QUAL A CAPITAL DA CALIFÓRNIA? CONSIDERAÇÕES ACERCA DO ENSINO DE GEOGRAFIA NOS EUA



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Transcrição:

QUAL A CAPITAL DA CALIFÓRNIA? CONSIDERAÇÕES ACERCA DO ENSINO DE GEOGRAFIA NOS EUA Henrique Dorneles de castro/universidade Federal do Rio Grande do Sul henrique.dorneles@ufrgs.br INTRODUÇÃO A geografia brasileira pode ser dividida historicamente em fases epistemológicas. Até a terceira década do século XX temos a fase clássica, caraterizada pela simples descrição e classificação de localidades, paísagens, países, etc. A fase seguinte pode ser enquadrada dentro da rigorosidade científica da academia e da razão, pois a geografia quantitativa importava-se em se afirmar como ciência e com fórmulas e modelos estatísticos para provar a realidade. A influência do positivismo cartesiano é vísivel nesta fase, que crê e busca uma teoria matemática possível de explicar todos os fenômenos. A partir da década de 70, com o terceiro encontro nacional dos geógrafos, inaugura-se a fase atual da ciência geográfica, a geografia crítica. A geografia desenvolvida nos Estados Unidos ainda pode ser considerada em uma fase anterior à geografia brasileira. No país ainda há uma grande presença da geografia tradicional na escola e da corrente quantitativa na academia. Teorias e equações ainda são as grandes explicações para a sociedade como um todo, apesar de alguns avanços em direção à criticidade, chamada de geografia radical. E em relação ao cotidiano escolar, temos que a geografia é exatamente como a imagem estereotipada de memorizar capitais, países e locais, sem nem ao menos se importar com os fatores que levam àquele arranjo espacial. Além disso, o ensino ainda se caracteriza por um foco interno. São decorados todas as capitais e estados dos Estados Unidos, porém pouco é visto do resto do mundo. A geografia nos Estados Unidos não passa pelo estágio de questionamentos que a geografia como um todo no mundo incluso no Brasil passou durante as décadas de

50/60/70. Esses questionamentos, de crises epistemológicas, que levaram à evolução da ciência geográfica nas décadas posteriores. Sobre isso, Ruy Moreira diz: Um problema, entretanto, passa a incomodar o geógrafo a partir dos anos 1950. Nessa década acontece um rápido desenvolvimento dos meios de trasnferência(transportes, comunicações e transmissão de energia) e nesse quadro de realidade já não basta à teoria geográfica localizarm demarcar e mapear o espaço. É preciso saber ler e entender de mudanças(...)é assim que o geógrafo será surpreendido pelos acontecimentos que se dão no mundo a partir dos anos 1960-1970. Só então constata que mais que localizações, os espaço são estrutura fluidas(...)por isso o mapa já se defasa da organização real dos grandes espaços no momento mesmo de sua montagem. Mais do que simplesmente localizar pontos, a geografia passa então a se importar com as razões daquela localização. E quando surge a pergunta que aprofunda o sentido da geografia, passando da memorização de lugares a questionadora do arranjo espacial. É quando a geografia adota como pergunta fundamental o por que. E é justamente neste ponto que a geografia estadunidense se diferencia, ou não evolui. Devido ao isolamento da ciência geográfica do país com outras correntes mundiais, ela não atravessa esse momento de crise. Ao não olhar para si mesmo e perceber suas limitações, acaba por não evoluir e perder espaço, limitando-se a ser uma mera ciência matemática de localização de pontos. Neste trabalho visamos trazer algumas considerações acerca da ciência geográfica nos Estados Unidos e, principalmente, seus reflexos na geografia escolar. Achamos a proposta valiosa por trazer uma evolução geográfica diferente, levando à reflexão sobre a ciência como um todo. Além disso, também achamos válido trazer o tema do distanciamento entre a geografia da academia e a escolar, muito presente na sociedade brasileira. Achamos interessante trazer que essa discussão é também presente em outros países, e como ela é conduzida, considerando seus erros e acertos. Metodologia Através de consórcio de intercâmbio FIPSE-CAPES entre as universidade Bridgewater State College (BSC) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), foi possível desenvolvermos nossa metodologia. Foram feitas observações em sala de aula de colégios públicos de Massachusetts, onde também houve atividade com os estudantes

destinadas à questionamentos sobre cultura diferentes. Também participamos de disciplinas oferecida pela faculdade BSC sobre ensino de geografia e preperação à docência. Deste modo, pudemos ter contato com a geografia sendo ensinada na sala de aula e também com as perspectivas mais recentes em voga na faculdade, servindo de base para os novos professores. Como os Estados Unidos apresentam dimensões continentais e, principalmente, muita autonomia para seus estados, as considerações feitas aqui não podem ser necessariamente generalizada para o país inteiro. Ficamos restritos ao Estado de Massachusetts, onde o ensino de geografia é vinculado às séries de ensino fundamental. Como parte mais teórica de nossa metodologia, executamos consultas a inúmeras fontes bibliográficas, advindas principalmente da disciplina cursada na faculdade de Bridgewater. Pudemos também ter acesso a livros escolares dos colégio estadunidenses e livros sobre ensino de geografia da biblioteca da faculdade. Isto proporcionou um contato direto com a literatura presente na e sobre a geografia escolar, aproximação essa só possível devido ao intercâmbio presencial. Dezoito normas, Cinco Razões, Cinco Temas Os Estados Unidos são marcados pelo seu pragmatismo, sua praticidade em vários aspectos, e nas ciências este elemento também se faz presente. Exemplo mais vivaz dentro da geografia talvez seja o desenvolvimento da geopolítica em relação à geografia política. Enquanto a geopolítica utiliza-se de preceitos da geografia para ações carregadas de interesse de dominação no território, a geografia política executa uma análise sobre como a política em si influencia e define o território (CASTRO, 2005). Pois temos que é justamente a geopolítica, mais prática para os interessese do Estado, que é mais desenvolvida nos EUA. Dito isso, não surpreende que em relação à geografia escolar haja cartilhas, com fórmulas e regras que devem ser seguidas. Ainda que as regras mais atuais até apresentem novos elementos de criticidade, devemos ainda considerá-las parte de elementos numerados de uma cartilha, ceifando a flexibilidade e a liberdade criativa que a atividade docente tanto deve incentivar, especialmente no mundo inconstante de hoje.

Uma das listas que temos, mais abrangente, é a das dezoito normas (eighteen standards). Separados em seis elementos são listados dezoito temas que devem ser trabalhados. Assim temos, por exemplo, que a pessoa geograficamente informada sabe e entende : 1 - como usar mapas e outra representações cartográfica; 5 que pessoas criam regiões para interpretar a complexidade da Terra; 12 os processos, padrões e funções dos estabelecimentos humanos; 17 como aplicar a geografia para interpretar o passado. Destes poucos itens listados, podemos ver que alguns são questionadores, levam a um pensamento sobre a realidade espacial. Ainda assim, a forma como são apresentados é um tanto matemática demais, podendo fazer com que se esvazie esse elemento que consideramos positivos. Corre-se o risco de se importar mais em aplicar as dezoito regras, de maneira matemática, do que interpretar a profundidade que alguns deste itens podem trazer. Atualmente o grande paradigma do ensino de geografia no EUA são os cinco temas de geografia ( Five Themes of Geography): Localização, Regiões, Movimento, Lugar, Interação Homem-Meio. Esses cinco temas são interligados, e são os nortes do ensino de geografia, abrangendo dentro de si outros assuntos. Podemos ver que alguns destes temas poderiam coincidir com nossos conceitos geográficos, como por exemplo lugar ou interação homem-meio. Todavia, não há profundidade suficiente nos temas para considerálos conceitos, não há grandes discussões epistemológicas por detrás deles. Tanto é que a idéia de lugar aparece apenas na geografia escolar, e apenas como tendo diferentes características humanas e físicas. Ou seja, esses temas surgem para a geografia escolar, para o ensino de geografia; não são conceitos desenvolvidos na ciência geográfica sendo agora levados para a escola. E ao tratar a interação homem-meio como apenas mais um tema, a geografia estadunidense parece estar disperdiçando uma grande oportunidade de trazer uma das questões essenciais da geografia para o debate acadêmico. De novo, o excessivo pragmatismo presente nesta sociedade acaba por trazer resultados negativos, ao esvaziar as discussões e reflexões que poderiam trazer grandes considerações para a ciência geográfica dos EUA. Do modo como está atualmente, a geografia estadunidense busca uma afirmação, uma razão para existir e ser ensinada da escola. Este questionamento também foi enfrentado

pela geografia brasileira e mundial, fruto justamente da crise epistemológica devido à disparidade entre a geografia e a realidade. Enquanto busca superar suas limitações, a geografia dos EUA apresenta, de novo na forma de lista, cinco razões de por que é uma disciplina escolar essencial. Dentro destas razões, temos a perspectiva espacial presente na geografia, que não poderia ser desenvolvida nos estudos sociais (Journal of Geography, 2003). Dentro dessas cinco razões, já podemos ver algumas evolução que parecem indicar uma evolução da ciência geográfica, como essa perspectiva espacial e as habilidades de solucionar problemas desenvolvidos na geografia. Outra perspectiva surgida no ensino de geografia são as questões geográficas. Apresentadas novamente em forma de lista, pergunta-se se as questões do professores levam os estudantes a considerar determinados aspectos. Aqui cabe destacar o item processos, apresentando a pergunta por que as coisas estão situadas onde estão?. Novamente vemos uma perspectiva de possível evolução da ciência geográfica, pois essa pergunta leva à superação do simples localizar pontos no espaço. Oficinas Durante a disciplina de ensino de geografia cursada na BSC, onde as perspectivas teóricas apresentadas anteriormente foram vistas, os estudantes deveriam elaborar um aula e executá-la para a turma, como se estivessem numa sala de aula de escola. O tema era livre, assim como a escolha da série em que a aula seria aplicada. Então era onde poderíamos ver como todas as idéias de ensino de geografia estavam sendo apreendidas pelos futuros professores e como eles transformariam os atuais paradigmas de ensino em aulas. Basicamente, é onde a teoria transforma-se em prática, tornando esse elemento como crucial na nossa análise. Iremos agora apresentar algumas das oficinas desenvolvidas pelos estudantes da universidade, bem como a avaliação feita pelo professor. Oficina 1 Cinquenta estados, cinquenta capitais A primeira oficina que quermos mostrar é também a que foi mais elogiado e teve melhor nota. Um jogo envolvendo todos da turma chamada I have, who has...? (eu tenho, quem tem...?). Cada aluno pegava um pedaço de papel, onde tinha uma capital e perguntava

que tinha a capital de outro estado. Deste modo, o aluno que tivesse a capital daquele estado deveria levantar-se e dizer a capital, em seguida perguntando quem tinha a capital do estado presente no seu papel. O que temos aqui é uma aula que não leva os estudantes a pensarem, mas sim a memorizarem a capital dos Estados e só.

Figura 1 oficina do jogo I have, who has...?

Oficina 2 as estações pelas estações A segunda aula que queremos trazer é sobre as quatro estações. A dinâmica de aula foi interessante, com cada aluno desenhando roupas de cada estação em diferentes bonecos. Porém, o que queremos ressaltar aqui é como o conteúdo foi trabalhado posteriormente ou melhor, como não foi trabalhado. O objetivo da aula era entender que temos quatro estações diferentes ao longo do ano e quais aspectos estão incluídos em cada uma. Ou seja, não se trabalhou por que existem as estações do ano, por que elas mudam,qual a relação entre a mudanças da estação e a inclinação do eixo terrestre e todas as outras questões que deveriam ser trabalhadas. Há que considerar, no entanto, que a aula era prevista para primeira série do ensino fundamental, onde realmente seria impossível trabalhar questões tão complexas. Isso nos leva, porém, ao questionamento se a geografia deve ser uma disciplina em especial desde tão cedo e ser suprimido no níveis mais avançados. Porque em Massachusetts a geografia escolar existe no ensino fundamental apenas. Ora, ao antecipar demais a geografia, acabase por esvaziá-la nos momentos seguintes por manter a característica em todas as séries. Para se poder trabalhar com crianças tão pequenas, perde-se muito do conteúdo da geografia. Certas habilidades geográficas devem ser trabalhadas desde cedo, mas a nosso ver não como uma disciplina específica e sim como habilidades.

Figura 2 aula sobre as quatro estações

Oficina 3 Chile (férias) A última oficina que queremos aqui destacar é sobre o Chile. Trazemos esta aula para falar de um aspecto ainda muito presente no ensino de geografia nos EUA: o foco na figura do professor em detrimento do aluno. Temos que a figura central na sala de aula é o professor, pondo os estudantes como meros ouvintes. No ensino de geografia no Brasil buscamos superar essa barreira, pela visão de que o conhecimento não está no professor somentes. O modo como os alunos seres humanos se relacionam com o meio também pode criar conhecimento geográfico. A aula apresentada sobre o Chile começou de forma interessante, com o professor vestindo camisetas de futebol de vários países. À medida que ele tirava as camisas, indagava de qual país era aquela seleção, até chega na correspondente ao Chile. Esse início foi dinâmico, chamou bastante a atenção da turma e desequilibrou os alunos através de uma forma divertida. Porém, novamente, o potencial da aula não fora aproveitado. O que se seguiu foram vinte minutos com uma pessoa na frente falando sobre o Chile, ou melhor, sobre o que tinha visto no Chile nas suas férias. Aqui, mais uma etapa que poderia ser bem aproveitada, mostrando como a geografia pode ser vista numa visita turística como por exemplo nos Andes e na sua formação. Esta aula foi centrada na figura do professor, e apenas nela como grande e única fonte de conhecimento. Qual a capital da Califórnia? Apesar de algumas tendências parecerem ir em outras direções, mais críticas, o que pudemos constatar da geografia ensinada no estado de Massachusetts um foco da geografia escolar,na prática, na localização de pontos no espaço. Memorizam-se capitais e estados, na versão mais estereotipada possível de geografia; e ainda assim esses pontos são interiores, apenas os que têm relação com os Estados Unidos, mantendo a sua visão já fechada em relação ao resto do mundo. Basta saber a capital da Califórnia que o aluno já domina parte considerável da geografia básica. Mas, qual é a capital da Califórnia? Entre as cidades mais importantes deste que é o estado mais rico dos EUA podemos citar Sacramento, San Francisco, San

Diego e Los Angeles. Aqui entra uma característica peculiar do arranjo espacial estadunidense, fator que poderia ser ainda mais motivador de uma geografia crítica. Nem sempre a capital é a cidade mais desenvolvida. No caso da Califórnia, a capital é Sacramento, ao contrário do que muito poderiam pensar Los Angeles ou San Francisco. Com este tema tão adorado nos EUA das capitais dos Estados poderia se trabalhar uam geografia muita mais profunda e de reflexões muito maiores: por que a capital não é a principal cidade do estado? Quais os fatores de cada uma das cidades e dos estados que levaram a esta formação economico-espacial (MOREIRA, 2007)?. E mesmo tendo só o foco nas capitais, poderia se perguntar por que a capital é localizada naquele ponto. Consideramos entender mais importante do que decorar, pelo próprio aprendizado e pelas possibilidades de superação que o entendimento das questões gera. A memorização é passível de esquecimento, até porque é um processo que deve estar sempre sendo atualizada para não se perder a informação. No momento em que um aluno esquecer a capital da Califórnia, se ele entendeu os motivos que elvam uma cidade a ser fundada em determinado local e que as capitais foram as primeiras a serem fundadas, ele conseguirá raciocinar e entender onde seria o melhor lugar para um cidade-capital. O aluno que simplesmente decorou nomes, no momento que esquecê-los não terá outros recursos. E como na vida enfrentamos desafios para os quais não pudemos decorar as respostas antes, a capacidade de raciocinar é essencial.

Referências Bibliográficas CASTRO, Iná Elias de. Geografia e Política: território, Escala de Ações se Instituições. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005 GERSMEHL,Phil. Teaching Geography. New York:The guilford Press, 2008 NATIONAL GEOGRAPHY STANDARDS, 1994. MARRAN, James. Geography: an essential school subject Five reasons why.journal of Geography 102, p. 42-43. MOREIRA, Ruy. Pensar e Ser em Geografia: ensaios de história, epistemologia e ontologia: do espaço geográfico. São Paulo: Contexto, 2007. PATTISON, William. The four Traditions of Geography. Journal of Geography, p. 202-206,1990.