Tratamento do câncer no SUS



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Transcrição:

94 Tratamento do câncer no SUS A abordagem integrada das modalidades terapêuticas aumenta a possibilidade de cura e a de preservação dos órgãos. O passo fundamental para o tratamento adequado do câncer é o diagnóstico, incluindo o estadiamento, no qual se baseará o planejamento terapêutico. Para isso é essencial que a rede de serviços de saúde conte com especialistas nas áreas clínica e cirúrgica, além de procedimentos vários endoscopia, histopatologia, imagenologia, citologia e estudos laboratoriais, como o dos marcadores tumorais. Os diagnósticos precoces, que incluem estratégias de rastreamento, aumentam a possibilidade de cura para alguns cânceres e reduzem a morbidade resultante da doença e de seu tratamento. O diagnóstico do câncer deve constar de história clínica e exame físico detalhados e, sempre que possível, de visualização direta da área atingida, utilizando exames endoscópicos como broncoscopia, endoscopia digestiva alta, mediastinoscopia, pleuroscopia, retosigmoidoscopia, colonoscopia, endoscopia urológica, laringoscopia, colposcopia e laparoscopia. Na área em que houver alteração, o tecido deverá ser biopsiado e encaminhado a exame histopatológico, confirmando-se ou não o diagnóstico. Após a confirmação diagnóstica, é necessário ampliar a avaliação do paciente para estadiar a doença, ou seja, conhecer sua extensão no organismo, com o objetivo de: 1) auxiliar na escolha do tratamento; 2) fazer o prognóstico; 3) facilitar a comunicação entre os envolvidos; 4) determinar quando parar a terapia; e 5) padronizar o protocolo de tratamento. O tratamento é um dos componentes do programa nacional de controle do câncer. As metas são, principalmente, cura, prolongamento da vida útil e melhora da qualidade de vida. As principais modalidades de tratamento são a cirurgia e a radioterapia/quimioterapia (incluindo manipulação hormonal), com apoio de outras áreas técnico-assistenciais, como enfermagem, farmácia, serviço social, nutrição, fisioterapia, reabilitação, odontologia, psicologia clínica, psiquiatria e a estomaterapia (cuidados de ostomizados). Embora cada área tenha papel bem-estabelecido, a abordagem multidisciplinar integrada é mais efetiva do que uma sucessão de intervenções isoladas no manejo do paciente.

Cirurgia e radioterapia são apropriadas para tratamento da doença localizada e regional, e pode curar nos estádios precoces do câncer, especialmente quando há uma política de detecção precoce. Em geral, radioterapia e cirurgia têm papel limitado no câncer em estádios avançados. A quimioterapia pode curar alguns tipos de câncer e ter atuação efetiva em doenças disseminadas, como na doença de Hodgkin, linfomas não-hodgkin de alto grau e leucemias, além de ser válida na paliação de várias outras doenças. Exceto para cirurgias de doenças muito limitadas ou lesões pré-cancerosas (como a lesão de alto grau do colo do útero), serviços oncológicos dependem do apoio de uma estrutura hospitalar terciária, especialmente preparada para confirmar o diagnóstico e fazer o estadiamento, promover o tratamento, a reabilitação e os cuidados paliativos, que podem ser organizados na rede de serviços de saúde de forma integrada com os níveis primários e secundários de atenção. 95

96 A efetividade do tratamento do câncer varia de forma significativa conforme a localização da doença e os fatores sociais. Um dos aspectos fundamentais é o acesso à melhor terapêutica disponível. O SUS vem estruturando respostas aos desafios da organização do tratamento do câncer, levando-se em conta as dimensões e a heterogeneidade do Brasil. Alguns desses desafios: Integrar a detecção precoce ao tratamento, sem a qual tanto um quanto outro se torna menos efetivo; Estruturar a informação hospitalar em câncer em todos os hospitais do SUS que tratam a doença (RHC) para avaliar os resultados do tratamento em nível nacional; Melhorar o acesso ao diagnóstico do câncer (estruturação da média complexidade); Adotar estruturas que regulem a Atenção Oncológica na Rede SUS, de modo a facilitar o acesso ao melhor tratamento disponível; Garantir que as unidades que tratam doentes com câncer ofereçam serviços integrados, assegurando as condições para a integralidade da assistência.

97 Para responder aos desafios da estruturação da Rede Assistencial de Alta Complexidade em Oncologia, o Ministério da Saúde publicou em 2/9/98 a Portaria nº 3.535 (republicada em 12/10/98), pioneira ao estabelecer requisitos de garantia ao atendimento integral do doente com câncer e parâmetros para o planejamento da assistência oncológica. Esta portaria foi complementada por outra (nº 3.536/98), que determinou a adoção do Sistema de Autorização de Procedimentos de Alta Complexidade em Oncologia (Apac/Onco): os novos procedimentos passaram a se basear na neoplasia, e não mais nos medicamentos, com autorização prévia regulamentada e alimentando um sistema de informações. Quantidade de procedimentos de quimioterapia aprovados no SUS, por região (2001-2005) Fonte: DATASUS/SIA Valores aprovados em reais de quimioterapia no SUS, por região (2001-2005) 900.000.000,00 800.000.000,00 NORTE NORDESTE SUDESTE SUL CENTRO-OESTE BRASIL 700.000.000,00 600.000.000,00 500.000.000,00 400.000.000,00 300.000.000,00 200.000.000,00 100.000.000,00 0,00 2001 2002 2003 2004 2005

98 Em 2005, avançando na busca de respostas aos desafios da área oncológica, o Ministério da Saúde publicou as portarias nº 2.439, de 19 de dezembro de 2005, a primeira a instituir uma Política Nacional de Atenção Oncológica: Promoção, Prevenção, Diagnóstico, Tratamento, Reabilitação e Cuidados Paliativos, a ser criada em todas a unidades federadas, respeitadas as competências das três esferas de gestão; e a de nº 741, de 19 de dezembro de 2005, pela qual a Secretaria de Atenção à Saúde substitui a 3.535/98 e estabelece novas classificação e exigências para hospitais que tratam câncer (Centros ou Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia), além de estabelecer parâmetros para o planejamento da Rede de Alta Complexidade em Oncologia e definir processos relacionados à informação em câncer (RHC) e ao acesso a exames de média complexidade.

As Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) são hospitais terciários estruturados para tratar, no mínimo, os cânceres mais prevalentes no país (mama, próstata, colo do útero, estômago, cólon e reto), menos pulmão. O câncer de pele não-melanoma pode ser tratado em serviços não-especializados. Os Centros de Alta Complexidade em Oncologia (Cacon) são hospitais terciários estruturados para tratar todos os tipos de cânceres, em todas as modalidades assistenciais. Apesar dos esforços do Ministério da Saúde e de seu Instituto Nacional de Câncer, e do crescimento dos gastos e da quantidade de procedimentos oncológicos no SUS o que nem sempre significa melhores resultados, ainda há muito a ser feito em resposta aos desafios da organização e da operação da Rede Assistencial de Alta Complexidade em Oncologia, de modo a garantir à população usuária o acesso à atenção de qualidade com o melhor resultado possível. 99 Número de casos novos de câncer e quantidade de Cacon e Unacon com radioterapia própria ou referenciada, necessários e existentes no SUS, por região (jun/2006) Existentes no SUS Regiões Número de casos novos de câncer Cacon e Unacon com radioterapia necessários* Cacon e Unacon com radioterapia própria ou referenciada** Unacon sem radioterapia NORTE *** 12.650 13 6 NORDESTE *** 50.970 51 40 SUDESTE 194.700 195 103 SUL 77.260 77 43 CENTRO-OESTE *** 19.830 20 11 BRASIL 355.410 356 203 0 7 19 16 6 48 * A necessidade está baseada no parâmetro da PT/MS 741/05 de 1 Cacon ou 1 Unacon com radioterapia para cada 1.000 casos novos de câncer/ano. ** CACON ou UNACON C/ RT contado segundo capacidade instalada em radioterapia (quantidade de acelerador linear ou Unidade de Telecobaltoterapia). *** Pelo Projeto EXPANDE/ INCA/ MS, estão em implantação 6 novas UNACON (1 no Acre, 3 no Pará, 1 em Alagoas e 1 no Distrito Federal).