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Transcrição:

BuscaLegis.ccj.ufsc.br Compra e venda com reserva de domínio Raquel Abdo El Assad * Através da compra e venda com reserva de domínio, não se transfere a plena propriedade da coisa ao comprador, pois ao vendedor fica reservado o direito ao domínio da coisa em função da cláusula pactum reservati dominii. O comprador possui tão somente a posse da coisa, continuando o domínio reservado ao vendedor até o pagamento integral do preço da coisa ou bem objeto do contrato. Só haverá transferência de domínio ao comprador após o pagamento integral do preço. Estes contratos são aqueles celebrados a prazo, no qual o preço é devido em prestacões. Esta cláusula possibilita segurança ao devedor, visto que este pode retomar a coisa que está na posse do comprador ou de terceiros caso haja inadimplemento do contrato; é uma garantia ao vendedor do pagamento integral do preço. Este contrato é semelhante aos contratos de alienação fiduciária, porém este último possui natureza jurídica diversa do primeiro porque é celebrado por instituições financeiras e possui lei própria. A natureza jurídica da venda com reserva de domínio é uma questão divergente entre os juristasa natureza jurídica da venda com reserva de domínio é uma questão divergente entre os juristas. Para explicá-la, recorreu-se à analogia a outras figuras contratuais. Há entendimentos vários, os quais serão a seguir analisados criticamente.

Alguns dizem que é modalidade particular de promessa de compra e venda pela qual o promitente vendedor se compromete a realizar a venda no momento do advento do termo. Outros, equiparam-na ao comodato, porém nessa modalidade de empréstimo a coisa, não fungível, regressa ao poder do comodante. Da mesma forma ocorre no depósito, com a diferença de que ao depositário não é permitido usar a coisa depositada e na venda com reserva de domínio a entrega imediata da coisa tem por fim possibilitar tal uso. Do mesmo modo exclui a aplicação de locação porque a coisa locada volta ao poder do locador visto que este não perde a propriedade, enquanto que o comprador no contrato em questão, usa o bem durante um tempo, pagando prestações semelhantes a alugueres, adquirindo o domínio ao integralizar o pagamento do preço. É preciso salientar que houve impugnação do pacto porque sustentava-se incompatibilidade deste com a venda de tipo francês visto que neste tipo o contrato por si só produz efeito translativo. Na Itália, sustentou-se que violentava, esta cláusula a essência da compra e venda tendo em vista a eliminação do efeito translativo. Alguns, como Walter Brasil Mujali, sustentam que trata-se de venda condicional devido a ocorrência de seu aperfeiçoamento ocorrer apenas com o pagamento do preço. Outros, como Orlando Gomes acreditam que não se trata de venda condicional porque "admitir que o pagamento do preço constitui condição suspensiva da transmissão da propriedade da coisa, é converter elemento essencial do contrato num elemento acidental. Ademais a obrigação de pagar o preço ficaria sujeita a condição meramente potestativa, desarticulando o contrato de compra e venda pela possibilidade de eliminação de de uma de suas peças insubstituíveis". (Orlando Gomes).

Certos doutrinadores acreditam ser contrato misto, ou seja a venda com reserva de domínio seria um contrato de locação com condição resolutiva e de compra e venda com condição suspensiva. Os efeitos da locação extinguir-se-iam com o pagamento de todas as prestações e a partir daí iniciar-se-iam os efeitos da compra e venda. Isto contraria a intenção das partes. Quanto à teoria do termo, esta tem como pressuposto, não correto por sinal,o pagamento do comprador como fato certo; além disso, o termo inicial suspende o exercício e não a aquisição do direito. A doutrina inclina-se para a teoria da venda sob condição suspensiva, mas, segundo Orlando Gomes é censurável este entendimento porque considera o pagamento acontecimento incerto, o que na verdade é a principal obrigação do comprador. Se fosse condição, no entendimento do mesmo autor seria tão somente potestativa visto que o cumprimento da obrigação ficaria ao arbítrio do devedor. Não há explicação clara acerca da venda com reserva de domínio nos sistemas jurídicos em que a venda tem efeitos obrigacionais. Quanto ao objeto da venda com reserva de domínio é este necessariamente coisa móvel, pois nas vendas imobiliárias o efeito da transcrição impede a reserva de domínio, entendimento este não unânime. Segundo Orlando Gomes nem todas as coisas móveis são passíveis de venda com reserva de domínio, mas somente as que podem ser individuadas, porque antes de se completar o pagamento do preço o comprador pode ser obrigado a restituir o bem ao vendedor. Na venda com reserva de domínio o comprador tem a posse da coisa para usá-la, obrigando-se a pagar o preço em prestações. Antigamente, se o devedor deixasse de

cumprir alguma prestação perderia a coisa em conseqüência da resolução do contrato e sem o recebimento dos valores pagos; assim a coisa era vendida a várias pessoas sucessivamente configurando usura, o que a Lei proibiu. Se o vendedor preferir obter judicialmente a coisa deve restituir ao comprador a diferença entre o seu valor no momento da resolução e o que faltar pagar. Caso o comprador não pague a prestação pontualmente, as obrigações viscendas são consideradas vencidas; o vendedor tem o direito de exigir judicialmente o pagamento das prestações vencidas e a vencer. Além disso, na venda com reserva de domínio o vendedor pode penhorar a coisa vendida. Com o pagamento da última prestação, a propriedade passa a ser do compradorquando houver mora no pagamento das prestações devidas pelo comprador, o vendedor pode interpor à sua escolha: ação para cobrar as prestações vencidas e viscendas ou ação para obter judicialmente a restituição da coisa vendida. Independente de audiência do comprador, tem o direito a requerer apreensão e depósito judicial da coisa vendida; enquanto não integralizar o pagamento das prestações o comprador é tão somente possuidor e não proprietário do bem e por isto não lhe é permitido alienar a coisa. Quanto à forma da venda com reserva de domínio é esta escrita, para fins de segurança do vendedor. Para valer contra terceiros, o instrumento do contrato deve ser total ou parcialmente, transcrito no registro público de títulos e documentos do domínio do comprador. Caso a coisa pereça por caso fortuito ou força maior, o comprador o comprador é o responsável e suporta o risco, então, destruída a coisa, o comprador continua com a obrigação de pagar integralmente o preço, embora não possa mais ser dono da coisa.

Com o pagamento da última prestação, a propriedade passa a ser do comprador. Há autores que confundem a venda com reserva de domínio com a simples promessa de venda, mas esta difere daquela porque apesar do pagamento de ambas ser feito em prestações, na primeira obrigação de tranferir a propriedade da coisa se cumpre ipso iure no momento em que é cumprida a última prestação do comprador e na segunda é necessário que a venda prometida se efetive, sendo indispensável outro contrato. * Advogada Disponível em:< http://www.direitonet.com.br/artigos/x/59/00/590/ > Acesso em.: 4 jun. 2007.