RENATA V. Tilápia em reservatório de água para irrigação e avaliação da qualidade da água. Revista Brasileira de Ciencias Agrárias, Vol. 5, Núm. 1, 2010, pp. 117-122. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA IBGE. Produção da Pecuária Municipal 2014 Brasil. v. 42, n.01, p. 1-39, 2015. MINISTÉRIO DA PESCA E AQUICULTURA MPA. Potencial brasileiro. Quarta, 18 de junho de 2014. Brasília DF: MPA, 2014.