O LICENCIAMENTO AMBIENTAL DE PEQUENAS CENTRAIS HIDRELÉTRICAS E A SUA EFETIVIDADE NO PLANEJAMENTO TERRITORIAL DA BACIA DO RIO UBERABINHA-MG

Documentos relacionados
Dispõe sobre procedimentos para o licenciamento ambiental no âmbito da Secretaria do Meio Ambiente.

Aspectos Jurídicos e Ambientais das PCHs. Jason T. Ferrari

Auditoria de Meio Ambiente da SAE/DS sobre CCSA

Curso de Formação em Licenciamento e Fiscalização Ambiental. Marconi Vieira da Silva Engenheiro Ambiental Hybsen Silva Pinheiro Engenheiro Agrônomo

ANEXO 2 - TERMO DE REFERÊNCIA PLANO DE CONTROLE AMBIENTAL SIMPLIFICADO PCAS I. CONTEÚDO MÍNIMO DO PLANO DE CONTROLE AMBIENTAL SIMPLIFICADO PCAS

Plano Anual de Auditoria PAA-2016

Relatório elaborado pela. ONG Sustentabilidade e Participação

Sub Bacia: Rio Paracatu

O CONGRESSO NACIONAL decreta: CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Lei nº de 24 de julho de 2000.

REVISÃO ORDINÁRIA DAS GARANTIAS FÍSICAS DAS GERADORAS DE ENERGIA ELÉTRICA. Vítor F. Alves de Brito outubro/2014

I. Descrição das ações de auditoria interna realizadas pela entidade durante o exercício de 2015:

TERMO DE REFERÊNCIA PARA ELABORAÇÃO DO RELATÓRIO AMBIENTAL PRÉVIO RAP

MINUTA INSTRUÇÃO NORMATIVA LICENCIAMENTO PARA CONCESSÃO FLORESTAL. Versão - 15 junho 2007 MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE

EQUIPE DE QUALIDADE E GESTÃO AMBIENTAL (DQGA)

VOTO. INTERESSADO: Faixa Azul Indústria de Móveis para Escritório Ltda.

Contrata Consultor na modalidade Produto

POLÍTICA DE RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL CREDITÁ S.A. Crédito, Financiamento e Investimento

ARGANIL INVESTE MAIS REGULAMENTO DE APOIO A INICIATIVAS ECONÓMICAS DE INTERESSE MUNICIPAL. Nota Justificativa

B Central de Armazenamento de Gás Natural Liquefeito 3

Política de Responsabilidade Socioambiental - (PRSA) Política de Responsabilidade Socioambiental (PRSA).

DECRETO Nº 2.655, DE 02 DE JULHO DE 1998

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO SECRETARIA DE DEFESA AGROPECUÁRIA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 25, DE 15 DE ABRIL DE 2003

Consulta à Sociedade: Minuta de Resolução Complementar sobre Acreditação de Comitês de Ética em Pesquisa do Sistema CEP/CONEP

Licenciamento Ambiental de Plantas de Biogás

SENADO FEDERAL PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 185, DE 2011.

RESOLUÇÃO CONJUNTA ANA, IEMA E IGAM Nº 553, DE 8 DE AGOSTO DE 2011

Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) Procedimentos de licenciamento ambiental

Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança EIV

Cronograma - Seguindo o plano de metas da USP para 2015

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

O exame de processos de outorga de concessão deve conter em sua introdução as informações básicas relativas ao tipo de processo.

Sustentabilidade no Setor Público, A3P e Planos de Logística Sustentável

Conselho Municipal de Habitação

ANÁLISE DE PRÉ-VIABILIDADE TÉCNICA, ECONÔMICA E AMBIENTAL DA IMPLANTAÇÃO DE UMA USINA SOLAR FOTOVOLTAICA EM CONSÓRCIO COM A REABILITAÇÃO DE ÁREAS

Título do Case: Categoria: Temática: Resumo: Introdução:

Referência: Licença de Operação (Transporte de Resíduos) Atividade objeto do licenciamento: Código DN 74/04 Descrição

Acordo de Acionistas. do Grupo CPFL Energia. Atual Denominação Social da Draft II Participações S.A.

POLÍTICA DE RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL DO BANCO DA AMAZÔNIA

Gerenciamento do Escopo do Projeto (PMBoK 5ª ed.)

Nº 009 Setembro/

Processo de planejamento participativo do Plano Diretor Aspectos metodológicos

Fundamentos de Teste de Software

Institui, na forma do art. 43 da Constituição Federal, a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia SUDAM, estabelece a sua composição, natureza

RELATÓRIO SOBRE A GESTÃO DE RISCOS BANCO ABN AMRO S.A. Setembro de 2013

Minuta Circular Normativa

Seminário Internacional Trabalho Social em Habitação: Desafios do Direito à Cidade. Mesa 2: AGENTES PÚBLICOS, NORMATIVOS E DIREÇÃO DO TRABALHO SOCIAL

MINUTA DECRETO Nº, DE_ DE_ DE ALBERTO GOLDMAN, Governador do Estado de São Paulo, no uso de suas atribuições legais,

GOVERNO DO ESTADO DE ALAGOAS SECRETARIA DE ESTADO DA GESTÃO PÚBLICA SUPERINTENDÊNCIA DA ESCOLA DE GOVERNO REGULAMENTO DO CONCURSO DE AÇÕES INOVADORAS

Portaria n.º 106, de 25 de fevereiro de CONSULTA PÚBLICA

POLÍTICA DE INVESTIMENTOS DA BRASKEM

CAPÍTULO I DA NATUREZA E DOS OBJETIVOS

CURSO GESTÃO PÚBLICA E ELABORAÇÃO DE PROJETOS SUSTENTÁVEIS

EDITAL PARA SELEÇÃO DE ESTUDANTES MONITORES PARA O CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO

Evolução do Orçamento Público

Dos Serviços de Obras, Arquitetura, Engenharia e Tecnologia, Sanitária.

Manual. Alambique. A Engenharia nos Empreendimentos. Anexo VIII

Gestão de PCB: Visão do Setor de Distribuição

II Projeto de Educação Ambiental dos Trabalhadores

EDITAL N 001/2016 DG

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo, Editora Atlas,

2. ATOS DO DIRETOR-GERAL

Experiência: Gestão Estratégica de compras: otimização do Pregão Presencial

Senado Federal Subsecretaria de Informações DECRETO Nº 2.794, DE 1º DE OUTUBRO DE 1998

NORMA DE ELABORAÇÃO DE INSTRUMENTOS NORMATIVOS - NOR 101

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO-OESTE - UNICENTRO CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM MÍDIAS NA EDUCAÇÃO JULIANA LEME MOURÃO ORIENTADOR: PAULO GUILHERMETI

RESOLUÇÃO CONSEPE/UFERSA Nº 007/2010, de 19 de agosto de 2010.

Land Tenure Regularization in Urban Protected Areas. Preliminary considerations from ongoing experience

Pólos de Educação Permanente em Saúde: a participação na Roda de Gestão

Desafios do saneamento básico em face da crise hídrica

Política de Responsabilidade Socioambiental Sulcredi São Miguel

SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL Gabinete do Reitor

SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE

GLOSSÁRIO PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO

PALAVRAS-CHAVE Handhelds, Manutenção de Subestação, Tecnologia da Informação.

Demonstração do Ativo Líquido por Plano de Benefícios - TVA

2. Sobre a importância socioeconômica e a viabilidade do empreendimento, a SECEX/SP registra o seguinte:

DECRETO N 1801/2012 DECRETA:

REGULAMENTO DO NÚCLEO DE ESTUDOS COMPORTAMENTAIS (NEC) DA COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS

Defender interesses difusos e coletivos, defender o regime democrático e a implementação de políticas constitucionais.

Estudo de Caso Reutilização de Água em Usina de Destilaria de Etanol Hidratado e Fabricação de Açúcar Através de Torres de Resfriamento

FORMAÇÃO DOCENTE NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA DO CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIRG

Considerando a Lei Municipal nº 495, de 27 de novembro de 1991, que criou o Fundo de Aposentadoria e Pensões FAPEN, resolve:

RESOLUÇÃO CONSUN N.º 008/2010. O Conselho Superior da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul - UERGS, no uso de suas atribuições e

IMPACTO DA ATIVIDADE FISCALIZATÓRIA SOBRE A MELHORIA DA QUALIDADE NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO DE DRENAGEM URBANA NO DISTRITO FEDERAL

Conselho Municipal de Meio Ambiente CONSEMAC Câmara Setorial Permanente de Educação Ambiental CSPEA Parecer 03/2013 Março 2013

LICENÇA DE INSTALAÇÃO LI

Tema: Fachadas Ativas. Palestrante: Thomaz Assumpção

11. Ciclo de Gestão do Governo Federal

Art. 5º - A operação do SIDS será executada segundo as diretrizes enunciadas no art. 4º da Lei nº , de 2001.

REGULAMENTO DA APRESENTAÇÃO

Minuta de Instrução Normativa

Projeto 10Envolver. Nota Técnica

FORMULÁRIO DE SOLICITAÇÃO DE ABERTURA DE PROCESSO - FAP EMPREENDIMENTO: EMPREENDIMENTOS MILITARES

SISEMA. Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos. POLÍCIA MILITAR D E M I N A S G E R A I S Nossa profissão, sua vida.

SECRETARIA DE DESENVOLVIMENTO ECÔNOMICO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA SISTEMA INTEGRADO DE LICENCIAMENTO

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

1 Sobre os aspectos legais da abrangência da Lei de 29/07/2013

Ministério da Educação Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Acre Pró-Reitoria de Extensão - PROEX

Transcrição:

O LICENCIAMENTO AMBIENTAL DE PEQUENAS CENTRAIS HIDRELÉTRICAS E A SUA EFETIVIDADE NO PLANEJAMENTO TERRITORIAL DA BACIA DO RIO UBERABINHA-MG GelzeSerrat de Souza Campos Rodrigues Universidade Federal de Uberlândia gelcampos@ig.ufu.br Rafael Mendes Rosa Ekos Planejamento Ambiental rafaelmendesr@hotmail.com EIXO TEMÁTICO: GEOECOLOGIA DAS PAISAGENS, BACIA HIDROGRÁFICAS, PLANEJAMENTO AMBIENTAL E TERRITORIAL Resumo O planejamento do Estado de Minas Gerais, desde 2003, tem se dado por meio de Projetos Estruturadores, os quais procuram, desde então, intensificar a atuação do governo estadual na gestão ambiental, por meio do uso de uma série de instrumentos, dentre os quais o licenciamento ambiental. Concomitantemente, uma das metas do planejamento energético estadual é a expansão do número de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) no Estado, justificada pela demanda energética das atividades produtivas e pelo menor impacto ambiental causado pela implantação de tais empreendimentos quando comparado ao de uma Usina Hidrelétrica. Nesse contexto, o presente trabalho, parte de uma pesquisa que analisa o uso dos instrumentos de planejamento ambiental no município de Uberlândia, oeste do Estado de Minas Gerais, apresenta o atual quadro de implantação sequencial das PCHsem uma das principais bacias hidrográficas do município, a Bacia do Rio Uberabinha, e o alcance de seus respectivos licenciamentospara a qualidade ambiental do município. Para tanto foram realizadas pesquisas documentais, trabalhos de campo e verificado que, de modo contraditório, a avaliação dos impactos ambientais, contida nos diferentes processos de licenciamento, baseada na análise dos efeitos de cada empreendimento sobre as potencialidades e fragilidades socioambientais da bacia hidrográfica em questão, nãoalcança a necessária avaliação dos impactos sinérgicos e cumulativos derivados da sua implantação sequencial. Palavras-chave: Pequenas Centrais Hidrelétricas, licenciamento ambiental, Rio Uberabinha. Abstract The planning of the State of Minas Gerais has been done by Structuring Projects, which seek, since 2003, intensify the performance of the state government environmental management with the use of a variety of instruments, among whichenvironmental licensing. Concomitantly, one of the goals of stateenergy planning is to expand the number of Small Hydro Power (SHP) in the state, justified by the energy demand of the productive activities and the least environmental impact caused bythe implementation of these projects when compared to a hydroelectric plant. The present study is part of a research that examines the use of instruments of environmental planning in the municipality of Uberlândia, west of Minas Gerais, and presents the current picture of sequential implementation of SHPs on a major river basin of the municipality, River BasinUberabinha, and the scope of their licenses to the environmental quality of the municipality. To achieve this, we conducted documentary research, field work and found that, in a contradictory way, the assessment of environmental impacts contained in the differentenvironmental studies, based on analysis of the effects of each project on social and environmental potentialities and fragilities of the river basin,does not achieve the necessary evaluation of the synergistic and cumulative impacts resulting from their SHP sequential implementation. Keywords: Small Hydropower, environmental licensing, Uberabinha River. 1117

Introdução Atualmente, o Brasil vive um momento de expansão da implantação de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). O Banco de Informações de Geração da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) aponta que em fevereiro de 2012, as PCHseram responsáveis por 3,31% da matriz energética do país, havendo 60 empreendimentos em construção e 167 com o aproveitamento hidrelétrico outorgado na ANEEL.Em Minas Gerais, há a previsão para o período entre 2007-2027, conforme o Programa de Geração Hidrelétrica (PGHMG), da construção de 335 PCHs, muitas delas, sendo instaladas de modo sequencial no mesmo curso d água. Apesar dos novos empreendimentos passarem pelo processo de licenciamento ambiental, verifica-se que grande parte dos estudos ambientais têm sido elaborados e analisados pelos órgãos licenciadores de forma isolada, ou seja, considerando os empreendimentos de forma separada, apesar de estarem localizados na mesma bacia hidrográfica. Por meio do levantamento documental dos Estudos de Impacto Ambiental das PCHs já licenciadas, trabalhos de campo e leitura das referências pertinentes, o presente trabalho objetiva caracterizar e discutir a efetividade do licenciamento ambiental e analisar as especificidades de sua utilização no município de Uberlândia, oeste de Minas Gerais, no que tange à implantação sistemática de Pequenas Centrais Hidrelétricas em um dos principais rios da região, o Rio Uberabinha. A expansão das Pequenas Centrais Hidrelétricas no Estado de Minas Gerais De acordo com a Resolução n 394/1998 da Agência Nacional de Energia Elétrica, são consideradas como Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) os aproveitamentos hidrelétricos com configuração básica cuja potência é de 1MW a 30MW e área total de reservatório igual ou inferior a 3 Km². No início do século passado, as centrais hidrelétricas com pequena potência instalada (abaixo de 30 MW), eramconstruídas para suprir a necessidade de energia das poucas e pequenas fábricas, sendo à noite, parte dessa energia dirigida às residências e iluminação pública. Tal processo ainda pode ser observado por meio das ruínas dessas antigas PCHsainda presentes em rios de vários municípiosdo Estado, como Dores de Indaiá e Pratinha (foto 1). 1118

Foto 1 Ruínas de antiga PCH localizada no rio Funchal, Dores de Indaiá, MG, em 2008. Autora: RODRIGUES, G. S. S. C., 2008 Com a industrialização, urbanização e consequente aumento de demanda de energia, deu-se preferência, a partir de meados do século XX, à construção de grandes usinas hidrelétricas. Entretanto, a partir do início desse século, as PCHs recuperam novamente o seu poder atrativo, com o impulso do governo federal, por meio do Programa de Incentivo às Fontes de Alternativas de Energia Elétrica (PROINFRA), criado pelo Decreto nº 5.025, de 2004, que passa a estimular o investimento em PCHs, assegurando a compra de energia produzida. Além disso, devido às restrições ambientais decorrentes dos processos de licenciamento das usinas hidrelétricas, passa-se a considerar mais viável ambientalmente a construção de uma PCH, quetem reduzida e limitada área de reservatório e, por conseguinte, conceitualmente provocaria impactos de menor magnitude ao meio ambiente. Economicamente também é um empreendimento vantajoso, já que possui custos e tempo menor para construção, além de serem dispensadas do pagamento da compensação financeira pelo uso de recursos hídricos na fase de operação, diferentemente das usinas hidrelétricas. Dessa forma, em Minas Gerais, passa-se a haver uma dinamização no processo de construção de PCHs, seguindo inclusive uma das metas do Programa de Geração Hidrelétrica em Minas Gerais 2007-2027 (PGHMG), ou seja, a expansão de usinas hidrelétrica para o suprimento das necessidades energéticas de todo o Estado, bem como ageração de excedentes exportáveis para comercialização no restante do território brasileiro (ARCADIS, 2007, p. 15), através da implantação de 380 novos 1119

empreendimentos hidrelétricos, onde 335 são PCHs, totalizando um acréscimo de 3.591MW de energia em todo Estado. A empresa responsável, no Estado, pelo setor, é a Companhia Energética do Estado de Minas Gerais (CEMIG), a qual também vem promovendo a atração, intensificação e construção de PCHs, com fundos específicos para ampliar o parque gerador. Neste sentido, [...] a CEMIG definiu, no final de 2004, programa de investimentos (Minas PCHs) contemplando cerca de R$ 1,0 bilhão para a primeira fase, envolvendo a geração de 400 MW. A meta estabelecida foi a instalação de 252 PCHs com potencial energético de 2.800 MW (ARCADIS, 2007, p. 15). O licenciamento ambiental de Pequenas Centrais Hidrelétricas em Minas Gerais O licenciamento ambiental adquire status de instrumento de controle ambiental em Minas Gerais com as regulamentações federal e estadual, sobretudo a Lei 6.938/1981, que institui a Política Nacional de Meio Ambiente, e as Resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) 01/1986 e 237/1997, além da Política Estadual de Meio Ambiente, Lei 7.772/1980. Em Minas Gerais, os processos de licenciamento ambiental são analisados de maneira interdisciplinar desde o ano de 2003, realizada por analistas ambientais da Superintendência Regional de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SUPRAM), autarquia vinculada à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), abrangendo técnicos de três órgãos: Instituto Estadual de Florestas (IEF), Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM) e Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM). O processo contempla basicamente três fases: Licença Prévia (LP): concessão durante a fase de planejamento das atividades, conforme análise do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). O Relatório de Controle Ambiental (RCA) cabe aos empreendimentos de menor complexidade (SEMAD, s/ data; RODRIGUES, 2011); Licença de Instalação (LI): autoriza de fato a implantação do empreendimento desde que a etapa anterior seja cumprida. Nessa fase, analisa-se o Plano de Controle Ambiental (PCA) (SEMAD, s/ data; RODRIGUES, 2011); Licença de Operação: trata-se de verificar a correta instalação e operação dos empreendimentos aprovados nas fases anteriores (RODRIGUES, 2011). Desse modo, uma das principais fases do licenciamento ambiental é aquela da licença prévia, tendo em vista que nessa etapa são avaliados todos os possíveis impactos decorrentes de uma determinada tipologia de empreendimento, sendo possível negar-se a sua instalação. Após análise técnica no órgão licenciador, o processo de licenciamento ambiental é encaminhado à Unidade Regional Colegiada (URC) do Conselho de Política Ambiental (COPAM) da 1120

região do Estado onde o empreendimento pretende instalar-se. A URC é um órgão deliberativo e normativo, composto por vinte membros titulares, dos quais 50% são representantes do poder público estadual e municipal e 50% da sociedade civil (empreendedores, ONGs, instituições de pesquisa, profissionais liberais e outras entidades vinculadas à área ambiental). O COPAM é responsável, portanto, pela concessão das licenças ambientais, tendo como base a análise técnica efetuada pelo órgão licenciador e os interesses das instituições representadas. Os estudos ambientais para os processos de licenciamento ambiental das barragens para produção de energia hidrelétrica são focados na apresentação da estrutura básica do barramento e reservatório, bem como nos diagnósticos biofísicos e socioeconômicos da área direta e indiretamente afetada. Com a proposição da realização de programas ambientais voltados à conservação da fauna silvestre, ictiofauna, socioeconômicos (prospecção arqueológica e educação patrimonial, comunicação social, educação ambiental e saúde), praticamente todos os impactos ambientais são avaliados como mitigáveis, permitindo a ênfase, durante o processo de licenciamento prévio, dos efeitos econômicos benéficos da ampliação da produção energética causados pela implantação de tais empreendimentos e a concessão da licença ambiental. Pequenas Centrais Hidrelétricas no Rio Uberabinha A bacia do Rio Uberabinha está localizada no Triângulo Mineiro, porção oeste do Estado de Minas Gerais, sendo afluente da margem esquerda do Rio Araguari. Suas nascentes estão localizadas no município de Uberaba, no entanto, sua maior extensão está no município de Uberlândia. Tem como principais tributários os Ribeirões Beija-Flor, Bom Jardim e o Rio das Pedras, tratando-se de um manancial importante, pois abastece a cidade de Uberlândia e propriedades rurais do município. Atualmente, ao longo do curso d água já estão em operação duas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs): a mais antiga, PCH Martins, em operação desde 1947,e a PCH Malagone, em operação desde 2011; uma em implantação: PCH Cachoeira do Miné; uma em processo de licenciamento prévio: PCH Dias; e, outra com a avaliação do potencial hidroenergético realizada: PCH Bom Jardim (quadro 1). 1121

Quadro 1 Dados das novas PCHs na bacia do rio Uberabinha. Empreendimento Potência (MW) Área Alagada (ha) Status PCH Bom Jardim 3,10 85 Potencial PCH Cachoeira do Miné 16,00 300 Implantação PCH Dias 7,40 05 Potencial PCH Malagone 19,00 109 Operação PCH Martins 7,7 20 Operação Fonte: PGHMG 2007-2027 (ARCADIS, 2007, p. 21) e BIG/ANEEL (adaptado). A PCH Martins Alto (foto2), pertencente à Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG), é uma usina com potência de 7,70 MW, sendo o mais antigo empreendimento hidrelétrico na Bacia do Rio Uberabinha. Sua Licença Ambiental de caráter Corretivo 1 encontra-se paralisada na Superintendência Regional de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba (SUPRAM-TM/AP). Foto 2 Vertedouro da PCH Martins. Autora: Rodrigues, G. S. S. C. (2008). 1 De acordo com a SEMAD (s/ data), o Licenciamento de Operação Corretivo (LOC) opõe-se ao Preventivo, uma vez que este último é solicitado em um estágio inicial de planejamento, antes de intervenções no local de instalação, enquanto a LOC é requerida quando o empreendimento estiver na fase de operação sem a Licença Prévia (LP) e Licença de Instalação (LI). 1122

A outra usina em operação, a PCH Malagoneestá localizada a jusante da PCH Martins, e possui Licença de Operação deferida desde dezembro de 2009. O empreendimento pertence a holding Wanerg Energética Ltda. De acordo com a Ata da 144ª Reunião Ordinária do Conselho de Política Ambiental (COPAM) 2, foram afetadas 19 propriedades no município de Uberlândia. A maioria dos empregos gerados pela PCH foi ocupada por mão-de-obra da região, representando um total de 82% dos colaboradores (COPAM, Ata da 144ª reunião ordinária, 2009). Na Bacia do Rio Uberabinha,a PCH Cachoeira do Miné (foto3), também pertencente a Wanerg Energética Ltda., encontra-se com a Licença de Instalação concedida desde 2008, mas até o final de 2011, as obras não haviam sido iniciadas. Foto 03 Cachoeira do Miné, parcialmente submersa pelo remanso da PCH Martins. Autor: Rosa, R.M. (2011). A PCH Dias (foto5), também pertencente à Wanerg Energética Ltda., é outro empreendimento previsto pelo PGHMG 2007-2027, e cuja licença prévia encontra-se em análise no 2 OCOPAM é um órgão normativo, colegiado, consultivo e deliberativo, subordinado à SEMAD (SEMAD, s/data). As reuniões ordinárias são realizadas normalmente uma vez ao mês para haja aprovação dos processos de licenciamento ambiental por parte dos conselheiros. 1123

órgão licenciador, desde 2008. A localização é próxima à área urbana do município de Uberlândia e deverá ser a terceira usina a ser instalada em sequência, no curso do rio Uberabinha. Foto 5 Lugar previsto para implantação da PCH Dias, com a Cachoeira Dias ao fundo. Autora: Rodrigues, G. S. S. C. (2008). A hidrelétrica com a menor potência é a PCH Bom Jardim, cerca de 3,10 MW, cuja localização encontra-se à montante das demais usinas. Embora seja prevista a instalação desta PCH, não há registro de protocolo do licenciamento ambiental, na forma de Licença Prévia. De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), por intermédio do Despacho n 4.329, de 20 de novembro de 2009, há possibilidade de aproveitamento hidrelétrico pela PCH Buriti, localizada entre a PCH Martins Alto e PCH Dias, com potência de 8,9 MW. Os empreendimentos hidrelétricos podem ser localizados e visualizados sequencialmente no mapa 1, que também contempla resumidamente a situação referente aos respectivos processos de licenciamento ambiental. 1124

Mapa 1 Mapa de localização das PCHs na bacia do rio Uberabinha-MG. Considerações finais Conforme a descrição da situação dos processos de licenciamento ambiental das PCHs instaladas na bacia do Rio Uberabinha, faz-se necessário uma discussão crítica acerca do efetivo uso do licenciamento ambiental como instrumento de gestão, pois se verifica que não há contribuição efetiva na proteção ambiental da bacia, pautada na sustentabilidade. Durante o período de pesquisa analisou-se os únicos EIA/RIMAelaborados até o momento, das PCHsMalagone e Miné, constatando-se que na realidade tais estudos são mera formalidade e servem apenas para cumprir a obrigatoriedade que a legislação impõe.nos documentos há o diagnóstico ambiental e a identificação dos vários problemas existentes na bacia hidrográfica: mineração, agricultura, indústrias, poluição do manancial, abastecimento público, entre outros, entretanto, tais observações são diluídas diante do viés econômico para a implantação dos empreendimentos. 1125

Apesar do licenciamento ambiental mineiro confluir para uma visão integrada na avaliação dos efeitos ambientais decorrentes das atividades antrópicas, a peculiaridade da implantação sequencial de PCHsimpõe a reflexão sobre novas propostas de elaboração e avaliação de impactos ambientais, pois do modo individualizado em que é realizado atualmente, não consegue avaliar de forma mais precisa a magnitude dos impactos cumulativos e sinérgicos dos barramentos na bacia hidrográfica. Referências AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. Despacho n 4.329, de 20 de novembro de 2009. Nota técnica n 406/2009-SGH/ANEEL. AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. Resolução n 394, de 04 de dezembro de 1998. Estabelece os critérios para o enquadramento de empreendimentos hidrelétricos na condição de pequenas centrais hidrelétricas. Disponível em: <http://www.aneel.gov.br/cedoc/res1998394.pdf> acesso 23 de mar. 2011. ARCADIS. Avaliação ambiental estratégica: Programa de geração hidrelétrica em Minas Gerais PGHMG 2007-2027. Produto 6 - Relatório Final, 2007. BRASIL. Lei nº 6.938/1981. Dispõe sobre a Política Nacional de Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação. Brasília, 1981. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br> acesso em 12 de dezembro de 2011. CONSELHO DE POLÍTICA AMBIENTAL (Minas Gerais). Ata detalhada da 144ª plenária ordinária, de 18 de dezembro de 2009. Disponível em: <http://www.conselhos.mg.gov.br/uploads/7/file/ata%20da%20144%c2%aa%20plen%c3%a1ria% 20Ordin%C3%A1ria%20-%20detalhada.pdf> acesso em 21 de janeiro de 2012. CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. Resolução CONAMA n 01/86. Dispõe sobre critérios e diretrizes para Estudos e Relatórios de Impacto Ambiental. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res86/res0186.html> acesso em 12 de dezembro de 2011. CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. Resolução CONAMA nº 237/97. Dispõe sobre os procedimentos e critérios utilizados no licenciamento ambiental, bem como sobre as atividades e empreendimentos sujeitos ao licenciamento ambiental. MINAS GERAIS. Lei nº 7.772, de 08 de setembro de 1980. Dispõe sobre a proteção, conservação e melhoria do meio ambiente. Minas Gerais, 1980. Disponível em: <http://www.siam.mg.gov.br>acesso em 19 de fevereiro de 2012. 1126

RODRIGUES, G. S. S. C. A análise interdisciplinar de processo de licenciamento ambiental no estado de Minas Gerais: conflitos entre velhos e novos paradigmas. Sociedade & Natureza, Uberlândia, 2010, p. 267-282. RODRIGUES, G. S. S. C. Os instrumentos de gestão da política ambiental do estado de Minas Gerais e a expansão da cana-de-açúcar no triângulo mineiro, Brasil. Revista Geográfica de América Central. Número Especial EGAL, 2011- Costa Rica, 2011, pp. 1-12. SECRETARIA DE ESTADO DE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. Disponível em: <http://www.semad.mg.gov.br/copam> acesso em 19 de fevereiro de 2012. SECRETARIA DE ESTADO DE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. Disponível em <http://www.semad.mg.gov.br/regularizacaoambiental/licenciamento> acesso em 19 de fevereiro de 2012. SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DE MEIO AMBIENTE. Parecer Único. SUPRAM. Disponível em: <http://www.semad.mg.gov.br/copam/urcs/triangulo-mineiro> acesso em 21 de janeiro de 2012. 1127