Universidade Federal de Ouro Preto - Escola de Minas Departamento de Engenharia Civil CIV620-Construções de Concreto Armado Curso: Arquitetura e Urbanismo CAPÍTULO 4: CISALHAMENTO Profa. Rovadávia Aline Jesus Ribas Ouro Preto, 2015/2
Plano de aula 1. Hipóteses básicas 2. Comportamento de vigas ao cisalhamento 3. Dimensionamento de armaduras transversais de vigas de seção retangular 4. Exercícios
Hipóteses básicas As vigas submetidas a um carregamento vertical qualquer, com ou sem esforço normal, estão trabalhando em flexão simples ou composta não-pura e o momento fletor é variável e a força cortante é diferente de zero. Surgem nas seções transversais da viga as tensões normais e as tensões tangenciais, ou cisalhantes, que equilibram o esforço cortante, formando um estado biaxial de tensões, com tensões principais de tração e compressão, em geral, inclinadas em relação ao eixo da viga. Para pequenas cargas não há fissuras. Mas, com o aumento do carregamento, no trecho de momento máximo (entre as forças), a resistência do concreto à tração é ultrapassada e surgem as primeiras fissuras de flexão (verticais devido à ausência de esforço cortante). Evolução da fissuração
Hipóteses básicas Se o carregamento ainda for aumentando, as fissuras serão inclinadas nos trechos entre as forças e os apoios porque o elemento estrutural fica sujeito à tensões normais e de cisalhamento (estado duplo de tensões) A inclinação das fissuras corresponde aproximadamente à inclinação das trajetórias das tensões principais, isto é, aproximadamente perpendicular à direção das tensões principais de tração Em geral, apenas as regiões dos apoios permanecem isentas de fissuras, até a ocorrência de ruptura no centro da peça Destaca-se que as peças fletidas de concreto armado devem ser dimensionadas de modo que, se atingirem a ruína, ela ocorra pela ação do momento fletor, que leva a grandes deformações antes da ruptura por cisalhamento Evolução da fissuração
Hipóteses básicas Analogia à treliça Então, uma viga esbelta de concreto simplesmente apoiada com armadura longitudinal e transversal (estribos), sob flexão simples apresenta, próximo à ruptura, fissuras inclinadas na zona em que predomina o cisalhamento e elementos de concreto comprimido formando bielas comprimidas Ritter e Mörsch, no início do século XX, idealizaram um mecanismo resistente assemelhando a viga a uma treliça de banzos paralelos e isostática formada pelos elementos Treliça fictícia Banzo superior Banzo inferior Viga real Cordão de concreto comprimido Armadura longitudinal de tração Diagonais comprimidas Bielas de compressão (concreto íntegro) entre as fissuras (θ = 45 ) Diagonais tracionadas Armadura transversal de cisalhamento: estribos (α = 90 ) ou barras dobradas (α = 45 ) θ α Analogia de treliça (armadura transversal com inclinação de 90 )
Hipóteses básicas Analogia à treliça Hipóteses básicas - fissuras com inclinação de 45 o (bielas de compressão com inclinação de 45 º ) - banzos paralelos - treliça isostática (não se considera o engastamento nas ligações entre os banzos e as diagonais) - armadura de cisalhamento com inclinação entre 45º e 90º No entanto, resultados de ensaios comprovam que o cálculo dessa forma conduz a resultados exagerados de armadura (a tensão real atuante é menor do que a obtida pelo modelo de treliça) devido a: i) a inclinação das fissuras é menor que 45º ii) os banzos não são paralelos (há o arqueamento do banzo comprimido, principalmente nas regiões dos apoios) iii) a treliça é altamente hiperestática (ocorre engastamento das bielas no banzo comprimido) Para um cálculo mais refinado, tornam-se necessários modelos nos quais são introduzidas correções. A NBR 6118 fornece dois modelos para a verificação das vigas quanto ao cisalhamento, baseados no modelo de treliça
Modos de ruptura Numa viga de concreto armado submetida a flexão simples, os tipos de ruptura possíveis são: a) Ruptura por flexão Nas vigas dimensionadas nos domínios 2 ou 3, a ruína ocorre após o escoamento da armadura, com a abertura de fissuras e deslocamentos excessivos (flechas), que servem como aviso. Nas vigas dimensionadas no Domínio 4, a ruína se dá pelo esmagamento do concreto comprimido, não ocorrendo escoamento da armadura nem grandes deslocamentos, o que caracteriza uma ruína sem aviso. b) Ruptura por falha de ancoragem no apoio A armadura longitudinal é altamente solicitada no apoio, em decorrência do efeito de arco. No caso de ancoragem insuficiente, pode ocorrer o colapso na junção da diagonal comprimida com o banzo tracionado, junto ao apoio. Essa ruína ocorre bruscamente, provocando uma ruptura ao longo da altura útil da viga, e não decorre da força cortante, mas sim da falha na ancoragem do banzo tracionado na diagonal comprimida, nas proximidades do apoio.
Modos de ruptura c) Ruptura por esmagamento da biela No caso de seções muito pequenas para as solicitações atuantes, as tensões principais de compressão podem atingir valores elevados, incompatíveis com a resistência do concreto à compressão com tração perpendicular (estado duplo). A ruptura é por esmagamento da biela comprimida de concreto e determina o limite superior da capacidade resistente da viga à força cortante. Ruptura por esmagamento da biela
Modos de ruptura d) Ruptura da armadura transversal Corresponde a uma ruína por cisalhamento, decorrente da ruptura da armadura transversal. É o tipo mais comum de ruptura por cisalhamento, sendo resultante da deficiência da armadura transversal para resistir às tensões de tração devidas à força cortante. Ruptura da armadura transversal
Modos de ruptura e) Ruptura do banzo comprimido devido ao cisalhamento Decorrente da deficiência de armadura transversal, que entra em escoamento provocando intensa fissuração (fissuras inclinadas), que invade a região comprimida pela flexão e diminui a altura dessa região sobrecarregando o concreto, que pode sofrer esmagamento, mesmo com momento fletor inferior àquele que provocaria a ruptura do concreto por flexão. Ruptura do banzo comprimido decorrente do esforço cortante
Modos de ruptura f) Ruína por flexão localizada da armadura longitudinal A deformação exagerada da armadura transversal pode provocar grandes aberturas das fissuras de cisalhamento. O deslocamento relativo das seções adjacentes acarreta flexão localizada da armadura longitudinal, levando a viga a um tipo de ruína que também decorre do cisalhamento. Ruptura por flexão localizada na armadura longitudinal
Comportamento de vigas ao cisalhamento Nos dois modelos de cálculo da NBR 6118, que pressupõem analogia com modelo de treliça de banzos paralelos, associado a mecanismos resistentes complementares, traduzidos por uma parcela adicional ao esforço cortante complementar (V c ) devido aos esforços normais na viga, devem ser consideradas as etapas de cálculo: (i) verificação da compressão na biela (ii) cálculo da armadura transversal (iii) deslocamento (decalagem) α l do diagrama de força no banzo tracionado O modelo I admite: - bielas de compressão com inclinação θ = 45º - V c constante e independente de V Sd (V Sd - força cortante de cálculo na seção) O modelo II considera: - bielas de compressão com inclinação θ entre 30º e 45º - V c diminui com o aumento de V Sd
Comportamento de vigas ao cisalhamento Nos apoios diretos, para o cálculo da armadura transversal, podem-se fazer as seguintes reduções no valor da força cortante V Sd, na região próxima dos apoios a) A força cortante oriunda de carga distribuída pode ser considerada, no trecho entre o apoio e a seção situada à distância d/2 da face do apoio, constante e igual à desta seção (V c ) (d=altura útil da viga) b) A força cortante devida a uma carga concentrada aplicada a uma distância a 2.d do eixo teórico do apoio, pode nesse trecho ser reduzida tal que: V c = V máx. a/(2.d) (a) Redução no valor do esf. cortante (carga distribuída) (b) Redução no valor do esf. cortante (carga concentrada)
Comportamento de vigas ao cisalhamento Estado limite último No ELU, a resistência do elemento estrutural ao cisalhamento, numa determinada seção transversal, é considerada satisfatória quando verificadas simultaneamente as seguintes condições Na região dos apoios, os cálculos devem considerar as forças cortantes que atuam nas respectivas faces, levando em conta a redução dada por V c
Dimensionamento de armaduras transversais O modelo I admite diagonais de compressão inclinadas de θ=45 em relação ao eixo longitudinal do elemento estrutural e que a parcela complementar V c tem valor constante, independente do valor da força cortante solicitante de cálculo (V sd ) a) Verificação da compressão diagonal do concreto Considera-se que não haverá ruína (esmagamento) da biela comprimida de concreto se a força cortante resistente de cálculo relativa à ruina das bielas for maior ou igual a força cortante (solicitante) de cálculo da seção V rd 2 0 27 α =, v2 f cd kn/cm 2 b w d cm cm V sd = 1 b) Verificação da armadura transversal A armadura transversal deverá ser dimensionada para resistir à aplicação de uma força cortante igual a V sw α v2 fck 250 ; f ck em MPa V sw V sd V c
Dimensionamento de armaduras transversais Considera-se que a força cortante complementar seja, na flexão simples e na flexo-tração com a linha neutra cortando a seção, igual a V c0, tal que: V c = V c0 V c0 = 0, 6 f ctd b w d f ctd f ctk,inf = ctk,inf ctm γ c f = 0, 7 f f ctm = 2/3 0,3 fck f ctm e f ck em MPa f f ctd ctm = resistência decálculodoconcretoà tração; fctk, inf = resistência médiadoconcretoà tração; f ck = resistência característicadoconcretoà tração; = resistência característicadoconcretoà compressão
Dimensionamento de armaduras transversais Fazendo o equilíbrio estático da treliça Determinação de A sw Equilíbrio de forças verticais F t - força de tração na armadura transversal R st - força de tração na armadura de flexão R cc - força de compressão no concreto (flexão) s - espaçamento entre os elementos da armadura transversal (passo) α - ângulo de inclinação da armadura transversal em relação ao eixo longitudinal da viga θ - ângulo de inclinação da biela comprimida de concreto V sw - parcela de força cortante resistida pela armadura transversal V sd força cortante solicitante de cálculo b w - menor largura da seção transversal d - altura útil da seção transversal f ywd - tensão na armadura transversal passiva, limitada ao valor de f yd no caso de estribos e a 70% desse valor no caso de barras dobradas, sempre > 435 Mpa A sw área da seção de aço da armadura transversal
Dimensionamento de armaduras transversais O modelo II admite diagonais de compressão inclinadas de θ em relação ao eixo longitudinal do elemento estrutural, com θ entre 30 e 45, e que a parcela complementar (V c ) sofre redução com o aumento da força cortante solicitante de cálculo (V sd ) a) Verificação da compressão diagonal do concreto Considera-se que não há ruína da biela comprimida de concreto se a força cortante resistente de cálculo relativa à ruina das bielas (V rd2 ) for maior ou igual a força cortante solicitante de cálculo da seção (V sd ) b) Cálculo da armadura transversal V rd3 - força cortante resistente de cálculo relativa à ruína por tração V sw - força cortante solicitante da seção da armadura transversal α - ângulo de inclinação da armadura tracionada: 45 ou 90 θ - ângulo de inclinação das bielas comprimidas de concreto
Dimensionamento de armaduras transversais Considera-se que a força cortante complementar seja, na flexão simples e na flexo-tração com a linha neutra cortando a seção, igual a V c1, tal que: V c = V c1 com. V c1 = V c0 quando V sd V c0. V c1 = 0 quando V sd = V rd2, interpolando-se linearmente para valores intermediários (V rd2 : força cortante resistente de cálculo das bielas comprimidas de concreto) V c0 = 0, 6 f ctd b w d Valores de V c0 (Modelo de cálculo II)
Decalagem do diagrama R st Consiste na alteração do posicionamento do diagrama da resultante nas armaduras de tração da viga, de um valor (α l ), para ajustar o valor dessa resultante obtido no modelo de cálculo na flexão e no modelo de cálculo usado para o esforço cortante Decalagem do diagrama R st
Decalagem do diagrama R st Modelo de cálculo I Quando a armadura de tração longitudinal for determinada através do equilíbrio de esforços na seção normal ao eixo do elemento estrutural, os efeitos provocados pela fissuração oblíqua podem ser substituídos pela decalagem do diagrama de força no banzo tracionado Modelo de cálculo II Para os dois modelos de cálculo. α l 0,5.d no caso geral. α l 0,2.d para estribos inclinados à 45º Essa decalagem pode ser substituída pela decalagem do diagrama de momentos fletores. A decalagem do diagrama de força no banzo tracionado também pode ser obtida aumentando a força de tração, em cada seção, pela expressão
Armaduras nos apoios i) Nos apoios extremos, onde o momento fletor atuante é considerado nulo, para garantir a ancoragem da diagonal de compressão, deve existir uma armadura capaz de resistir a seguinte força de tração (R sd ) Força de arrancamento nos apoios Caso a viga esteja submetida à flexo-tração, a força de tração (N d ) aplicada sobre a mesma deverá ser acrescida ao valor de R sd. Dessa forma, a armadura que deverá chegar até o apoio será
Armaduras nos apoios ii) Nos apoios extremos e intermediários, com momentos fletores não nulos, por prolongamento de uma parte da armadura de tração do vão (A svão ) correspondente ao momento positivo máximo do tramo (M vão ), deverá chegar as seguintes armaduras de flexão Armadura mínima nos apoios
Disposições construtivas
Disposições construtivas A armadura transversal, para resistir aos esforços de tração decorrentes da força cortante podem ser constituídas por barras dobradas (cavaletes) ou por estribos poligonais As barras dobradas (Bd) a 45º foram por muito tempo utilizadas e eram associadas às armaduras longitudinais ou eram executadas a partir dessas. Mas atualmente estão em desuso, devido a: sua execução é mais difícil há o risco de fendilhamento do concreto e risco de fissuração junto a dobra Os estribos poligonais podem ser inclinados na direção das tensões principais de tração. No entanto, essa disposição é muito difícil de ser executada e não permite ancorar devidamente a biela de concreto no apoio. Por essa razão, a disposição mais comum adotada é a vertical, que mostra outras vantagens: maior facilidade de execução e montagem podem ser melhor distribuídos e podem ter diâmetro menor que as barras longitudinais, favorecendo a aderência e diminuindo a incidência de fissuração auxiliam na montagem da armadura longitudinal podem resistir sozinhos a todo esforço cortante auxiliam na distribuição de tensões de tração produzidas pela transmissão de esforços entre concreto e aço.
Disposições construtivas Principais tipos de estribos: Dependendo da largura da viga e do número e disposição das barras é necessário utilizar estribos duplos, triplos etc. Quando são empregados estribos abertos, por razões construtivas, o lado fechado é sempre colocado no fundo da forma, quer esse lado vá ser tracionado ou comprimido. É recomendável a colocação de armadura suplementar de fechamento.
Disposições construtivas Espaçamento mínimo entre estribos Deve ser suficiente para permitir a passagem do vibrador, garantindo um bom adensamento da massa Espaçamento longitudinal máximo - Se V sd 0,67. V rd2 S max = 0,6. d 30 cm - Se V sd > 0,67. V rd2 S max = 0,3. d 20 cm Espaçamento transversal máximo entre tramos sucessivos - Se V sd 0,20. V rd2 S max = d 80 cm - Se V sd > 0,20. V rd2 S max = 0,6.d 35 cm As emendas por traspasse são permitidas somente quando os estribos forem constituídos por telas ou barras de alta aderência Espaçamento longitudinal de barras dobradas Não deve ser superior a V sd - força cortante solicitante de cálculo V rd2 - força cortante resistente de cálculo relativa à ruina das bielas
Disposições construtivas Armadura mínima para os elementos lineares submetidos a força cortante ρ sw = SW 0, 2 b w A s senα f f ctm ywk A sw - área da seção transversal dos estribos s - espaçamento dos estribos α - inclinação do estribo em relação ao eixo longitudinal da peça b w - largura da seção transversal f ctm = 0,3.f ck 2/3 tensão à tração do concreto f ywk - resistência ao escoamento do aço da armadura transversal Diâmetro dos estribos φt < 5mm b w /10
EXERCÍCIOS