CURSO DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA E O ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO Iara Zimmer Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática PUCSP Silvia Dias Alcantara Machado Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação Matemática - PUCSP Resumo Este trabalho trata de questões do Estágio Curricular Supervisionado ECS em uma Licenciatura em Matemática. É parte de uma pesquisa qualitativa doutoral mais ampla, em andamento, que investiga como ECS ocorre em 5 universidades públicas brasileiras. Escolhemos universidades federais amparadas em Gatti (2009) de que é entre as universidades públicas brasileiras que se concentram as instituições de excelência acadêmica e, dentre elas, são as federais que continuam a oferecer licenciatura em disciplinas específicas, como Matemática. Do ponto de vista teórico a pesquisa se apoia em Pimenta (2010), Kulcsar (2011), Pimenta e Lima (2012) e Tardif (2014). Recorremos a um estudo de documentos oficiais referentes ao ECS das licenciaturas e ao o Projeto Pedagógico do Curso - PPC para embasar a elaboração do roteiro de entrevista semiestrturada, segundo (Lüdke e André, 1986), realizadas como o professor supervisor do ECS da licenciatura visitada. Consideramos a partir das análises que o ECS da Licenciatura da UF-A atende parte da legislação brasileira, é consolidado pelos alunos conforme Kulcsar (2011) e é concebido pelo professore mais que uma prática instrumental (Pimenta, 2010). Há conexão entre o Ensino Superior e a Educação Básica da UF-A, conforme sugere Tardif (2014). Concordamos com Pimenta (2010) que, o ECS na licenciatura é um processo contínuo, que depende do coletivo de docentes do curso, ao concebê-lo como eixo central do mesmo. Mas, falta representação docente da Educação na elaboração do PPC, resultando na desarticulação desses docentes em relação ao ECS. O acúmulo de trabalho, do professor supervisor, dificulta a conciliação de horários com os estagiários, privilegiando o C-A da UF-A, à realização do ECS, em que por um lado facilita a inserção dos alunos em uma escola de ponta, por outro impede que ele conheça a realidade da maioria das escolas públicas onde provavelmente ele desempenhará suas funções. Palavras-chave: Estágio Curricular Supervisionado, Licenciatura em Matemática, Educação Matemática. Introdução O Estágio Curricular Supervisionado é estabelecido na legislação pela: Lei n o 9394/96 (diretrizes e bases da educação nacional) pela Resolução CNE/CP 1/2002 (diretrizes curriculares nacionais à formação de professor da Educação Básica - EB, curso de licenciatura), Resolução CNE/CP 2/2002 (duração e a carga horária das licenciaturas), Resolução CNE/CES 3/2003 (diretrizes curriculares - cursos de Matemática) e pela Lei n o 11.788/2008 ( dispõe sobre o estágio de estudantes). 4753
2 De acordo com o Parecer CNE/CP 9/2002 (base Res.1/2002) o ECS tem se apresentado como um problema, aligeirado, pontual e deixado para a etapa final do curso, que precisa ser superado. Esses aspectos, segundo o parecer, dificultam o acompanhamento de um trabalho pedagógico contínuo impedindo a percepção do desenvolvimento das propostas, da dinâmica do grupo e das demais características da escola pelo estagiário. O Parecer CNE/CP 27/2001 (também base Res.1/2002) dedicado somente ao ECS, entre outras recomendações, detalha e reforça a necessidade de que o ECS seja feito nas escolas da EB, por um projeto pedagógico próprio e que ocorra a partir da segunda metade do curso. Embora documentos oficiais sobre o ECS, desde 2001, sugiram a forma de praticá-lo, treze anos após, em 2014, Silvestre e Valente (2014) denunciam que ranços do passado são mantidos na forma como algumas licenciaturas encaminham o ECS, seja pelo distanciamento entre teoria e prática e entre escola de formação e escola-campo ou pela ampla burocratização da atividade. Assim, julgamos que estes elementos sugerem uma investigação sobre o ECS do Curso de Licenciatura em Matemática sendo, portanto, pertinente conhecer e compreender como esta atividade acadêmica é proposta no PPC, e praticada hoje, por professores supervisores do ECS. Ideias Teórico-Metodológicas Considerar o estágio como campo de conhecimento significa atribuir-lhe um estatuto epistemológico que supere sua tradicional redução à atividade prática instrumental (Pimenta e Lima, 2012, p. 29). Segundo as autoras o ECS adquire papel de eixo central na licenciatura, pois além de integralizar o currículo, complementa a postura de estudioso e pesquisador para que o futuro professor tome decisões, reflita sobre sua prática, seja criativo pedagogicamente, perceba o contexto que está inserido e seja capaz de avançar para uma visão de que a ação prática é geradora de conhecimento. O ECS desempenha um indispensável papel formador, na licenciatura, na medida em que articula teoria e prática, ou seja, conecta os diferentes saberes que constituem a profissão docente, pois: [...] o professor ideal é alguém que deve saber conhecer sua matéria, sua disciplina e seu programa, além de possuir certos conhecimentos relativos às ciências da educação e à pedagogia e desenvolver um saber prático baseado em sua experiência cotidiana com os alunos. (TARDIF, 2014, p. 39) 4754
3 Tardif (2014) afirma que os saberes advindos por meio da experiência profissional lhe permite julgar sua formação anterior ou ao longo da carreira. Pois é em sua prática cotidiana que os saberes experienciais têm origem e é por intermédio das relações com os pares, jovens professores e professores experientes, que o ECS pode se caracterizar em situações que favorecem esses saberes. Kulcsar (2011) acrescenta que o ECS pode ser um instrumento fundamental no processo de formação docente, pois possibilita, ao estagiário, compreender e enfrentar o mundo de trabalho, a formação de sua consciência política e social, ligando a teoria e a prática, estabelecendo a articulação orgânica com a própria realidade. Gatti (2009) indica que as universidades públicas brasileiras concentram as instituições de excelência acadêmica e, são as federais que continuam a oferecer os cursos de licenciatura em disciplinas específicas, como Matemática. O objetivo da investigação implicou na abordagem qualitativa, situando nossa pesquisa como um estudo de caso, caracterizado pelo fato de que os cursos de Licenciaturas em Matemática investigados são de universidades públicas federais. Para compreendermos a prática do ECS, julgamos importante analisar os documentos da legislação brasileira sobre o mesmo, o Projeto Pedagógico do Curso PPC da licenciatura, obter dos responsáveis pelo ECS os dados sobre a concepção e a pratica do ECS. Identificamos tanto a universidade quanto os sujeitos voluntários, por codinomes. Obtivemos o PPC da Licenciatura em Matemática no site da UF-A. Descrição e Análise de documentos Segundo o PPC da UF-A (200x) a estrutura da Licenciatura em Matemática é embasada no Parecer CNE/CP 28/2001e segundo esse parecer [...] é preciso considerar um outro componente curricular obrigatório integrado à proposta pedagógica: estágio curricular supervisionado de ensino[...] e também, no Parecer CNE/CP 1.302/2001 e segundo o PPC da UF-A [...] poucas alterações foram necessárias, sendo a maioria delas para atender à legislação dos Estágios e da Prática como Componente Curricular [...]. O PPC foi elaborado por uma comissão composta por 14 professores da área de Matemática, 1 de Informática e Estatística, 1 de Psicologia, 1 de Física e 1 de Expressão Gráfica). A falta de representantes das áreas didático-pedagógicas é justificada no PPC pelo comentário de que: [...] em relação à formação pedagógica, as disciplinas (inclusive o Estágio) foram discutidas com os departamentos competentes, seguindo orientações gerais para todas as Licenciaturas... e respeitando a legislação; a coordenação 4755
4 do curso participou de todos os Colóquios das Licenciaturas promovidos pelo Centro de Educação. (PPC, 200x, p.5) Assim, o processo descrito acima, indica que a estruturação do ECS da UF-A se baseou em uma visão de que a licenciatura é um complemento na formação inicial de um especialista. Concepção essa reforçada pela informação de que os membros da comissão respeitaram as orientações provindas dos Colóquios das Licenciaturas. O que vigora uma visão fragmentada dos conteúdos geral e específico. A licenciatura está organizada em seis núcleos, e o núcleo 5 é constituído pelas disciplinas da formação pedagógica, incluindo o ECS, caracterizado como: [...] é a docência efetivamente acontecendo na vida acadêmica do aluno; o Estágio I insere o aluno na rotina da escola dando-lhe oportunidade de observar as aulas em todos os níveis e de efetuar pequenas tarefas relacionadas com a docência. [...] Os Estágios II e III são de docência propriamente dita, com o aluno na escola por um período maior. (PPC, 200x) Os estágios são sugeridos a partir do 5 o semestre, contendo o ECS I, 72h, o ECS II e III, 204 h/a cada, total de 480h/a, que corresponde as 400h/r exigidas na Resolução. Dessa forma, o PPC indica que se pautou na legislação e colóquios, no entanto, notamos que apenas se limitou adequar à carga horária, ao que foi prescrito. Descrição e análise dos dados coletados na entrevista com um professor supervisor O supervisor de estágio é doutor em Educação Matemática, e atua no ECS nessa licenciatura desde a década de 2010. Ele assegura que a estrutura do ECS respeita a legislação, e comenta que: [...] os professores das disciplinas de Matemática que dão aula na licenciatura não têm o mesmo compromisso do ponto de vista da educação. Fato esse causado pela própria estrutura que temos aqui na universidade, pois trabalho no departamento da Faculdade de Educação e alguns colegas pertencem ao Departamento de Matemática onde o curso fica sediado... Nós, meio que, orbitamos o curso. O que reforça nossa observação sobre a falta de articulação entre os conhecimentos específicos e os didático-pedagógicos. Ele organiza os estagiários em duplas para a realização das atividades de ECS II e III, que ocorrem no colégio, C-A, da educação básica, vinculado à UF-A [...] é uma escola aqui pertinho de nós, que acolhe com muito carinho esse trabalho e (o) entende como uma coformação. Então, é onde as minhas turmas são colocadas... É uma entidade pública, extremamente bem estruturada... Uma referência importante que propicia o desenvolvimento da docência no ECS... Há colegas que argumentam que o ECS deve ser feito numa escola da rede municipal ou estadual, mas eu prefiro o C-A, também pelas dificuldades encontradas nas escolas com relação aos horários que conciliem com os dos alunos. Explica que há 4756
5 uma resolução interna que exige um acompanhamento de pelo menos 50% das aulas de docência dos estagiários, mas revela que o excesso de atividades dentro da universidade (ensino, pesquisa, extensão e administração) dificulta a supervisão do ECS. Considerações A análise dos dados coletados nos leva a considerar que o ECS da Licenciatura em Matemática da UF-A atende a maior parte da legislação brasileira, é consolidado pelos alunos no sentido de Kulcsar (2011) e é visto pelo professor muito mais que uma prática instrumental (Pimenta, 2010). Além disso, ficou clara a conexão entre o Ensino Superior e a Educação Básica da UF-A, conforme sugere Tardif (2014). Concordamos com Pimenta (2010) que, o ECS na licenciatura é um processo contínuo que depende principalmente do coletivo de docentes do curso ao concebê-lo como eixo central do mesmo. No entanto, falta representação de docentes da Educação na comissão de elaboração do PPC, resultando na falta de articulação entre os docentes do curso em relação a essa atividade curricular. O acúmulo de trabalho, do professor supervisor, dificulta a conciliação de horários com os estagiários, levando a privilegiar a escola da UF-A, para a realização do ECS, fato esse que se por um lado facilita a inserção dos alunos em uma escola de ponta, por outro impede que ele conheça a realidade da maioria das escolas públicas onde provavelmente ele desempenhará suas funções. Referências BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CP n o 9/2001. Brasília, 8 de maio de 2001. Disponível em: portal.mec.gov.br (acesso em maio de 2014) BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CP n o 27/2001. Brasília, 2 de outubro de 2001. Disponível em: portal.mec.gov.br (acesso em maio de 2014) GATTI, B. A. Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009. KULCSAR, R. O estágio supervisionado como atividade integradora. In: A Prática de Ensino e o Estágio Supervisionado. Stela C. B. Piconez (coord.). 24. ed. Campinas, SP: Papirus, 2011. (Coleção Magistérios: Formação e Trabalho Pedagógico). LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. PIMENTA, S. G. O estágio na formação de professores: unidade teoria e prática? 9. ed. São Paulo: Cortez, 2010. PIMENTA, S.G.; LIMA, M. S.L. Estágio e docência. Revisão Técnica José Cerchi Fusari. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2012. (Coleção docência em formação. Série saberes pedagógicos). SILVESTRE, M. A.; VALENTE, W. R. Professores em Residência Pedagógica: estágio para ensinar Matemática. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. 16.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. 4757
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